ilustração - Quino |
Ana Nunes
Sob o olhar alheio,
Velho é ridículo.
Quanto mais à vontade, mais ridículo
Quanto mais fala, pior parece.
Se antigo, é indesejado
Se prá frente, evitado.
Se corre para pegar o ônibus, desajeitado.
Capenga, dolorido, coitado.
E se o perde, atrasado.
Se fala de filmes, vagabundo, aposentado,
Se fala de dores, insuportável, abandonado.
Se se veste sóbrio, tadinho, quadrado,
Se se veste jovem, não se vê, descolado.
Se gosta das crianças, um tarado,
Se gosta dos jovens, safado.
Se fica na sua, infeliz, mofado.
Se pinta o cabelo parece bruxa,
Se o deixa branco parece velho.
Se correto e educado, ultrapassado,
Se boca suja, inconveniente, desbocado.
Se dirige, irresponsável,
Se não dirige, um encostado.
Se tem dinheiro é procurado,
Se é pobre, um fracassado.
Se esquece nomes, demente, senilizado,
Se lembra tudo, um fofoqueiro danado.
Se trabalha é criticado,
Se aposentado, preguiçoso, acomodado.
Se bebe, um alcoólatra a ser tratado,
Se não bebe, poucochato desmamado.
Se come muito tem gases,
Se come pouco, enfezado.
Se magrinho, doente desenganado,
Se gorducho, comilão desequilibrado.
Se tem os dentes, mau hálito,
Se não os tem, só cremes e ensopados.
Artrose, arritmia, depressão,
Colesterol alto, AVC, infartado.
Se feliz risonho, bobo alegre,
Se carrancudo, rabugento mal humorado.
E na rua tem que ouvir em desespero,
Que velhinho bonitinho, bem tratado!
Deuses, Buda, todos os Santos,
Benzedeira, Pai de Santo, saravá
O que será de nós pobres coitados?
Texto hilário, divertido, bem feito, ao mesmo tempo que escancara a realidade do idoso que, de certa forma, não deixa de ser cruel e indigna.
ResponderExcluirE a Ana não exagerou nas suas comparações e sintomas da velhice, não, pois nesta idade somos mesmo descartáveis, inoportunos, incomodamos os filhos e noras, que desejam se ver livres de nós o quanto antes.
Diferente do nascimento que representa a alegria, a felicidade, o futuro, a esperança, o velho demonstra como poderá ser o nosso ocaso, a nossa vida ao seu final, e o quanto vamos precisar de ajuda e compreensão.
Tem sido comum os velhos serem abandonados em hospitais;
Deixados em asilos, e nunca receberem visitas de algum familiar;
Há casos de abandono de idosos que ficam perambulando pelas ruas e dormindo embaixo de pontes, elevadas, viadutos, junto com outras pessoas.
No RS, dois episódios chamaram à atenção do povo gaúcho:
O “filho” que matou a mãe para ficar com o seguro de vida, de R$ 400,000,00;
O “filho” que despejou a mãe do apartamento porque o tinha vendido!
Certamente a expressão do idoso com seu rosto enrugado, pele seca, a papada, os braços finos, o caminhar titubeante, a sua tosse permanente, parcialmente surdo e cego, tendo dificuldades para entender o que se passa ao seu redor, o odor característico, sejam componentes que para algumas pessoas ocasionam asco, um certo nojo, tanto no olhar quanto no tocar.
E não existe uma forma de mudar os mais novos com relação aos velhos, que sejam mais solidários e compreensivos, pelo contrário, no mundo atual o velho atrapalha, perturba, impede a liberdade dos filhos, precisa de atenção, que poderia estar sendo usada para outros objetivos, empreendimentos, projetos.
(Continuo)
Quando fui taxista em Porto Alegre, e por vários anos, fui testemunha de casos absurdos desses abandonos e maus tratos com os idosos.
ResponderExcluirA mulher, por exemplo, idosa, gorda, pesadona, de movimentos limitados, e que não tinha ninguém para ajudá-la no banho ou após ter usado o vaso sanitário, limpava-se com talco!
Todas, indistintamente, que transportei e eu sabia que moravam sozinhas ou recebiam visitas esporadicamente, exalavam o mesmo cheiro quando entravam no carro.
O homem fedia, de eu não poder andar meio metro com o vidro fechado no mais rigoroso inverno ou chuva torrencial!
Comigo nunca aconteceu, e agradeço a Deus por isso, mas colegas que buscavam pacientes em casa para levá-los aos hospitais ou clínicas, os casos de idosos que evacuavam e se urinavam no carro era até comum!!!
Não preciso dizer de como ficava brabo este motorista, claro que não.
Apenas informo que, dependendo do quanto foi expelido pela pessoa, o banco traseiro e tapetes precisavam ser trocados, pois não bastava lavá-los porque o mau cheiro não saía!!!
Tive vários colegas que não mais atendiam hospitais e idosos, diante do que poderiam fazer no carro.
E quando o idoso tomava remédio no hospital ou clínica ou pronto-socorro, e inventava de vomitar no táxi!!??
E lançava aquela golfada que chegava até o banco da frente??!!
Imagina, Aninha, o quanto os velhos vão angariando de “simpatia” com esses episódios que não podem controlar, mas que prejudicam os outros??!!
Havia casos, de a filha ou o filho, embarcarem com o pai ou a mãe, pedirem para o táxi os levar longe de onde os tinha apanhado, pedir para o motorista que esperasse um pouco que ele já retornaria, deixando o idoso no carro como sinal de “garantia”, e NÃO MAIS VOLTAVA!!!
O motorista perdia o valor da corrida, e tinha de ainda prestar depoimento na polícia!
Agora, convenhamos, envelhecer como estamos avançando na idade com este espírito, movimentos, raciocínio, a gente ainda fazendo a higiene pessoal sem ajuda, assim como o banho diário, trocando a própria roupa e, de forma divertida, imaginando como poderemos chegar aos 80/90, se for possível, somos uns velhos muito bons para ser companhia de quem quer que seja, haja vista a utilidade que ainda temos e podemos oferecer.
Agora, os coitados que estão na cama, que não caminham, que precisam ser limpos no leito, comida na boca, remédios constantes, e que não podem pagar um asilo que tenha esse tipo de serviço, o fim é melancólico, deprimente, altamente sofrido e injusto, a meu ver.
Enfim, Aninha, temos muito mais para agradecer do que pedir, e tomara que cheguemos ao fim nessas condições, que desfrutamos aos setenta!
Um forte e fraterno abraço, Aninha.
Saúde e paz, extensivo aos teus amados.
Olá Francisco dos Pampas!
ExcluirMuita chuva por aí? Aqui estamos nadando de braçada! E com tragédias ao redor.
Fiquei com medo de por este texto porque além de não ser muito bom, o sr. Editor disse que muitos poderiam não entender a ironia. Mas como foi uma emergência, coloquei assim mesmo.
Até aqui tudo bem.
Comentário divertido do Moacir e o seu, sério, me despertando para realidades taxistas não imaginadas. A gente brinca com o real para ele ficar mais leve.
Quantas vezes, quando alguém queixa muito, eu falo o mesmo que você citou tipo, tudo bem porque ainda tomamos banho sozinhos, lavamos nós mesmos nossas próprias bundas, e escolhemos nossas roupas.
E o melhor de tudo, entre umas esquecidas e uns foras inevitáveis, ainda saber pensar!
Mas que tenho medo do que me espera, isso lá tenho de montão.
Obrigada pelo comentário tão triste e tão bom!
Conto sempre com você.
Até mais.
Caríssima Donana,
ResponderExcluirTaí: eu não sabia que sou "um fofoqueiro danado" (rsrs) Confesso que da primeira vez que fui chamado de "tio" por uma bela desconhecida a depressão resultante durou uma semana. Mas pior foi constatar que, de repente, não podia mais me recuperar de uma ressaca como costumava fazer. Tudo bem! Admito que meus dias ficaram mais curtos, minhas memórias mais longas e que o meu reflexo no espelho assusta: é muito cabelo branco! Tem jeito? Não!! Da última vez que as mulheres da tribo tentaram fazer-me “mechas” caseiras fiquei parecendo um dálmata! (rsrs) Nunca mais!
Então o remédio é tentar rir das nossas mazelas, pois uma boa risada além de ser uma delícia, libera as tais das endorfinas e promove as rugas certas. Correr alguns quilômetros nos calçadões da vida ajuda. Dizem que o exercício melhora a função cognitiva. O certo é que, pelo menos as bundinhas correndo à minha frente, me parecem mais bonitas do que as de antigamente (rsrs)
Uma coisa é rir com os amigos, no boteco e no bar virtual , sobre as pegadinhas e truques diabólicos que o envelhecimento nos causa – como esquecer de levantar o zíper! (rsrs) Outra coisa é, constantemente, lamentar para qualquer um, ao alcance da voz, sobre estar ficando velho. Nada a ver! Depois de muitos quilômetros rodados no idadômetro, o ritmo da vida apenas se suavizou, se transformou numa rotina que não precisa ser chata nem perder a popularidade... apesar das manutenções constantes. Talvez a receita seja criar, na “terceira idade”, novos passeios, novas leituras, novas comidas, novas artes, novos hábitos, novos posts, novos aprendizados. E, muito principalmente, seguir leve, sem mágoas e/ou arrependimentos, procurando e encontrando a maravilha das coisas pequenas cotidianas, calmamente, prestando atenção, degustando e nos repetindo como um mantra: que viagem!
"Até sempre mais"
Olá Moacir,
ResponderExcluirFiz um comentário e não sei o que fiz mais que perdi tudo.
Let's do it again.
Presta atenção que você ainda está na categoria velhinhos em formação.
Mas se se reconhece um fofoqueiro danado, penso que também é um pouco safadinho! Sabe, essas coisas de bundinhas... Mas não posso falar muito porque também aprecio uns panoramas. Não bundinhas, que nunca me atraíram, mas pernas, pés e mãos. E um peito largo para se deitar. Ah! E quando nado, pode crer, gosto de olhar axilas. Ainda vou fazer um trabalho para chamar de Sovacos Cabeludos! Igual ao Sovaco de Cristo, de vocês cariocas.
Quanto aos cabelo brancos...conferem um certo charme.
Mas a sua tribo fez alguma coisa errada na fazeção do dálmata. Conheço homens que fazem a tal das"trevas", contrário das luzes, e ficam muito bem. Você sempre pode tentar de novo numa casa mais especializada. (Difícil vai ser fazer mechas no bigode!rsrsrs)
E assim entre uma bundinha e um sovaco vamos andando, criando muitos novos (novas artes, novas comidas e leituras, posts e comentários ) para contrabalançar os muitos velhos.
E rir dos esquecimentos ocasionais e possíveis foras. E ainda curtir a"viagem", que é boa! Viver é uma festa, certo?
Até sempre mais.
Ana
ResponderExcluiro envelhecer não é fácil, só os fortes sobrevivem e mesmo assim estropiados
Vc sabe fazer do limão uma limonada
Francisco completou seu texto com observações pertinentes aos velhos
A velhinha aqui agradece o humor negro
Olá PrimaLéa,
ExcluirÉ verdade, aqui os comentários sempre completam os textos. Com suas diferentes leituras e diferentes interpretações. E põe aí, idade, formação, tudo!
De velhinha para velhinha, agradeço muito.
Beijo. ( respondi ontem mas perdi o comentário. Acontece!,)
A Autora, excelente Escritora Sra. ANA NUNES, faz harmonia com as Palavras, faz "o que quer com as Palavras" em qualquer assunto que for. Até mesmo nesse, sobre a Velhice.
ResponderExcluir"Se tem Dinheiro, é procurado". Não há dúvida que é bom ser procurado, bem melhor do que ser abandonado. Então : Nunca é tarde para Acumularmos.
Saudações.
Olá Flávio Bortolotto,
ResponderExcluirObrigada pelas gentilezas, seu cartão de visita.
Uma coisa me preocupou no seu comentário: e se não dá mais tempo? (rsrs)
Até mais.
1) Parabéns Ana, bela reflexão sobre importante idade da vida, as outras também são.
ResponderExcluir2)Aprendi com a Filosofia Budista que idade é sabedoria. Há muito o que aprender, muito o que vivenciar, muito o que contar. Aprendemos com as alegrias e tristezas.
3)Bom fim de semana para vc e os seus !
Olá Antonio budista,
ExcluirHá tempos um médico homeopata me disse que até na morte estamos aprendendo,porque uma experiência até então não tida.
Por outro lado Garcia Marques disse que a experiência vem quando a gente não precisa mais. Excludentes ou complementares?
Fazer o que? Talvez ir se chocoalhando entre dizeres outros que não os nossos no gasto dessa idade importante como você disse. Ouvindo, esquecendo, ouvindo de novo e vivendo.
Bom fim de semana para vocês também.
Até mais.
Ana,
ResponderExcluirQue velhos que somos, se mal deu tempo de ver o tempo passar, se nem entendemos o que foi ser jovem? O que são as dores de corpo diante das lembranças dos prazeres de corpo provocados e vividos?
Enquanto os sinais de prazeres e desprazeres se misturam, como a tinta que tenta pintar o cabelo, como a briga da dieta com a vontade de comer, capengas, doloridos, coitados de todos os tratados e regras. Porque enquanto houver vida só nos resta viver. Eu sei, nada será como antes, mas ninguém sabia antes como seria o depois.
Portanto, se outro cabeludo aparecer na sua rua, eu ainda moro nessa mesma rua. Você ainda quer morar comigo? Sofro calado, a voz é um instrumento que eu não posso controlar. É só poesia, eu só preciso ter tudo aquilo por mais um dia e a terra continua azul da cor do seu vestido. Se eu morrer não chore não, é só a lua. E alguém vai lembrar de olhar. Até sempre.
Olá Heraldo,
ExcluirBom mesmo é se mostrar do avesso num texto não muito acreditado por mim mesma e receber, já de manhã, uma poesia dessas. É de se ganhar o dia cinza chuvoso!
"Que velho que somos se mal deu tempo de ver o tempo passar...ou Nada será como antes, mas ninguém sabia antes como seria o depois."
Estou carimbada com suas palavras. Pelo dia todo e todo o que vem depois.
Até sempre.
Vamos continuar velhas alegres.
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