Primeiro logotipo do Fantástico (imagem Globo) |
Francisco Bendl
Não sei por
que cargas d’água, o domingo sempre foi pra mim uma espécie de antessala de
expectativas boas ou ruins quanto à semana que dava início à época que fui
vendedor-viajante, que lá se vai quase meio século!
Um dia
nostálgico, cujas horas sempre foram aquelas que mais passavam rápido em
comparação aos demais. Quando eu me dava conta, entrava em cena a música do
Fantástico, anunciando que a segunda-feira batia à porta.
Para mim, o
domingo significou por anos a fio viajar à noite, fosse de carro ou de ônibus,
trem ou avião, haja vista que eu deveria estar no “campo” pela manhã cedo, pois
a minha região era distante de onde eu morava.
Mais seis
dias e meio sem estar ao lado da esposa, e depois dos filhos porque a empresa
exigia que trabalhássemos aos sábados.
A forma
inteligente que constatava se de fato estávamos onde deveríamos era mencionada
no recibo dado pelo Correios quando entregávamos o malote da semana, e
colocávamos dentro do envelope de pedidos, relatórios, cobranças e ocorrências,
o comprovante referente ao Sedex enviado no sábado à empresa.
Depois do
meio dia, quem quisesse, poderia então ir para sua casa.
E eu dava no
pé!
Havia duas
opções:
Ou o trem,
aquele famoso das paqueras ou o ônibus, este mais rápido, porém sem nenhuma
graça.
E estou me
reportando a mais de seiscentos quilômetros longe de casa, onde o tempo que se
levava de ônibus era de dez horas e, o trem, em torno de doze até Porto Alegre!
Portanto, o
domingo era sagrado durante o dia, pois eu queria ficar com a esposa o máximo
de tempo possível e, ao nascerem os filhos, eu queria desfrutar da companhia
dos guris, que vieram em escada:
A cada dois
anos aumentávamos a população do planeta.
Quando veio
o terceiro, e era também guri, três, ao todo, a minha mulher decidiu fazer a
laqueadura, pelo fato de eu ser viajante e ao voltar para casa eu dava
sequência à lua de mel interrompida, na sequência natural que deveria ter, pelo
menos, quinze dias.
Ora, eu
casei ainda no quartel.
Me deram
três dias e me mandaram lamber sabão!!!
Logo, a lua
de mel dos sonhos jamais se concretizou de uma vez, mas em etapas ou doses
homeopáticas.
Eu chegava
em casa já beijando a porta e abraçando a mesa, se é que vocês estão me
entendendo o sentido figurado, lógico!
Desta forma,
o domingo era um dia especial, que me tomava o tempo possível para aproveitá-lo
porque à noite eu retornava para a cidade do roteiro, que fora entregue à
chefia na reunião do mês (lembro que sequer sonhávamos com a palavra celular ou
computador)!
A minha
segunda-feira, durante anos, se tornou muito cansativa, em razão de viajar à
noite toda. Se, de ônibus, eu não pregava o olho, controlando o motorista e
aquele que o revezava, de trem era a chance de viajar com os colegas do dia
anterior, e caso eu não os encontrasse, pedi inúmeras vezes para viajar com o
condutor, a ponto que eu saberia manejar o trem sem problemas, pois não tem
direção.
Acelera e
freia, e o trem faz a curva pela inclinação dos trilhos, então o conhecimento
da linha férrea para saber a velocidade máxima em que se pode conduzir o
comboio, conforme assim o denomina um amigo lusitano.
Segunda pela
manhã, e eu arrastava os pés. Não via a hora do almoço para dormir, mesmo
enforcando a boia.
Mas,
voltando ao domingo, sempre foi o dia do futebol também, e naquela época não
havia transmissão ao vivo, muito menos a TV era em cores.
Eu tinha
comigo uma TV Philco, na cor verde, de 17”, e uma antena interna fixa na caixa
do aparelho que, mediante informações “científicas”, a imagem melhorava ou
diminuía os fantasmas com Bombril, na dita antena.
Igualmente
as garrafas plásticas de refrigerante na caixa de luz, em face de que o
material “diminuía” o consumo de energia elétrica!
Sim, éramos
mesmo ingênuos ou muito imbecis!
Mas, para a
esposa, um gênio, diante da “criatividade” apresentada
(muito tempo depois, a Marli me confessa que ria da minha cara quando eu vinha
com essas novidades, sabendo de antemão que jamais dariam certo).
E, como todo
o bom domingo que se preza, o indefectível churrasco, que ultrapassou a condi.cão
de tradição para ser obrigação.
A Marli
caprichava na maionese, saladas de tomate e cebola, o pudim como sobremesa, e
eu assava a carne, salsichão e galeto.
Uma festa!
E as horas
voavam. Uma hora e parecia que se tinham passado duas ou três.
A noite se
aproximava, na razão inversa que eu me afastava da esposa e da minha casa.
Hoje,
domingo, 23 de setembro, um belo dia ensolarado, a Marli ao meu lado, tivemos
uma estrondosa vitória sobre o tempo, penso com os meus botões.
Conforme o
nosso gosto ou disposição, todos os dias da semana ou são domingo ou qualquer
outro dia, condição oferecida pela aposentadoria e concessão dada pelo tempo
aos idosos.
Entretanto,
o tempo além de ser implacável é também irônico, pois não se deixaria derrotar
tão facilmente.
Agora que eu
tenho os dias à minha disposição, sempre em casa, junto à mulher da minha vida,
o meu trabalho é procurar o frenesi perdido, a volúpia que se escondeu, o
desejo que fugiu!
O domingo
ficou muito quieto, sem agitação e respiração ofegante, calmo demais.
Até a música
do Fantástico, que está tocando na TV nesse momento não me deixa mais
nostálgico como antes, quando eu tinha de me ausentar.
Hoje, a
canção anunciando o início ou fim do programa dominical e remodelada várias
vezes, indica que está na hora de dormir, de tomar o chazinho da noite, ir
deitar e... até amanhã!
1) Salve Chicão, parabéns pela crônica.
ResponderExcluir2)Lembrei de uma brincadeira, acho que é do folclore:
"Hoje é domingo
Pé de cachimbo
O cachimbo é de ouro
Bate no touro
O touro é valente
Bate na gente
A gente é fraco
Cai no buraco
O buraco é fundo
Acabou-se o mundo !"
3)Abraços de bom domingo e boa semana.
Rocha,
ExcluirObrigado pelo comentário.
Casualmente, quando eu era um guri, na década de cinquenta, havia um programa infantil aos domingos à tarde, que não me lembro o nome, na Rádio Guaíba, cuja música era a seguinte(lembro que o RS ainda não tinha TV):
A Velha a Fiar
Estava a velha em seu lugar
Veio a mosca lhe fazer mal
A mosca na velha e a velha a fiar
Estava a mosca em seu lugar
Veio a aranha lhe fazer mal
A aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava a aranha em seu lugar
Veio o rato lhe fazer mal
O rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o rato em seu lugar
Veio o gato lhe fazer mal
O gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o gato em seu lugar
Veio o cachorro lhe fazer mal
O cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o cachorro em seu lugar
Veio o pau lhe fazer mal
O pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o pau em seu lugar
Veio o fogo lhe fazer mal
O fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o fogo em seu lugar
Veio a água lhe fazer mal
A água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava a água em seu lugar
Veio o boi lhe fazer mal
O boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o boi em seu lugar
Veio o homem lhe fazer mal
O homem no boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava o homem em seu lugar
Veio a mulher lhe fazer mal
A mulher no homem, o homem no boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar
Estava a mulher em seu lugar
Veio a morte lhe fazer mal
A morte na mulher, a mulher no homem, o homem no boi, o boi na água, a água no fogo, o fogo no pau, o pau no cachorro, o cachorro no gato, o gato no rato, o rato na aranha, a aranha na mosca, a mosca na velha e a velha a fiar.
https://www.youtube.com/watch?v=SyzoqdvfS24
Abraço.
Saúde e paz.
Olá amigo dissidente (acho que sou mais dissidente que você, ando "dissidindo" de tudo e todos, rsrs),
ResponderExcluirSeu post domingo deixei para comentar no domingo por causas de coerência.
Tudo muito autêntico, sua descrição universal desse dia único que, por isso mesmo, nos traz, antes e ainda agora, melancolia no começo do fim. Mesmo quando os "dias todos são domingos ou outro dia qualquer". Se nos domingos de agora se procura o frenesi de antes, essa procura agora se faz cheia de ternura e complacência, "nunca antes na história, etc, etc"...
Quanto à sabedoria das mulheres-mães é mais por desconfiança e descrédito. Podes crer. Vocês homens-maridos-pais são mais ingênuos e por mais que passe o tempo continuam a acreditar em esponjas de bombril e economia em garrafas pet.
Bom domingo "para você e seus amados".
Até mais (o que vem depois do domingo?).
Prezada Aninha,
ExcluirObrigado pelo comentário, invariavelmente sempre és muito gentil comigo.
Olha, deixei com o Mano uma crônica intitulada A Rotina, que seria a sequência do domingo, evidentemente nos tempos atuais.
Não mais aquele que eu tinha de viajar, mas, agora, de estar sempre em casa e na companhia da minha esposa, de quem eu tive muita falta quando vendedor-viajante.
Concordo contigo que somos mesmo mais ingênuos. O homem se deixa levar facilmente pela sabedoria feminina, a começar que vocês permitem que imaginemos mandar quando, na verdade, cumprimos com os seus desejos.
Agora, indiscutivelmente é uma das formas da longevidade do matrimônio, que precisa de ilusão, de um sonho ainda não concretizado, de acabamento em certas áreas.
Tais objetivos levam o casal unido sempre à frente, às conquistas, aos ganhos familiares (não pecuniários, mas sentimentais).
Ter sempre algo para realizar impede a rotina, aquela mesma sequência de dias sem alegrias, ânimo, vontade, que se arrastam e não terminam.
Até mesmo a presença de um ou do outro incomoda, perturba, a ponto que não conseguem mais estar juntos, pois o desentendimento se torna constante.
E, cabe ao homem, a tarefa principal de escaparem - ele e ela - dessa mesmice, desses dias insuportáveis.
Logo, faz-se mister que a criatividade esteja sempre viva, em estado latente, pronta para ser utilizada quando em momentos adequados ou de crise entre marido e mulher.
Vou mais além, Aninha:
Mesmo que a rotina seja paradoxalmente a fuga do inalcançável, da diversão absoluta, da inquietação, do casal que não para em casa, que não sossega, necessitando ambos da tranquilidade do lar, da paz dentro de casa, de estarem à vontade um ao lado do outro conforme querem e precisam!
Um forte e fraterno abraço.
Saúde e paz, extensivo aos teus amados.
Bendl,
ResponderExcluirEntendo que há um tempo certo para tudo. Na minha praia, por exemplo, o domingo é tão agitado que quando finalmente o abençoado silêncio da segunda feira se instala de novo em nosso viver.... é uma maravilha!(rsrs) Em Tocando em Frente o Sater filosofa melhor do que eu sou capaz:
(...)
Penso que cumprir a vida seja simplesmente
Compreender a marcha e ir tocando em frente,
Como um velho boiadeiro levando a boiada
Eu vou tocando os dias pela longa estrada eu vou,
Estrada eu sou.
Ando devagar, porque já tive pressa
E levo esse sorriso, porque já chorei demais,
Cada um de nós compõe a sua história,
Cada ser em si carrega o dom de ser capaz,
de ser feliz.”
(...)
https://www.youtube.com/watch?v=TIfVNCkckH4
Uma boa semana e um abraço
Pimentel,
ExcluirPosso dizer que o meu domingo, agora, se assemelha ao teu, em razão das visitas dos meus filhos, esposas e netos.
Na crônica, eu me reportava à época que eu viajava constantemente, enquanto hoje permaneço em casa todo o santo dia.
A consequência dessa minha presença em casa exige alguns contorcionismos de minha parte, haja vista eu não poder ocasionar na Marli que ela fique enfadonha quanto à minha permanência, quanto à minha pessoa, quanto aos meus modos e costumes.
Imagina só, eu nesta idade, mais prá lá do que prá cá, e ela inventa de dar no pé??!!
- Chico, não te aguento mais!
Pois eu quero que os meus domingos de hoje sejam como os do passado, mas não consigo por conta da idade, peso, reações adormecidas ... entendeste?!
De certa maneira, preciso e devo compensar a abrupta queda dos arroubos de antanho, quando os domingos eram arrebatadores, apaixonados, memoráveis!
Ainda bem que as presenças dos netos neste dia nos deixam tão cansados que, ao irem embora no início da noite, a música do Fantástico se torna uma canção de ninar para esses dois velhos!
Um forte abraço.
Saúde e paz, extensivo aos teus amados.