Ana Nunes
A velhice
não vem só
Nas rugas
Nem nas
passadas doloridas
Ou no
sono interrompido
Nem na
insônia persistente
No corpo
mais pesado
Ou nos
desejos impossíveis
Ela fica
nos jardins dos envelhecidos
Nas
folhas secas e mal cuidadas
Nas
flores murchas debruçadas no concreto
No
matinho delicado entre as pedras
E nas
ervas indesejadas na grama crescida
Nas
janelas demoradas no abrir
E no sol
acordando ares desolados
No musgo
desbotado que ameaça paredes brancas
E a
tristeza do inevitável
Atravessa
as grades, o portão
E o muro
invisível
Invade a
calçada
E toca o
passante descuidado
E um
pouco desse triste
Acompanha
a alma pelo dia
E o velho lá dentro
Deitado
Tem olhos embaçados
E coração carcomido
E não conhece mais o seu jardim
E nem sabe da primavera
Triste mas verdadeiro ! Tempos desolados e cheios de angústia
ResponderExcluirEnvelhecer é uma arte difícil de aprender
Como sempre vc foi brilhante e seus jardins são de uma beleza intensa !!
Prima Léa querida,
ExcluirObrigada mais uma vez.
Assim, entre tapas e beijos, vamos construindo nossos jardins.
Os seus são exuberantes.,
Beijo.
Prezada Aninha,
ResponderExcluirLi o teu comentário e fui para a TI, de modo a pensar sobre o que escreveste.
Em princípio, não seria a Ana vibrante, jovial, alegre, que conheço.
Não poderia ser a mulher que sempre tem uma frase de efeito com relação à felicidade, à vida, o sentido da existência ao lado da família e até com netos, o renascimento do idoso!
Mas, pensei melhor e mais profundamente.
A Ana quis deixar um recado com esta poesia sobre o Jardim dos Esquecidos.
Penso daqui, imagino dali, tiro a prova dos nove, e chego à conclusão que a mensagem que foi transmitida é sobre a realidade cruel dos velhos, dos combalidos, dos esquecidos!
Indiscutivelmente somos as exceções neste mundo tão dramático, que vive a maioria dos idosos.
Abandonados em asilos ou deixados em casa sem qualquer atenção ou até mesmo em hospitais quando conseguem um leito, o velho tem sido descartável, abandonado, jogado fora, esquecido pelos seus e pelos outros, esperando chegar o fim da vida.
A Ana está certa.
Por melhores que sejam as nossa vidas, elas são exceções e não servem como parâmetro, como modelo.
O cotidiano é o velho triste, sem brilho nos olhos, a face flácida e sulcada pelo amargor de um final que não imaginou que seria dessa forma, largado no meio de flores e ervas daninhas, de capim e mato, abandonado, que sequer é lembrado, brilhantemente postado pela Ana como o Jardim dos Esquecidos!
Agora, como que tratamos nossos velhos?
Como que seremos atendidos pelos mais novos?
Acredito que a maneira como demonstramos nosso amor para com os filhos, noras, netos, irmão e amigos, jamais seremos deixados de lado.
Jamais seremos jogados no Jardim dos Esquecidos, pois a nossa vida tem sido nos lembrar dos mais novos e dar-lhes carinho, atenção, afeto, cuidado, companhia, o que nos resta de alegria, energia e amor!
Certamente teremos de volta esses sentimentos quando as nossas existências começarem a murchar, quando as rugas se tornarem mais profundas, quando nossos passos forem mais claudicantes, quando nosso olhos já não distinguem mais quem está ao nosso lado.
Parabéns, Ana, pela poesia tão verdadeira, tão real, que nos faz iniciar uma semana com os pés no chão, e trabalharmos para construir o nosso jardim, onde queremos estar, descansar, pensar, ler, e agradecer a vida que nos foi dada e cuidada até o seu final!
Um forte abraço.
Saúde e paz, junto aos teus amados.
Querido amigo Francisco,
ExcluirEntão você juntou tristes velhices com políticas tristes para me entender melhor indo para a TI.Uma vez alguém me contestou ao falar que não me interessava e nem entendia de política dizendo que todo mundo sabe e deve entender de política, que política está em tudo. Será o novo Deus? Se for, aqui no nosso mundo Brasil estamos fritos! Conto que o Senhor Editor não me leia. Caso contrário dirá que estou cutucando onça (você) com vara curta (rsrs)! Coisas de dissidentes, sabe?
Também tenho meu lado escuro. E te falo que é tão mais escuro quanto mais realista. E aí mora o perigo. E a velhice é triste. Com sorte podemos cuidar dos nossos velhinhos com muito amor. E mesmo que às vezes fiquemos cançados ou impacientes nada como uma pausa com café amigo para nos colocar no lugar.
O texto surgiu de manhã a caminho da piscina. Passei em frente à casa dos pais velhinhos e doentes de uma amiga e a imagem do jardim antes impecável pegou esta passante distraída. E quedei sorumbática lembrando do banheiro grande e bonito da minha avó, quando fui para o seu enterro, com ferrugens e lascados. Me atingiu em cheio. E no velório da tia do Mano, em uma bela casa em zona nobre de BH, a falta da porta de um armário na cozinha com ares de abandono. Como abandonadas vão ficando as casas de donos envelhecidos.É que vamos deixando o cuidado da casa querida e ficamos nós mesmos aos cuidados de outrem.
Obrigada pelo comentário.
Até mais. Prometo voltar mais alegre. E, quem sabe, vibrante?!
Caríssima Donana,
ResponderExcluirNão nos sentimos velhos! Nada disso. Ainda somos crianças só que “nascidas faz tempo”, cujas cabeças dariam conta de mais sessenta anos, pelo menos. Hoje ao ler os seus versos e ver a sua arte soube que não seria eu a responder-lhe. E não porque me ensinaram que poesia só se responde com mais, mas porque um mineirim já disse tudo e bem melhor do que eu diria.
"Até sempre mais"
Os Velhos
Todos nasceram velhos — desconfio.
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre — sempre
assim como estão hoje
e não deixarão nunca de estar:
soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do Juízo Final.
Os mais velhos têm 100, 200 anos
e lá se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
não menos de 50 — enorm'idade.
Nenhum olha para mim.
A velhice o proíbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal?
Quem infrigiu a lei da eternidade
que não permite recomeçar a vida?
Ignoram-me. Não sou. Tenho vontade
de ser também um velho desde sempre.
Assim conversarão
comigo sobre coisas
seladas em cofre de subentendidos
a conversa infindável de monossílabos, resmungos,
tosse conclusiva.
Nem me vêem passar. Não me dão confiança.
Confiança! Confiança!
Dádiva impensável
nos semblantes fechados,
nos felpudos redingotes,
nos chapéus autoritários,
nas barbas de milénios.
Sigo, seco e só, atravessando
a floresta de velhos.
Carlos Drummond de Andrade, in 'Boitempo'
Querido Moacir,
ExcluirVocê me encanta com seus Drummond de Andrade e me constrange por se lembrar dele com meus versos de pé colado!
E nos versos dele que você me fez conhecer me descubro na nossa enorm'idade pós cinquenta conversando sobre coisas seladas e subentendidos e resmungos. Talvez tosse também porque ninguém é de ferro.
E lá vamos nós bem lampeiros e pimpões, entre hiatos de tristeza, atravessando a "floresta de velhos".
Obrigada por tudo, pelo Drummond, pelo comentário e pela generosidade.
Até sempre mais.
1) Parabéns Ana pela poesia reflexiva.
ResponderExcluir2)Tenho descoberto que precisamos aprender a ser velhos. Por exemplo, aprender a ir com mais frequência aos médicos e cumprir o que eles recomendam.Coisa que eu ia raramente quando jovem...
3) Tudo de bom para todos nós e, principalmente, saúde !
Olá Antonio querido budista,
ExcluirVamos mesmo aprendendo a ser velhos. E começa cedo! Fazer o quê?
E quando jovens cheios de saúde, com juntas e órgãos funcionando na plenitude de seus óleos e hormônios e movimentos, não precisamos mesmo dos médicos. Mas depois...haja plano de saúde. Mas não precisamos cumprir tudo que mandam. Uma insubordinaçãozinha sempre é bem vinda. Mesmo que paguemos o pato.
Como dizem FBendl e você, saúde muita para nós todos.
Até mais.