O mundo inteiro viu as notícias, e milhões de pessoas acompanharam ao vivo o salto de paraquedas patrocinado pela Red Bull, quando depois de cinco anos de treinamento e preparação Felix Baumgartner saltou de uma gôndola pressurizada levada por um balão a 39.045 metros de altitude, caiu por 4 minutos e 22 segundos em queda livre, durante a qual quebrou a barreira do som e atingiu uma velocidade estimada de 1.343 quilômetros por hora antes de abrir o paraquedas. Foi um feito magnífico, ajudado por toda uma tecnologia de ponta. Felix usou um traje espacial desenvolvido especialmente para o salto, alimentado dentro da gôndola por uma mistura de nitrogênio e oxigênio líquidos, e durante o salto por dois cilindros acoplados a seu traje espacial.
Os recordes anteriores que Felix quebrou tinham sido estabelecidos cinquenta e dois anos atrás por um piloto de provas da Força Aérea Americana, o capitão Joseph Kittinger, em agosto de 1960 (Aliás Kittinger, hoje coronel reformado, funcionou como consultor no projeto da Red Bull). Kittinger saltou de 31.333 metros de altitude, num projeto da Força Aérea para testar um sistema de estabilização de paraquedas que permitisse aos pilotos escapar de aviões que na época estavam atingindo altitudes cada vez maiores.
Durante a Segunda Guerra Mundial, os aviões de combate atingiam altitudes de mais de doze mil metros, e havia uma controvérsia sobre qual seria a melhor maneira de escapar de um avião a esta altitude; se seria melhor abrir o paraquedas imediatamente e depender de um maior suprimento de oxigênio para flutuar até o solo, ou cair rapidamente uns dez quilômetros em queda livre e abrir o paraquedas numa altitude onde já se pudesse respirar.
Em 1943 um cirurgião aviador da Força Aérea resolveu testar ele mesmo, e saltou de uma Fortaleza Voadora B-17 a 12.164 metros carregando um cilindro de oxigênio, abrindo o paraquedas logo após o salto. O choque da abertura do paraquedas fez com que ele ficasse inconsciente e arrancou as luvas das duas mãos. Por sorte o oxigênio funcionou e o manteve vivo até chegar a uma altitude mais baixa. Outro cirurgião aviador, o Coronel Mel Boyton, resolveu testar a técnica oposta, com queda livre longa, mas recusou-se a usar um dispositivo que abriria automaticamente o paraquedas a baixa altitude porque os pilotos de combate não dispunham do mesmo dispositivo. Saltou de pouco mais de 12.400 metros mas não chegou a abrir o paraquedas; pode ter perdido a consciência, e aparentemente ainda estava olhando para o cronômetro quando bateu no chão.
Depois deste acidente a Força Aérea interrompeu os testes.
Nos anos seguintes os aviões continuaram a voar cada vez mais rápido e cada vez mais alto, e em 1952 a Força Aérea começou um programa para desenvolver técnicas de escape que funcionassem entre 18.000 e 30.000 metros de altitude. E decidiu que o melhor meio de fazer os testes seria utilizando balões estratosféricos.
Testes lançando bonecos de grande altitude mostraram que o maior problema era que os bonecos começavam a girar durante a queda, chegando a atingir duzentas rotações por minuto, o que faria com que os pilotos perdessem a consciência e não pudessem comandar a abertura dos paraquedas. Com a baixa pressão de ar naquelas altitudes, seria também muito difícil para os pilotos controlar sua posição aerodinamicamente, utilizando a posição dos braços e perna como superfícies de controle, como os paraquedistas fazem em saltos em queda livre a altitudes mais baixas. Além disso, os pilotos de combate não são paraquedistas treinados. Era preciso encontrar uma solução que não dependesse do piloto.
Francis Beaupré, da Divisão Médica Aeroespacial da Força Aérea, projetou um paraquedas que deveria em três estágios: Depois de dezoito segundos de queda livre, para atingir uma velocidade em que a pressão do ar fosse suficiente para um mínimo de controle, um pequeno paraquedas auxiliar com trinta centímetros de diâmetro se abriria, puxando um paraquedas estabilizador de um metro e oitenta, que deveria estabilizar o piloto na posição de pés para baixo. Chegando a uns seis mil metros de altitude, o paraquedas estabilizador puxaria para fora o paraquedas principal e interromperia a queda livre. Todo o sistema devia funcionar sem intervenção do piloto, para o caso em que ele tivesse perdido a consciência.
Depois de cento e quarenta testes do sistema Beaupré com bonecos lançados de até 30.000 metros, Kittinger saltou de um Hércules C-130 a nove mil metros de altitude, e a Força Aérea considerou que o sistema estava pronto para ser testado saltando da estratosfera.
A Força Aérea não tinha uma gôndola fechada que permitisse um salto fácil, então resolveram utilizar uma gôndola aberta, projetada para vôos de balão de baixa altitude, pouco mais do que uma cadeira de braços pendurada do balão. Como o objetivo dos testes era provar que um piloto de combate poderia sobreviver ao salto, Kittinger tinha que usar um traje de vôo padrão de combate, parcialmente pressurizado, durante todo o vôo, e depender de garrafas de oxigênio para respirar. Qualquer falha da pressurização do traje, a grandes altitudes, poderia causar sua morte em poucos minutos. A sua única proteção adicional era um macacão de vôo com isolamento térmico, vestido por cima do traje, para protegê-lo do frio extremo lá em cima. Ele levava ainda uma mochila no peito, com instrumentos, câmaras e o oxigênio para mantê-lo vivo durante o vôo e o salto.
Usando esta "cadeira voadora", Kittinger fez um total de três saltos. No primeiro, de 23.000 metros, em 26 de novembro de 1959, o paraquedas auxiliar se abriu antes da hora, e a falta de pressão de ar fez com que ele chicoteasse e se enrolasse no pescoço do piloto. Sem a estabilização, Kittinger começou a girar e perdeu a consciência, que só recuperou a menos de dois mil metros, pendurado do paraquedas reserva. Devido à falha do auxiliar, o paraquedas estabilizador e o principal não se abriram, e Kissinger só se salvou por causa do sistema barométrico que abriu o paraquedas reserva a três mil metros de altitude.
Com algumas pequenas correções no projeto dos equipamentos, Kittinger saltou de novo em 11 de novembro, desta vez de 22.700 metros. Tudo funcionou perfeitamente, e em 16 de agosto do ano seguinte ele subiu no balão até a altitude de 31.333 metros.
Durante a subida a pressurização da luva direita falhou, e a mão inchou até quase o dobro do seu tamanho original. Apesar da dor e do risco, Kittinger não avisou o controle do vôo antes de atingir sua altitude máxima por medo de que abortassem o salto.
Numa queda livre de quatro minutos e meio e quase vinte e seis quilômetros, ele atingiu a velocidade de 1.012 quilômetros por hora.
Como piloto da Força Aérea, Kittinger não teve direito a nenhuma compensação pecuniária pelos riscos que correu no projeto, além de seu soldo de capitão. Depois do programa de testes, pilotou balões para o projeto Stargazer, levando astrônomos em vôos a 25.000 metros de altitude, e depois ofereceu-se como voluntário na guerra do Vietnã, voando em 485 missões de combate até ser derrubado pelo inimigo e feito prisioneiro em 1972.
Depois de se reformar com o posto de Coronel, Kittinger continuou voando, e em 1984 foi o primeiro piloto de balão a fazer um voo solitário dos Estados Unidos até a Europa.
Tanto Felix Baumgartner quanto Joe Kittinger utilizaram nos seus saltos a tecnologia mais desenvolvida de suas épocas, mas não deixa de ser interessante olhar a grande distância entre uma e outra.
A filmagem do seu salto (incluindo o primeiro feito do Hércules) pode ser vista aqui:
https://www.youtube.com/watch?v=Qw8OJJQ_hgk
O site da Red Bull com a história da missão e os detalhes da tecnologia do salto de Félix está aqui:
http://www.redbullstratos.com/technology/
E uma história bastante detalhada do projeto da Força Aérea está aqui:
http://stratocat.com.ar/artics/excelsior-e.htm
Um blog de conversas sobre assuntos variados. Mano é o apelido de infância de Wilson Baptista Júnior.
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21/10/2012
01/10/2012
Câmaras em sala de aula - atestado de falência (de quem?)
Dias atrás, um colégio particular tradicional de São Paulo (o Colégio Rio Branco) mandou instalar câmaras de vigilância em suas salas de aula. Os alunos protestaram, recusando-se a entrar nas salas com câmaras até que a diretora do colégio se manifestasse - e em vez de receberem explicações foram punidos com suspensão.
O episódio provocou polêmica, com opiniões diversas sobre a maneira como a escola tratou o protesto dos alunos e sobre a legitimidade da colocação das câmaras. Não vou entrar aqui nessa discussão, porque me faltam informações confiáveis sobre a maneira com que a escola preparou (ou não) os alunos para a introdução das câmaras. O que me chamou a atenção foi um artigo da psicóloga Rosely Sayão, na Folha de São Paulo, a respeito do caso.
Rosely, contestando a instalação das câmaras, diz no seu artigo:
"As escolas estão se rendendo ao aparato tecnológico que vigia alunos e professores. A justificativa para o seu uso é semelhante em todos os lugares em que as câmeras são instaladas: segurança.
A escola, sempre é bom lembrar, tem a função de educar. Para a cidadania, inclusive, como costumam documentar a maioria dos projetos pedagógicos.
E qualquer tipo de educação escolar só se concretiza a partir da relação entre professores e alunos. É a partir dessa relação que tudo acontece: ensino, aprendizagem, embates, conflitos, conhecimentos etc.
Podemos dizer que é essa relação, uma relação de confiança, que viabiliza a educação escolar.
Pois bem: a presença de câmeras em sala de aula é um atestado de falência, assinado pela própria instituição, dessa relação. Sinal de que imagens valem muito mais do que palavras, diálogos, conflitos, encontros e desencontros, regras e transgressões."
Eu queria discutir um pouco essa afirmação da Rosely, que parece implicar que a falência da relação de confiança é culpa da instituição escola.
O que infelizmente temos visto, repetidamente, no noticiário são agressões físicas de alunos a professores, dentro das escolas, e, mais preocupante ainda, agressões físicas de pais, mães, e outros parentes de alunos aos professores.
Na minha opinião isso não indica uma falência das escolas, reflete uma falência da sociedade como um todo. Em primeiro lugar, uma falência dos pais. Sim, dos pais. Que não ensinam mais aos filhos o respeito ao próximo. Porque isso, apesar de ser uma coisa que se leva toda a vida aprendendo, se aprende primeiro em casa.
(Respeito ao próximo não significa obrigação de aceitar as opiniões do próximo. Eu fui criado, e junto com minha mulher, que também é assim, tentei passar isto para meus filhos, para não aceitar passivamente uma opinião de ninguém sem examiná-la e questioná-la à luz do conhecimento que eu já tivesse a respeito do assunto. Isso me levou a ter muitas discussões com professores, do grupo escolar à universidade. Estive certo algumas vezes, errado noutras. Com todas elas aprendi mais um pouco. Para mim, eram coisa normal, faziam parte de estar na escola. Mas, tanto quanto posso me lembrar, creio que nunca deixei de respeitar, no meu comportamento, a relação professor / aluno dentro da sala de aula. E nem depois, passando para o outro lado, nos muitos anos em que dei aulas e treinei pessoas).
Em qualquer relação de convivência, seja na escola, no trabalho, no esporte, na rua, em qualquer tipo de sociedade, é preciso haver uma coisa que se chama "civilidade".
Uma palavra que se ouve pouco hoje, e que muita gente que gosta de falar em liberdade, em direitos e em cidadania desconhece. Vem do latim "civilis", que significa "próprio do cidadão". "Cidadão", por sua vez, vem do latim "civitas", cidade. É aquele que vive numa cidade. E é do ser cidadão que vem a palavra cidadania.
Civilidade, então, significa o comportamento próprio de uma pessoa que vive numa cidade, quer dizer, a maneira como deve se comportar alguém que não vive isoladamente, vive perto de outras pessoas. É ela que faz com que as pessoas consigam viver numa sociedade. As civilizações existem porque as pessoas vivem em sociedade. O progresso existe porque as civilizações existem. E a cidadania tanto tem direitos quanto deveres. Uma coisa não existe sem a outra. Senão a conta não fecha.
A civilidade pode ser definida, de maneira simples, como o respeito pela pessoa do outro. E a sua regra mais básica, mais essencial, do respeito pela pessoa do outro não tem nada a ver com hierarquia, com autoridade, com posição. Ela diz simplesmente "Não faças aos outros o que não queres que te façam". Ou, de outra maneira, "Trate o outro como você gostaria de ser tratado". É simples assim.
Mas se é tão simples, porque os pais já não conseguem ensinar aos filhos o respeito ao outro? Talvez porque a vida moderna venha tornando isso mais difícil? Porque eles têm menos tempo para passar com os filhos e assim acham que podem delegar à escola esta parte da sua formação? Ou, talvez, porque eles mesmo respeitem menos o próximo?
Eu acredito nesta última razão. E acredito porque a maneira de se ensinar a civilidade não é falando dela, é pelo exemplo. É vendo a maneira com que os pais tratam um ao outro, os filhos, os que estão perto e os que não estão tão perto, que os filhos aprendem a fazer o mesmo. Não adianta pregar uma coisa e e não fazer o que se prega, as crianças não são burras, elas percebem muito bem como agimos. E o que elas veem?
Veem os pais dentro de uma sociedade onde se diz uma coisa e se faz outra, onde a pequena corrupção (aquela do jeitinho para resolver os problemas imediatos do indivíduo, das carteiras de estudante compradas fraudulentamente para pagar meia entrada, do parar o carro em qualquer lugar porque "é só um instantinho, não vai atrapalhar ninguém", das redes de aviso das blitzes da lei seca nos celulares, da venda de recibos falsos por profissionais para diminuir o imposto de renda dos outros, e de tantos outros exemplos), onde tudo se torna aceitável porque "não faz tanto mal assim, os políticos roubam muito mais", vai tomando conta, onde a violência nas ruas se torna cada vez mais gratuita e os assaltantes matam os assaltados para mostrar ao público que não se deve resistir a eles, ou simplesmente porque não se incomodam mais com isso, e porque sabem que provavelmente não serão presos e condenados. Uma sociedade onde o povo já não respeita a classe política porque ela não respeita o povo que a elegeu. Mas onde o mesmo povo reclama da grande corrupção e acha natural praticar a pequena.
Como vamos querer que eles ajam com civilidade? Como vamos querer que se tornem cidadãos?
Se não souberem viver em sociedade, a sociedade vai falir. Quando uma sociedade cresce, ela só tem dois caminhos: civilização ou barbárie. Que eu saiba, ainda não conseguiram descobrir outro.
O link para o artigo da Rosely está aqui: http://www1.folha.uol.com.br/educacao/1161476-opiniao-camera-em-sala-de-aula-e-um-atestado-de-falencia.shtml
O episódio provocou polêmica, com opiniões diversas sobre a maneira como a escola tratou o protesto dos alunos e sobre a legitimidade da colocação das câmaras. Não vou entrar aqui nessa discussão, porque me faltam informações confiáveis sobre a maneira com que a escola preparou (ou não) os alunos para a introdução das câmaras. O que me chamou a atenção foi um artigo da psicóloga Rosely Sayão, na Folha de São Paulo, a respeito do caso.
Rosely, contestando a instalação das câmaras, diz no seu artigo:
"As escolas estão se rendendo ao aparato tecnológico que vigia alunos e professores. A justificativa para o seu uso é semelhante em todos os lugares em que as câmeras são instaladas: segurança.
A escola, sempre é bom lembrar, tem a função de educar. Para a cidadania, inclusive, como costumam documentar a maioria dos projetos pedagógicos.
E qualquer tipo de educação escolar só se concretiza a partir da relação entre professores e alunos. É a partir dessa relação que tudo acontece: ensino, aprendizagem, embates, conflitos, conhecimentos etc.
Podemos dizer que é essa relação, uma relação de confiança, que viabiliza a educação escolar.
Pois bem: a presença de câmeras em sala de aula é um atestado de falência, assinado pela própria instituição, dessa relação. Sinal de que imagens valem muito mais do que palavras, diálogos, conflitos, encontros e desencontros, regras e transgressões."
Eu queria discutir um pouco essa afirmação da Rosely, que parece implicar que a falência da relação de confiança é culpa da instituição escola.
O que infelizmente temos visto, repetidamente, no noticiário são agressões físicas de alunos a professores, dentro das escolas, e, mais preocupante ainda, agressões físicas de pais, mães, e outros parentes de alunos aos professores.
Na minha opinião isso não indica uma falência das escolas, reflete uma falência da sociedade como um todo. Em primeiro lugar, uma falência dos pais. Sim, dos pais. Que não ensinam mais aos filhos o respeito ao próximo. Porque isso, apesar de ser uma coisa que se leva toda a vida aprendendo, se aprende primeiro em casa.
(Respeito ao próximo não significa obrigação de aceitar as opiniões do próximo. Eu fui criado, e junto com minha mulher, que também é assim, tentei passar isto para meus filhos, para não aceitar passivamente uma opinião de ninguém sem examiná-la e questioná-la à luz do conhecimento que eu já tivesse a respeito do assunto. Isso me levou a ter muitas discussões com professores, do grupo escolar à universidade. Estive certo algumas vezes, errado noutras. Com todas elas aprendi mais um pouco. Para mim, eram coisa normal, faziam parte de estar na escola. Mas, tanto quanto posso me lembrar, creio que nunca deixei de respeitar, no meu comportamento, a relação professor / aluno dentro da sala de aula. E nem depois, passando para o outro lado, nos muitos anos em que dei aulas e treinei pessoas).
Em qualquer relação de convivência, seja na escola, no trabalho, no esporte, na rua, em qualquer tipo de sociedade, é preciso haver uma coisa que se chama "civilidade".
Uma palavra que se ouve pouco hoje, e que muita gente que gosta de falar em liberdade, em direitos e em cidadania desconhece. Vem do latim "civilis", que significa "próprio do cidadão". "Cidadão", por sua vez, vem do latim "civitas", cidade. É aquele que vive numa cidade. E é do ser cidadão que vem a palavra cidadania.
Civilidade, então, significa o comportamento próprio de uma pessoa que vive numa cidade, quer dizer, a maneira como deve se comportar alguém que não vive isoladamente, vive perto de outras pessoas. É ela que faz com que as pessoas consigam viver numa sociedade. As civilizações existem porque as pessoas vivem em sociedade. O progresso existe porque as civilizações existem. E a cidadania tanto tem direitos quanto deveres. Uma coisa não existe sem a outra. Senão a conta não fecha.
A civilidade pode ser definida, de maneira simples, como o respeito pela pessoa do outro. E a sua regra mais básica, mais essencial, do respeito pela pessoa do outro não tem nada a ver com hierarquia, com autoridade, com posição. Ela diz simplesmente "Não faças aos outros o que não queres que te façam". Ou, de outra maneira, "Trate o outro como você gostaria de ser tratado". É simples assim.
Mas se é tão simples, porque os pais já não conseguem ensinar aos filhos o respeito ao outro? Talvez porque a vida moderna venha tornando isso mais difícil? Porque eles têm menos tempo para passar com os filhos e assim acham que podem delegar à escola esta parte da sua formação? Ou, talvez, porque eles mesmo respeitem menos o próximo?
Eu acredito nesta última razão. E acredito porque a maneira de se ensinar a civilidade não é falando dela, é pelo exemplo. É vendo a maneira com que os pais tratam um ao outro, os filhos, os que estão perto e os que não estão tão perto, que os filhos aprendem a fazer o mesmo. Não adianta pregar uma coisa e e não fazer o que se prega, as crianças não são burras, elas percebem muito bem como agimos. E o que elas veem?
Veem os pais dentro de uma sociedade onde se diz uma coisa e se faz outra, onde a pequena corrupção (aquela do jeitinho para resolver os problemas imediatos do indivíduo, das carteiras de estudante compradas fraudulentamente para pagar meia entrada, do parar o carro em qualquer lugar porque "é só um instantinho, não vai atrapalhar ninguém", das redes de aviso das blitzes da lei seca nos celulares, da venda de recibos falsos por profissionais para diminuir o imposto de renda dos outros, e de tantos outros exemplos), onde tudo se torna aceitável porque "não faz tanto mal assim, os políticos roubam muito mais", vai tomando conta, onde a violência nas ruas se torna cada vez mais gratuita e os assaltantes matam os assaltados para mostrar ao público que não se deve resistir a eles, ou simplesmente porque não se incomodam mais com isso, e porque sabem que provavelmente não serão presos e condenados. Uma sociedade onde o povo já não respeita a classe política porque ela não respeita o povo que a elegeu. Mas onde o mesmo povo reclama da grande corrupção e acha natural praticar a pequena.
Como vamos querer que eles ajam com civilidade? Como vamos querer que se tornem cidadãos?
Se não souberem viver em sociedade, a sociedade vai falir. Quando uma sociedade cresce, ela só tem dois caminhos: civilização ou barbárie. Que eu saiba, ainda não conseguiram descobrir outro.
O link para o artigo da Rosely está aqui: http://www1.folha.uol.com.br/educacao/1161476-opiniao-camera-em-sala-de-aula-e-um-atestado-de-falencia.shtml
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