fotografia Moacir Pimentel |
Moacir Pimentel
Quem assistiu o filme Nunca te Vi, Sempre te Amei lembra que, recém
chegada a Londres, a escritora Helene Hanff contemplou o Trafalgar Square – a Praça Trafalgar - através da janela de um táxi
depois de ter percorrido The Mall, a larga e majestosa avenida que, a partir do
Arco do Almirantado, conecta a Praça em linha reta ao Memorial da Rainha
Vitória do lado de fora dos portões da frente do Palácio de Buckingham. Essa
avenida de aproximadamente um quilômetro é aquela que estamos carecas de ver
enfeitada por bandeiras vermelhas quando rolam as grandes comemorações
nacionais, os desfiles de noivos reais e os eventos esportivos como a Maratona
e o Tour de France.
Quem visita Trafalgar Square aproveita para ouvir um dos belos concertos
da Igreja de Saint- Martin-in- the Fields e tomar uma bebida quente no seu Café
da Cripta, antes de perambular sem pressa pelas Galerias vizinhas - a Nacional
e a dos Retratos – e de fechar o passeio com chave de ouro, visitando as
livrarias da Rua Charing Cross, bem ali à beira.
Charing Cross é o coração de Londres e o nome dado à sua junção com mais
três ruas na região de Westminster: Strand, Whitehall e Cockspur. O cruzamento
é considerado o verdadeiro centro de Londres e usado como um marco zero
referencial a partir do qual todas as distâncias da cidade são calculadas. Essa
tradição de se considerar Charing Cross como o centro arbitrário de Londres
parece ter surgido no final do século XVIII, quando se tem prova escrita, em
documentos oficiais, de que tudo que morava a uma certa distância de Charing
Cross “deveria ser considerado parte de Londres”.
A origem do nome foi uma cruz - a Cruz de Eleanor - erguida entre o
vilarejo de Charing e o Palácio de Whitehall, no início década de 1290, pelo
então rei Eduardo I , inconformado com a morte precoce da esposa, a rainha
Eleanor de Castela. A cruz, de madeira, foi uma das doze feitas e fincadas sob as
ordens reais para marcar o caminho tomado pela procissão fúnebre de Eleanor,
desde Lincoln até a Abadia de Westminster.
Quando a cruz foi erguida, Charing – do anglo-saxão cierring significando curva – era apenas uma pequena aldeia rural em
uma das curvas do rio Tâmisa entre as cidades de Westminster e Londres, que
então muito distavam uma da outra. A famosa peça de nome Crônica do Rei Eduardo
I, escrita em 1593 pelo dramaturgo inglês George Peele, menciona a cruz:
“Que uma cruz rica e imponente seja erguida, no topo da qual sua
gloriosa estátua possa brilhar e a partir de então que a terra seja chamada
Charing Cross.”
E a pequena aldeia passou a ser conhecida pelo nome de Charing Cross,
cuja livre tradução primordial teria sido “cruz da curva” e a moderna seria “cruz
de Charing”. À medida que os séculos foram passando, as construções foram
tomando de assalto os campos circundantes até que, um belo dia, a aldeia de
Charing Cross encontrou-se com o palácio de Whitehall ou, pelo menos, com seus
estábulos (rsrs)
No século XVII, durante a Guerra Civil, a antiga cruz medieval de
Charing Cross foi destruída e após a Restauração, em 1675, quando a Inglaterra
voltou a ser uma monarquia, uma estátua equestre do rei Carlos I foi colocada
no exato local da antiga cruz sem que a vizinhança imediata jamais tenha
deixado de ser chamada de Charing Cross.
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Na realidade a estátua de Carlos I, na Praça Trafalgar, é oficialmente o
marco zero da cidade. Mas acontece que, desde 1864, quando a nova estação
ferroviária Charing Cross foi inaugurada na Strand, ao lado da praça, a South
Eastern Railway encomendou uma nova Cruz, uma réplica vitoriana da Cruz de
Eleanor, remodelada conforme as descrições da sua irmã original. O monumento
ainda decora o pátio da estação ferroviária a poucas centenas de metros da
Praça Trafalgar.
Sucede que hoje os motoristas de táxi de Londres tratam essa nova Cruz
de Eleanor como se fosse o ponto mais central da cidade simplesmente porque o
rigoroso “treinamento” de três anos que têm que fazer para poder exercer a
profissão, exige que eles conheçam de cor e salteado cada rua e ponto de
interesse turístico dentro de um raio de dez quilômetros a partir do pátio da
Estação de Charing Cross.
imagem Wikipedia |
O certo é que o nome Charing Cross já batizou uma aldeia, um cruzamento,
uma rua, uma estação ferroviária, um hotel, um hospital, uma delegacia de
polícia e dois locais de entretenimento: um teatro e um music hall.
Não, a estação de metrô de Charing Cross não mora na badalada rua mas
ela é uma passagem obrigatória para Covent Garden e Chinatown, para os famosos
magazines e os primeiros clubes de jazz londrinos que foram criados em porões
da vizinhança como é o caso do meu preferido, o de Ronnie Scott, que desde 1959
vem garantindo aos seus frequentadores dois excelentes shows de música ao vivo
todas as noites.
É por isso que embora a rua não seja um dos points preferidos dos
turistas hordas deles a atravessam marchando na direção de Covent Garden onde,
no século XVI, morava um mercado de flores, frutas e legumes e hoje rolam
performances artísticas de rua “em seguidinho” em torno da Royal Opera House mais
conhecida como “Covent Garden”.
Só que, para mim, Charing Cross quer dizer muito principalmente um dos bairros
mais lendários da capital inglesa. Significa Soho, um território que na minha
cabeça tem fronteiras nebulosas que dão guarida a alguns dos meus “favoritos”:
as praças Trafalgar e Leicester, os Piccadily e Oxford Circus e a National
Gallery bem ali à beira.
Viva o Soho e nele Charing Cross Road que avança do norte da Praça
Trafalgar na direção de Tottenham Court Road até a Oxford Street, com muitos
peculiares e pitorescos becos laterais à esquerda e à direita, iluminados por
neons e enfeitados por balcões floridos e belos telhados. Aqui entre nós e
baixinho, o Soho é ainda, pelo menos na minha tradução, uma babel gastronômica,
povoada por restaurantes gregos, franceses, italianos, indianos, coreanos e
alemães inesquecíveis até por que alguns deles misturam as estações.
A Bodega, por exemplo, é o melhor mix de restaurante mexicano e sex shop
do vasto mundo. Nele fomos recebidos por um cidadão de dois metros de altura,
sotaque indefinível e cara de poucos amigos, atrás de um balcão de vidro
recheado por uma parafernália supostamente erótica para
lá de criativa. Diante do olhar nitidamente reprovador e repressivo do
porteiro, fingimos não estar curiosos pelos inocentes brinquedinhos à venda e,
depois de entregar os casacos e cachecóis ao leão de chácara, seguimos na
direção que nos apontou com um indicador imperioso: para baixo!
E entramos
em uma caverna quentinha, à luz de velas, com paredes de concreto agredidas e
decoradas por barris de tequila detonados,
habitada por um piano de cauda inclinado para um lado e caindo aos
pedaços. O mais
surpreendente de tudo, no entanto, era que tal espaço surreal e subterrâneo era
frequentado por um monte de outros clientes tão “normais”
quanto nós, os quais, de alguma forma, tinham caído no mesmo buraco
(rsrs) e resolvido fazer o mesmo que a gente: relaxar e tomar umas e outras à
base de tequila e
comer ceviche e tacos e guacamole! Depois do jantar no andar de baixo, todos seguiram alegremente para o de cima, onde rola
música ao vivo e pole dance. ISSO é estar no Soho e/ou transitar pelas suas
imediações!
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Depois de um belo por do sol, seja lá onde for, há que perambular por
essas paragens iluminadas, um roteiro obrigatório para quem - depois de ter
passado de manhã cedo pelo quiosque de bilhetes de teatro com descontos da
Praça Leicester - quer conhecer a “night”, os musicais e as produções do West
End, perambular pelas ruas de Chinatown, passar por cafés, pubs, lojas vintage,
clubes, galerias de arte e discotecas e vitrines deslumbrantes, ver as
decorações e luzes natalinas, sem medo de violência nem de ser feliz.
Bem, talvez a nossa escritora preferisse em vez da “pole dance”,
conhecer uma estátua literária “adulta” que se chama Uma Conversa com Oscar
Wilde e mora na Adelaide Street, entre a estação de Charing Cross e a Praça
Trafalgar.
Apesar do escritor e dramaturgo ter se despedido em 1900, o tributo de
bronze e granito verde só foi inaugurado em 1998 depois de uma longa luta dos
seus fãs que reclamavam da ausência de um memorial público para Wilde na cidade
onde ele viveu e trabalhou e onde suas peças foram encenadas.
Com certeza não é a mais tradicional das esculturas: um Wilde assustador
emerge de um sarcófago - na realidade um banco comprido - fumando um cigarro e convidando
os transeuntes a sentar-se e conversar. Com aquele rosto duvido que o coitado
consiga entabular muitas conversas e pelo menos da última vez que o vimos, por
conta de uma martelada, tinha deixado de fumar (rsrs)
No mármore lemos gravada uma citação de Wilde, retirada da peça O Leque de Lady Windermere:
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“Estamos todos na sarjeta, mas alguns de nós estão olhando para as
estrelas”.
Essa peça, inclusive, virou um outro filme há valentes anos atrás,
titulado de A Falsária com a deslumbrante Scarlett Johansson no papel de Meg
Windermere e a ótima Helen Hunt no da controversa Sra. Erlynne, que em vez de
uma rival como a moça acredita, é a sua mãe.
O Soho parece ter laços ainda mais estreitos é com o mundo literário. A
Rua Charing Cross, no velho coração de Londres, na verdade quer dizer livros e
livrarias e, é claro, muitos sebos. Até a virada dos Swinging Sixties para a
década de 70, foi bem ali no Cambridge Circus ou , mais precisamente, no número
84 da rua Charing Cross que funcionou a famosa livraria favorita da Helene, a Marks
& Co, que também era conhecida de forma errônea como “Marks & Company”
ou, coloquialmente, como “84”.
fotografia de Alex Bolton, em londonreviewbookshop.co.uk |
Essa é a foto mais conhecida da Marks and Co, tirada pelo fotógrafo
australiano Alec Bolton meses após a morte do seu gerente Frank Doel. Mas a
melhor descrição da livraria foi feita em uma carta destinada a Helene Hanff,
da lavra de sua vizinha Maxime, uma bela atriz que morou seis meses em Londres:
“É a mais adorável das lojas londrinas e parece saída direto das páginas
de Dickens, você ficaria completamente maluca por lá. Tem mesas cobertas de
livros do lado de fora e, antes de entrar, eu parei e folheei alguns fingindo
ser uma cliente. É escuro lá dentro, você sente o cheiro da loja antes de
vê-la, um cheiro adorável, difícil de definir, que combina poeira e tempo além
da madeira que cobre o chão e as paredes. Clientes e proprietários falam em voz
baixa pelos corredores pouco iluminados do mundo do livro antigo. As
prateleiras continuam para sempre. Elas vão até o teto e são muito velhas e
cinzas, como o carvalho antigo que absorveu muita poeira ao longo dos anos e
perdeu a sua verdadeira cor.”
A loja foi fundada na década de 1920 por Benjamin Marks e Mark Cohen, que
foi persuadido a permitir que seu nome fosse abreviado para ser o “Co” na logo
da empresa. O prédio, além do espaço de varejo no térreo onde os clientes
podiam folhear à vontade o gigantesco estoque, tinha mais quatro andares. Mark
Cohen morava no primeiro deles, o estoque mais precioso e as encadernações em couro
no segundo e terceiro pavimentos, e no quarto andar eram guardadas milhares de “peças
de reposição” para as restaurações.
A Marks & Co fechou as portas em dezembro de 1970, para o desgosto
de clientes famosos, incluindo Charlie Chaplin, George Bernard Shaw, membros da
realeza e instituições públicas, como universidades e o Museu Britânico.
Durante a década de 1980, foi uma loja de discos, durante os anos 90, abrigou
uma sucessão de bares, cafés e restaurantes até que tornou-se, quase
inevitavelmente, uma lanchonete do McDonald's. Uma placa, inaugurada por Helene,
permanece na frente do edifício e nela se lê:
“84, Rua Charing Coss. A Livraria Marks & Co funcionou neste local
que se tornou mundialmente conhecido através do livro de Helene Hannf.”
imagem em www.londonremembers.com |
As livrarias de livros usados da Charing Cross, apesar de empoeiradas e
pobrinhas estão, aparentemente, não apenas sobrevivendo mas rindo das mudanças
e das concorrentes digitais e conseguindo manter o nariz enrugado muito acima
da linha d’água. Deve ser porque tem gente que é “tarada” por velhos livros. Eu
tenho uma edição italiana de 1921 de Alice no País das Maravilhas que não
empresto, não vendo, não tem acordo: o livro tem um cheiro delicioso. Isso só
pode ser fetiche!(rsrs)
Os frequentadores desses lugares são geralmente homens cujos óculos
moram mais perto da ponta do nariz do que dos olhos, que caçam preciosidades, prateleira
por prateleira, porão após porão, desmanchando pilha após pilha, folheando
livro após livro. Se na Charing Cross Road os obsessivos adotam as velhas
livrarias ou se elas adotam os obsessivos é uma questão para outro dia...
Da última vez que estive na Charing Cross Road, em dezembro de 2014,
enquanto minha mulher curtia na Tate Modern uma exposição, eu passei algum
tempo fuçando nas prateleiras da uma livraria de nome Any Amount of Books – Qualquer
Número de Livros - que se possa desejar, of course! Um local delicioso onde
parece que os livros brotam das paredes e que tem sempre, na calçada, uma
coleção impressionante daqueles de bolso que custam uma libra. Para quem quer
mais, a alguns metros de distância, outra rua de nome Cecil Court tem outra
coleção de sebos para chamar de sua.
Para muitos as livrarias e/ou sebos são lugares mágicos. É como se
finalmente ao entrar em uma delas encontrássemos nossa casa longe de casa entre
pilhas de velhos parentes e amigos. Nessa rua que tem sido, tradicionalmente, o
centro do comércio de livros antigos e de segunda mão de Londres, ainda mora a
Foyles, a matriz da vovó das livrarias ditas “independentes”, que recebe seus
clientes com a seguinte mensagem de boas vindas: “Olá amigo dos livros, você
está na sua casa”.
Foi em 1903 que ainda muito jovens e depois de terem sido reprovados nos
exames para o funcionalismo público os irmãos William e Gilbert Foyle decidiram
vender seus livros didáticos e começaram um rentável negócio. A loja abriu suas
portas na Charing Cross Road em 1906 e mudou-se para o atual endereço, sem sair
da rua, em 1929.
imagem Wikipedia |
Dizem que quando a Alemanha começou a queimar livros na década de 1930,
William Foyle imediatamente enviou ao Führer um telegrama oferecendo um bom
preço por quaisquer pobres condenados. A rápida resposta nazista foi que a
Alemanha não tinha livros para vender e que a queima continuaria.
Anos mais tarde, no início dos bombardeios de Londres, quando a Foyles
foi rodeada por sacos de areia para se proteger das bombas nazistas, William
Foyle fez publicar nos jornais um pequeno recado para os alemães: que o telhado
da livraria havia sido totalmente coberto com cópias do livro de Hitler, Mein
Kampf (rsrs) Coincidência ou não a livraria não sofreu nem escoriações mas uma
bomba abriu uma cratera gigante bem defronte da loja, impossibilitando temporariamente
a entrada de seus fiéis clientes.
Com mais de um século de idade e ainda de propriedade da mesma família,
a Foyles continua a prosperar mesmo em um mundo de comércio eletrônico. Quem
acredita que tamanho não é documento jamais visitou essa livraria que tem dimensões
e conteúdos surpreendentes: “são duzentos
mil títulos diferentes, quase três mil e quinhentos metros quadrados de varejo
e mais de seis quilômetros de prateleiras”. Confesso que é muito difícil me
resgatar desse labirinto (rsrs)
Tudo bem que Covent Garden hoje é um point de compra de souvenirs em vez
de um mercado de respeito, que ao se virar a esquina na Bow Street em vez de um
tribunal - a Magistrates’ Court mencionada por Dickens em Oliver Twist - damos
de cara com uma delegacia de polícia, mas fizemos todo esse longo desvio
turístico em paragens londrinas só para grifar que Helene sabia muito bem que
estava endereçando as suas cartas para um dos ainda não perdidos paraísos dos
livros. Não é de estranhar, portanto, que o qualificado alfarrabista que a
atendia fosse um profundo conhecedor das obras que a moça apreciava.
Realmente Charing Cross Road é o tipo de lugar onde ainda pode-se
encontrar mais facilmente os leitores, os Franks e Helenes da vida, membros de
uma confraria em extinção, olhando com fervor para os livros que os rodeiam e
suspirando juntos porque, na verdade, estão pensando o mesmo: Como acharemos
tempo para ler todas essas maravilhas?
E nesses lugares empoeirados, nesses filmes livrescos, nesses momentos
literários, os leitores vorazes se sentem quase como companheiros de armas dos
grandes escritores da humanidade, quando na realidade estão destinados a
devorar as obras-primas alheias e a rascunhar a lápis, silenciosamente, pelas suas
beiradas. Parece pouco? Não é. Os últimos só existem graças aos primeiros.
Continuaremos essa viagem “literária” numa próxima conversa.
Adorei! Me senti passeando pela rua Charing Cross, visitando as atrações turísticas e suas livrarias favoritas. Só você mesmo para misturar de um jeito tão leve e delicioso a história da Cruz com a dos taxistas, um funeral com vitrines atrevidas, o Café da Cripta com o sex-shop mexicano, sebos com pole dance e se despedir pegando uma carona no Expresso do Oriente kkk Genial! Obrigada!
ResponderExcluirMônica,
ExcluirMuito aprecio quando você me elogia às gargalhadas mas entenda, por favor, que quem mistura as estações, as experiências e os ambientes não sou eu.... é Londres (rsrs) Como a cidade tem um longo passado, a Londres celta tropeça na romana, que esbarra na elizabetana, que se encontra com a vitoriana. Tendo sido por duzentos anos a capital do Império Britânico, há séculos que a cidade recebe contínua imigração e hoje os censos revelam que quase um terço dos seus habitantes não nasceram no Reino Unido. Portanto ali o idioma inglês é falado com todos os sotaques: irlandês, escocês, galês, australiano, neozelandês, indiano, paquistanês, afegão, singalês, jamaicano, africano, polonês, português!Naquelas paragens mora gente de todas as etnias, vinda de todo o vasto mundo e a diversidade desfila orgulhosa vestindo roupas de grife ou de brechó, saris, burcas ou sarongues.
Faz parte do pacote ir direto para a modernosa Roda Gigante depois de ouvir o coral fabuloso da Abadia de Westminster e quem sai da Catedral de São Paulo - depois da missa frequentada por senhorinhas de cabelo azul e cardigans cor de rosa - a vê refletida nos vidros espelhados dos vizinhos arranha-céus de aço. Isso antes de pegar o metrô para o punk mercado de Camden cujos habitantes são tatuados, exibem piercings os mais bizarros e penteados moicanos de cores indizíveis. No entanto essa mistura de eras e o multiculturalismo londrino não se desdobram em guetos mas em uma cidade unificada, acostumada a receber os de cor diferente, religião diferente, cultura diferente.
“Obrigado!” e abração
Moacir,
ResponderExcluirQuando visitei a Inglaterra eu era muito nova para entender o senso de humor britânico e para aproveitar esta vida noturna animada que você nos mostrou lindamente. Amei conhecer o significado de Charing Cross e a história do amor de um rei inglês que eu não conhecia por sua rainha espanhola. As suas explicações da rua, das livrarias, dos monumentos, do bairro Soho são tão encantadoras e cheias de informações interessantes que me deixaram morrendo de vontade de continuar lendo.
Um abraço para você
Flávia,
ExcluirMuito mais do que as cruzes dão testemunho do amor de Eduardo e Eleonor os dezesseis filhos que fizeram! (rsrs) Vulgo o “Pernas Compridas” ou o “Martelo da Escócia”, esse rei que é muitas vezes confundido com o seu tio-avô, Ricardo I, o Coração de Leão, é nosso velho conhecido. Trata-se daquele monarca malvado que no filme Coração Valente começa perdendo a briga mas termina massacrando o exército de escoceses liderado por William Wallace que a seu mando é capturado, aprisionado, barbaramente torturado e finalmente decapitado na Torre de Londres. No entanto a morte do guerreiro não obteve o efeito desejado por Eduardo: amedrontar os rebeldes. Muito ao contrário, Wallace virou mártir e herói nacional e o seu mito turbinou a luta pela independência da Escócia, conquistada duas décadas depois.
Quanto à vida noturna, a cultura dos pubs, o teatro e os musicais londrinos são imperdíveis. Da última vez que estivemos na cidade assistimos o polêmico, politicamente incorreto e divertido musical O Livro de Mórmon.
Outro abraço para você
Das duas, uma:
ResponderExcluirOu Pimentel nos presenteia com textos estupendos como este, sobre seus conhecimento sobre Londres ou, então, ocasiona em quem jamais poderá viajar para a Inglaterra, uma bruta raiva de si mesmo!
Londres não faz parte da relação das 10 cidades mais bonitas do mundo, longe disso, mas, a meu ver, é uma das três capitais mais importantes do Globo!
O ambiente londrino é sofisticado, cercado de cultura, tradições, modos e costumes exclusivos do povo inglês, que se orgulha do jeito como vive, mesmo cultuando uma monarquia retrógrada, ultrapassada e dispendiosa - é o que penso, por favor!
Mas, não invalida o texto brilhante de Pimentel, claro que não, ainda mais abordando uma cidade que tem 2.000 anos de existência, e uma história peculiar.
E, com o conhecimento do nosso globetrotter da capital do Reino Unido e sua maestria em escrever, Londres se torna uma iguaria para ser degustada, e não somente um prato de peixes com batatas, básico da alimentação britânica, mais purê de batatas com salsichão, salsichas com massa e o indefectível roast beef.
Não é por nada o crescimento espantoso do McDonald’s.
Legal, Pimentel, esta tua viagem por Londres, transmitindo-nos as tuas impressões e detalhes que observaste desta capital tão importante.
Abração.
Saúde.
Prezado Bendl,
ExcluirObrigado pelo interessante comentário. É bem verdade que nada pode justificar que no Reino Unido o poder, a autoridade e os privilégios venham sendo herdados com base em acidentes de nascimento desde que um cara de nome Athelstan foi coroado como o primeiro rei dos ingleses em 927. Acontece que menos de um quinto dos “súditos” da atual rainha querem se livrar dela! E o ínfimo percentual dos contrários à pompa monárquica – dezessete por cento para ser mais exato - quase não mudou ao longo das últimas sete décadas. É sim surpreendente que o sistema tenha conseguido manter sua popularidade e que o caso de amor entre os britânicos e a realeza continue a florescer. Fazer o quê?
Mas ao tentar entender esse sucesso de público não se deve esperar respostas baseadas na razão. Eu diria que tem muito mais a ver com o orgulho nacional do que com a lógica.Trata-se de uma reverência mística, de uma fidelidade quase religiosa, de inconsciente coletivo enfim, de sentimentos. É como se quando o poder colonial e as riquezas do Império declinaram, tivesse sobrado no Reino um desejo de continuar sendo especial e a necessidade de definir a grandeza como algo diferente de riqueza e território. Daí o apego à tradição e ao espetáculo teatral cujo clímax é a família real. Trata-se de um grande ato de comunhão nacional de um povo determinado a abraçar e bancar não apenas a monarquia mas os valores que a sustentam, a vida familiar e comunitária para conservar sua identidade.
Não é portanto um cálculo de perdas e ganhos, não é uma relação custo/benefício. Mas se fosse estaria no azul pois afinal quanto custa a rainha em comparação com o que ela traz para o comércio e o turismo devido ao fascínio global que a realeza exerce - o tal do soft power - que não mostra sinais de diminuir?
Quanto ao seu salto triplo carpado argumentativo linkando o “crescimento espantoso do McDonald’s” à baixa qualidade da culinária inglesa note que os Macs dos centros históricos das cidades europeias têm como público alvo os turistas estrangeiros e não os nativos. Aliás os famosos peixes e batatas fritos servidos em cones de papel são a versão inglesa de fast food, os chamados “takeway” , significando "peque e leve". Da mesma forma a lenda de que a mesa britânica é sem graça e sabor foi fakenews da oposição francesa e não corresponde aos fatos narrados por Dona História. Afinal naquelas paragens a arte das especiarias remonta à Idade Média quando da Conquista Normanda da Inglaterra. A galera da Cornualha come muito mais alho e mostarda picante, por exemplo, do as tribos do Mediterrâneo(rsrs) Vale lembrar ainda que foram os “bucaneiros” ingleses os principais responsáveis pela que comercialização dos temperos orientais de sabores exóticos pelo mundo afora e que a influência da Índia no paladar britânico é notória.
Como paladar e gosto não se discute, vou pular os “ indefectíveis rosbifes” rodeados por batatas e cenouras e ervilhas e acompanhados pelos famosos yorkshire puddings - algo intermediário entre pão e bolinho - que a gente come chorando ensopando-os com o molho. Não vou defender as insípidas codornas recheadas, as intragáveis trutas com amêndoas preparadas na manteiga, os péssimos salmão e o arenque defumados, os cordeirinhos assados erroneamente com alecrim e a vomitativa sopa de haddock defumado com batatas e cebolas. Para focar no tradicional café da manhã servido nos pequenos hotéis do campo ao qual du-vi-d-ó-dó, que você fizesse quaisquer objeções: ovos fritos, bacon e torresmo crocantes, linguiças, salsichões e embutidos de carnes e de caças variados - inclusive o de nome black pudding recheado de cebola, gordura e sangue de porco! - presunto rosado, tomates grelhados, torradas pingando manteiga ou, para quem prefere, os sanduíches grelados feitos com pão caseiro, queijo cheddar, cebola e alho-poró que derretem na boca. Que tal?
SAÚDE e abração
Parece que você vai conseguir, de novo, nos fazer viajar e babar na poltrona, rs. Lendo seu excelente post senti vontade de voltar à velha e classuda Europa e terminei me fazendo a pergunta inevitável. Paris ou Londres? Paris vence na gastronomia e tem uma arquitetura mais linda. Mas se falta a Londres o charme dos bulevares, ela leva uma ligeira vantagem na quantidade de locais históricos interessantes. Quanto à oferta cultural creio as duas cidades se igualam. Keep Walking!
ResponderExcluirMárcio,
ExcluirA resposta para sua pergunta é muito pessoal e não quero me prolongar no assunto porque iria cometer spoilers “em seguidinho” (rsrs) Para já o que posso teclar é quis conhecer Londres desde os meus primeiros dias de ginásio quando virei roqueiro. Na minha opinião a capital do Reino Unido continua ganhando disparado no quesito música! Tudo bem que ainda podemos ouvir os artistas de rua cantando e tocando as lindas canções da Piaf pelas ruas de Paris e, é claro, ainda se escuta em cafés como La Chope des Puces, ao lado do Mercado das Pulgas, ou no Clarion de Chasseurs, no coração de Montmartre, violões e violinos e um ocasional clarinete ou saxofone cometendo o jazz manouche, a música da periferia cigana que o guitarrista Django Reinhardt tornou famosa.
Mas nada disso se compara à cena musical londrina, começando pelo jazz de Ronnie Scott , passando pela Rua Dinamarca cujo apelido é Tin Pan Alley - Beco da Panela de Estanho - uma viela histórica que já foi a alma da indústria do rock e que sobreviveu a chacina do desenvolvimento com suas lojas de instrumentos musicais onde antes funcionavam estúdios de gravação.
Mas nenhum tour musical estaria completo sem uma escala no Café Troubador, em Earl's Court, na fronteira boêmia de Kensington e Chelsea. Através dos anos 50 e 60 e 70 a casa funcionou como um dos centros da vida intelectual e artística de Londres e no seu minúsculo palco se apresentaram monstros como Bob Dylan, Paul Simon, Jimi Hendrix, Led Zeppelin e Elvis Costello. O lugar teve vários proprietários que compraram as lojas de ambos os lados para aumentar a ribalta, mudaram um pouco o cardápio, acrescentando hambúrgueres e, mais recentemente, Sir Elton John e até uma ainda desconhecida Adele. Imperdíveis são ainda alguns pubs de Camden com música ao vivo, com destaque para o Roundhouse onde já arrasaram os da Pink Floyd.
Enfim, Londres é mais musical e tem melhor cerveja, Paris é mais bela e tem melhor vinho. Deu empate! (rsrs)
Pimentel,
ResponderExcluirNota dez! Eu gostaria de ter caminhado por estas ruas sem medo de batedores de carteira. Queria de ter tomado uns uísques de malte pelos pubs sem me preocupar em como voltar para o hotel. Não falar outras línguas talvez me atrapalhe fora do Brasil. A falta de domínio do dialeto local é muito limitativa. Mas duvido que mesmo que eu fosse poliglota e mais corajoso pudesse ter conhecido melhor Charing Cross do que aqui com você de guia. Muito obrigado.
Sampaio,
ExcluirQuem não tem medo é doido e quem dá uma de Bob Esponja sozinho em uma mega metrópole desconhecida é louco de pedra (rsrs) Agora ...é besteira inventar motivos e/ou medos inexistentes e permitir que nóias baseadas em estresse e ansiedade nos impeçam de viajar.
Não dá para ficar ruminando que em Londres seremos roubados, atacados, feridos, enganados quando isso ocorreria, muito mais facilmente, nas nossas próprias esquinas. Não vale a pena perder tempo pensando no que pode acontecer com os nossos enquanto estivermos fora: o sol vai continuar nascendo e a galera vai se virar.
Quanto às direções nada como um GPS e a internet. Quanto à barreira da língua, um bom app tradutor resolve com frases básicas as situações mais desesperadoras. Coisas como: "Onde fica o banheiro mais próximo ?" e "Eu preciso de um táxi", intercaladas, é claro, com "por favor" e "obrigado"(rsrs)
Isso tudo dito relaxe e “se perca" à vontade!
Abração e muito obrigado
Olá Moacir,
ResponderExcluirTão bom quanto o outro. Adorei essa cidade que adoraria conhecer mas infelizmente está no pretérito do passado.
Passeei pela Trafalgar Square e ouvi concerto na Igreja. Deixei o café para depois, no Soho. Lá perambulei pelos becos à direita e à esquerda da Oxford Street, afinal minha mãe veio de Ouro Preto.
Passeei pelo Bodega e pelo sex shop. Não entrei. Achei que não pegava bem.
Na Charing Cross, numa das livrarias, quase me encontrei com você (foi por pouco!) vendo "livros que brotam das paredes" e a coleção da rua. "Nossa casa longe de casa". Teria sido bem divertido!
Que bom que nos encontraremos novamente no próximo passeio londrino!
Até sempre mais.
Caríssima Donana
ExcluirTambém eu muito aprecio os pequenos e antigos becos que sobreviveram aos séculos, incêndios e bombardeios com seus muros de pedra verdes de hera, pequenos jardins por trás de portões de ferro e arcos sombrios. Escondidos pelo Soho, por Covent Garden e pelas ribeiras do Tâmisa é incrível como tais caminhos estreitos - que provavelmente foram rotas secundárias em propriedades de frente para o rio - ainda conservam seu charme centenário e nos encantam com a sua quietude em meio a paragens pós-modernas tão agitadas. Penso que os ilhéus precisam pontuar a sua modernidade com flashes de passado, que gostam dos parques, por exemplo, porque eles os remetem aos campos e florestas de outrora. É como se eles encontrassem a sua verdadeira identidade nas curvas das estradinhas rurais e não no pragmatismo das autoestradas e não abrissem mão das suas excentricidades e estranhezas, porque elas refletem uma parte importante do caráter nacional.
Bem sei que nos últimos tempos virou clichê se falar dos contrastes de um destino turístico mas sucede que Londres é realmente uma cidade de contrastes. Talvez só com essa frase feita se consiga destilar a essência de um lugar do passado, do presente e do futuro onde a história e a inovação se casam, o oriente e o ocidente se encontram, o novo e o antigo se harmonizam, a criatividade abraça a tradição. Não sou competente o bastante para definir melhor uma das cidades mais culturalmente dinâmicas do mundo que se moderniza celebrando os alicerces celtas e romanos da sua história sem abrir mão , no entanto, de uma mentalidade que aceita as mudanças e absorve os outros no seu tecido social, embora continue tomando xícaras e mais xícaras de chá.
Last but not least, acredito que toda vez que nos encontramos nas pretinhas alheias experimentamos a boa sensação de “estar em casa longe de casa”. Por ela, muito obrigado.
“Até sempre mais”
1) O título me fez lembrar do livro "Enterrem meu coração na beira do rio", sobre os índios dos EUA.
ResponderExcluir2)Mas então vi que era Londres e novamente lembrei, a cidade Meca para quem gostava dos Beatles como eu, aliás, toda uma geração.
3) Já contei aqui que cheguei de lá de navio, em 1979, mas as minhas preocupações eram visitar a Buddhist Society e similares.
4)Pimentelji, nosso bom guia turístico através do mundo.
Antonioji,
ExcluirNão sabia que você é fã dos Beatles e chegar a Londres, em um navio, é uma experiência que nunca vivi. Mas tenho um fascínio pelo rio em cujas margens se espalham as docas do segundo maior porto do Reino Unido. Londres não seria Londres sem o Tâmisa. Muitos turistas optam por ver a cidade de cima dos ônibus descapotados, dos quais podem fotografar à vontade e entrar e sair quando bem lhes aprouver ao longo do dia e da validade do bilhete.
Mas se pode fazer o mesmo com os barcos/táxi que, a cada meia hora, fazem escalas nas paragens ribeirinhas mais interessantes como Westminster e a Ponte de Londres e prosseguem até Greenwich. Um cruzeiro pelo rio é uma ótima maneira de se ver um lado diferente da cidade que , na minha opinião, é muito bonita vista d'água. Dependendo da época do ano e do fog o pôr-do-sol sobre o horizonte de Londres é um espetáculo deslumbrante.
Outro passeio muito agradável é pegar uma barcaça em Little Venice, pertinho da estação de Paddington, onde o Regent’s Canal se encontra com o Grand Junction Canal e navegar em direção do Tâmisa passando pelo Regent’s Park e o zoológico até Camden. Outrora um minúsculo porto rural, Little Venice ainda mantém muito do seu charme original, emoldurada por chorões, mansões, pubs históricos e os barcos/casa ancorados pelas margens do canal. Não conheço melhor maneira de se aprender que a cidade é cortada por canais artificiais construídos antes das estradas de ferro para facilitar o transporte de mercadorias.
Namastê!
Prezado Autor Sr. MOACIR PIMENTEL,
ResponderExcluirQuão admirável são os Artigos desse Escritor fabuloso Sr. MOACIR PIMENTEL especialmente quando descreve como aqui o centro de Londres, Trafalgar Square, a famosa Charing Cross Road, a grande Livraria MARKS & CO no número 84, arredores, tudo enriquecido com excelentes fotos.
E isso tudo inserido no contexto Histórico-Sociológico. E nenhum detalhe passa despercebido.
É muito prazeroso ler seus Escritos.
Abração.
Prezado Bortolotto,
ExcluirSabe? Escrevendo essas looooongas franquias às vezes tenho receio de me tornar maçante, de cansar os leitores do blog. Vindo de quem vem o seu generoso comentário é um inestimável incentivo que chega em boa hora e pelo qual agradeço-lhe muitíssimo. Que nas Conversas do Mano possamos continuar lendo e viajando em boa companhia.
Abração