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04/09/2018

A conversa dos cubistas

Pablo Picasso - Clarinette (1911)

Moacir Pimentel
Foi em Céret, uma pequena cidade no sudoeste da França, perto da fronteira espanhola, que Picasso e Braque pintaram juntos, na maior conversa, as suas mais herméticas telas cubistas. Cada pintura passou a ser um fim em si mesma e a falar uma linguagem própria e os rapazes complicaram definitivamente a tradução do cubismo (rsrs)
É o caso da tela acima batizada de Natureza Morta com Clarinete, na qual o instrumento musical foi várias vezes apenas esboçado, “inteiro aos pedaços”. Nesse trabalho foi dispensada qualquer tentativa de simular a tridimensionalidade por meio da perspectiva de um ponto e os fragmentos do objeto foram simplesmente sobrepostos sem qualquer relação espacial entre eles: a representação continuava mas a simulação acabara.
Como também é caso do Homem com o Cachimbo que, saído da paleta de Picasso foi de imediato respondido por Braque com o seu Homem com o Violino, no interior de um café mal iluminado e repleto de fumaça. Pouquíssimos fragmentos de informação gráfica são legíveis nessas duas charadas ovais nas quais ambos fragmentaram as imagens como vidro quebrado: os bigodes, os cachimbos, as cabeças dos homens e suas mãos, um pedaço de papel, o violino.
Pablo Picasso - Homme à la pipe (1911) / Georges Braque - Homme avec violon (191)

Os rapazes estavam experimentando ideias, desafiando a ortodoxia ilusionista na pintura, testando diferentes tipos de representação, aglutinando múltiplas visões de cada objeto em uma única imagem composta e, é claro, encorajando com essa fragmentação radical uma leitura abstrata em vez da descoberta da forma representacional.
Gradativamente os volumes imaginários das figuras humanas e dos objetos foram se dissolvendo em coleções cada vez menos objetivas de linhas, planos, luz, cores e facetas interpenetrantes de formas flutuantes em um espaço raso e indeterminado. Nesse período Picasso e Braque, de quebra, também usaram a sobriedade cromática nas obras para dar ênfase à natureza cerebral das questões que abordaram.
As telas abaixo também foram pintadas pela dupla em estreita colaboração, nos Pireneus. À esquerda vemos um Homem com uma Guitarra, fugido da paleta de Braque e, à direita, um Poeta saído da cabeça de Picasso. Todas essas telas ilustram o momento no cubismo analítico com o maior o grau de abstração das imagens, quando os temas na pintura se tornaram quase irreconhecíveis. Ou seja, à primeira vista, o violeiro pode muito bem ser o poeta e vice versa (rsrs)
Georges Braque - Homme avec guitare (1911) / Pablo Picasso - Poète (1911)

Aliás, note que a única renderização realista cometida por Braque na sua cena pictórica acima – que o meu netinho acha que é um “Transformer” (rsrs) - é a imagem perfeita de um prego e de uma corda no canto superior esquerdo da primeira tela para ilustrar um dos seus bordões prediletos: “Pinto por que gosto de ver minhas ideias penduradas nas paredes”.
Diante dessas representações quase indecifráveis de um violeiro e de um bardo o jeito é chutar o pau da barraca da perspectiva tradicional e topar o desafio de buscar os temas divididos em componentes geométricos. Sim, nessas telas é difícil tanto perceber as figuras representadas de vários ângulos de uma só vez, quanto estabelecer os espaços e neles o movimento. Mas, como os títulos indicam, as formas humanas estão lá visualmente dissecadas e reconstruídas como arquiteturas de elementos retilíneos e curvilíneos.
Apesar da indefinição das pistas visuais, o observador atento pode detectar as duas figuras piramidais centrais densamente articuladas, fundidas de forma colorida e textural com o espaço circundante, menos detalhado. Pequenos círculos - invadidos pelas pontas de planos triangulares - tornam-se olhos quando associados a outros planos mais longos de possíveis narizes e aos crescentes de prováveis bigodes(rsrs) Depois dessas descobertas básicas as imagens completas podem ser reconstituídas pela inferência do queixo, do pescoço, do tronco, dos cotovelos, dos braços de uma cadeira, do violão, dos muitos livros em torno do Poeta que finalmente aparece de perfil voltado para a direita e olhando para fora da tela enquanto fuma um cachimbo branco.
Na realidade Picasso e Braque estavam se encaminhando, a passos largos, para a abstração total, que Kandinsky estava experimentando na vizinhança e que Malevich finalizaria alguns anos depois em Moscou. Dizem os especialistas, que o espanhol chegou muito perto do limiar entre a figuração e a abstração, no verão de 1910, na cidadezinha espanhola praiana de Cadaqués, quando ele pintou algumas telas quase sem ilusão de formas sólidas, como foi o caso da Natureza Morta com um Copo e um Limão...
Pablo Picasso - Nature morte avec verre  et citron (1910) /
Pablo Picasso - La mandoliniste (1910)

... e da Mulher com o Violão. Tais obras são dois conjuntos de planos geométricos interligados em tons de marrom e cinza e só não são abstratas no nome.
Porém se você olhar de novo, perceberá como era mais difícil para o pintor fugir dos objetos do que da figura humana. Explico: na natureza morta é impossível encontrar tanto o copo quanto o limão, certo? Mas, na segunda tela, embora o violão tenha se escafedido, o oval de um rosto feminino, um nariz e os vestígios de um olho permanecem irredutíveis no centro da composição (rsrs)
Muitos anos depois Picasso afirmou que a realidade era seu ponto de partida e que ela deixava suas digitais nas tintas:
“Não existe arte abstrata. Você deve sempre começar com alguma coisa. Depois, você pode remover todos os vestígios da realidade. Então não há mais perigo porque a ideia do objeto já deixou uma marca indelével”
E sustentou que lhe era impossível eliminar inteiramente o tema de uma pintura: “Mesmo que a tela seja toda verde - e daí? Nesse caso, o assunto é a verdura! “ (rsrs)
O certo é que depois de seriamente tentar abstrair criando tais organizações de planos geométricos monocromáticos interligados que levavam do nada para mais nada, Picasso e Braque simplesmente recuaram. Decidiram não atravessar a fronteira da abstração total, tanto que passaram a adicionar mais pistas às suas cubices analíticas extremas.
Note que nessa fase mais radical do cubismo, quando os dois amigos oscilaram à beira da abstração, foi Braque quem recuou primeiro, introduzindo nas pinturas detalhes que chamava de “certezas” - letras, palavras, numerais, notas musicais! - como pontes para a realidade, como pequenos sinais que indicavam mais claramente a pessoa e/ou o objeto que estavam sendo representados.
Pablo Picasso - Ma Jolie (1912)

Uma das mais famosas cubices “letradas” é essa tela de nome Ma jolie - Minha Linda! À época tal expressão era o refrão de uma canção popular muito tocada nos muitos cafés concertos de Montmartre que Picasso frequentava. Sim, talvez aqui estejamos diante da primeira união da grande arte com a cultura popular. Veja como o artista, inclusive, sugeriu esse link musical, colocando bem perto das palavras MA JOLIE no centro inferior da tela, uma clave de sol em negrito, mandando um recado para a moça que estava amando.
Acontece que a bela Fernande se envolvera com um artista italiano, dizem que em uma tentativa desesperada de despertar os ciúmes do namorido. É que Picasso, desde 1911 estava de cabeça virada pela Ma Jolie da vida dele. Seu novo amor chamava-se Marcelle, mas foi apelidada de Eva Gouel e – pasme! - era, nada mais nada menos, do que a melhor amiga de Fernande, a companheira de sete anos, que finalmente o deixou em 1912.
Frágil e esguia e esquiva, Eva jamais foi pintada pelo toureiro, aparece fantasmagórica em apenas duas das fotografias dele e sua personalidade permanece um enigma. O romance dos dois coincidiu com o advento do radical e sisudo cubismo analítico, mas também atravessou a fase do irreverente, colorido e divertido cubismo sintético. Apesar de jamais ter retratado sua Eva, incluir essas palavras de amor no seu trabalho, talvez tenha sido o gesto artístico mais abertamente carinhoso que Picasso fez para uma de suas mulheres.
É claro que a tela acima não é um retrato tradicional da mulher do encanto do artista, mas há indícios de Eva na massa triangular central que sussurram a forma da cabeça e do tronco de uma mulher. Da mesma forma, o conjunto de seis linhas verticais no centro inferior da pintura representa as cordas de uma guitarra sendo dedilhadas pela garota.
Picasso usou nessa obra de arte várias maneiras de representação ao mesmo tempo, em uma linguagem que combinou as letras e a clave musical com tintas ainda muito próximas, fronteiriças mesmo da abstração. As pinturas cubistas analíticas arquetípicas são assim como Ma Jolie, virtualmente monocromáticas, com os planos ou facetas pintados em marrons e/ou ocres quentes ou cinzas suaves, o preto fazendo os contornos necessários e o branco realçando as superfícies. Esse esquema de cores em um só tom e/ou em tons desmaiados era ideal porque tornava mais fácil a necessária decodificação das intrincadas imagens de rostos, figuras, instrumentos musicais e/ou naturezas-mortas, abstraídas em várias camadas.
A pintura a óleo de Braque, intitulada O Português, já é bem mais traduzível ao retratar um emigrante lusitano que deve ter sido visto pelo pintor nas docas de Marselha, tocando a sua viola para a malta fazer a festa. Dele percebemos a boina tradicional do lobos do mar do Minho, o perfil, um olho e o grande bigode preto e uma das mãos dedilhando as suas cordas do instrumento. E o resto?
Georges Braque- Le Portugais (1912)

O resto é fado. A geometria cubista aniquilou o pescador ou estivador que, na forma de um triângulo, desaparece na distribuição e no arranjo dos planos da pintura de linhas oblíquas e tons de verde / ocre / cinza. Aqui, Braque realiza a mais completa fusão entre o rigor puro das composições piramidais e a proliferação das tais indicações – letras e números - entre a abstração e a presença humana.
De resto tudo mais foi fraturado: o guitarrista e o cais são apenas tantíssimos pedaços de forma quebrada e o ambiente festivo resumido na palavra BAL. Debaixo dela, no canto superior direito de novo Braque cravou o prego e a corda com os quais pendurava suas criações. Mas note que aqui apesar de superar a singularidade unificada do seu tema, ao quebrar o sujeito e a sua viola em elementos menores, o pintor foi capaz de segurar esse Português emigrante.
Durante o resto do ano de 1911 e os primeiros meses de 1912, o espanhol e o francês se tornaram menos compulsivos nas pinturas que faziam essas descrições de múltiplos pontos de vista ou que colecionavam pontos de vista destruídos - dependendo de como você interpreta o trabalhos do Cubismo Analítico. E o cubismo avançava...
Pablo Picasso - Le poète (1912)

Na tela acima, mais uma vez, foi representado o já conhecido Poeta do espanhol, só que numa versão frente/perfil bem mais definida que anuncia futuras mudanças, começando pela textura utilizada pelo artista para grifar a barba, o cabelo e os bigodes em alto relevo (rsrs) Em seguida, Picasso e Braque, Juan Gris, Jean Metzinger e tantos pintores mais, voltaram-se para um novo tipo de construção pictórica, um novo método de fazer cubices, para mim mais surpreendente e atraente. Mas essa será a próxima conversa...


12 comentários:

  1. Mônica Silva05/09/2018, 08:12

    Eu não consigo ver nada nestas teias de aranha confusas, Moacir. Picasso e Braque devem ter desistido do estilo por falta de comprador kkk

    Até que o português é simpático mas se eu fosse a Ma Jolie não ia gostar de ser reduzida a uma ‘massa triangular'. Os pintores desenhavam as coisas antes ou iam destruindo tudo a mão livre? Acho que falta harmonia nestas obras e falta cor. Gosto de quadros abstratos por causa das cores. Uma pintura vermelha brilhante me afeta de um jeito e uma de um azul legal de outro. A vibe é diferente. Obrigada!

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    1. Moacir Pimentel06/09/2018, 08:19

      Mônica,
      Quanto à pergunta a resposta é sim e não. Fotos, cadernos e biografias provam que eles esboçavam as estruturas dos objetos e figuras, mas não de uma forma bonitinha ou naturalista. Em cima de um riscado minimalista fragmentavam tudo – o tema e o espaço circundante - em pequenas formas geométricas planas, nessas “teias de aranha”, de tons claros e escuros.
      Mas você está certa: em primeiro lugar as tentativas de abstração de Braque e Picasso não foram bem recebidas e/ou vendidas pelos seus marchands e, em segundo, a fase de abstração radical no Cubismo foi sim anêmica e contraditória no propósito. Porque o abstrato, afinal, expressa algo que só existe no pensamento e não na prática do indivíduo. Mas a experimentação cubista de Picasso e Braque nunca foi uma rejeição do mundo material, visível e comum. Foi antes uma investigação da realidade. Eles inventaram uma linguagem abstrata, com regras próprias, para representar a real, um sistema que tentava revelar visualmente o tempo e o movimento no espaço, mas nos play-grounds tradicionais da pintura: o retrato, a paisagem e a natureza morta.
      Last but not least, assino embaixo das suas reflexões cromáticas mas aguarde as belas cores cubistas.
      “Obrigado!” e abração

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  2. Flávia de Barros05/09/2018, 11:17

    Moacir,

    Amo a riqueza de detalhes nos seus artigos. Agora que li sobre o fim da união de Picasso e Fernande, nunca que vou esquecer que a tela Ma Jolie foi um recado carinhoso dele para a nova namorada. Na verdade eu prefiro os retratos mas adorei ver os pregos e as cordas de Braque, o Português e o segundo Poeta de barba, cabelo e bigodes bem penteados. Mas a cereja do bolo foi a Mulher com o Violão porque consegui achar na tela além do rosto, o busto.

    Um abraço para você

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    1. Moacir Pimentel06/09/2018, 08:32

      Flávia,
      Dica: em se tratando de cubices, procure onde as coisas jamais deveriam estar(rsrs) Sei que não é moleza traduzir essas telas mais herméticas e localizar os seus temas porque a luz, a sombra, a volumetria e a perspectiva são iguais a zero. Há muito pouca diferença entre os temas e os espaços ao redor, pintados na mesma superfície plana, com uma mesma gama de cores suaves - preto, cinza, ocre e verde - no mesmo nível, sem primeiro plano ou pano de fundo. Embora rolem tons mais claros e escuros dentro da pintura que às vezes criam uma aparência tridimensional como, por exemplo, quando um tom escuro é usado no lado do que seria um violão, fazendo com que a estranheza pareça sólida. Então...o único jeito de lidar com o Cubismo é deixar a imaginação divagar, escolhendo um detalhe após o outro e deslizando os olhos das pistas sugeridas para as formas fragmentadas e para aquelas levemente tocadas por vida tridimensional. Mas depois que a gente acha o vago contorno de uma figura e/ou objeto cubista, rola um barato qualquer no processamento dos dados e, de repente, se percebe a solidez das coisas que Picasso e Braque viram mas não pintaram: um lugar e uma hora e a coisa e/ou a criatura dão o ar da graça deles e o sentido do trabalho é revelado.
      Quanto à Ma Jolie, trata-se da segunda companheira de Picasso, que foi para o andar de cima, aos trinta anos, em dezembro de 1914. Não se sabe exatamente para qual mal físico a moça perdeu a guerra mas como todas as mulheres importantes da vida dele, a pobre Ma Jolie marcou um período específico na sua arte: a passagem do cubismo analítico para o sintético. Mas essa já é outra conversa.
      Outro abraço para você

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  3. Márcio P. Rocha05/09/2018, 16:36

    Muito bom. Gostei de ler sobre o pintor abstrato Kazimir Malevich, o fundador do Suprematismo. Eu acho que a arte é o que abstraímos da realidade até os limites de nossa capacidade sensorial e recursos tecnológicos, rs. Comparo a arte abstrata à música clássica ou instrumental. Do mesmo jeito que a música sem palavras não deixa de fazer o ouvinte sentir a emoção, a arte abstrata tenta se comunicar sem narrativas. Por isso lamento que Braque e Picasso não tenham saído das regras do Cubismo e se arriscado mais pelo abstracionismo.

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  4. Alexandre Sampaio05/09/2018, 17:40

    Pimentel,

    Mais um post diferenciado mostrando que o Cubismo era um negócio dinâmico. Em 1910 Picasso e Braque quase abraçaram a arte abstrata, em 1911 passaram a pintar retratos quase indecifráveis e em 1912 começaram a colocar nos quadros detalhes quase esclarecedores. Ainda bem que temos você para elucidar quase tudo. Parabéns!

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    1. Moacir Pimentel06/09/2018, 08:42

      Sampaio,
      Estamos QUASE na reta final (rsrs) Mas mesmo depois de terem “cubolizado” tanto, na minha modesta opinião, os rapazes ainda guardam cartas nas mangas. Obrigado e, por favor, continue lendo (rsrs)
      Abração

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  5. Olá Moacir,
    Seu netinho já é um sabichãozinho.
    E por mais que se busque os "temas divididos em componentes geométricos" os bigodes que você viu no Poète ou no Homme avec guitarre só podem ser projeção dos seus. São como o relógio do outro, indetectáveis! No Le Poète tudo bem, os bigodes são mesmo do Picasso.
    É interessante observar nesses trabalhos como Picasso e Braque realmente andaram juntos nas deformas e cores dessa temporada. É um diálogo em que discutiram diferentes questões do mesmo tema.
    As tela ovais foram uma surpresa para mim, mas não sei se pelo inusitado não me agradaram muito. E no Homme de Braque, como em outros trabalhos já vistos em outros posts, sinto falta da fragmentação no fundo, como Picasso comete na Natureza morta com limão e Jolie. Nesse caso a figura central poderia até se misiturar ao fundo, mas eles foram safos e souberam separar direitinho.
    E como conseguiram se segurar para não chegar à abstração...
    O tema é difícil mas se torna cada vez mais interessante a cada post seu e nós, cada vez mais sabidos!
    Até sempre mais, no embalo da sabichonice!

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    1. Moacir Pimentel06/09/2018, 14:16

      Caríssima Donana,
      Dos meus filhos o mais apressadinho me encarou com dez dias de vida. O meu primeiro neto, porém, já estava de olhos arregalados no berçário da maternidade meia hora depois de chegar ao mundo! E olha que tenho a foto da façanha (rsrs) Mas vou tentar responder ao seu ótimo comentário, uma tarefa difícil de cumprir, sem cometer spoilers.
      So sorry, mas não se trata de “sabichionice” mas de observação. Não, eu não projetei os meus veneráveis bigodes brancos nessas telas e, como me ensinaram que as senhoras
      "quando procuram acham", peço-lhe, por favor, para olhar de novo(rsrs) Nas montagens os bigodes mais evidentes e bastos são, é claro, o do Homem com o Cachimbo e o do primeiro dos Poetas, ambos picassianos. O fumante, inclusive, é o dono de um bigode bicolor - metade cinza e metade branco - na forma de meias luas ascendentes.
      Já o caso mais "indefectível" é o do Homem com o Violino, de Braque. Mas note que o "rosto" do músico situa-se ao alto, na parte mais clara da tela. Abaixo de um nariz/obelisco, uma linha reta figura como boca e, à sua direita e ao lado de um cachimbo, está um pequeno parêntese... ) ...ou um provável bigode muuuito abstraído(rsrs) Já no Homem com a Guitarra, Braque colocou um crescente abaixo de um nariz de Pinóquio, só que retangular.Trata-se de uma linha fina, curva e escura que só é perceptível porque a sua ponta esquerda, virada para cima, adentra um plano branco. Nessas “teias de aranha” retilíneas, a dica é focar nas curvas (rsrs)
      Quanto ao relógio do Kahnweiler, ele mora a meio caminho entre os bigodes e as mãos do fantasma. Vamos focar primeiro nas duas linhas curvas e brancas que representam duas correntes de algibeira. Duas? É claro! Uma pertence ao Kahnweiler de perfil, a outra ao marchand de frente para a senhora (rsrs) Abaixo das correntes - um pouco mais para a direita, na verdade - Picasso não apenas sugeriu um objeto redondo mas dois ponteiros marcando ou as três e meia ou as seis e quinze (rsrs)
      Folgo em saber que a senhora continua atenta aos fundos das telas. Só faço uma observação: os trabalhos de Picasso e Braque foram o resultado de conversas quase diárias e, portanto, devem ser confrontados não apenas por datas mas por local de nascimento. Ou seja, o que eles fizeram juntos em Cadaqués difere dos trabalhos feitos nos Pirineus e das telas cometidas em Céret e por aí vai. Porém note como a fragmentação do espaço é a mesma no Homem com o Cachimbo e no do Violino, pintados pelos rapazes no verão de 1911.
      Mas, como sempre, a senhora acertou: quanto mais fragmentados fossem o objeto e o espaço circundante mais abstrata seria a leitura e menos perceptíveis os temas, certo? Então a pergunta é: Picasso abstraiu mais? Não se sabe. De fato, Braque tanto “cubolizou” quanto “abstraiu” um pouco antes mas o problema é que Picasso fazia quatro telas para cada uma que Braque terminava (rsrs) Mas enquanto Picasso ainda fragmentava o pano de fundo da Ma Joie da vida dele, já cravava na tela uma das "certezas " inventadas anteriormente por Braque: a clave de sol. Quem deu meia volta volver, quem facilitou a percepção de figuras e objetos, quem colou, quem texturizou, quem segurou os dois montanhistas para que não pulassem nos braços de Dona Abstração, não foi o toureiro, foi principalmente Braque, com Picasso assinando embaixo. Para eles, naquele momento, o Cubismo era um assunto inacabado.
      "Até sempre mais"

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  6. Francisco Bendl06/09/2018, 12:24

    Não se pode abrir mão da especialidade, do conhecimento.
    Muito menos quanto à sabedoria de se saber transmitir o que se sabe, mediante uma didática própria que cative e verdadeiramente ensine quem esteja disposto a aprender.

    Apesar da minha idade avançada, ainda tenho comigo o desejo de saber mais, de pesquisar, de ser curioso para certos aspectos.
    Ainda mais quando tais ensinamentos colhidos somam aos parcos conhecimentos que tenho, muito mais frutos da experiência do que o intelecto, talento e vocação.

    Dito isso, e por acompanhar as sequências postadas pelo Pimentel desde o início, não acredito que alguém tenha um acervo sobre os mestres da pintura, seus estilos e escolas, conforme o nosso especialista na matéria nos proporcionou!

    Eu, um sujeito que jamais se importaria com a arte da pintura, apesar de achar alguns quadros belíssimos, se não fosse o modo como Pimentel posta seus artigos no Conversas do Mano, eu continuaria distante desse trabalho altamente elogiável que temos à disposição, graças à boa vontade de um amigo nosso, que não guarda para si o que sabe e, muito, mas quer compartilhar conosco seus extraordinários conhecimentos a respeito deste tema interessante como cultura.

    Confesso que não tenho mais o que dizer sobre esta obra magnífica de Pimentel e os enaltecimentos que já lhe fiz ao longo desse tempo.
    Mas não importa.
    Eles precisam ser repetidos porque devemos ao nosso expert muita gratidão pelo que fez até este momento e pelo que ainda vai nos apresentar.

    Um forte abraço, Pimentel.
    Saúde e paz.

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    1. Moacir Pimentel06/09/2018, 14:19

      Caro Bendl,
      “Mas não importa”. Não, não importa. Muito mais importante do que um homem diz são os seus atos. É comparecer, é estar presente, é não se omitir, é estender a mão, é incentivar, é não renegar um companheiro de trincheira, um amigo de estrada e/ou um colega de caixa de comentários, concordando ou discordando respeitosamente dele.
      E de que vale o conhecimento se não é compartilhado? De que vale somar e não dividir com quem, como todos nós aqui, “está disposto a aprender e saber sempre mais”? Bom mesmo é saber que você está aí lendo as cubices dessa tão longa franquia. E grato lhe sou eu, sempre, pelos seus belos e importantes posts e seus comentários constrangedores (rsrs) Outro forte abraço e muita saúde e paz.

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  7. 1)O artigo do Pimentel que fez lembrar: quando comecei a namorar Heloisa, em 1974, às vezes, nós íamos para uma praça ou outro local publico munidos de folhas brancas para desenho e lápis cera.

    2) Até tentei rabiscar uns traços, mas eu era completamente sem jeito na área. Claro, tentei desenhar um Buda, uma flor e o outro não lembro. Fiquei só nas tentativas e os referidos estão guardados nas minhas pastas... arquivos ... quando encontrar, publicá-los-ei no Facebook, então o mundo ficará conhecendo o artista que não fui...

    3) Por isso, aprendo demais com o Moacir e como não sei enveredar por comentários referentes às pinturas postadas, volto-me para a memória.

    4)Abraços desenhísticos...

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