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Heraldo
Palmeira
Eles tinham suas histórias desnecessárias. Nem precisavam ter
vivido, mas viveram porque a vida às vezes parece só ter um caminho, nem sempre
oferece rotas de fuga. Daria um livro se fossem contar tudo o que deixaram para
trás.
E saíram de suas histórias desnecessárias e ficaram quietos se
refazendo. E se guardaram, como se soubessem sem saber, um sem ver o outro, que
estavam vindo.
Havia um Carnaval chegando devagarinho e eles quebraram regras, recusaram
convites irrecusáveis, não foram para os mesmos lugares de antes. Como se
soubessem sem saber que havia um encontro marcado. Como se fosse um arrepio que
ainda não saíra da pele. Havia uma certeza quase santa de que o outro um dia
viria para ficar. Como se houvesse uma sintonia sem que soubessem a origem dos
sinais.
Era como se soubessem sem saber que chegaria o tempo da certeza de
que tudo teria sentido. Que tudo faria sentido de ser sentido. Que valeria a
pena dizer tudo que era preciso falar em silêncio ou num sussurro sem prazos e sobressaltos,
sem hiatos alagados de solidão.
Ela olhou com aqueles olhos de quem não sabe o que fazer porque já
não havia como não fazer, como fugir do que estava escrito para ser feito. Ele olhou
com aqueles olhos de quem pergunta se poderia antecipar o tempo de começar. Os olhares
diziam docemente que não mais estavam perdidos tentando achar o melhor jeito de
se encontrar, que já não precisavam dizer o que queriam.
Caminharam protegidos pelos ares de outono e pela festa ao redor e
tudo foi clareando com a chegada da noite, as mãos cúmplices oferecendo os
dedos para que fossem se traduzindo, se revelando por aqueles toques tímidos dos
primeiros passos.
Eles souberam sem saber encontrar o destino, porque ninguém
aprende o que não pode deixar de ser. Já está ensinado: basta ir seguindo para
lá pela estrada que sempre esteve escrita. Algumas coisas levam tempo, outras
passam apressadas, mas tudo termina fazendo sentido.
Embora os
dias sejam longos
O crepúsculo
canta uma música
Em breve
meus olhos fecharão
Em breve
acharei repouso
E nos meus
sonhos
Você sempre
está perto de mim
Olhos tenros
que brilham
Eles irão
iluminar
O nosso
caminho esta noite
Verei você em meus sonhos
Eles estão espalhados por aí, em tantos rostos felizes, feito
crianças felizes que descobriram o jeito de brincar de viver sem arranhar o
coração, a vida. Refeitos pela coragem de perceber que há momentos em que é
preciso mudar o rumo, como quem ganha uma segunda pele.
Por isso, não é de estranhar uma chuva de pétalas quando menos se
espera. E nem é preciso tentar entender, há mistérios que apenas precisam ser
vividos. Eles dançaram na chuva. Ponto final!
Trechos
de:
I’ll see you in my dreams (Isham Jones-Gus
Kahn)
Texto irretocável, Palmeira.
ResponderExcluirA bela crônica confirma a célebre frase “está escrito nas estrelas”, quando se torna inevitável encontrarmos a nossa “segunda pele”, a outra metade da laranja!
Curioso que não precisamos procurá-la, assim como a outra metade não nos procura.
O encontro é inexorável, “tá escrito”.
A própria vida se encarrega de encontrá-los, de aproximá-los, de se unirem em definitivo, e de escreverem a sua história.
Se, antes, suas trajetórias eram desnecessárias, quando se encontraram valeria aquela que os dois iriam construir, a verdadeira e completa história de amor!
Gostei da analogia que Palmeira usou com a segunda pele.
Do alto do meu tempo de casado, 49 anos, entendo perfeitamente esta junção da mulher que amamos e que recebemos em troca o mesmo amor, o mesmo sentimento.
Tanto sou a sua segunda pela, quanto ela é a minha.
Há uma simbiose absolutamente biológica e sentimental, condicionando ambas as partes a viverem juntas, unidas, como se fosse uma só porque não há como separá-las, pois deixariam de viver pela falta de alimento, de água, de cuidados, que somente o casal sabe o que os satisfaz, deixa-os felizes, e os impulsiona a viver cada dia de maneira esplendorosa, com intensidade, como naturalmente amantes da vida e de si mesmos!
Parabéns, Palmeira!
Um forte abraço.
Saúde, muita SAÚDE, extensivo aos teus amados.
Caro Bendl,
ExcluirVocê está ainda melhor nesta sua nova fase, de recomeço, de quereres sobre tantas coisas. E (re)apaixonado. Bom demais sabê-lo assim.
Estes meus personagens estão por aí, soltos, animando mais gente a abrir os olhos para encontrar outros olhos que sejam os olhos comuns, que estejam na segunda pele. Saúde a todos que nos cercam no circuito dos amores.
Heraldo
ResponderExcluiros poetas dão beleza ao mundo ! E neste texto vi a simplicidade no encantamento do encontro ! Sentimentos a flor da pele !
Muita delicadeza na sua maneira de transmitir e dou os parabéns a vc
Um abraço
Prezada Lea,
ExcluirA poesia está na rua, nas pessoas e eu tenho a sorte de poder enxergar alguns flagrantes que me trazem histórias e personagens. E eu apenas me ocupo em tentar levá-los a leitores que também conseguem enxergar o que me foi dado enxergar um pouquinho antes de tudo virar tinta no papel. Obrigado. Abraço.
Olá Heraldo,
ResponderExcluirUm arrepio ainda não arrepiado na caneta Bic despretenciosa vira conto poesia.
Porque a caneta é simplesmente uma Bic mas o escrevinhador é você.
Não poderia ser de outro jeito.
Até muito mais.
Ana,
ExcluirNão duvide do poder de uma Bic, mesmo aquelas mais simplezinhas como a minha, Cristal, azul. Elas chamam para uma "conversa" ao menor sinal de que há alguma história para ser contada. E "não poderia ser de outro jeito" mesmo. Até muito mais.
Estes poetas ...gosto muito Ana
ResponderExcluirVcs dão cor à vida e eu me sinto colorida por dentro 😘
1)Salve Heraldo, parabéns !
ResponderExcluir2) Meu pareceu uma história de amor, bem original, com suas idas e vindas e paradas, e paragens como dizem os nossos irmãos portugueses.
3) Bom texto, cativante leitura.
Olá, Antonio,
ExcluirObrigado. Apenas uma história cotidiana que, como costumo dizer, pode ser de qualquer um.
Mestre Heraldo,
ResponderExcluirChego atrasado e lhe pedindo desculpas.Hoje vou tentar não me perder de novo (rsrs) mas é complicado porque,como você bem diz, os "encontros" e desencontros de amor diferem de acordo com os personagens.Tudo bem que o universo conspira e que “o que tem de ser, tem muita força”, mas é verdadeira aquela tal história: “João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili que não amava ninguém”. Sem esquecer que, às vezes, embora o clic seja mútuo se chega cedo demais ou atrasado, se encontra a mulher certa na hora errada ou a mulher errada na hora certa e, o que é pior, pode ser que a gente se perca entre as horas erradas e certas.
Portanto quando o tal do "encontro" acontece - @#$%&@! - quando parece não haver tempo bastante para dizer um ao outro os pensamentos mais íntimos e as recordações mais remotas na ambiciosa intenção de posse mútua e completa, quando rola essa sensação de total intimidade que você descreve, de completude, de que ao lado dela "tudo faz sentido sentir", quem tem juízo encara o desconhecido, abraça o que precisa e, de mãos dadas com a moça, trata de perder-se melhor pela vida afora (rsrs)
Abração