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03/08/2018

Brega sim, por que não?

imagens CBS, Continental, Polygram e RCA



Ana Nunes

Algum pouco tempo atrás zapeando na TV encontrei Pedro Bial celebrando cinquenta anos da música brega. Com ele estavam Falcão com suas cores e modelitos extravagantes e o amigo Pablo, não o Vittar, por favor. E também Paulo César Araújo, autor da polêmica biografia de Roberto Carlos e de um livro sobre a história da música brasileira. Livro referência para quem se interessa pelo tema.
Cativou-me o programa que peguei já andado. Porque adorei. E comprovei o que já desconfiava, sou brega, ou boa parte de mim. Já desconfiava por causa de um CD gravado para mim, por filho e nora em Paris (deviam estar de banzo) que trazia de Caetano com “London London” à “Vaca Loca”. De permeio veio uma música que fala de um cara que recebe o convite de casamento de sua amada que ele viu crescer, o que tornava o amor impossível. Ou quase, porque
 “...no cantinho rabiscado no verso
   ela disse meu amor eu confesso
   estou casando mas o grande amor
   da minha vida é vocêêêê....”
Acreditem, gostei tanto, gostei de arrepiar! E coloquei para tocar de novo e de novo, bem baixinho com vergonha de algum vizinho ouvir. Bem, isso no passado porque agora que assumi ouço no talo.

Dizem que o brega surgiu nos bordéis do nordeste “embalando os amores de aluguel”. Bordéis esses que desenhei sob encomenda sem nunca ter visto, nem nas pesquisas googlianas. Surgiu como cornífera, romântica da população de baixa renda e considerada cafona e deselegante nos anos setenta. Jerry Adriani , Odair José com “Pare de tomar a pílula”, Almir Rogério “Fuscão Preto”, Waldick Soriano “Eu não sou cachorro não”, Sidney Magal “Sandra Rosa Madalena “ e “Mulher”, cara fiel ao seu estilo até hoje, Wando e as calcinhas da plateia histérica, Matogrosso e Mathias cantando “Boate Azul”, suprassumo da breguice. E muitos outros que fizeram sucesso.
Nos tempos de chumbo, com a censura bem ativa e massacrante, a música brega incomodou políticos, gregos e troianos, opondo-se com sua tristeza ao ufanismo militar. Era um modo encontrado para burlar os censores.

Na verdade o cafona tem raízes bem mais antigas com Vicente Celestino e suas trágicas canções de viúvo inconsolável dividindo sua dor com a plateia em “O Ébrio”, e Batista, Nelson Gonçalves, Nelson Ned, Aguinaldo Timóteo.
E veio desaguar na Jovem Guarda com Reginaldo Rossi Rei em contraponto ao Rei Roberto Carlos.
E ficou chamada brega por causa de uma estória complicada com o nome alemão de um frequentador dessa turma alegre dos bordéis. Ou deriva de “Nóbrega”, nome da rua em que ficavam os “castelos”, os puteiros de Jorge Amado, na cidade de Salvador.

Saudosismo saudável e divertido. De tias histéricas com choro e tudo por causa do Nelson Gonçalves, de avózinha querida Ana portuguesa, branquinha de olhos claros (pena, só uma irmã saiu com seus olhos de gato, meio verdes meio cinzas meio raiados), que se emocionava com “Encosta sua cabecinha no meu ombro e chora”, e “Tão longe de mim distante, onde irá, onde irá teu pensamento?”. Certamente se lembrando de sua bela terra tão distante e dos queridos lá deixados. Porque avós também tiveram pais e avós e tias e primos e irmãos. Valsinhas que minha mãe tocava no seu teclado certamente se lembrando dela.

E não devo me esquecer da colega engenheira eletricista, chamávamos de engenheira “elétrica”, que fazia projetos no escritório onde eu era desenhista. Seu repertório era oficialmente brega. Uma das músicas falava de “dentes de canjica”. Enquanto ríamos Helenice nos ameaçava com sua juba voadora, sabe, aquelas escovas de projetista, parecidas com o bigode do Sarney e cabos compridos para limpar desenhos e pranchetas. Voadora porque ela costumava mandar pelos ares em nossa direção. Depois de um tempo bastava mostrar a juba, e ríamos mais ainda.

Um mundo antigo onde entrei e nadei de braçada num saudosismo gostoso e conhecido. Cheio de afetos e memórias musicais.

E descobri coisas
A desconfiança de que já sou uma velhinha com História
E a certeza de que sou brega!


13 comentários:

  1. Lea Mello Silva03/08/2018, 08:10

    Como sempre muito divertida 😄e desconfio que no fundo todos temos o nosso lado brega
    Lembro muito da tia lavando roupa no tanque e cantando Nelson Gonçalves
    Gosto muito de encontrar pela manhã estes textos !! Obrigada Ana pelas lembranças das breguices da nossa vida ❤️

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    1. Léa,
      E viva nosso lado brega! Com Sidney Magal especialmente para você!
      Para sempre amigas.

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  2. Francisco Bendl03/08/2018, 12:33

    Prezada Aninha,

    Em princípio, no que diz respeito à música não existe a palavra brega para defini-la.

    Gostos são gostos, e eles são aceitos ou não mediante a sensibilidade da pessoa em ouvir canções que a transportam no tempo ou que as emocionam.

    Ora, a maioria das pessoas hoje em dia não conhece uma ópera que seja, logo, como que eu teria de classificá-las?
    Abomináveis?
    Toscas?
    Rudes?

    Nada.

    Cada um, cada um.

    Essas canções que te referiste embalaram a minha juventude também.
    Fuscão Preto foi um sucesso nacional;
    Jerry Adrianni, cantando Amore Scusami, ficou muito tempo nas paradas de sucesso;
    A música, Na Boate Azul, foi um ícone para os frequentadores desses locais;
    Waldick Soriano, Eu Não Sou Cachorro Não, ficou conhecido nacionalmente.

    Porque o povo gosta desse tipo de música e letra, que lhe falam diretamente no coração e surgem suas emoções, rotular de brega tanta a obra quanto quem as escuta é aquele tipo esnobe, um falso intelectual, uma pessoa com complexo de superioridade e tomada de defeitos de caráter e personalidade!

    O respeito às pessoas que possuem gostos diferentes das demais é o princípio da educação, dos bons costumes, de civilidade.
    E daí, se eu gosto de canções sertanejas?
    O que importa, se eu gosto de ouvir músicas românticas e populares?

    Vale a minha alegria, eu me sentir bem comigo mesmo ao ouvir as composições que me emocionam me deixam feliz e, estas, invariavelmente são simples, justamente porque amar é simples, sem muitas explicações de como agir neste sentido.

    Parabéns pelo teu belo trabalho.
    Um artigo que nos faz pensar e emitir opiniões com sinceridade, da mesma forma como nos brindaste com este texto mais uma vez elogiável, abrangente, e com uma certa nostalgia, haja vista que este tipo de música não existe mais, apenas arremedos e imitações das legítimas que ouvimos e nos emocionaram no passado.

    Lembra de Wanderley Cardoso, O Bom Rapaz?
    Os VIPS, com A Volta?
    Martinha, então?!

    Bons tempos, bons tempos, que não voltam mais.

    Parabéns, Ana, por mais esta viagem que nos ofereceste para os tempos pretéritos, e que a cada vez que os visitamos somos impulsionados para seguir em frente, conhecer o futuro, e declarar que vivemos uma época estupenda, maravilhosa, simples, porém emotiva, romântica e muito importante, e que são essas lembranças que nos tornam especiais, seres humanos conscientes do que a vida pode nos oferecer de bom, de agradável e, por sabermos valorizá-las, hoje escrevemos sobre uma época que tanto nos deixou saudades, e que agora nos aproxima mais uma vez ao nos recordarmos daqueles dias sensacionais!

    Um abração.
    Saúde e paz, extensivo aos teus amados.





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    1. Olá Francisco Bendl,
      Conheço muita gente que gosta de ópera. Eu comecei a apreciá-la mais tarde na década de 80. Por assim dizer sou ainda uma iniciante. O Mano e os filmes tiveram sua influência.
      Ah! Amore scusami, minha época de viver em estado de paixão. Ouvi Amore scusami naqueles 4 rotações diversas vezes seguidas. ( Também vejo filmes repetidos, viu? Tenho lá meus preferidos)
      Como você disse, um artigo nostálgico, acabou sendo mas não era minha intenção.
      Também um artigo de amor, "amar é simples, sem explicação" disse você.
      Hoje mesmo comentei com o Mano que meu coração agora é promíscuo. Me apaixono por locutores da CBN, jogadores de vôlei, repórteres da TV, homem ou mulher. E agora vocês do blog.
      Mas avisei a ele que é só amor, nada de sexo! Kkk
      Obrigada pelo comentário. Viu como estávamos em sintonia ambos escrevendo sobre música?
      Até mais.

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    2. Digo, 45 rotações.
      Até.

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  3. 1) Belo texto, memórias maravilhosas. Parabéns Ana.

    2) Eu tb sou brega, roceiro, matuto.

    3)Bons tempos no meu Gama querido !

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    1. Olá querido Antonio,
      Achei que estava sozinha nessa! Ainda bem que encontrei amigos...
      E você, matuto? Matuto zen budista? Ora, pois.
      Acho realmente que seus tempos no Gama querido foram muito bons!
      Obrigada pelo comentário.
      Até mais.

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  4. Moacir Pimentel04/08/2018, 08:01

    Caríssima Donana,
    Um belo post, como sempre. Bem, de "calcinhas" só me lembro das exocet – "bélicas mas comestíveis" - da Kátia Flávia, a Godiva do Irajá (rsrs) Mas gosto tanto de London, London que até já virou post com direito à foto e meus pais ouviam sempre - e com cara de aborrecentes ! - Nelson Gonçalves cantado a Normalista , que era tão linda, mas cujo pai não deixava casar antes de se formar (rsrs) Muitas vezes as razões que nos fazem gostar de uma canção não estão só nas suas notas e lyrics.
    Seja lá como for, as playlists de nossas vidas são assunto nosso e, como a senhora, também gosto de música considerada cafona, brega, sentimentalóide e não tenho o menor problema com isso. Gosto do que me diverte e emociona, do que muita gente gosta, mas também não abro mão de gostar do que quase ninguém gosta. Da grande música e do jazz que meu pai escutava no escritório e do bel canto e canções francesas e orquestras americanas que minha mãe ouvia na sala da casa da minha infância. Até que virei beatlemaníaco e fã de carteirinha desse tal de Roque Enrow! Viva Pink Floyd! Quando voltei para casa, nos anos 80, o rock verde e amarelo nascia com força total: Titãs, Blitz, Paralamas, Ultraje a Rigor, Legião Urbana, Cazuza! Minha mulher introduziu na trilha sonora o fado, Cesária Évora , Mariza, Madredeus, Pedro Abrunhosa. Depois as crianças cresceram e, começando pelos Mamonas (rsrs) encheram a casa com som novo e continuam nos apresentando gente boa até hoje: Tiê, Zaz, Adele e o Teatro Mágico, aquele que jura de pés juntos que "velhinhos são crianças nascidas faz tempo!"
    Eu só acho que, de repente, a música foi ficando monocórdia: na década de 90 em vez de rock, MPB, samba etc o mundo começou a tocar só axé e/ou sertanejo. Hoje o funk é o dono do pedaço e eu mudo de canal, sem comentários. Sempre fui capaz de apreciar todos os gêneros musicais e, portanto, não me acho metido à besta por não curtir essas coisas coreografadas atuais, sem melodia e com péssimas letras. Das duas uma: ou lhes falta qualidade ou eu estou ficando velho. Em ambos os casos: fazer o quê?
    “Até sempre mais”

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    1. Olá Moacir,
      Bom, de calcinhas exocet ou Wando entendemos todos. De "cueca virada" entendem o querido Francisco Bendl e os gaúchos.
      Também gosto do que me emociona, diverte. E intriga. E as playlists da minha infância juventude envolveram me em The Platters, Glenn Miller, Duke Ellington, Satchmo e sua turma, Gershwin, Rimsky Korsakov, Tchaikowisky, Borodin, Beethoven, Sibelius e por aí afora. Já viu, vivo emocionada!
      E da adolescência dos filhos ficaram os Pink Floyd, Titãs, Ultrage, Cazuza,You Two, e muitos outros que não vou lembrar agora.
      Só sei que eles falavam que iam me educar musicalmente e punham para tocar, e gravaram para eu ouvir no carro, Knock knock in the haven's door. E quando saíram de casa, um deles veio passar uns dias e disse: - Poxa mãe, não tem nem dois meses que saí de casa e te pego ouvindo Martinho da Vila?
      Pois é. Assim vamos sendo educados. Por pais, marido, filhos, irmãs bem mais novas (12 e 17 anos), irmão que morou comigo e me ensinou Billy Paul, Santa Esmeralda, e com quem dividi meus rock'n roll.Nossa, fui longe na memória e na saudade do meu Bro. Quem sabe os netos?
      Gosto de quase tudo. Tudo tem sua hora, menos música religiosa. Pe. Rossi e por aí.
      E quando passa de noitão um carro com funk no talo não consigo não me mexer.
      Obrigada por suas pretinhas sempre coloridas no coração.
      Até sempre mais.

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  5. Permita-me uma observação?
    ...
    Nos tempos de Jesus ... cantava-se Salmos!!!
    ...
    E aparece o canto gregoriano no mundo romano.
    ...
    Foi assim até São Francisco de Assis, quando o canto provençal canta a Natureza, a Mulher etc e começa a música popular!!!
    ...
    O brega é bem popular kkk KKK kkk
    ...
    Um aperto de mão do Lionço Ramos Ferreira

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    1. Olá Lionço, Lógico, quantas observações quiser. Ainda mais se forem interessantes como essa. Obrigada pelo comentário. Outro aperto de mão.

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  6. Oi aninha,parabéns mais uma vez! O texto ficou muito bom, bem como os comentários tb ! é sempre muito divertido os seus amigos ! Vamos escutar de Ave Maria a KYGO , porque não ?
    beijocas

    Anna Paula

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  7. Até que enfim bichinha!
    Sim, vamos de Ava Maria a KYGO. Por que não?
    Beijocas.

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