desenho de Norman Rockwell |
Francisco Bendl
Eu sempre
gostei de ir para a escola.
Mesmo tendo
ingressado no Primário aos cinco anos – eu completaria seis somente em setembro
-. nutri pelos estudos um certo gosto.
Fiz os três
primeiros anos do Primário no Colégio Santo Antônio, dos Lassalistas;
O 4º ano e
5º no Colégio São Pedro, dos Maristas.
De Porto Alegre,
rumamos para Brasília, onde fiz o Ginasial no Colégio Dom Bosco, dos padres
salesianos, onde as minhas notas invariavelmente eram 10!
O colégio
era excelente, com campos de futebol, piscina, uma biblioteca maravilhosa, e
isso em plena década de sessenta!
Os
padres-professores eram rígidos, e tínhamos Latim, Francês e Inglês!
Mas, uma das
minhas maiores frustrações que tive no colégio, e no São Pedro, foi quando
participei de um concurso de poesias.
O Irmão
Elói, Regente de Classe, do 4º ano Primário, me chamou e disse que eu decorasse
a famosa poesia de Casimiro de Abreu, Meus Oito Anos, pois eu iria representar
a classe no concurso estipulado pelo colégio.
Eu tinha
facilidade para decorar e, mais ainda, fazer os gestos que enfatizavam a
narração poética.
A voz não
era tão grossa como agora, mas firme, bem postada.
No dia do
concurso estava frio. Vesti o meu melhor e mais bonito pulôver, calça de lã,
sapatos engraxados, meias brancas, cabelos penteados, e fui confiante para o
concurso.
Os
participantes eram em dez, no total.
Fui o sexto
na apresentação. E obtive muitos aplausos, inclusive com muitos dizendo que eu
era o vencedor, o famoso “já ganhou, já
ganhou”!
O resultado
não demorou, após o último competidor apresentar o que lhe havia sido
determinado.
Em contagem
decrescente, o Irmão Diretor anunciava a colocação de cada um:
- Em décimo lugar.... em nono...
Ao anunciar
o terceiro lugar, o meu nome foi pronunciado.
Algumas vaias
modestas surgiram. Eu fiquei meio que decepcionado, mas o júri havia assim
decidido, logo...
O meu prêmio
fora um livro, intitulado Percy Winn, sobre as aventuras de um estudante em
plena escola.
O troféu do
vencedor era muito bonito, que o colega o carregou orgulhoso até o fim da aula,
às 12:20h.
Ao terminar
o concurso e o recreio, voltamos para as salas de aulas.
O Irmão Elói
não entrou conosco, mas não se podia dizer um pio!
Cinco
minutos depois, entra na sala, senta-se à mesa que ficava em um estribo, e diz:
- Chico, o resultado do concurso estava errado. Um dos jurados não
teve a sua nota somada com os outros. A soma verdadeira aponta que foste o
vencedor!
Bah!
Vou levar o
troféu para casa; vou desfilar com ele nas ruas até chegar para o almoço; que
orgulho...
Meus
pensamentos gloriosos foram interrompidos.
O regente,
meio sem graça, explicou que fui o vencedor moral, no entanto, o troféu uma vez
dado ao suposto vencedor, que não era o culpado pelo erro, seguiria com ele!
Até hoje não
sou lá muito adepto de poesia, em consequência.
Elas
significam tristeza, frustração, decepção.
Querem dizer
para mim que as perdas são inevitáveis, e que devemos aceitar da melhor maneira
possível a derrota.
Fiquei meio
amuado por alguns dias.
Fazer o
quê?!
Vim a
receber troféus na minha vida muito tempo depois, já casado e pai de filhos,
quando venci por dois anos seguidos a disputa pelo melhor vendedor do ano.
Não foi tão
fácil como recitar uma poesia, lógico, no entanto, os números jamais deixariam
de dizer a verdade:
Eu era o
vencedor, incontestavelmente, mas era outra situação.
Não mais
poética, mas real, verdadeira, sem rimas e analogias.
Mas, a
poesia que me entristecera, que me impedira de ter o meu primeiro prêmio e
troféu, também prorrogou que eu concluísse o Científico – no caso o Ensino
Médio, pois não mais havia mais esta denominação -, aos SESSENTA ANOS!!!
Meus Oito
Anos não me dariam mesmo o troféu tão desejado.
A saudade da
aurora da minha vida iria se confundir com o acaso da minha existência.
A minha
infância querida fora substituída pela velhice, uma fase que, entre mim e ela,
surgem vários problemas a cada dia!
Os belos
dias que despontaram a minha existência, hoje são sombrios, nublados,
cinzentos.
Fez-se
justiça com a minha derrota, pois eu não saberia, aos 69 anos, dar o devido
valor aos meus oito anos, pois um período como os outros, sem vitórias, sem
troféus, sem reconhecimentos.
A menos que,
viver desta forma, a compensação ou a vitória seja a resistência, a vontade
férrea de vencer, a determinação de manter o casamento, a felicidade obtida com
o nascimento dos filhos e a graça divina poder sustentá-los, educá-los e
formá-los!
Os louros
desta glória invisível, os netos, amados!
Mas bem que
eu gostaria de ter ganho aquela Taça!!!
Prezado Autor Sr. FRANCISCO BENDL,
ResponderExcluirHavia um Rei poderoso que gostava muito de um Pai de Família pobre, pelas Virtudes que esse tinha.
Quando chegava perto do final do mês de Abril, época de Declaração do Imposto de Renda e pagamento com desconto em parcela única, o Rei mandava um dos seus Guardas ir discretamente na casa do pobre Pai de Família e depois de alguma conversa geral, deixasse discretamente escondido debaixo de uma almofada do sofá, um saquinho com moedas de ouro.
O Pai de Família pobre acabava encontrando, fazia sua Declaração de renda e pagava em parcela única, achando que era tudo mérito dele.
Assim também aconteceu com seu Colega de Aula naquele Concurso de Poesia de linda Taça, que ele venceu, achando que era tudo mérito dele, enquanto que o verdadeiro vencedor foi o senhor.
Mas muito mais importante que um Concurso de Poesias de bela Taça é o Concurso da Vida, no qual o senhor tira o Primeiro Lugar por ser um excelente Marido, Pai e Avô, e amanhã depois bis-Avô, com todo Mérito.
É que o senhor aprendeu com o Rabi ABRAHAM TWERSKI, de abençoada Memória, a sempre dizer para a Esposa, apesar de todas as crisezinhas:
1- Obrigado
2-Me desculpe,
3-Te admiro.
Além de escrever muito bem.
Abração.
Mestre Bortolotto,
ExcluirMuito obrigado sempre pelo incentivo que tens me dado às minhas mal traçadas palavras.
Por mais que eu me esforce, a minha limitada capacidade de comunicação e porque sou dotado de poucas luzes, somente a boa vontade dos amigos para tecer um que outro elogio pelas postagens de minha autoria.
Gostei da história relatada, ela tem um grande significado.
Quanto ao disputadíssimo troféu da vida, mestre Botolotto, quem nos outorga são nossas obras e comportamentos, mas o incomparável galardão, o sonho de qualquer homem, é recebê-lo das mãos de seus filhos, e com os netos aplaudindo!
Um forte e fraterno abraço, mestre.
Saúde e paz.
Olá Francisco,dissidente ardoroso,
ResponderExcluir"Não mais poética, mas real, sem rimas, sem analogias." Outras palavra não resumiriam melhor as vitórias adultas. Elas nos negam o sonho de desfilar com o troféus pelas ruas a caminho de casa. Mas são concretas. São batalhadas. E nos dão um sono feliz e gratificante. E perduram. Olha só os netos, amigo dos Pampas.
Mas da sua crônica fica comigo a tristeza imensa desse meninão de oito anos carregando um livro que vai ler com saudade do que não foi.
Com troféu, sem troféu até muito mais.
Dissidente injuriada!
Prezada Aninha,
ExcluirA união dos dissidentes extrapola qualquer balizamento que se queira dar à amizade que os agrega, então a solidariedade, a luta ombro a ombro, o objetivo comum.
Muito obrigado pelo comentário.
Aliás, Aninha, palavras que usaste para comentar o texto são indiscutivelmente troféus que carregamos para sempre em nossas vidas, e sem concursos, apenas e tão somente sinceridade.
E não importa a gravidade do fato, pois mesmo os mais simples unem os dissidentes para enfrentar as dificuldades surgidas tanto ao acaso como consequências.
Talvez eu faça um artigo, se o Mano aceitar a sua postagem, a respeito da dissidência.
As razões pelas quais nos identificamos desta forma, que não significa protesto, reclamação, descontentamento, mas uma rebeldia contra o estabelecido carente de base, de alicerce, de sustentação de fundamento!
E, por óbvio, o troféu maior, que nos é oferecido pela família que originamos, que sustentamos, educamos e formamos!
Outro ponto que somos absolutamente favoráveis, trata-se dos netos.
A meu ver, a coroação indiscutível de um período que sonhávamos embalar crianças advindas das nossas crianças primeiras, seus pais, nossos filhos.
E, por óbvio, a taça especial, disputadíssima, porém poucos conseguem erguê-la, a da AMIZADE!
E, este blog extraordinário, tem sido um gerador de amizades, de coleguismo, de camaradagem, alimentado pelo reconhecimento dos artigos publicados e admiração pelos talentos que se tornaram conhecidos, indiscutivelmente.
Um grande e forte abraço, Aninha, respeitoso, como não poderia deixar de ser.
Saúde e paz, extensivo aos teus amados.
Bendl,
ResponderExcluirO seu post nos esclarece, na prática, aquela "poesia" que jura de pés juntos que , às vezes, se ganha perdendo e vice versa (rsrs) O fato é que desde a mais tenra idade nos ensinam a cultuar e premiar o mérito - os melhores nos esportes, na literatura, no cinema, nas ciências etc- com títulos, troféus, medalhas e flashes. Portanto foi muita falta de sensibilidade desses seus professores não imaginar o quanto era importante para o seu moleque ser campeão e ter na estante a taça que mereceu de fato e de direito mas não levou. É inquestionável e lamentável que certos “educadores” às vezes sejam perfeitos idiotas, no sentido mais grego da palavra: "aquele que não sai de si".
O mais grave é que o Irmão Elói também não tinha noção do quanto é difícil o aprendizado do ganhar/perder. Note que na corrida olímpica de 100 metros a diferença entre o primeiro e o último lugar é de apenas centésimos de segundo. Ou seja, há que ter regras determinadas para a competição, a pontuação e a premiação e elas não podem ser desrespeitadas.
Ao varrer a mancada da sábia comissão julgadora docente para debaixo do tapete, ao esclarecer os fatos na surdina para a sua turma apenas e não diante da audiência do concurso – todo o primário - e ao não tomar as providências para que o ganhador realmente ganhasse e o perdedor realmente perdesse, os senhores deseducadores perderam uma grande oportunidade para explicar aos alunos o que é “competir”, de motivar a galerinha a participar do jogo da vida de maneira justa e honesta, conforme as regras e entendendo que ganhar é muito bom, obrigado, mas perder não tira pedaço, que ganhar não é tudo mas saber querer pode ser quase todo o caminho andado e que às vezes não há vencedor e a gente só tem que seguir adiante dando duro na direção do que quer alcançar.
Por fim, na reta de chegada deusnoslivre! de contar taças em vez de afetos. Como cantam os Titãs:
“Devia ter amado mais/ Ter chorado mais/ Devia ter arriscado mais/ E até errado mais/ Ter feito o que eu queria fazer”.
Foi isso o que você fez e, portanto, meus parabéns e um grande abraço.
Caro Pimentel,
ResponderExcluirLevei comigo esta mágoa durante um bom tempo, confesso.
Afinal de contas, a prova de que eu vencera o concurso seria o troféu, no entanto, sem ele, quem acreditaria que eu fora o vencedor?
Também, naquela época as relações entre alunos e professores, ainda mais quando os mestres eram Irmãos maristas, o que diziam era lei, sem contestação ou reclamação.
A partir daquele momento que, "ganhei e não levei", mesmo eu ainda sendo um piá, aprendi uma duração lição de vida, que nem sempre os campeões são reconhecidos!
Que não devemos lutar para vencer, mas fazermos o máximo que puder para se viver melhor, de modo que ao nos olharmos no espelho fazendo a barba, a conclusão é uma só:
Não recebi a taça, mas sei que venci!
Por outro lado, esta experiência dolorosa foi muito útil, pois amadureceu um guri da maneira melhor possível, na base da frustração, da decepção, e que nem sempre a vida é justa!
Não sei te dizer o sentimento de quem não venceu e levou o troféu, mas admito que teria sido muito pior depois que recebesse a honraria, tirassem dele a taça porque havia um erro de avaliação.
Muito obrigado pelo comentário.
Um grande abraço.
Saúde e paz.
1) Belo texto Bendl, parabéns pela inspiração poética.
ResponderExcluir2) Penso que vc deve investir novamente nessa área. É só ficar receptivo e quando menos espera a Musa Inspiradora lhe traz uma poesia.
3) Abraços de bom final de semana, para vc e os seus.
Meu amigo e professor Rocha,
ResponderExcluirJamais dediquei um minuto que fosse para compor uma poesia, jamais!
Apesar de eu reconhecer que - sem falsa modéstia -, conheço um pouco do nosso idioma, a rima nunca foi o meu forte ou eu ter a sensibilidade de me exprimir em tom poético.
Aliás, tenho para mim que os poetas são mesmo seres do outro mundo.
Observa, Rocha, por favor:
As pessoas que não são felizes, que sentem fugirem uma a uma as aspirações da vida, nada tão salutar para este espírito enfraquecido que perder-se nas miragens do sonho procurando esquecer as torturas da realidade.
Para deletarmos tais tormentos, tentamos viver como os poetas, que dão importância a detalhes que em nada nos afetariam ou que merecessem alguma manifestação de nossa parte.
O cantar, o sorrir, o chorar ... enfim, de perceberem através dos olhos dos outros esta tortura imensa, indescritível, que é estarmos longe da pessoa amada ou do local que tão boas recordações nos trás à mente!
E, ousam dizer, os poetas, que a saudade quando nos bate forte no peito é porque queremos lembrar aquilo que devemos esquecer!!!
Um forte abraço.
Meu primeiro comentário extraviou ...
ResponderExcluirA injustiça doi e imagino sua tristeza quando criança
A vida vai nos ensinando a lidar com coisas boas e ruins e acho que é um ótimo aprendizado se soubermos entender
Afinal nem tudo são flores
Ótima reflexão que vc nos presenteou
Um abraço afetuoso