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22/10/2023

Carta para Gilberto


Carlos Monteiro

 

Fotografia Carlos Monteiro


O Rio de Janeiro continua lindo"...

Ôooo, Seu Gilberto, me perdoe, mas tenho que discordar de você meu querido Imortal...

O Rio de Janeiro tem todas as prerrogativas, todos os encantos naturais e de seu povo que exaltava, isso mesmo exaltava felicidade. No entanto essa cidade está sofrendo e sofrida, anda triste e cabisbaixa. Acho que perdeu o tom, pois literalmente perdeu Tom Jobim. Ele já não senta à sombra da sumaúma que hoje leva seu nome, ele já não anda pela praia até o Leblon, já não há mais Plataforma e Seu Alberico e, como diria Drummond, "...já não há...", aliás,  Gilberto, andam teimando em roubar seus óculos, do Drummond, o poeta já não tem mais sossego, vive aos saltos no banco da praia que, em fotografia imortalizada por Rogério Reis se transformou em imagem, eternizada em bronze, de suas formas e, pois é, as vezes cansado com tantas selfies... Poetas também cansam.

Mesmo sabendo que há inocentes no Leblon ou que “no mar nesta estava escrita uma cidade”.

Pois é, Gilberto, essa cidade que você mandou abraços já não é mais aquela. Já não tem mais aquele elan, diria Claude Amaral Peixoto. Queria, eu poder passear com a minha bike..., "tá" bom, o Ancelmo vai dizer que bike é o cacete, eu sei, tudo bem, com meu camelo, minha magrela, pelas ciclovias da cidade, mas, anda meio complicado.

  

Fotografia Carlos Monteiro

Pela orla até vai, vejo a paisagem, as meninas coloridas pelo sol, que encantavam Vininha, vejo meus amanheceres, meus pôr dos sóis, dou aquela paradinha para o mate gelado, para o Biscoito Globo, mas só chego até o fim do Leblon.

Queria ir até São Conrado, pois essa era ideia da ciclovia da Niemeyer, queria pegar minhas ondas no canto da praia, naquele cantinho democrático, onde todos os surfistas são bem-vindos, onde a galera da Rocinha e os bacanas da Zona Sul se confraternizam à espera da rainha, a onda perfeita para dropar, para o tubo, para se exibirem, para compartilharem a felicidade.

Mas Gilberto, agora não dá, a ciclovia, batizada de Tim Maia, caiu, desmoronou, desabou, tombou, desintegrou, matou seres humanos. A ciclovia foi derrubada por uma ressaca, não uma vez, mas algumas vezes. Fiquei imaginando o Tim, deve ter se revirado no túmulo, deve estar rogando pragas, por ter seu nome atrelado a esta obra até hoje e o fará por toda eternidade. Não tiro sua razão, afinal o que era belo, o que era nobre, o que era para ser do Leme ao Pontal, foi interrompido por umas ressacas, logo umas ressacas que nunca derrubaram o Tim que adorava ver o “azul da cor do mar”.

Pois é, Seu Gilberto, a coisa aqui anda feia, já cantava o Francisco, agora, também, anda difícil.

Sabe Gilberto, ando, ultimamente, meio triste, queria tanto ver “essa gente bronzeada mostrar seu valor...”, queria sair às ruas com minha magrela e circular toda cidade, queria poder sair lá da Penha, do Meier, de Madureira ou, quem sabe, de Ramos e pedalar até o Pontal e vice-versa.

Sabe Gilberto, queria muito voltar a ser feliz, queria muito dizer que é FelizCidade, queria muito receber novamente ‘aquele abraço’.


Fotografia Carlos Monteiro