Fotografia Carlos Monteiro |
Carlos Monteiro
Ô abre alas que eu quero
passar...
Este ano
não vai rolar, ninguém vai passar. Não vai passar nem a Lira, nem Rosa de Ouro.
Não adianta pedir passagem, esse ano não será igual ao que passou. Não tem
Banda de Ipanema, Cordão da Bola Preta, não tem Orquestra Voadora, não tem
Monobloco, quanto mais Stéreobloco. Não vamos subir para Santa porque As
Carmelitas ficarão enclausuradas, rogando aos céus que tudo se resolva aqui na
Terra. Não tem Simpatia; o amor se perdeu no estandarte da angústia e da
solidão.
O Suvaco
de Cristo será somente o Redentor em sua ‘tarefa hercúlea’ de zelar pela Cidade
Maravilhosa, com tantos rotos inconsequentes e esfarrapados irresponsáveis que
a transformaram num jardim das perdidas ilusões, como os velhos blocos de sujos
que nunca tiveram fantasia. Eles, os blocos, assim como o ‘futebol das
piranhas’, pelo menos, traziam alegrias ao povo. O Baixo Gávea também não é
mais igual, mesmo se estivéssemos em festa já não teríamos o chope no Hipódromo
e o sorriso do Sassá se perderam na multidão, Minas não há mais. Não teríamos o
Me Beija que eu sou Cineasta, já não se beija como d’antes na Santos Dumont.
Com as máscaras e a pandemia já não se beija mais em lugar algum. Saudades
daquele beijo. Quero matar a saudade num corso ou numa marcha-rancho.
E os
bate-bolas, Clóvis suburbanos multicoloridos, genial genuína cultura carioca,
onde estarão? Como Vincent Rosenblatt vai registrá-los em prosa e alegria. Como
Evandro Teixeira fará contraluzes sensacionais, em preto e branco, naqueles
incríveis planos abertos?
Os
ensaios nos barracões em retalhos de cetim, purpurina salpicada, escondem as
fantasias entornadas pelos chãos. Madureira chorou. Chora de dor, “...Mil
paetês salpicando/O chão de poesia/A vedete principal/Do subúrbio da Central
foi a pioneira...”.
Este ano
seremos palhaços das perdidas ilusões, num Carnaval que não existirá, com
máscaras negras de pesar pela festa que acabou e o povo sumiu drummonianamente.
Quando fevereiro chegar as polêmicas em relação às fantasias politicamente
corretas ou incorretas dos nomes de blocos ofensivos e das músicas e marchinhas
de conteúdo homofóbico, misógino, sexista, racista e preconceituoso não
inundará às redes sociais com acaloradas discursões. Bailarina pode? Pirata
então... Vou de Pierrô e ela de Colombina, não pode? Mas é Carnaval, não me
diga quem é você, seja o que Deus quiser. Peter Pan e Sininho, podem? O que
pode afinal?
Também
não seremos testemunhas de quantos blocos os amigos seguiram. Não haverá
postagens nem mensagens de onde cada um está. É bem capaz de que assistiremos a
bailinhos residenciais em lives intermináveis, algumas delas chatíssimas,
blocos e mais blocos com o lema “concentra [na sala] mas não sai” e retiros
espirituais nas varandas e jardins de casa. Vai ser um “oṃ maṇi padme hūṃ”
uníssono e vibrante anunciando o fim da pandemia.
As
marchinhas andarão pelas JBLs da vida. Qual será o grande sucesso? “Xô Corona”
do Emmerson Morvan ou “Xô Pra Lá Covid” dos palhaços Teleco e Teco Nova
Geração? Oremos! O Sambas-enredo e as temáticas brasileiras sergioportianas. “...Assim
se conta essa história/Que é dos dois a maior glória/A Leopoldina virou trem/E
dom Pedro é uma estação também/Oô, oô, oô, o trem ‘tá’ atrasado ou já passou”.
Vão tonitruar? O trem passou na história, perdemos o bonde.
A
Passarela da Sapucahy estará iluminada em homenagens, luzes especiais, uma
avenida sem o colorido das fantasias, apenas leds. Pista e arquibancadas
formando o bloco da solidão. Somente o surdo de marcação repleto de banzo,
melancólico, triste, angustiado e misantropo. Mesmo com o palco iluminado,
apagado pela soturnidade, a apoteose se mostrará infinita e as estrelas
brilharão nos céus.
Também
não terá a célebre frase anual, justificativa da espera para negócios e
acontecimentos e da mornaça dos dois meses que abrem o ano. “O ano só começa
[comercialmente falando] depois do Carnaval”. Agora é que Momo chora, se não
temos folia, o ano não começará? Frase de efeito talvez. O ano começará depois
que a vacina estiver disponível para todas e todos, então será: “o ano só
começa depois de todos vacinados”. Haja Carnavais.
E quarta-feira, um ano
inteiro em cinzas, mas 2022 está logo ali, com vacina e sem pandemia. Deixa o
dia raiar, amanhã voltará tudo ao novo normal. A águia altaneira da Portela
será Phenix, ressurgirá dessas cinzas, o conde, fantasia de plumas azuis
lembradas por Joaquim Ferreira dos Santos: azuis YInMn Blue. Batam palmas,
aplaudam quem sorri!
Nos
restará chorar um rio de lágrimas, derramar nossas mágoas pelo Rio que passou
em nossas vidas, nos guardando para quando o Carnaval de 22 chegar e botarmos
nosso bloco na rua com ginga e gemedeira.
E agora
José Pereira, para onde?
1)Da minha janela, do alto de Santa Teresa,RJ, contemplo o Sambódromo vazio, a noite fizeram um jogo de luzes multicoloridas.
ResponderExcluir2)Gosto muito do carnaval, aproveito o feriadão e vou descansar em Teresópolis, terra natal da minha esposa. Mas este ano não fomos.
3)Creio que a festa não acaba, nem a data, pois é parte do calendário católico no Ocidente.
4)Monteiro, cronista dos bons !
Caríssimo Antonio,
ExcluirSaudades da minha Santa e da visão, quase 360° da Cidade Maravilhosa, proporcionada do cimo da Vila Suíça. Fizeram uma iluminação especial em memória dos acometidos pelo Covid.
Tere e seu Dedo de Deus. Não acabarão, ano que vem será como em 1919 - seis meses de folia.
Muito obrigado e forte abraço.
O ilustre Autor, Sr. CARLOS MONTEIRO, em " E se acabarem com seu Carnaval?", desenvolve o Tema do Não Carnaval nesse Ano de Pandemia Covid-19, com muita graça e competência.
ResponderExcluirNão é fácil ter o domínio completo da difícil Língua Portuguesa, mas o Sr. CARLOS MONTEIRO, tem. pois produziu uma Peça Harmônica e Elegante, com o difícil Tema.
E olhe, que ESCREVER BEM, é a mais difícil das Artes, segundo os HEBREUS que tem quase 7.000 Anos de prática.
Parabéns e um Abração.
Caro Bortolotto,
ExcluirNão creio ser merecedor de palavras tão gentis.
Seus apontamentos me trazem duas responsabilidades; a primeira de, na medida do tempo, buscar o aprimoramento em minhas crônicas. A segunda, julgo absolutamente impossível: a magnitude do povo Hebreu. Tenho ainda exatos 6938 anos para alcançá-los.
Forte abraço.
Já querido Carlos,
ResponderExcluirE a Colombina triste no seu quarto solitária chora rímel escorrido ao ler seu texto e lamenta o beijo que não deu!
Gratíssima.
Até mais.
Ana querida,
ExcluirEste ano o pierrô chorou pela colombina. "...A colombina entrou num botequim/Bebeu, bebeu, saiu assim, assim ...//...o pierrô, levando esse grande chute/Foi tomar vermute com amendoim...".
Carnavais melhores virão.
Abraços.