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26/12/2020

SMS

 

fotografia Carlos Monteiro

Carlos Monteiro

Há alguns dias, passei a receber mensagens, por SMS, do meu cartão de crédito. Até aí nada de anormal, afinal todas as instituições financeiras o fazem a fim de dificultar fraudes. A questão eram as compras realizadas em um momento que estava recluso. Logo pensei: fraude! Mas, com valor tão baixo? Seria um teste? Numa leitura mais apurada percebi que não se tratava do meu cartão, pois a numeração final era completamente diferente daquela impressa em relevo naquele pequeno pedaço de mau caminho de financiamento. Um engano do sistema?  Erro no envio?

Fiz contato com a operadora para dirimir todas as dúvidas. Nenhuma fraude, nenhuma tentativa de compra com o meu dinheiro plástico. Nada. A Hipótese aventada pela atendente, é que ao cadastrar o número telefônico, o incauto cliente, se confundiu com algum número, cadastrando o meu celular no sistema. Tudo bem, acontece, quem nunca? O que fazer para desfazer tal engano? “Senhor, não temos como estar fazendo nada”... Como assim? É só descadastrar e pronto. “Senhor, impossível estar fazendo o ‘descadastramento’, não sabemos qual cliente cadastrou”. Bacana, bloqueio então o número do SMS, assim acaba a aporrinhação. Não posso, se assim o fizer passo a não receber os meus avisos. O jeito é conviver.

Mas, quem era aquela pessoa, seria nova, mais velha, homem, mulher, transgênero, travesti, alta, baixa, gorda ou magra. Quem seria aquela personagem?

Aos poucos, pelo perfil consumidor, fui traçando aquela personagem em minha mente. Aquela ou aquele comprador misterioso. As primeiras aquisições não me deram muitas pistas: Uber, “hoje em promoção no Guanabara”, espetinhos delícia do Beto, carrocinha Podrão do Zé, armarinho São Jorge. Nada, nenhuma pista. Todos os protagonistas que elucubrei fariam estas ações independente de gênero e idade. Já tinha um dado, a minha personagem, provavelmente mora na região de Pilares e é bem chegada a uma alimentação não muito saudável. Seria gulosa(o), talvez fora de forma? Quem sabe nas próximas compras alguma dica viria. E vieram: bolo da Vó Alzira, Cantinho da Picanha e Maria Lúcia sorvetes. Sentenciei: gulosa(o). Na verdade, é uma afirmativa baseada em fatos. Não necessariamente pode espelhar a verdade. Não é porque alguém compra comida em fast-food e frequenta restaurantes, pratica um dos sete pecados capitais.

Noutro dia me preocupei; minha personagem fez uma corrida no Uber às 4h de 112 reais. O que teria acontecido? Uma emergência? Era uma sexta-feira. Saiu da farra e foi deixar amigo(a)os, Namorad(a)o em casa? Fez uma pequena viagem? O que terá sido? Nesse ritmo, fui acompanhando o passo a passo dessa personagem. Pequenas compras variadas. Depósito de balas, Casa do Bom Biscoito, 99 Táxi - não devia estar satisfeita com o Uber -, Lojas Americanas... da mesma forma que acompanho as compras, também vejo o saldo diminuir. Me questiono: vai virar o mês no vermelho? Vai poder comer o churrasquinho nosso de cada dia? A cervejinha sagrada dos fins de semana? Sobrará crédito?

Hoje seus hábitos mudaram o que me levou a crer que possa ser uma mulher. Pela manhã esmalteria da Milena, Burger King, Salão da Madá. À tarde, provavelmente no shopping, foi a vez da C&A, Pelo Sim, Pelo Não, Loungerie. Batata; os hábitos estavam diferentes. Estaria feliz e se cuidando? Um novo amor, nova paixão, toda contente? O que me dizes cartão? O que comprara no grande magazine? Que roupa íntima terá adquirido... essa curiosidade que me queima por dentro; o que será, que será?

À noite, novo ‘plin’ em meu celular: Pilares Grill. Opa, um grelhado sempre cai bem... mas, que grelhado terá sido? Com quem andará a personagem? Mais um ‘plin’, provisão da 99 Táxi R$ 18,67. Hum, parece uma corrida rápida, para onde vai minha personagem. Vinte minutos depois, mais um ‘plin’: 99 Táxi R$ 17,20. Opa, economizou. Foi por caminhos mais curtos, talvez.

Alta madrugada, acordo com o ‘plin’ do celular. Atordoado pela sonolência e lá estava, mais uma compra. “Compra no estabelecimento 52728963-87”. Uhuuu!

Entendedores entenderão. Minha personagem foi feliz esta noite...

Ou não. Oh dúvida cruel!

 

14/12/2020

A sombra da bailarina

 

Aquarela Ana Nunes

Ana Nunes

Sempre me perguntei, principalmente nesses tempos bulímicos onde o que importa é a barriga tanquinho, a figurinha esquálida, se o homem aprecia mesmo sua presa gordinha, roliça de carnes para segurar e delícias para sondar.
Tive dúvidas. Tive pulgas atrás da orelha. E resolvi desenhar mulheres rechonchudas. Aí me vieram ideias de bailarinas. Porque conheço uma bailarina que apesar do tempo e das tristezas da vida lhe colocarem um peso a mais, continua sua leveza nas aulas de balé para suas alunas. Fico maravilhada!

E despindo-as, as gordinhas, vi que elas são belas! Sem os panos que as amarram e deformam, fazendo dobras e rolinhos e estufados, elas trazem linhas apuradas! Diferentes e delicadas.

Aí, porque o processo criativo é um não acabar nunca na sua vontade própria e invasiva, pensei nas sombras das bailarinas. Até porque a linha do desenho objeto me basta e não gosto de encher com fundos e fakes. E as sombras delas poderiam completá-las. E se as sombras fossem seus subconscientes trabalhando e atrapalhando? Mostrando o que elas realmente gostariam de estar fazendo?
Confesso que fiquei tentada a colocar, além do cigarro e sua fumaça romântica, uns copos e umas flores. E uma certa eroticidade, influências do querido Schiele, mas disse para mim mesma, calma, vá com calma. Uma coisa de cada vez meu filho me ensinou.
Também me tentou a primavera e dei a elas nomes de flores.

Aquarelas Ana Nunes


Tive ótimas modelos! Corri atrás das bailarinas do maravilhoso Degas, das meias verdes do Egon Schiele, queria desenhar como ele, e de umas bonequinhas russas.
E me dei bem, acho. Queria que elas fossem velhas, um reflexo de mim, mas a juventude ganhou! Pena mesmo. Mas chego lá. Ainda quero seios pendurados e faces murchas! Tipo escultura da Camille Claudel. A velhice não é difícil só no real. No imaginário também! E nos traços. Podem ficar amargos (e geralmente são) ou caricaturais.

Coloquei para mim a meta de umas sete. Mas fui indo e desenhando, encomendei mais papel, abri novos tubos de aquarela e parei nas vinte.

E ficou um resto do desenho nas mulheres gordinhas que encontro nas raras vezes em que saio da toca. Eu as vejo, tiro seus panos, e tenho vontade de dizer-lhes, sabe que você é linda?

Aquarelas Ana Nunes


E, para os meus amigos,









08/12/2020

Into the wild blue yonder

 

Chuck Yeager e o X-1 na base de Muroc

Wilson Baptista Junior

Toda criança, nova ou antiga, tem seus heróis de infância. E eu, criança antiga, não sou exceção.

Hoje um dos meus viajou para mais longe.

Desde pequeno fui um apaixonado pela aviação. Desde o primeiro aviãozinho de papel que meu pai me ensinou a fazer, depois pelos aviõezinhos de madeira que ele construía para mim em sua oficina e que eram a inveja de meus colegas do primário, passando depois pelos planadores que eu adorava construir e fazer voar, e até por pequeninos modelos como um, que cabia na palma de minha mão, que fiz num torno de joalheiro com fuselagem de latão e asas de aço, de um avião francês da Primeira Grande Guerra.

Meu sonho de garoto era ser um piloto de caça. Mas quis o destino que a miopia crescesse mais depressa do que a idade, e quando cheguei aos dezoito anos já não conseguia passar nos exames de vista da Força Aérea.

Dinheiro para o curso de piloto civil não houve na juventude, e depois ao correr dos anos outras prioridades foram aparecendo. Sobrou-me o encanto de voar levado por outros, em aviões pequenos e grandes de todos os tipos, que guardo até hoje e me levou por tantos lados.

Hoje de manhã cedo recebi a notícia da morte de um dos pilotos que fizeram história. O hoje general Charles Yeager, mas que todo o mundo chamava de “Chuck”, e que em 1947, pilotando um avião que parecia uma bala de fuzil, com o nome de sua mulher pintado ao lado da cabina, duas asinhas afiadas como lâminas, um motor foguete na cauda e duas toneladas e meia de combustível altamente explosivo atrás do piloto, foi deixado cair da barriga de um bombardeiro B-29 a sete quilômetros de altura, acendeu o foguete e disparou para o céu.

A quase treze quilômetros de altura ele nivelou o avião, acelerou ao máximo, e se tornou o primeiro homem a atravessar a barreira do som e sair vivo do outro lado. Depois, sem combustível, o motor apagado, desceu planando até aterrissar no lago seco de Muroc.

Hoje voar mais rápido do que o som é coisa de rotina, até um avião de passageiros, o belíssimo Concorde, hoje aposentado pelos altos custos de operação, levou muita gente viajando ao dobro dessa velocidade. Mas naquela época era uma incógnita, só se sabia que ao chegar perto daquela velocidade o ar comprimido pelo avião, de um deslizamento suave se transformava numa verdadeira muralha aerodinâmica que alterava todos os efeitos dos controles e podia levar o avião a se despedaçar. Daí o nome que lhe deram de “barreira do som”, e mais de um piloto pagou com a vida o encontro com essa muralha ao mergulhar em alta velocidade em aviões que não tinham sido construídos para enfrentá-la.

Alguns anos depois, quando eu já tinha idade para ler, acompanhei o desenvolvimento da série de aviões experimentais que eles chamavam de “aviões X” (X era a abreviação em inglês de “experimental”, aquele de Yeager foi o X-1). Um trabalho magnífico que foi empurrando cada vez mais para longe os limites da aviação, num tempo em que não havia computadores, os engenheiros usavam réguas de cálculo e pranchetas de desenho e não se sabia muito como esses aviões iam voar quando chegava a hora de um piloto corajoso entrar nele e tirar a prova.

Alguns dos leitores talvez tenham visto uma parte da história de Chuck Yeager num filme que fez sucesso em 1983 e trouxe o título em português de “Os Eleitos” (em inglês se chamava “The Right Stuff”) que mostrou a progressão dos pilotos destes primeiros aviões até os astronautas que chegaram à Lua.

Chuck aprendeu a atirar desde garoto caçando para ajudar a encher a geladeira da família na Virgínia do Oeste, foi piloto de caça na Segunda Guerra Mundial, foi abatido sobre a França e fugiu para a Espanha ajudado pelos maquisards, voltou a combater e terminou a guerra como capitão e duplo ás (piloto com mais de dez vitórias), depois da guerra foi piloto de testes, desde os primeiros aviões a jato americanos até o programa dos Aviões X, e voltou a lutar, já como tenente coronel, comandando um esquadrão de caça na guerra da Coréia.

Mas não quero aqui fazer uma biografia dele. A quem por acaso quiser saber mais recomendo a sua auto biografia, ou o livro do Tom Wolfe, “The Right Stuff”, que deu origem ao filme, e que fazem companhia um ao outro numa estante atrás de onde estou escrevendo. Só falei do começo da sua vida para poder falar no que ele escreveu ao final de sua biografia, com sessenta e dois anos: 

“Tenho um enorme prazer pessoal em voar um F-20, mas conheço pessoas demais que erigiram barreiras, paredes reais de tijolos, apenas porque têm cabelos grisalhos, e que se isolam, definitivamente de coisas que amaram fazer toda a vida pensando – Estou muito velho para fazer isto ou aquilo, isso é para os mais jovens – Viver até uma idade avançada não é um fim em si próprio; o truque é aproveitar os anos que ainda nos restam”. E termina dizendo: “Ainda há tantas coisas que quero fazer, nunca perdi minha curiosidade sobre as coisas que me interessam. (---) Não fiz tudo ainda, mas quando chegar meu fim não terei perdido muita coisa”.

Chuck nos deixou hoje, com noventa e sete anos, para voar definitivamente para “o selvagem azul lá em cima”, que é a tradução do título deste post e como os pilotos do tempo dele chamam o infinito céu.

E ao pensar nisso me lembro de um poema escrito por um piloto canadense  chamado John G. Magee Junior, lutando pela RAF na Segunda Guerra Mundial, poucos dias antes de morrer num acidente com seu Spitfire, e que me vem à memória sempre que tenho a alegria  de voar:

"Oh, I have slipped the surly bonds of earth,
And danced the skies on laughter-silvered wings;
Sunward I've climbed, and joined the tumbling mirth
of sun-split clouds -and done a hundred things

You have not dreamed of -.wheeled and soared and swung

high in the sunlit silence. Hovering there
I've chased the shouting wind along
and flung my eager craft through footless halls of air.

Up, up the long delirious burning blue
I've topped the wind-swept heights with easy grace,
where never lark, or even eagle, flew;

and, while with silent, lifting mind I've trod
the high untrespassed sanctity of space,
put out my hand and touched the face of God."

E que, se me perdoarem a tradução, fica mais ou menos assim:

“Oh, eu me livrei dos tristes laços da terra
e dancei pelos céus em asas prateadas pelo riso;
subi para o sol, e me uni à alegria buliçosa
das nuvens divididas pelo sol – e fiz um cento de coisas

De que nunca sonhastes –rodopiado e planado e me balançado

bem alto no silêncio ensolarado. E lá pairando
persegui pelos céus o vento uivante
e lancei meu ávido aparelho por salões sem piso de ar.

Alto, mais alto pelo longo, delirante, flamejante azul
escalei com graça ligeira os cimos varridos pelos ventos
onde nunca voaram nem a águia nem a cotovia

E enquanto com a alma silente e elevada pisei
a alta e intocada santidade do espaço
estendi a mão e toquei o rosto de Deus.

 


02/12/2020

Dinheiro não traz felicidade...

 

O Príncipe Charles e a Princesa Diana (fotogtrafia em Saltwire)

Francisco Bendl

Assisto a série promovida pela Netflix, The Crown, que aborda a realeza britânica ou os Windsor.

Deixando de lado alguns detalhes históricos, os episódios são primorosos pela qualidade, pela veracidade ao passado do pai da Rainha Elizabeth II, que se viu rei com a abdicação ao trono pelo seu irmão, Edward VIII, que optou por ser feliz ao lado da mulher amada, renunciando ao dever de ser rei do povo britânico.

Recomendo que assistam à série, pois uma das melhores já feitas e que assisti ao longo da minha vida.

Agora, se o célebre ditado, “dinheiro não traz felicidade”, existe quem possa contestá-lo, inclusive alegando que pode não trazer, porém ajuda muito, o seriado que mencionei e recomendo é a prova cabal que a máxima popular tem razão!

Pode-se dizer que a vida nos castelos e palácios ingleses são uma espécie de contos de fadas.

Luxo, abundância, riqueza, poder, pajens, vassalos, seguranças, mordomos, uma condição que não se vê numa pessoa mesmo abastada porque lhe falta a linhagem, a influência local e mundial, as exigências que a corte estabelece e que devem ser cumpridas acima da felicidade dos membros da realeza.

Pois, se dinheiro, fama, uma vida inigualável não é suficiente para qualquer pessoa se sentir bem, a família real britânica é o exemplo!

O personagem mais enigmático, contido, infeliz, frustrado, ligado somente em si mesmo, egoísta, invejoso, uma personalidade titubeante, inseguro, é nada mais nada menos que o príncipe Charles.

Não é por nada que a rainha jamais abdicou para lhe transferir o poder e torná-lo rei, pois ela sabe como ninguém que o seu filho não tem a menor condição de ser o monarca esperado.

Bom, mas não quero me desviar do assunto.

A questão é eu tentar transmitir se existem motivos para alguém sadio física e espiritualmente, herdeiro de um trono, rico, poderoso, ter se deixado ser exemplo de infeliz, e esse é o enredo dessa crônica.

Charles desposou a mulher de que o mundo se enamorou, apaixonou-se, adorava e reverenciava.

Foi a mulher mais fotografada na história, e uma das mais fotogênicas, se não a maior de todas.

Diana era linda, meiga, sensível, deixava-se abraçar, pegar na sua mão, embalava crianças, sentava-se perto de aidéticos, visitava feridos e doentes, viajou para a África, simplesmente levou os Windsor para patamares nunca dantes imaginados pela realeza inglesa.

Mas, trouxe consigo uma necessidade premente de carinho, de afeto, de ser amada, pois a sua família havia sido desfeita quando a sua mãe se separou do pai.

Charles, antes de Diana, tinha o seu amor voltado para uma mulher casada, frívola, porém o escutava, consolava, entendia como ninguém os problemas do príncipe, quando ia ao seu encontro furtivamente para desabafar.

Chamava-se Camila Parker Bowles.

Curiosa ou ironicamente, hoje Duquesa da Cornualha...

Pois bem.

Camila, se comparada à beleza de Diana, seria o mesmo que eu disputar com Einstein quem seria mais inteligente!

Diana ofuscava; Camila não tinha luz alguma.

Mas, mulher mais velha que Charles, tinha o segredo de como agradar um homem, de como envolvê-lo, ainda mais em se tratando de um uma pessoa medíocre, ridículo, inseguro, mimado e superficial.

Se Diana esperava encontrar um príncipe que a levaria à felicidade plena, Charles ao ser obrigado a se casar com a srtª Spencer, queria transformá-la em mera seguidora de seus passos, uma mulher submissa, apenas para “o inglês ver” como o seu matrimônio era feliz.

Camila era inesquecível, Diana não lhe agradava, pelo contrário, em muitas ocasiões deixava a sua esposa “em casa”, e se mandava para os macios braços e o colo quente da sua verdadeira amada.

No entanto, certamente a grande mágoa de Charles, a sua frustração, a sua impotência constatada por ele mesmo, dizia respeito à sua vida.

Ele não a tinha como desejava, pois estava determinada para ser o futuro monarca britânico.

Príncipe, rico, poderoso, influente, uma vida nababesca mas, antes da sua felicidade, havia o senso do dever!

Então, a sua rebeldia, infelicidade, e algoz da sua esposa, a encantadora e maravilhosa Diana, a Princesa de Gales, com a qual se viu obrigado a se casar em detrimento do seu amor, Camila.

A preocupação da corte com Charles era tanta, que a rainha e o seu pai, Phillip, que abandonara a sua brilhante carreira na Marinha para se casar com Elizabeth, imaginavam que Charles poderia copiar o seu tio, rei Edward VIII, que abdicara do trono para estar ao lado da mulher dos seus sonhos, gerando uma crise imensa na coroa, e que chegou a ser discutida a sua continuidade ou não!

Se Charles fizesse o mesmo, o futuro da realeza britânica estaria irremediavelmente em jogo.

Logo, encontrar uma esposa para Charles ficou sendo uma tarefa de todos os membros do palácio de Buckingham, de modo a tirar Camila da mente do filho mais velho da rainha, o herdeiro do trono inglês.

Resumo da tragédia real britânica:

Diana começou a devolver ao Charles a sua traição com Camila, e escancarada.

Diziam as más línguas, que o quarto da princesa tinha uma porta giratória, de tantos eram seus visitantes furtivos e ocasionais.

Nas várias tentativas de Charles pedir que a mãe lhe concedesse se separar de Diana, e a rainha o obrigava a tentar a reconciliação, mais ainda Charles se tornava infeliz, magoado, derrotado.

Até que chegou um dia que a rainha ouviu de seus auxiliares as peripécias amorosas da sua nora, e concordou com o divórcio.

Diana, expulsa da família, execrada pelos Windsor, morreria em seguida, buscando uma felicidade que jamais encontrara.

A comoção mundial e, principalmente, a britânica, obrigou que a família resolvesse dar importância ao episódio trágico.

No dia do enterro, com o caixão de Diana sendo conduzido por uma carruagem levada por vários cavalos, quando passou em frente à rainha, esta em um gesto que deixou a todos perplexos, que devolve as críticas que recebera pelo tratamento dado à morta, meneia a cabeça, reverenciando a princesa que deixara de existir!

A rainha rompia com o cerimonial, a tradição, e saudou a passagem da sua ex-nora como se fosse ela a rainha e, Elizabeth, a princesa!

Charles finalmente se casou com Camila. Encontrou a felicidade, enfim. Atendeu aos apelos de sua vontade, do seu egocentrismo, da sua vida pequena.

Mas, a rainha, cujo senso do dever é maior do que ela mesma, que a sua felicidade pessoal, a sua responsabilidade com o povo suplanta qualquer anseio particular, também cobrou do filho um preço pelo que fizera com Diana e o seu próprio futuro:

Jamais será rei!

Charles se deixou vencer pela emoção, pela paixão, pela sua vontade.

Um legítimo monarca não pode pensar em si, mas na tradição do nome, na linhagem, na realeza, que deve estar acima de tudo e todos.

Ao se equiparar com uma pessoa comum, da plebe, comprovou que não teria condições de colocar a coroa, que exige de quem a usa qualidades muito acima dos mortais, conforme os sacrifícios que devem ser feitos e que se espera de um rei.

De fato, dinheiro não traz felicidade e, até para contrariar o complemento do ditado que ajuda a encontrá-la, a realeza britânica, a mais importante do planeta, cuja rainha é a mais longeva na história do trono inglês, a condenação pelo fausto, poder, abundância, refinamento, riqueza, veio na forma de ser negada a felicidade aos Windsor, uma punição cruel, convenhamos.

Dito isso, até que estar no SPC, Serasa, não ter crédito na praça, ser um pelado não é nada importante, se a chance de ser feliz é muito maior que a dos ricos e poderosos.

Se eu não fosse um pobretão, sem eira nem beira, jamais eu teria encontrado a Marli pois, em tempo algum eu teria conhecido a verdadeira felicidade!

Tá bem, volta e meia ela se queixa, reclama da falta de condições, que ainda residimos em casa alugada, jamais viajamos para o exterior ...

Então respondo:

- Marli, minha amada mulher, quando nos casamos eu te prometi uma vida de emoções, lembras?

- Que emoções, Chico, se não temos nada?

- Ora, emoções no sentido de hoje termos o que comer, amanhã quem sabe; hoje residimos em uma casa, mas podemos ser despejados; agora temos roupas, no futuro, sabe-se lá, se não temos de usar folha de parreira; temos algumas moedas que sobraram de ontem, possivelmente no dia seguinte teremos de pedir dinheiro emprestado ... queres uma vida mais emocionante que esta??!!

Percebi que a minha felicidade estaria fatalmente comprometida, caso ela acertasse a frigideira que atirou em mim!

Para a minha felicidade, a Marli errou!