Leonardo da Vinci - A Mona Lisa - 1317 - Museu do Louvre (imagem wikipedia commons) |
Moacir Pimentel
A Mona Lisa de Leonardo da Vinci já foi reproduzida de todas as formas
imagináveis mas a sua magia continua intacta desafiando a obstinação humana de
compreendê-la através de um vidro espesso e diante uma massa de turistas que se
empurram para olhá-la lá em Paris.
O que é que a Mona Lisa tem que fascina os historiadores de arte há
séculos e os inspira a fabricar, compulsivamente, novas teorias sobre esse
retrato encomendado na virada do século XVI pelo marido de uma senhora
florentina?
Devemos lembrar que à época o retrato secular de homens e mulheres
comuns, mas que podiam pagar por tal luxo, em vez daqueles costumeiros dos
poderosos governantes e aristocratas ou clérigos proeminentes, ainda era uma
prática recente na Itália. O Renascimento estimulou a popularização desse tipo
de pintura, mas exigiu que os retratistas seguissem os exemplos clássicos.
Sucede que a única forma antiga de retrato então conhecida eram as moedas romanas com seus dignitários
gravados de lado. Assim, o retrato de perfil tornou-se o estilo preferido entre
as altas classes por sinalizar, talvez, que tanto o pintor quanto sua
excelência o modelo fossem cultos, conhecedores da arte antiga e/ou
colecionadores de moedas raras (rsrs)
Um exemplo típico é o retrato que Leonardo fez por volta de 1500 da poderosa
marquesa Isabelle d'Este, que nos mostra uma postura e um posicionamento de
mãos que antecipam claramente a Mona Lisa.
Leonardo da Vinci - Retrato de Isabella D'Este |
Já se falou que a Mona Lisa seria um auto retrato do próprio Leonardo da
Vinci, já se gastou muita tinta descrevendo supostas letras misteriosas e
números escondidos em suas pupilas, de detalhes na paisagem de fundo sugerindo
que o trabalho foi criado uma década depois do que originalmente se acreditava
e dos restos mortais de uma nobre italiana que um pesquisador queria exumar
para determinar se ela fora ou não a verdadeira musa. Adicione a essas
especulações as dezenas que vieram antes e as que ainda estão sendo
investigadas, e você teria uma novela!
Mas...
Uma coisa é certa: muito se engana quem acredita que há apenas uma Mona
Lisa no vasto mundo, aquela famosa do Museu do Louvre.
Ledo engano!
A esta altura do post eis que entra na conversa o comerciante de seda
florentino Francesco del Giocondo que, em 1503, ocupava uma posição importante
no governo republicano de Florença. Ele era um empresário perspicaz e muito bem
relacionado que queria algo em troca de sua veemente defesa dos talentos de
Leonardo junto aos poderosos: um pequeno retrato de sua jovem esposa que
acabara de dar à luz o seu terceiro filho.
É muito provável que em qualquer outro momento de sua vida, Leonardo da
Vinci tivesse esnobado tal encomenda. Afinal ele era um dos pintores dos
grandes da Itália e não de donas de casa. Mas aqueles eram tempos de vacas
magras, Leonardo estava subsistindo de suas economias que, aliás, diminuíam a
um ritmo alarmante. Ele precisava criar uma nova fonte de receita para
sustentar a si mesmo e à sua comitiva de aprendizes. A encomenda da Mona Lisa
veio a calhar.
Lido nesse contexto, o principal testemunho sobre a Gioconda da lavra do
pintor e autor Giorgio Vasari que biografou os artistas do século XVI na sua
obra As Vidas dos Excelentes Pintores, Escultores e Arquitetos, é de suma
importância e completamente plausível. Vasari escreveu:
“Leonardo se comprometeu a executar, para
Francesco del Giocondo, o retrato de Mona Lisa, sua esposa”.
No entanto, o parágrafo no qual ele descreve o retrato passou por
valentes ataques através dos séculos e por dois excelentes motivos. O primeiro
é que Vasari fez uma descrição detalhada da pintura, embora seja um consenso
universal que ele nunca poderia ter visto a obra de arte, pela simples razão de
que, em 1530, a Mona Lisa já estava na França, um país que ele nunca visitou. E
o segundo é que ele afirmou que o retrato da Mona Lisa restara inacabado,
embora o painel do Louvre seja, talvez, a mais bem acabada e completa de todas
as obras de Leonardo.
Consequentemente o texto de Vasari foi desacreditado por muitos
estudiosos antigos e modernos como mais um exemplo da imaginação vívida do
dublê de pintor e biógrafo dos artistas e da sua propensão para a hipérbole.
Mas qualquer leitor sério de Vasari reconhecerá que, mesmo que o autor às vezes
exagere nas tintas de suas narrativas, ele não seria capaz de inventar uma
descrição de duas centenas de palavras sobre uma pintura que não tivesse
efetivamente contemplado. Na verdade nas Vidas dele, essa passagem descritiva
da Mona Lisa é sem precedentes:
“Quem tivesse dúvidas de quão intimamente
a arte pode imitar a natureza, conseguiria se convencer com facilidade só de
olhá-la. Pois nela os olhos tinham aquele brilho aquoso que sempre é visto na
vida e ao seu redor estavam todos os tons rosados e perolados, bem como os
cílios, que não podem ser representados sem a maior das sutilezas. A boca
delicada com os extremos unidos pelo vermelho dos lábios aos tons rosados do
rosto parecia, na verdade, não ser de tinta mas carne. O nariz, com suas belas
narinas, rosado e macio, parecia estar vivo. No poço da garganta, se alguém
olhasse atentamente, veria o bater do pulso”.
A bem da verdade se duvidava que Vasari tivesse realmente dado um boa
olhada na Mona Lisa também porque os estudiosos tinham uma certa dificuldade de
reconhecer a descrição feita por ele dos “tons rosados e perolados” da moça nos
matizes sombrios da Lisa do Louvre, mesmo admitindo séculos de verniz, fuligem
e sujeira.
Mas então, pouco antes da Primeira Guerra Mundial, um colecionador de
arte inglês de nome Hugh Blaker descobriu numa mansão de nobres ingleses uma
pintura da Mona Lisa. Tal achado levou o mundinho da arte a conjecturar se
Leonardo não teria pintado dois retratos da Lisa del Giocondo: aquele famoso do
Louvre e outro, descoberto e comprado por Blaker, que guardou a pintura na sua
residência londrina, em Isleworth.
Mona Lisa de Isleworth (imagem wikipedia commons) |
Além da nova Lisa ser bem mais “rosada” do que a sua irmã famosa surgira
outra prova documental inquestionável de que, como afirmara Vasari, a Mona Lisa
não fora concluída: uma nota de autoria do secretário de Machiavel, Agostino
Vespucci, rabiscada numa edição das cartas de Cícero, intitulada Epistulae ad
Familiares. Ao ler o livro, Vespucci encontrou uma passagem na qual Cícero
descrevia como o artista grego Apeles começara a pintar o retrato da deusa
Vênus mas deixara-o inacabado, e comentou na margem:
“É assim que Leonardo da Vinci trabalha as
suas pinturas, como, por exemplo, o retrato de Lisa del Giocondo e Ana, a mãe
da Virgem”.
A nota de rodapé pé demonstra cabalmente que, pelo menos em outubro de
1503 enquanto Vespucci a escrevia, ambas as obras estavam inacabadas e prova
uma questão importante sobre a Mona Lisa, a saber: que a modelo do retrato foi
sem qualquer dúvida Lisa del Giocondo, conforme Vasari afirmara o tempo todo e
muitos duvidaram.
Mas e quanto à pintura de uma “certa senhora florentina” que em 1517
estava entre as posses de Leonardo, pouco antes da sua morte e hoje mora no
Louvre?
Com base nessa contradição, os defensores da autenticidade da recém
aparecida Mona Lisa de Isleworth afirmam que ela seria a primeira Mona Lisa
inacabada mencionada por Vasari, feita pelo menos parcialmente por Leonardo
para Francesco del Giocondo e que a Mona Lisa do Louvre seria uma versão
posterior, pintada toda e exclusivamente pelo mestre para o seu próprio
deleite.
Que Leonardo produzisse duas versões de uma mesma pintura não é nenhuma
novidade. Sabemos que ao longo de sua carreira o pintor e seus discípulos
pintaram, por exemplo, várias versões da Virgem das Rochas, da Santana e da
Madona do Fuso, sem dúvida para compensar o fato de que o ateliê do artista, em
contraste com os de seus concorrentes, produzia um pequeno número de originais.
Depois de um longo exílio em um cofre de banco suíço a Mona Lisa de
Isleworth recebeu uma controversa autenticação como um Leonardo genuíno por
vários especialistas e continua a ser contestada por muitos mais, mas não tem
como não admitir que sua figura rosada nos permite ler o texto de Vasari sob
uma luz dramaticamente nova.
Quem contempla a Mona Lisa de Isleworth consegue entender a descrição
arrebatada de Vasari do “brilho aquoso” dos olhos, assim como do vermelho dos
lábios unido aos tons “rosados do rosto” e do nariz “com suas belas narinas
rosadas e macias”, de uma senhora que realmente parece ser “de carne e não de
tinta” e estar viva.
Em suma, a escrita de Vasari aparentemente descreve com uma maior
exatidão a Mona Lisa de Isleworth do que a sua irmã mais famosa, fato que
argumenta fortemente a favor da hipótese da Mona Lisa de Isleworth ser uma
versão anterior da francesa.
É provável que Leonardo tenha começado a trabalhar nesse retrato de La
Gioconda pelo rosto e pelas mãos e que tais detalhes mais importantes tenham
sido concluídos por ele que, no entanto e em seguida, não fez muito mais na
pintura.
Caso a Mona Lisa de Isleworth seja verdadeira talvez o atraso na sua
conclusão tenha feito o pintor ordenar a um de seus alunos que completasse o
retrato de forma acelerada. O cuidado meticuloso que da Vinci costumava
imprimir ao seu trabalho, mesmo nos elementos de fundo pintados por um
assistente, não estão presentes nessa Mona. Notadamente o pescoço da figura e a
paisagem ao fundo são muito inferiores aos rosto e mãos do próprio retrato e
daqueles da maioria das obras do Mestre.
O artista acusado de ter cometido a paisagem e o pescoço é Fernando, o
Espanhol que – dizem! - anteriormente teria trabalhado a quatro mãos com
Leonardo na segunda versão da Madona do Fuso. Há uma certa semelhança entre a paisagem
toscana dessa Madona com a da Mona Lisa de Isleworth, tanto em termos de paleta
de cores quanto na execução das formações rochosas.
Leonardo da Vinci - Madonna dei Fusi, coleção Buccleuch (imagem wikimedia commons) |
Os defensores da Mona Lisa de Isleworth garantem que, estilisticamente,
o retrato do Louvre pertence ao período tardio de Leonardo, entre 1507 e 1515,
e que o de Isleworth foi a pintura finalmente entregue a Francesco del Giocondo
nos primeiros meses de 1506.
Um dado importante nessa argumentação é que Leonardo foi realmente
forçado a deixar Milão e a retornar a Florença em 1507, para resolver algumas
pendências jurídicas relativas à herança de um tio. O pintor provavelmente
acreditou que o assunto seria resolvido dentro de poucas semanas e daí não
viajou com sua onipresente comitiva de assistentes.
Mas o processo se arrastou por meses nos tribunais deixando-o naquelas
paragens entediado e sem ter o que fazer. Foi então que, durante esse
interlúdio, o artista começou a organizar seus cadernos e iniciou suas
dissecações anatômicas de cadáveres.
Nos meses e anos vindouros, ele produziria cerca de duzentos estudos
anatômicos detalhados - cujos esboços moram agora na Coleção Real do Castelo de
Windsor - com base nas autópsias de cerca de trinta cadáveres. Ao examinar os
mistérios do corpo feminino e dos fetos não nascidos, Leonardo ficou
inexoravelmente atraído por um enigma: como uma mulher nutre e sustenta a vida
dentro dela?
Ambos os mistérios psicológicos e físicos da maternidade teriam – dizem!
- motivado três das pinturas tardias do mestre: a Santana com Maria e Jesus,
agora no Louvre, a Leda e o Cisne, agora perdida e, last but not least, um terceiro quadro que o gênio renascentista
manteve perto de si até o fim: a Mona Lisa do Louvre que seria uma segunda
versão do retrato original da Lisa del Giocondo.
Porém foi uma Mona inventada em um novo contexto: o interesse de
Leonardo pela maternidade e pelas forças criativas da natureza. Vários
especialistas defendem que a paisagem enigmática da Mona Lisa do Louvre ilustra
a convicção que Leonardo deixou registrada em seus cadernos, de que o corpo
humano possuía formas análogas na natureza.
“Mesmo que um homem seja composto de
terra, água, ar e fogo, seu corpo se assemelha ao da terra. E como o homem tem
nele os ossos, o quadro de sua carne, então o mundo tem suas rochas, os apoios
da terra”, escreveu Leonardo.
Parece, portanto, plausível pensar que a Mona Lisa do Louvre é o ponto
culminante do crescente interesse de Leonardo nessa simbiose entre Maternidade
e Natureza, e a idéia de que ambos são derivados de uma fonte comum: o mistério
da criação. Se esta suposição for correta, então a Mona Lisa francesa jamais
foi um retrato no verdadeiro sentido, mas sim uma meditação alegórica sobre a
feminilidade como fonte da vida.
Mas...
Muita gente boa jura de pés juntos que Leonardo jamais pintou duas
versões da Lisa, tanto que a de Isleworth foi pintada sobre tela e não em
madeira como de costume, e que portanto a senhora de Isleworth é apenas uma
cópia feita por outro artista, ou foi obra de um dos muitos alunos do Mestre ou
é simplesmente uma falsificação .
E então apareceu uma terceira Mona Lisa para botar ordem nos fatos
(rsrs)
Mas essa já vai ser outra conversa.
Pensei que a gente ia pra Londres com Helene, Moacir. Mas você me aparece com uma Mona Lisa londrina kkk Já tinha escutado falar que o quadro famoso podia ser um retrato do pintor mas que tem mais duas outras 'Lisas' pra mim é novidade. Eu queria poder dizer que conheci pessoalmente a Mona Lisa. Mas a verdade é que vi o quadro mal e porcamente. Depois de horas de fila para entrar no Museu do Louvre quando finalmente entramos na sala dela tinha uma multidão na nossa frente, todo mundo de braço levantado batendo fotos da pintura que eu achei pequena e escura. Por isso o que chamou mais minha atenção nas fotos é que a segunda mulher parece muito mais jovem e leve que a do Louvre. Obrigada!
ResponderExcluirMônica,
ExcluirComeço com uma dica: da próxima vez visite o Louvre à noite. Os turistas já estarão bebendo nos cafés e bristrôs circundantes (rsrs) Mas eu compreendo o seu desapontamento. Diante da Mona Lisa ficou faltando, talvez, um arrepio, prender a respiração e soltar um encantado “Minhanossasenhora!” (rsrs) A pintura, à primeira vista – e no meio de um exército de vândalos disparando flashes - pode sim parecer como todas as outras pinturas do Louvre: maravilhosamente bem pintadas por grandes mestres. Não porque não seja uma maravilha,uma verdadeira obra prima, mas porque não resistiu às suas expectativas, à visão preconcebida e magnificente que você tinha dela. Há que olhá-la de novo e de novo e com calma (rsrs) Por fim você acertou na mosca: a Lisa Gherardini “ londrina” parece ser dez anos mais jovem do que a senhora que você viu em Paris.
”Obrigado!” e abração.
Como bem diz o Autor Sr. MOACIR PIMENTEL, nunca saberemos ao certo se as outras MONA LISA'S foram obra do grande Pintor, Filósofo, Engenheiro, Inventor... LEONARDO DA VINCI.
ResponderExcluirMas é exatamente isso que dá encanto ao Artigo. E Ninguém como o Sr. MOACIR PIMENTEL para contar a história.
Aproveitamos também para relembrar a fabulosa Vida desse imortal Artista do Renascentismo, tão frutuosa.
Parabéns e Muito Obrigado.
Abração.
Prezado Bortolotto,
ExcluirVocê disse muito bem: “uma vida frutuosa”. Nascido em 1452 na vila toscana de Vinci e falecido há exatos quinhentos anos na cidade de Amboise, na França, Leonardo da Vinci foi um dos indivíduos mais talentosos da nossa espécie. Além de tornar-se o artista mais famoso do seu tempo ele foi cientista, matemático, historiador, botânico, cartógrafo, geólogo, astrônomo, inventor e biólogo, fazendo descobertas substanciais em anatomia, óptica e hidrodinâmica. Trabalhando como engenheiro para os poderosos de plantão – Médicis, Bórgias e Sforzas – o florentino desenhou mapas e projetou barragens, canhões, máquinas de fumaça, pontes portáteis e veículos blindados além , é claro, de uma máquina voadora, quatro séculos antes de Santos Dumont e dos irmãos Wright terem a mesma ideia.
Após a sua morte, seus diários foram descobertos e, ao longo das suas treze mil páginas e através de anotações, esboços e desenhos meticulosos, o mundo se surpreendeu com a vastidão dos seus estudos e das suas composições para pinturas, esculturas, músicas e aventuras arquitetônicas. Tudo isso intercalado com listas de compras, de tarefas cotidianas e dos nomes das pessoas que lhe deviam dinheiro (rsrs) Para as mente e personalidade sobre-humanas de Leonardo, era tudo igual e normal. O cara foi um verdadeiro gênio.
Obrigado pela leitura e comentário e um abração
1) Vcs me perdoem, principalmente o Pimentelji, um cidadão sério no que escreve e pesquisa.
ResponderExcluir2) Mas o seu belo texto me fez lembrar que, nos anos 1970, o semanário humorístico Pasquim teria descoberto parte da razão do enigmático sorriso da Monalisa ou Mona Lisa.
3) Explicaram, via charge que no momento em que a Madame referida pousava de modelo para o pintor, veio um empregado de Leonardo Da Vinci e sem que ele prestasse atenção, fez com os dedos o sinal de "V", dando a entender que seriam um belo par de chifres do famoso artista.E então a Mona Lisa expressou aquele sorriso preso... que virou enigmático, isto é, ela também gostava de fofoca da vida alheia.
4) Ou seja, o cônjuge ou a cônjuge de Da Vinci teria pulado a cerca.
5)Bem, ninguém tem nada com isso, muito menos eu, mas esta é a beleza da arte que permite interpretações múltiplas, inclusive esta fofoca que ora escrevo.
6) Com o devido perdão que peço a todos (as).
Antonioji,
ExcluirPara começo de conversa fique à vontade para rir e nos fazer rir. O problema com o chiste do “chifre” é que o pintor nada escreveu sobre sua vida pessoal. Herr Doktor Freud estudou minuciosamente os Cadernos do artista e, em 1910, publicou um estudo psicanalítico no qual afirmava que Leonardo era homossexual mas celibatário e que sublimara o seu lado erótico em pesquisas intermináááveis. Eu espero que não tenha sido bem assim porque me escapa como a castidade possa fazer bem aos corpos e espíritos (rsrs)
Mas o fato é que Leonardo da Vinci era, quase certamente, gay. Dona História registra que o pintor viveu alegre e abertamente com uma trupe de jovens alunos liderados por Gian Giacomo Caprotti da Oreno, vulgo Salai, ou "o diabinho", o seu mais bem apessoado aprendiz que nas horas vagas o roubava mas a quem o Mestre acabou legando a Mona Lisa, enquanto um aluno mais jovem, o Conde Francesco Melzi, herdou seus Cadernos. Salai e Melzi foram as amizades mais duradouras do pintor que, é claro, jamais conheceu as delícias do matrimônio.
Finalmente eu entendo que o certo é escrever “Mona Lisa” assim, com as duas palavras separadas. “Mona” é a contração da palavra “madonna”, significando no contexto "Senhora Lisa".
Abração
Não sou grande conhecedor de arte renascentista mas não acredito que a Mona Lisa de Isleworth seja uma falsificação porque se fosse seria perfeita nos mínimos detalhes. Um falsificador capaz de pintar um rosto com tanta qualidade não faria estes arbustos mal acabados no fundo da tela.
ResponderExcluirMárcio,
ExcluirEu também não boto fé na possibilidade de falsificação. Porém mesmo os mais apaixonados defensores da hipótese de que Leonardo cometeu a Lisa de Isleworth admitem que outro alguém pintou esse fundo claramente inferior. Para não falar do pescoço que é um trabalho verdadeiramente amador (rsrs) Nessa briga de especialistas, o melhor argumento da defesa é uma série de testes científicos que atestam com noventa e nove por cento de certeza que o mesmo pintor pintou as faces e as mãos de ambas as Mona Lisas. Assim, quem nega que a senhora de Isleworth é de Leonardo também nega a autoria da versão do Louvre. Por outro lado, o melhor argumento dos que não acreditam na autenticidade da obra é o fato dela ter sido pintada sobre tela, quando Leonardo costumava pintar em madeira.
Obrigado por participar
Moacir,
ResponderExcluirMinha mãe amava as canções de Nat King Cole. Eu cresci ouvindo-o perguntar a Mona Lisa se ela sorria para encantar alguém ou para esconder o coração partido. Quando visitei Paris pela primeira vez passei muito tempo diante desta obra de arte tentando descobrir o que é que que o sorriso dela tem de tão fascinante. Acho que ele é especial porque cada pessoa o interpreta de um jeito diferente. Mesmo que você me mostre mil novas Lisas, a do Louvre para mim vai continuar sempre em primeiro lugar.
Um abraço para você
Flávia,
ExcluirA Mona Lisa merece, sem dúvida, o seu afeto. Concordo com você que a força gravitacional dessa imagem é a qualidade enigmática de sua expressão facial. Acontece que um enigma é um troço extremamente sedutor, certo? Ela estava dizendo sim ou não? Ela queria ou ela não queria? (rsrs) Os pobres mortais ficam meio que perdidos diante dela, sem atinar para o que a moça estava pensando. E o pior é que nós nunca saberemos ao certo e como o velho King perguntaremos para sempre o que significa aquele olhar inescrutável e o levíssimo levantar dos cantinhos dos seus lábios e Mona Lisa continuará sendo uma eterna provocação.
Só que, na minha opinião, o pintor explorou, conscientemente, a ilusão das sombras para criar esse sorriso único, pintando o rosto da Gioconda de tal maneira que os olhos são o centro da atenção do observador e a boca é a periferia. Leonardo fez dos olhos , de caso pensado, as características mais proeminentes nesse retrato. O sorriso é apenas consequência.
Usando a técnica de nome “sfumato” - que não acreditava nas linhas e bordas nem nos contornos, mas usava diferentes tons de tinta para criar a ilusão de traços tridimensionais com luz e sombra - o pintor conseguiu provocar algo extraordinário: quando olhamos para os olhos, a boca fica desfocada na nossa visão periférica e, portanto, o significado do sorriso não é claro e parece ser alegre ou triste, caloroso ou distante, meigo ou zombeteiro. Só que quando nos concentramos na boca, o sorriso lentamente desaparece pois não era mesmo para ser. Experimente focar nos olhos, por favor! Pode-se dizer, inclusive, que são as sombras nas maçãs do rosto que fazem com que a boca pareça estar se erguendo no começo de um sorriso e tornam a Mona Lisa única em comparação com outras grandes pinturas.
Outro abraço para você
Olá Moacir ,
ResponderExcluirNota 10 para esse tanto de Monas Lisas das quais não me lembro ter ouvido falar. Nem na EBA.
Nota sem fim para sua sabichonice e seu interessante e curioso texto. E tudo indica que vão aparecer outras. Outras? Você vai dar nó nas nossas cabeças.
Conheci a "verdadeira" nas circunstâncias descrita por você: um monte de gente e câmeras na frente. E não adiantou ponta de pé, sou pequena.
A bichinha virou patrimônio mundial apesar de viver em Paris. Gosta até de propaganda. Você se lembra de uma série de Mona Lisa de gravatas? Se não me engana a memória...
Gosto dessas apropriações. Soam abusivas para você?
Interessante esse Da Vinci curioso das coisas da maternidade, corpo e alma. Mas não acho maternal esse olhar da Mona Lisa. Acho antes ser um olhar meio sonso, sedutor. Assim tipo olhar tangolomango! Quando, a pedidos repetidos, meu neto me dá esse olhar, fico maluquinha. Me lembra tango, Argentina, essas coisas. Mas ele reluta bastante!
Sempre a postos.
Até sempre mais.
Caríssima Donana,
ExcluirBravíssima! Não me incomodam nada as milhares de “apropriações” dessa senhora começando pela do Duchamp. Mas muito apreciei - e assino embaixo! - suas colocações sobre o olhar nada materno da Lisa. O nome dessa mirada “argentina” , segundo o Jorge Amado, é “olhar de frete” (rsrs) E sim as mulheres de Leonardo nos paqueram, nenhuma mais do que a Mona Lisa, para quem ele inventou um quase-sorriso tentador. Tudo bem que a gente sabe que Da Vinci não era espada mas o fato é que, durante toda a sua vida, ele esteve envolvido com mulheres, senão nas camas pelo menos nas telas. Dos seis retratos sobreviventes que cometeu, quatro são femininos. O que me intriga não é só o fato dele gostar de pintar mulher, mas a maneira pela qual escolheu mostrá-las: por inteiro. Há algo tão obviamente sensual no retrato da Cecilia Gallerani, na visão dela se virando para encarar alguém, que revela a fascinação do pintor pela modelo e ninguém me tira da cabeça hetero que o cara bem que gostaria de conhecer melhor a moça (rsrs) Também o olhar da adolescente Ginevra de' Benci é um caso sério. Ela nos encara com olhos imensos e sérios, verdadeiras janelas para as suas mente e alma.
Na defesa da nossa "tese" acabo de lembrar que nos seus Cadernos o artista fez questão de anotar e de se vangloriar que pintara a pedido de um pio cliente uma pequena Madonna tão bonita, mas tão bonita, que o proprietário era acometido por pensamentos impróprios sempre que se punha a rezar diante dela. Atormentado, o cristão pediu a Leonardo para modificar a pintura, talvez com um vestido mais severo e/ou com a adição de símbolos sacros. Mas não teve jeito! Ela continuou a deixar o cara animado “só de olhar para ele”. E então, no final, o comprador simplesmente devolveu a pintura e exigiu seu dinheiro de volta. Apesar do prejuízo o pintor se deleitou com esse pequeno triunfo “pornográfico” (rsrs)
“Até sempre mais”
Pimentel,
ResponderExcluirMais um artigo surpreendente e interessante. Por coincidência na semana passada li sobre o aniversário de quinhentos anos da morte do pintor mas eu que até me considerava um sujeito medianamente bem informado jamais soube da existência de dois quadros da Mona Lisa. Vivendo e aprendendo.
Sampaio,
ExcluirPrimeiro a Mona Lisa de Isleworth não é um lançamento: ela debutou no mundinho das artes na década de trinta do século passado! Depois ela se tornou um assunto para especialistas porque saiu dos holofotes ao ser comprada por um colecionador muito discreto e após a sua morte, em 1979, desapareceu por completo de cena dentro de um cofre de banco. A pintura só deu o ar da graça dela de novo em 2008, quando foi adquirida por um “consórcio americano”. Foi então que uma Fundação Mona Lisa foi criada para investigar a questão da atribuição a Leonardo. Há cerca de três/quatro anos atrás, os representantes dos proprietários e da fundação convocaram uma coletiva de imprensa em Genebra durante a qual apresentaram os resultados da dita investigação, sugerindo que a pintura era, de fato, um retrato anterior da Mona Lisa que Leonardo havia deixado inacabado depois de concluir o rosto e as mãos. Aí sim, após essa declaração a Mona Lisa de Isleworth foi manchete em todos os jornais europeus. Acontece que, na minha praia, se assiste diariamente os noticiários da SIC, uma televisão lusitana (rsrs)
Obrigado e, por favor, continue lendo!
Mais um dos tantos trabalhos de Pimentel, que aplaudo.
ResponderExcluirSe hoje sei o mínimo, pelo menos, sobre pintores, escultores e cidades que jamais irei visitá-las, porém conforme relato do nosso globetrotter passei a conhecê-las, principalmente Paris, da mesma forma com essas informações preciosas sobre quadro famosos e de seus autores extraordinários compreendo melhor a frase que, “uma das maneiras de se aproximar de Deus é através da arte”.
Um forte abraço.
Saúde.
Bendl,
ExcluirMuito obrigado pelas generosas palavras. Não sou um cara de certezas mas de dúvidas e portanto incompetente para lhe falar de Deus. Também não sou capaz de lhe dizer o que é a arte nem porque é tão importante. Mas confesso que dentre as milhares de definições, aprecio aquela de Tolstoy:
“A arte é a atividade humana na qual conscientemente e por meio de certos sinais externos, um homem entrega os sentimentos que viveu a outros e faz com que sejam infectados por esses sentimentos e também os experimentem.”
Prefiro seguir em frente permitindo que ela me transmita todo o espectro da experiência humana e me retire a poeira dos neurônios.
Muita saúde e outro forte abraço