Fotografia Wilson Baptista Junior |
Wilson
Baptista Junior
Neste
domingo vi aqui da minha janela, ao vivo, o que é solidariedade.
Tínhamos
terminado de almoçar quando a Ana, indo às janelas olhar suas flores, me chamou
a atenção para uma senhora, sentada no patamar da porta fechada de uma papelaria
do outro lado da rua.
A senhora,
provavelmente sem teto, como atestavam as sacolas ao seu lado que deviam conter
todas as suas posses, estava ali há horas, acompanhada de três viralatas deitados
ao seu lado no passeio. Aparentemente não tinha comido nada nesse período. Ana
pegou no tabuleiro de lasanha de carne moída e presunto, ainda pela metade, que
tínhamos comido no almoço, pegou num par de colheres, desceu, atravessou a rua
e entregou para a senhora. Ela agradeceu com um gesto de cabeça, e esperou
imóvel que a Ana voltasse para o nosso prédio.
Da
janela, vi a senhora desembrulhar o tabuleiro, tirar a máscara, pegar numa das
colheres e começar a comer. Sentindo o cheiro os cachorros se levantaram, e ela,
com todo o cuidado e com a mesma colher, levava um bocado de comida à boca de
cada um, depois comia ela mesma uma colherada, e calma e pausadamente repetia o
ciclo.
Depois,
tirou de sua sacola um vidrinho de álcool, higienizou cuidadosamente as mãos, recolocou a máscara e
se recostou novamente contra a porta da loja.
Fiquei
parado um bom tempo na janela, pensando no tanto que representava para ela, sozinha,
desabrigada e certamente faminta, abrir mão daquela porção de comida para
alimentar os seus cachorros, comparado com o pouco ou nada que representava
para nós aquele meio tabuleiro de lasanha.
E me
senti muito pequeno. Minhas preocupações com a pandemia, com os inevitáveis
incômodos da idade e da vida diária simplesmente desapareceram, não significaram
mais nada frente ao mudo e compassivo cuidado daquela senhora.
Volto a
olhar pela mesma janela e ela não está mais lá. Continuou seu caminho, só Deus
sabe para onde, com suas sacolas e seus companheirinhos. E levou comigo um
pedaço da minha alma.
Onde
estiver, senhora, muito obrigado.
A gente aprende a cada dia e vê que a humanidade não está perdida. Obrigada a você por compartlhar esta experiência tão valiosa e à Ana por ser quem ela é.
ResponderExcluirTita, irmãzona, a gente aprende sim. Graças a Deus, Um abração.
ExcluirMano, isso toca o coração. Vai um pedaço da minha alma também.
ResponderExcluirPois é, Guto, que bom poder ter contado isso para vocês! Um abraço do Mano
ExcluirQue lição de vida essa senhora nos deu
ResponderExcluirAprender a doar e compartilhar o pouco que tem
Da janela encontrar este gesto de atenção com os pequenos companheiros
Uma sensibilidade que nos toca profundamente
A vc e Ana o meu abraço
Léa, uma lição de vida sim. Quantas vezes quem tem menos é que nos ensina o que é dar mais.
ExcluirUm abraço do Mano
"...tem certos dias qdo passo no subúrbio eu muito bem vindo de algum lugar...é gente humilde, que vontade de chorar..." Wilson/Ana: meu abraço afeto e admiração. Deus os abençoe!
ResponderExcluirAmigo Paulo, seu comentário já diz tudo. Um abraço do Mano
ExcluirGrande Mano,
ResponderExcluirDe nada teria sido válido a solidariedade da mulher para com seus cachorros, incluindo dividir a comida no mesmo talher, se tu não tivesses observado esse comportamento humano, que só percebemos entre os desvalidos.
Qualquer vida para o pobre e miserável tem valor, ainda mais quando são aquelas que lhes acompanham diariamente, mesmo que nada tenham para comer.
O cão é o exemplo da fidelidade ao dono, do seu amor, do seu carinho, do seu afeto.
Se podemos extrair ensinamentos preciosos, a forma como o animal se conecta ao seu dono, e sem qualquer condição, seria o exemplo a ser seguido pelos racionais.
No entanto, fazemos sempre alguma distinção, principalmente a racial e a social.
O gesto da Aninha foi absolutamente humano.
Ela fez o que devia, apesar de muitos não obedecerem esta caridade para com o próximo.
A maneira como a mulher lhe agradeceu foi sublime.
Assim como recebera a comida para se alimentar, fez o mesmo com as suas companhias, seus amigos, aqueles que a amam.
E dividiu o alimento, servindo-lhes na mesma colher que se onde saboreou a deliciosa comida.
Por que seus amados (cachorros) não poderiam ter a mesma satisfação que ela?
Parabéns pela crônica, caro Wilson.
Belo gesto teu, Aninha, que se condoeu da miséria alheia e lhe levou comida.
A corrente que se elaborou com esta atitude de levar o alimento ao necessitado foi esplêndida:
A Ana se sentiu bem;
Wilson agradeceu;
a mulher se alimentou;
seus cachorros comeram também;
a tua crônica nos deixou felizes e agradecidos;
Tudo porque a Aninha levou comida para uma mulher carente, e que nada pediu para ser atendida!
Depois dizem que o santo, meu xará, Francisco de Assis, não tem razão:
"Ó mestre, fazei que eu procure mais
Consolar que ser consolado
Compreender que ser compreendido
Amar que ser amado
Pois, é dando que se recebe
É perdoando que se é perdoado
E é morrendo que se vive
Para a vida eterna"
Abração ao casal de amigos meus.
Saúde e paz, extensivo aos seus amados.
Chicão, o gesto dela tem tanto mais valor quanto ela não se preocupou nem por um instante se era visto ou não por alguém mais. Simplesmente, partilhava sua vida com os seus companheiros de caminho. E São Francisco, sim, sabia muito bem do que ele falava. Como o xará dele, muitas vezes, também :)
ExcluirUm abraço do Mano
Mano,
ResponderExcluirNos disse há muito o mesmo Nelson Sargento que nos deixou ontem:
"Agoniza mas não morre
Alguém sempre te socorre
Antes do suspiro derradeiro"
Cada um de nós tem o seu suspiro derradeiro já marcado, pouco importa quando. Ele é apenas a certeza do certo sem dúvida. Entretanto, esse meio do caminho desde o primeiro suspiro é que faz toda essa diferença que vai nos compondo.
A cena que você descreve - e nem preciso falar no gesto da Ana, seu também - foi um socorro descrito no samba. É esclarecedora e definitiva: mesmo que a vida esteja uma m...., há lugar para a grandeza humana. E suspeito que o pedaço de sua alma não foi levado pela senhora da rua com cachorros, ela é apenas parte da grande alma coletiva das pessoas de bem. Por isso, todos nós sentimos na alma, a mesma de todos, o tamanho do que você viu e sentiu. Abraço.
1)Parabéns ao casal pela importante iniciativa.
ResponderExcluir2)Eu comentei no Facebook, vou tentar por aqui novamente.
3) Abraços humanísticos !