Ana Nunes - aquarela e lápis de cor |
Ana Nunes
Nesses
começos de Outono a minha terra acorda em acordes de azul, amarelo e verdes
muitos. Os das montanhas vão de verde folha intenso, passa ao verde queimado e
vai se esverdejando até o azul longínquo. Onde só se vê o tênue contorno contra
o céu sem nuvens. Às vezes aparecem umas branquinhas, branquinhas como ovelhas
fugitivas que o vento tranquilo empurra para um redil qualquer.
Esse ventinho fresco cheiroso de mato não encontro em mais lugar nenhum. Só
aqui ele venta assim delicado e friozinho e vai trazendo cores para colocar
aqui um pouco de vermelho, um pouco de laranja ali. E um verde amarelo limão de
galego, capeta e siciliano. Cheiro bom de lembranças mil.
Da
minha janela cuidadora de violetas roxas e rosas e brancas vejo um pedaço dessa
corrente verde das montanhas protegendo nossas casinhas singelas espalhadas por
acima e por abaixo. Casinhas brancas e coloridas, igrejinhas solitárias
encastelando um morro onde nem precisa de missa. É só olhar em cima e em volta
e estar em graça. Oração do mato, da natureza, do coração.
E
assim, nesse agasalho das montanhas, nasce escondida nossa famosa e mal
entendida desconfiança recheada de acolhimento. Acolhimento de café adoçado com
broa de milho, pão de queijo com queijo, angu com quiabo e pé de moleque de
rapadura e amendoim para se comer escondido no passear da tarde.
Somos
também cheios de beijos estalados e abraços apertados proibidos por agora nessa
sombra escura que ponteia meu coração. Vamos estocando caladinhos como bons
mineiros porque mais tarde vai ser um abraço sem fim!
Porque a vida continua, não é meu querido cavalheiro?
Na
minha terra o Outono vem meio quente ao meio dia. E a terra solta aromas de
campo querendo chuva. Mas deixa a tarde cair lentamente e o ar fresco vem de
novo refrescar. É a hora entre arrulhos que os pássaros voltam para casa. É
tempo de se aninhar.
Ah!
O poente outonal da minha terra incendeia o céu azul com tons impossíveis! De
fogo que não queima, de laranja da terra, de roxo emprestado das violetas. E
sem que se perceba essa cor dos deuses vai cedendo espaço á noite serena e
complacente. Para mim é o momento da paz, da Ave Maria e do Ângelus. Hora de
esvaziar a alma para as estrelas se instalarem no nosso sono.
E quando é lua cheia, brilhante e redonda por completo, pesadona ao olhar, esse
outono traz uma luz diferente, fantasmagórica que corta o ar fino e frio e
espicha sombras fantasmagóricas no cimento das calçadas.
E
então eu pergunto ao meu espelho do espaço profundo se há no mundo lugar mais
lindo do que o meu.
1) Parabéns Ana pelas duas belíssimas poesias !
ResponderExcluir2) A primeira é uma poesia visual, aquarela e lápis de cor. Me pareceu algo "Naif", que podemos e devemos nos demorar contemplando.
3) A segunda poesia é o texto em forma de prosa, lindíssimo. Não é só elogio. É o reconhecimento sincero da natureza profundamente bela.Feliz Outono para todos nós e nossas famílias e nossos amigos !
4) Escreva sempre Ana, pinte sempre, desenhe idem.
Olá querido Antonio,
ExcluirSeu comentário me encheu de vaidades!
Isso de dizer "duas poesias" me encantou porque gosto muito dessa aquarela . Às vezes olho para ela, que mede só 25x32, e foi começada num tempo e terminada bem depois, e fico pensando o que mais eu colocaria nela. Acho mesmo que está pronta. O difícil é saber quando parar, em qualquer área, na escrita, na fala(!), no desenho, no tempero, no cansaço. Em tudo. O seu virtuoso caminho do meio.
Vou sim continuar desenhando, escrevendo quando tocada por alguma coisa, meu equilíbrio mora nesses endereços.
Gratidão Antonio.
Lindo este outono !! Uma poesia em prosa
ResponderExcluirVou repetir o Antônio Carlos desenhe mais Ana escreva mais
Sua aquarela está muito linda !! e precisamos sonhar nestes tempos áridos
Fiquei encantada com tanta delicadeza !!
Obrigada por nos proporcionar sonhar !!
Meu abraço com carinho
Querida Léa,
ExcluirO Outono é lindo e nossa terra é simplesmente linda e simplesmente nossa, não é?
Quando viajo fico louca de vontade de voltar para nossas montanhas e minha casa, meus lugares de ficar feliz. Até sinto saudades mesmo estando aqui!
Meu abraço carinhoso.
Ana,
ResponderExcluirE você de vez em quando vem com a prosa torta de dizer que eu tenho poesia nos meus rabiscos. Ah, quem dera desenhar outonos assim! E não é por falta de paisagem, todos os dias tenho uma tela panorâmica que meus bem 15 metros de janelão abrem sobre o mar deste litoral tropical. Vejo o mesmo outono daí começando o dia aqui, trazendo o calor, se pondo nas mesmíssimas cores e devolvendo o ar fresco de tardezinha, com o "plus a mais" da Lua - a de ontem for super Lua, nome bonito que inventaram - fazendo rastro no mar que ainda não chegou aí, mas um dia chega.
Mesmo tendo aqui o mesmo que lhe chega aí, não passo nem perto de desenhar sua gravura de letras. Dane-se minha incapacidade com as artes plásticas, pelo menos aprendi a ler. Até mais.
Querido Heraldo,
ExcluirE você falando que só sabe ler. Tadinho!...
Quem escreve como você, poesia em prosa, não precisa de aquarelas porque as cores e as imagens já estão nas suas letras, na sua Bic encantada.
E ainda canta!
Escreva esse lugar onde anda colocando seus passos e seus olhos principalmente.
Divida comigo esse mar que nunca vai chegar aqui se não for por você.
Aproveite tudo muito.
Obrigada de coração. Seu comentário foi tão bom que escandalizou meu EGO da cabeça aos pés.
Atē mais.
A Aninha tem uma propriedade como artista reconhecida, que é o seu talento natural em pintar, mas tem a mesma condição brilhante de escrever, de transferir para o papel seus pensamentos.
ResponderExcluirNo caso em tela, a pintura se encaixa perfeitamente no outono que ela relata, que imagina, e que discorre sobre esta estação com rara maestria, com detalhes, pormenores, rica em particularidades.
Faz algum tempo que leio e vejo as gravuras e artigos da nossa articulista artista/escritora/poetisa.
Ana se mostra talentosa sempre mas, a sua característica principal, a meu ver, diz respeito à sua impressionante sensibilidade!
Vá lá, a mulher é detentora desta qualidade porque lhe é inata, porém a Aninha a tem à flor da pele, na ponta de seus dedos, na sua mente prodigiosa, na sua inteligência, experiência que, posta em execução, resulta em obras portentosas, impressionantes, dignas de admiração e aplausos.
Por que faço questão de enaltecer as suas obras postadas neste blog, que considero um oásis cultural?
Pelo fato de Aninha ser uma mulher com várias atribuições, e desenvolver ainda predicados excelentes em outras áreas.
Esposa, mãe, avó, irmã, amiga, dona de casa ... e ainda arranja tempo para nos deliciar com seu talento e vocação às artes e para artigos que nos obrigam a pensar, refletir, raciocinar.
Dificilmente encontraríamos um texto tão inspirador sobre o outono, conforme Ana o descreveu.
Uma das passagens, ela me lembrou quando iniciei a viajar como vendedor-propagandista de laboratório. O momento era tão perturbador para o viajante, que muitos não resistiram e deixaram as viagens de lado.
Aninha foi perfeita nesta frase:
“Para mim é o momento da paz, da Ave Maria e do Ângelus. Hora de esvaziar a alma para as estrelas se instalarem no nosso sono.”
Simplesmente perfeito, poético, romântico, ao mesmo tempo nostálgico, com uma certa saudade do dia que está indo embora, e de uma noite que seja calma e repousante, ao mesmo tempo.
Aninha aguça esse romantismo abandonado; resgata o enlevo; relembra momentos de intensidade; faz questão de se mostrar uma mulher ainda enamorada do Mano, que ama com intensidade seus filhos e netos, pois tem o mesma profundidade de análise pela vida!
Legal, Aninha, parabéns por mais um trabalho digno, belo, que abrilhanta Conversas do Mano de maneira única, peculiar.
Abração.
Saúde e paz, extensivo aos teus amados.
Lindo como sempre. Estou esperando o livro
ResponderExcluirQuerida Tita,
ExcluirNesse dia de aniversário ainda arranjou um tempo para mim. Obrigada de coração!
Quanto ao livro...que tal folhas soltas ao vento que vão parar onde as queiram?
Beijo grande.
De novo muita felicidade e saúde com sua bela família, o maridão de quem gosto muito, as lindas filhas e os netos maravilhosos, e o genro tipo Rodrigo Hilbert versão morena!
Querido Chicão,
ResponderExcluirIsso não se faz. Porque não é um comentário, é um panegírico.
Estou aqui parada diante de um papel quase branco mastigando a ponta da lapiseira sem saber o que responder... Lapiseira sim porque adoro escrever à mão apesar do polegar de gatilho que de surpresa resolve dar as caras. E dizem que é bom para o cérebro.( a escrita à mão, não o gatilho)!Mas isso não estou verificando não (rsrs).
Quanto à escrita ,tão elogiada por você, de vez em quando pode ser boa. Mas não é sempre. Tem que haver motivo e emoção. Minha praia mesmo é o desenho. Oque também não quer dizer que saia sempre bom.
A escrita, quando estou inspirada, apanho no ar onde circulam as idéias. Quem me ensinou isso foi a Adélia Prado. O desenho, quando algo me interessa seja do bem ou do mal, é tentativa em cima de tentativa. Atē acabar em algo ou acabar no lixo. E aí é um tal de arrumara bagunça e a cabeça, organização interna.
Sou insegura em tudo , na escrita é pior. Só fico tranquila com ela quando tenho esses belos comentários de vocês. E ainda assim ás vezes duvido deles. Triste demais!!!
Por falar nisso, estou cheia de saudade do Bortolotto.! Fico pensando o que ele pensaria ao ler esse texto. Acho que gostaria.
Bem meu amigo,
Obrigada por tudo.
Atē mais.