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09/08/2018

Terça feira

Norman Rockwell


Francisco Bendl
Terça-feira, dia 31 de julho de 2018.
Dia claro, sol tímido, temperatura baixa, 12º Celsius.
Ouço Clair de Lune, de Debussy, e me vêm à mente várias questões:
Qual seria a melhor opção para um velho, que desce a ladeira em ponto morto, sem freios e em alta velocidade quanto ao resto de sua vida?
Caso eu me candidatar para qualquer vaga de emprego – além de difícil hoje em dia -, receberei um cortês e sonoro não, pois entendem que o idoso não tem condições mais para nada!
Tá bem, estou aposentado após mais de cinquenta anos de trabalho, mas continuo de posse das minhas faculdades mentais, que se somam à experiência adquirida, uma visão de mundo mais ampla, mas eu seria dispensado inapelavelmente!
Passar os dias em casa sentado em frente ao micro e correr a Web em busca de notícias, participar de blogs onde o tema político é a tônica, ler os textos importantes e cultos publicados no Conversas do Mano e, à noite, ligar a TV e assistir os seriados da Netflix, sinceramente, mas a sensação que tenho é de estar em um sarcófago, porém com mais conforto do que aqueles dos faraós, pois tenho também telefone e watts!
Logo, surgem as dúvidas sobre a ocupação que os velhos deveriam ter para que o tempo passado fosse mais útil, mais proveitoso, mais interessante, do que simplesmente esperar a morte chegar, como diz a letra de uma célebre canção!
E o que seria?!
Dirigir?
Tenho um bom carro na garagem, que uso raramente, pois depois de tantos anos na estrada e como taxista, sair de carro não mais me atrai como antes;
Ler?
Na verdade quero algo mais movimentado, e não tanto exclusivo;
Caminhar?
O fôlego e o peso limitam em demasia o trecho a ser percorrido;
Assistir TV o dia inteiro e dormir à noite?
Cansativo, sem graça, monótono e automático;
Passear, ir aos shoppings?
Na minha cidade eles não existem e, depois, sem dinheiro? Tortura chinesa!
O tempo passa, a música triste terminou, e coloco Tchaikovsky, pois o meu estado emocional pede músicas belas, porém sem que sejam animadas, assim como me encontro.
E daí?
- Fazer o quê, Chico Bendl, pergunto a mim mesmo?
Visitar os doentes no hospital da cidade?
Vão perguntar o que eu tenho!!!
Visitar os dois asilos existentes?
Vão dizer que não tem vaga para mim!
Sentar em um banco na praça e deixar o tempo passar?
Vou receber umas moedas de esmola pela aparência!
Penso, tento encontrar uma saída, preciso de uma.
Pescar?
Não, não me atraiu no passado, quanto mais agora;
Passar uns dias em um hotel?
Por mais pomposos que sejam não têm o conforto da minha casa;
Viajar?
Não, fiz isso a vida toda.
...
A saudade dos netos, que saíram ontem da minha casa após quatro dias comigo e a avó deles, certamente é a causa desse banzo que estou sentindo!!!
Falta o ruído do que faziam;
A alegria que os conduzia quando unidos;
A explosão de suas vozes;
As brincadeiras, os pedidos, a solicitação do meu celular para brincarem;
As carinhas de anjos querendo suco...
A nostalgia de uma casa de velhos sem criança traz o sentimento de se residir em um mausoléu e, com suas presenças, transforma-se em “bomsoléu”!
Tiro rápido o russo do aparelho de som, e procuro avidamente as músicas de carnaval:
Tá chegando a hora;
Cidade Maravilhosa;
Cachaça não é água não;
As pastorinhas;
A cabeleira do Zezé;
Mamãe eu quero;
Desfolhei a Margarida;
Allah-la-ô;
Aurora;
Abre Alas;
Me dá um dinheiro aí,
E saio pulando pela sala!!!
Tenho, sim, muito que fazer.
Tenho de me preservar para viver e por muito tempo esta felicidade de ser avô, de ser útil àquelas crianças maravilhosas, bênçãos de Deus!
Tenho de me conservar para recebê-los com a mesma alegria contagiante quando me visitam, que enchem esta casa de risadas, de brincadeiras, de cabanas com sofás unidos e cobertores, de ser vários heróis ao mesmo tempo!
E danço animado Abre Alas, como se estivesse abrindo as portas para uma nova) existência, uma nova vida, um novo sentido, e poder escrever para vocês, meus amigos tolerantes, esta imensa responsabilidade de se ser avô e sua função ímpar, de um velho ser aceito pela juventude, sem qualquer questão a dificultar essa existência em conjunto e aproximação, unindo o futuro ao passado, e se vivendo um presente memorável, um presente mesmo de Deus!
“De dia falta água, de noite falta luz...”
“Se você fosse sincera, ô ô ô ô, Aurora...”
“Ó abre alas que eu quero passar... “
“Ei, você aí, me dá um dinheiro aí, me dá um dinheiro aí...”
“Você pensa que cachaça é água, cachaça não é água não...”
“Ó jardineira por que estás tão triste, o que foi que te aconteceu?”
“Linda morena, morena, morena que me faz penar...”
“As águas vão rolar, garrafa cheia eu não quero ver sobrar...”
Estatelo-me no sofá cansado, arfando, sem poder me aguentar mais!
Porém, tomado de uma felicidade e alegria que somente um velho pode avaliar pela sua importância, em face de que está vivo e sente esta emoção indescritível:
SOU AVÔ!!!
(E berro para a Marli me trazer um copo d’água)


10 comentários:

  1. Lea Mello Silva09/08/2018, 09:06

    Ver alegria em tudo é muito bom !
    Saber tirar proveito de todos os momentos que vivemos
    Gosto muito do seu jeito de ver a vida
    E vamos aprendendo a ver cores em tudo
    Um grande abraço agradecendo sua crônica de hoje
    E vamos cantar ❤️

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    1. Francisco Bendl09/08/2018, 12:54

      Prezada Lea,

      Muito obrigado pelo comentário.

      E tens razão quanto a um dos tantos aspectos da vida:
      Temos de tirar sempre bons proveitos dos momentos que vivemos, e com alegria e positividade.

      Até porque, as pessoas não têm nada a ver com nossos problemas existenciais, logo, no lugar de nos apresentarmos como "chatos", que sejamos alegres, dinâmicos, vibrantes.

      Evidente, nada que nos identifique como bobos, mas uma pessoa disposta, legal, animada quando necessário, e divertida.

      Custei a aprender que temos permanentemente de mostrar capacidade de enfrentar obstáculos mas, principalmente, Lea, que tenhamos como nos recuperar dos problemas, ou seja, se temos ou não a famosa resiliência, que é a propriedade de voltarmos a ser o que éramos antes de uma tragédia ou infortúnio.

      Os netos são esta compensação, este prêmio, esta bênção para seus avós.

      Um abração, Lea.
      Saúde e paz, extensivo aos teus amados.

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  2. Olá Francisco voz de trovão,
    Sua voz se fez ouvir até nessas montanhas guardiãs.Não sei se gosto mais de Debussy, de descer a ladeira emponto morto, de você dançando animado o Abre Alas ou o "bonsoléu" com as carinhas de anjo pedindo suco, certamente de uva se preparando para o vinho do futuro, e o celular.
    Bom demais. E viva a avó que acaba pagando o pato!
    Quando você escreveu este delicioso texto eu também ensaiava um sobre netos, minhas pessoinhas preferidas. Mas ainda estou parada. É mais amor que palavra, sabe? Tenho que tentar mais. Te conto quando sair. Queria mesmo era colocar os desenhos todos, os de um só de bichos , e os do outro, preciosos mundinhos feitos dentro de uma régua de desenho de arquitetura. Paro em frente a eles pregados com fita crepe nas portas e me perco em aventuras adolescente e infantil.
    Quero mais escritas suas. Todos os dias da semana!
    Saúde e paz
    Até mais então.

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    1. Francisco Bendl09/08/2018, 13:08

      Prezada Aninha,

      Obrigado pela participação, e grato pelo comentário.

      Olha, te confesso que mudei depois que meus netos nasceram.
      Eu me tornei mais compreensivo, tolerante, mais paciencioso, mais alegre.

      As três gurias e os dois guris me trouxeram outros objetivos, que jamais imaginei nesta idade que eu iria tê-los.

      Um deles é assistir os cinco netos concluindo o Ensino Médio, pois não viverei para vê-los concluir uma faculdade!

      As duas meninas de onze anos, a Luíza e Sarah estão no sexto ano, quem diria, e os dois piás no primeiro.
      A Helena ainda está no Jardim até ano que vem, pois ela faz seis anos no fim de novembro.

      Quanto às brincadeiras, eu sou o homem das caretas, e a indefectível sonoplastia dos filmes de super heróis!

      Risadas fortes, voz cavernosa, de ameaça ... tenho de me esforçar para prender suas atenções, e eles se divertem comigo.

      Logo, quando me encontro saudoso, nostálgico, no lugar de me entristecer vou ouvir as marchas de carnaval da minha época e até anteriormente, haja vista que possuo sobradas razões para ser feliz, e agradecer a Deus a esposa, filhos e netos que Me presenteou!

      E não vejo outra forma do que esta, Aninha, de registrar esta animação e dinamismo que sinto, postando alguns textos em homenagem aos avós, que adoram seus netos, e percebem neles uma fonte eterna de juventude e vontade de viver!

      Abraços, Aninha.
      Saúde e paz, extensivo aos teus amados.

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  3. 1) Parabéns Chicão.

    2)Interessante o seu viver. Sucesso !

    3) Abraços !


    3)

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  4. Francisco Bendl09/08/2018, 17:12

    Rocha, meu amigo e professor,

    Penso que, ao nos distanciarmos de nós mesmos, de não nos permitirmos encolher diante de falsas tristezas ou crises existenciais, quando nos deparamos e constatamos que temos mais razões para ser alegre e felizes, definitivamente não podemos nos abater!

    Ora, se eu e a Marli tivemos filhos saudáveis, pessoas excelentes, que são úteis à sociedade a si mesmos e famílias, que nos presentearam com cinco netos maravilhosos, lindos, saudáveis ... só me resta exultar e fazer do resto da minha vida um carnaval!

    Claro, para isso eis-me aqui meditando conforme prega o Budismo, e verificando o que tenho de bom e que pode me deixar abatido, vencido por uma ou outra circunstância.

    Como meus motivos de felicidade são maiores do que os problemas pessoais, que venha a música de acordo, que me faz pular, dançar, e extravasar estes sentimentos tão extraordinários!

    Abraços, meu caro.
    Saúde e paz.

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  5. Prezado Autor Sr. Francisco BENDL,

    Depois de uma semana de fim de férias Escolares, Netos junto aos Vôos, quando da volta às Aulas e a casa ficando vazia, dá realmente um banzo.
    Nada melhor que cantar as velhas canções populares de Carnaval, como fizestes.
    Mas não te preocupes agora que momentaneamente a Casa ficou vazia, só a Prof. D. Marli, e escreva mais ainda.Tens o maravilhoso dom de Escrever Bem.
    Abração.

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    1. Francisco Bendl10/08/2018, 11:09

      Mestre Bortolotto,

      Obrigado pelo comentário.

      Certamente como temos a mesma idade, sentimos muito quando nossos netos deixam as nossas casas.

      Temos a sensação que estamos nos desprendendo da vida, pois a velhice é muito chata, monótona, silenciosa, sem iniciativa, quieta.
      A alegria é a baderna que fazem nos conectam à existência de novo, então vibramos, rimos, cantamos, fazemos bobagens.

      Enfim, temos de seguir em frente para aguardar pelos dias que voltarão a nos visitar e, mais uma vez, interligarmos o idoso à juventude, cuja simbiose é maravilhosa.

      Um forte abraço, mestre.
      Saúde e paz.

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  6. Moacir Pimentel10/08/2018, 08:31

    Bendl,
    O mais difícil de ser pai é ser responsável por tudo e, de ser avô, é aceitar que não somos (rsrs) Mas estou com você e não abro: ser avô é uma maravilha! Não há nada que possa se comparar à mágica de ver nossos filhos se transformarem em pais e mães carinhosos e constatar que fizemos o nosso dever de casa bem feito. Tudo bem que já não temos fôlego para correr e brincar com os pirralhos por horas a fio, mas como eles alargam esse horizonte chamado futuro e nos energizam e rejuvenescem com seu entusiasmo ilimitado pela vida!
    De certa forma os netos nos oferecem o melhor de dois mundos. É uma festa tê-los por perto mas quando termina um final de semana agitadíssimo, de mimos, aventuras, brincadeiras, desenhos e histórias, eles vão para as casinhas deles com seus papai e mamãe, os brinquedos e a bagunça e, sozinhos, podemos curtir o silêncio no velho ninho e/ou uma boa conversa "adulta" sem interrupções(rsrs) Beleza!
    Um dos meus poetas preferidos dizia que “Mover-se é viver, dizer-se é sobreviver”. Penso que "dizer-se" significa que já trilhamos um longo e árduo caminho e implica que agora temos muitas histórias para contar aos netos. Transforme as suas em mais belas "conversas" como essa.
    Obrigado e abração

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    1. Francisco Bendl10/08/2018, 11:17

      Pimentel, meu caro,

      Uma das tantas qualidades deste blog extraordinário do Conversas do Mano é que somos um bom número de avós.
      Entendemo-nos facilmente, pois existe uma identidade poderosa entre aqueles que atingiram este estágio na vida sumamente importante!

      Logo, o que dissermos, e por mais simples que sejam as palavras empregadas, receberemos o carinho dos outros avós, pois qualquer texto que se refira aos nossos netos é simplesmente maravilhoso!

      Diante deste escudo que me protege, de que a qualidade do artigo neste particular seja imprescindível, lá vou eu postar os meus rabiscos enfatizando como a nossa existência é mais completa quando somos avós, e o quanto é fundamental para o crescimento espiritual do ser humano ter esta sensação e realidade consigo.

      Portanto, muito obrigado pelo comentário, e concordo mesmo contigo quando depois de terem ficado conosco alguns dias e volta a reinar a quietude em casa, como é bom aquelas horas em silêncio, e eu e a Marli conversarmos exatamente sobre essas visitas, estirados no sofá, arfando, cansados, mas felizes!

      Abração.
      Saúde e paz.

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