Francisco Bendl
Faz algum
tempo que eu a Marli pensamos em sair de Rolante, e morar mais perto dos
filhos.
Dois na
capital e um na cidade de Osório, o médico, cuja esposa é enfermeira e leciona
na faculdade local.
Sentimo-nos
pontas soltas longe de nossos amados.
Olhamos
casas primeiro em Porto Alegre, inúmeras.
Afora o
custo da mudança e o valor dos aluguéis, o problema das casas em condomínios
fechados é a escada, pois a maioria absoluta é de sobrados.
Para quem já
é velho, eis um obstáculo intransponível.
A solução
seria apartamento.
No entanto,
eu preferiria enfrentar as escadas que morar embaixo de alguém que sapateia,
faz barulho à noite, usa de furadeira fim de semana, a mulher quando coloca
sapatos de salto alto chega a doer no coração pelo toc toc toc, no piso.
Mais:
O alto custo
do condomínio que, muitas vezes, empata com o valor do aluguel.
Desta forma,
somando as contas, afastamos Porto Alegre de nossas pretensões.
Para onde,
então, iríamos eleger a nova cidade onde iríamos residir?
Osório!
Lá mora o
nosso filho mais velho, médico, que nos ajuda volta e meia quando precisamos
desta atenção específica.
E demos
início ao périplo de escolher uma casa.
Os aluguéis
eram mais caros que Rolante.
Empecilho:
Exigiam
fiador.
Expliquei
que o fiador é uma figura mitológica, tornou-se uma lenda, um mito.
Perguntei se
era só esta modalidade de se alugar um imóvel?
Disseram-me
que restava o seguro fiança.
Mais uma vez
mencionei que a Porto Seguros levou o seu maior acionista à classificação de um
dos homens mais ricos do Brasil, dono de uma fortuna estimada em mais de cinco
bilhões de dólares!
O valor que
é cobrado do aluguel, de um e meio a dois meses por ano, é um dinheiro que não
fica para o inquilino, para o dono do imóvel e tampouco para a imobiliária.
As empresas
me alegaram que era assim que trabalhavam, portanto, se eu estava interessado
em alguma casa, eu teria de me submeter às suas regras.
Continuei
procurando, pesquisando em imobiliárias sem tanta fama que, lá pelas tantas,
aceitariam cartão de crédito, por exemplo.
Encontramos
UMA CASA MARAVILHOSA, sobrado... sobrado, porém somente os dormitórios eram no
andar de cima, e havia um no térreo, que seria inevitavelmente o meu, e também
transformado em escritório.
Eu e a Marli
olhamos, gostamos, e ficamos de voltar para assinar o contrato depois que o
inquilino saísse, e a imobiliária fizesse a vistoria e consertasse o que
precisasse de reparos.
Nesse meio
tempo, surgiu uma casa térrea, ou seja, sem andar de cima, plana, e mais barata
que o sobrado, mesmo com seus luxos e até piscina!
Cancelamos a
casa que gostamos, que ainda não tínhamos assinado papel algum.
Dia
seguinte, lá fomos nós de novo a Osório pela sexta vez em uma semana. Diga-se
de passagem, que esta cidade dista de Rolante setenta quilômetros, ida e volta
são cento e quarenta quilômetros percorridos, portanto.
Vimos a
casa, era o que queríamos e, mais uma vez, voltaríamos para assinar o contrato
depois que a papelada fosse analisada e o crédito aprovado, pois seria na mesma
modalidade do sobrado, cartão de crédito!
Na volta, eu
e a Marli pensamos, e começamos a rever os aspectos negativos de uma casa em
uma cidade muito maior que a nossa.
Em Rolante
temos segurança;
Pedimos as
compras por telefone para o supermercado, que nos traz em casa, recebe o cheque
e, ainda por cima, quem vem coloca as bebidas na geladeira!
Caso eu
queira ir ao banco, basta eu ligar que vem um atendente e me leva no carro o
que preciso, sem eu entrar na agência!
Todas às
terças-feiras à tarde, vem um rapaz na sua camionete nos vender verduras,
frutas, cebola, tomate, batatas, couve, repolho, abóbora, tempero verde... o
que necessitamos, e sem qualquer agrotóxico!
Temos
amizades sólidas em Rolante.
Por que
deixar tais mordomias e regalias para trás?!
No dia
seguinte liguei para esta imobiliária e desfizemos a preferência pela casa!
Nessas
alturas, as imobiliárias que ouviam a minha voz já me atendiam com natural má
vontade, também, pudera!
Tínhamos
desistido de vários imóveis, depois de clamar pela preferência e outra
modalidade de aluguel, e conseguido.
Ora, depois
cancelar?!
Eis que nos
liga outra imobiliária, e com uma proposta verdadeiramente irrecusável:
No prédio
onde mora o nosso filho, desocupara um apartamento no andar de cima, no sétimo
– ele reside no terceiro andar.
Garagem,
três dormitórios, living para três ambientes, cozinha de bom tamanho, área de
serviço, e um preço muito interessante.
A surpresa:
Nosso filho
e a sua esposa seriam os avalistas!!!!
Ficamos de
visitá-lo no sábado retrasado.
Pela manhã,
eu e a Marli pegamos o nosso “possante” carro, e nos deslocamos para Osório.
Vimos o
imóvel, agradou-nos de pleno, era o que precisávamos.
Combinamos
que voltaríamos na segunda-feira para assinar o contrato, pois os documentos eu
poderia enviá-los por e-mail.
No mesmo
dia, sábado, portanto, liguei para um amigo meu que faz esse serviço, de
mudança. O cara é especializado, um excelente profissional.
Expliquei-lhe
que seria no sétimo andar, logo, algumas tralhas que temos não subiriam pelo
elevador, deveria ser no “índio”, no muque, subindo sete andares pela escada!
O preço que
seria cobrado foi estipulado em três mil reais, isso que seria para mim, um
amigo(?!).
Um dos três
aparelhos de ar condicionado que temos na casa seria vendido para a empresa de
mudanças, diminuindo o valor do frete;
Também um
fogão de quatro bocas, pois temos um outro, de seis, e seria este que
levaríamos para Osório.
Resultado, a
mudança diminuiria mil reais, ou seja, eu estava fazendo um ótimo negócio!
A colocação
de dois aparelhos de ar condicionado no apartamento, localizado no sétimo
andar, lembro, mediante andaime estilo rapel, com segurança e tal, cada um me
custaria mil e duzentos reais a instalação, portanto, dois mil e quatrocentos
reais;
Não havia
cozinha.
A aquisição
de uma por mais simples que seja, incluindo balcão e o inoxidável da pia não
sai por menos de dois mil a dois mil e quinhentos reais.
Começamos a
somar:
Mudança, ar
condicionado, cozinha, outras instalações como máquina de lavar roupas,
secadora de roupas, máquina de lavar pratos, um tanque, instalação do
computador, antena de TV, telefone, Internet... o cálculo beirou dez mil
reais!!!
Um dinheiro
federal!
Uma soma que
eu compraria o que desejo e sobraria troco.
À noite, eu
e a Marli deitados um ao lado do outro e, como sempre fazemos, começamos a
conversar sobre custos e benefícios desta mudança de cidade.
Em
princípio, deveríamos esquecer as mordomias e regalias que mencionei;
Depois, a
questão de ser apartamento. Apesar da segurança, me assombrou mais uma vez a
lembrança sobre “quem mora no andar de cima”?!
E, se lá
pelas tantas, faltasse luz ou o elevador quebrasse ou ficasse em desuso para
reparações?!
Sem
alimento, sem poder descer sete andares e depois subir, a solução seria pedir
ajuda aos bombeiros, que seria tragicômico, um fiasco!
Também havia
o problema da nossa cadelinha, a Lili, uma linguicinha, que adora correr pelo
pátio da casa, além dos dois gatos pretos como o carvão, e que são os dengues
da Marli, a Monalisa e o Amon Ra!
Nesse
instante, paramos de conversar.
Olhávamos
fixamente para o teto do quarto.
Certamente
pensávamos o mesmo, a ponto que automaticamente e em sincronismo, voltamos
nossos rostos um para o outro e exclamamos quase em uma só voz:
- VAMOS
FICAR EM ROLANTE!
Na
segunda-feira, lá fui para o telefone – pessoalmente eu não iria a Osório, nem
sob os mais veementes protestos! – desistir do apartamento, alegando uma série
de razões, as mais absurdas possíveis, claro.
A moça que
me atendeu nesse meio tempo não gostou, natural.
Mas
decidimos ficar onde tão bem estamos instalados, mesmo distante dos filhos e
netos.
Agora, dia
desses liguei para uma das imobiliárias que nos havia atendido.
Tive o azar
de a mesma atendente estar do outro lado da linha.
Ao
reconhecer a minha voz, ela foi taxativa:
- Alô, o
senhor discou errado. Aqui é uma Petshop e não imobiliária!
Em outras
palavras:
Osório e
Porto Alegre, onde na capital fiz o mesmo com algumas imobiliárias, de ver as
casas, propor um aluguel menor, e desistir no último momento, certamente vão
usar do mesmo expediente, que mudaram de ramo.
Volta e
meia, eu e a Marli desatamos a rir sem parar.
Imaginamos o
que não devem ter pensado de nós, no mínimo, dois velhos loucos que não têm o
que fazer!
Pensamos até
mesmo no possível diálogo entre as imobiliárias:
- Alô, é da
Alfa?
- Sim, e
daí, é da Beta?
- Sim.
- Por acaso
vocês receberam a visita de dois idosos, que queriam alugar um imóvel em
Osório?
- Sim, ela
uma ruiva, estatura mediana, magra, ele um sujeito grande, que fala alto, é este
o casal?
- Sim, este
mesmo.
- Não
pareceram dois malucos e, ela, a chefe, pois o monstro a obedecia e só falava
depois que ela permitia?
- Acertaste,
são os dois velhos doidos. Escolhem o imóvel, pedem pela preferência, olham a
casa, dizem que vão alugar e depois cancelam!
- Pior
fizeram com a Delta!
- Com a
Delta, logo com esta imobiliária, tão exigente?!
- Sim, com a
Delta.
- Como?
- Pois a
Delta concordou em alugar até sem fiador, imagina só!
- Sem
fiador, como pode?
- O dono da
imobiliária os achou tão simpáticos, que admitiu pela primeira vez alugar um
apartamento desta forma!
- E
alugaram?
- Claro que
não!
- Tá
brincando!
- Não, tô
dizendo a verdade. Na segunda-feira ligaram e desistiram de mais esta
escolha!!!
- Credo, que
dois malucos!
- E soubeste
da Imobiliária Gamma?
- Nãaaaoooo,
mais uma?
- Nem te
conto!!!
Combinamos
que nossos filhos vêm nos visitar em Rolante por um bom tempo!!!
PS – Peço que Pimentel e Palmeira
me perdoem por eu não ter postado comentários sobre seus artigos.
Não havia como, pois até o
computador estava encaixotado.
O texto postado a respeito do
trabalho da Ana, eu o enviei por Whats pessoalmente.
O Wilson teve a gentileza de
postá-lo no Conversas do Mano.
Agradeço a compreensão.