Moacir Pimentel |
Moacir Pimentel
Dizem que por trás de seus arcos Paris é
uma cidade arrogante e autoritária. Ela certamente se vende muito bem mas,
convenhamos, tem do que se gabar: já foi o centro do poder, da civilização e
das artes, inclusive – segundo os franceses! – daquelas da mesa e do amor.
Além do mais até parece que Paris é imune
à destruição pois Dona História sugere que a capital francesa foi uma das
cidades mais afortunadas de todos os tempos. Sim, tendo sido ocupada por longos anos
pelos ingleses durante o século XV, tendo servido de pano de fundo para o
massacre de São Bartolomeu de 1572, tendo atravessado a Revolução de 1789 e o
terror guilhotinesco que se seguiu, tendo sido entregue aos prussianos em 1871,
a cidade terminou chegando sem mossas às mãos dos alemães em 1940. Tem mais. Em
1944 quando as tropas aliadas se aproximaram de Paris, Adolf Hitler ordenou a sua destruição mas o governador militar alemão de plantão, o general
Dietrich von Choltitz, simplesmente ignorou as ordens e entregou Paris, com
alguns hematomas e escoriações apenas, aos aliados.
O certo é que durante séculos os seus
visitantes de primeira viagem têm permitido - como nós permitimos por muitos
anos – que Paris lhes dite o que fazer e os mande ir ali e acolá. E lá se vão
multidões de turistas, em romaria, pelos famosos cartões postais da cidade,
admirando os grandes boulevards, a Avenida Champs Élysées, o Arco do Triunfo,
os Invalides, as Galerias Lafayette e o Panteão.
Onde – graçasadeus! – já se percebem
alguns sinais de rebelião por parte dos visitantes, que muitas vezes estão
menos interessados em vagar pela cripta sombria do que em acompanhar o lento e
imponente balanço do Pêndulo de Foucault. E então é a vez da Torre Eiffel, do
passeio de Bateau Mouche pelo Rio Sena, da Notre Dame e do Louvre e, é claro,
vendido como passeio opcional, de Versailles!
Foram necessários alguns anos para deletar
das nossas cabeças aquilo que Paris queria que admirássemos, para começar a
curtir o que realmente preferimos na cidade. E o que encanta nela não são
monumentos imponentes, mas edifícios individuais que contam uma história mais
calma, o estúdio de um artista ou uma casa da Belle Époque construída por um
magnata esquecido para uma amante inesquecível.
O que importa são as arcadas- como a que
inaugura o post, os “quais”, os cafés, as pontes sobre o rio, os telhados e
mansardas, as passagens, as belas portas de tantas casas no 7º distrito e os
museus de que ninguém ouviu falar. Em vez dos Jardins dos Champs Élysées, o
Parc Monceau – e os de Monet lá na vizinha Giverny! - em vez da Praça da
Concórdia uma pracinha ignota e empoeirada qualquer com uma fonte Wallace
inoperante e a estátua de algum obscuro personagem do século XVIII tornada bela
pela pátina do tempo.
O que seduz são as sabedoria e eficiência com
que Paris impediu que os prédios no seu centro crescessem e as diferenças entre
as tantas aldeias da cidade. O apelo de Paris é a surpresa ao se dobrar uma
esquina, o inesperado ao se cruzar o limiar de um arco e a beleza pungente de
seus cemitérios!
Nenhuma outra cidade do mundo, tanto
quanto Paris, oferece uma maior sensação de diversidade não só de bairro para
bairro, mas também dentro deles. É gostoso, de repente, a gente se descobrir em
um, digamos, quarteirão independente, numa aldeia de negociantes de selos ou de
lojas de roupas eclesiásticas ou de instrumentos de corda. Pense em algo
“inencontrável” e você o achará na cidade!
As cidades e as mulheres têm algo em
comum: não as conhecemos completamente por mais que as conheçamos. Então as
minhas preferências parisienses foram colecionadas cui-da-do-sa-men-te ao longo
de décadas e quase todas elas são sentimentais.
No entanto, se você só tivesse vinte e
quatro horas para ver a cidade e se eu tivesse que sugerir-lhe apenas um pedaço
da Paris que aprecio, a minha escolha seria a Place des Vosges.
Moacir Pimentel |
Lembro-me quando pisei pela primeira vez
nessa paisagem, um rapaz cabeludo de vinte e poucos anos. Meio atordoado com os
seus cento e cinquenta arcos pensei que nenhum outro lugar poderia ser mais
bonito para se hospedar em Paris do que um pequeno hotel em um predinho do
início do século XVII – hoje chamado de Hotel Pavillon de la Reine - cujo pátio
era um paraíso escondido a anos luz da pousadinha sombria na qual eu estava
acampado. Escapar das multidões através de enormes portas para dar só uma
rápida espiada naquele jardim tranquilo, foi o bastante para fazer o tolo que
eu era então se sentir não apenas presunçoso mas literalmente o dono do mundo
(rsrs)
Moacir Pimentel |
Com certeza a Place des Vosges jamais
deixou de ser um dos meus recantos prediletos no mundo. As praças públicas nas
grandes cidades ou já foram palcos para enforcar os traidores e os hereges, ler
as proclamações e começar as revoluções – como é o caso da Place de la Concorde
em Paris, da Piazza San Marco em Veneza, da Piazza della Signoria em Florença ou da Trafalgar Square, em Londres - ou são pátios menores e intimistas, hortos
gostosos de compartilhar, jardins quase fechados que parecem foragidos das ruas
e que nos cumprimentam em silêncio quando viramos uma esquina qualquer. São
espaços públicos mas que, no entanto, parecem privados.
É essa característica que encanta na Place
des Vosges, ali tão verde e pacífica no coração do Marais, na junção dos
terceiro e quarto distritos da cidade. Sabemos, é claro, que ela foi feita por
reis para artesãos e que uma vez, há muito tempo, ocupou um lugar especial na
vida francesa, mas nela desfrutamos de uma intimidade que poucos outros locais
públicos famosos oferecem.
Trata-se de um lugar tranquilo que acalma
as mentes cercado por ruas onde moram procissões idênticas de predinhos.
Contemplando suas arcadas sombrias e ouvindo o som dos calcanhares passantes no
granito dos pisos, imaginamos como eram por ali, há séculos trás, as conversas,
os flertes e os duelos enquanto, silenciosamente, os cavalos esperavam por seus
donos amarrados às pilastras das arcadas.
Moacir Pimentel |
Dona História nos diz que, entre as praças
parisienses, a des Vosges foi uma Cinderela - ou, como os franceses diriam, uma
Cendrillon. Nascida para incentivar a manufatura, rapidamente se transformou em
local de especulação imobiliária narrando-nos uma história de metamorfoses, de
plebeia para a realeza e vice e versa. O seu feitiço mora entre as suas
tranquilidade e melancolia, entre seus mistérios e sombras generosas e embora
não seja parte do design original, o dossel dos plátanos no centro do jardim ainda
hoje acaricia e abafa mesmo é o ruído das crianças.
Esse jogo entre o privado e o público, tão
essencial para quem quer vivenciar a praça, como uma mutação de DNA, foi tecido
por sua história. Onde a Place de la Concorde e a Place Vendôme nos soletram a
política francesa a história da Place des Vosges foi moldada por forças
comerciais.
Na verdade, até mesmo o seu atual nome tem
a ver com o vil metal e, o que é pior, em suas duas versões conflitantes. Dona
Lenda e os velhos frequentadores da praça juram de pés juntos que, em 1793,
após a Revolução Francesa, o governo revolucionário popular, desesperadamente
indigente, realizou uma competição nacional para ver qual das regiões da França
pagaria mais rapidamente seus impostos prometendo que aquela que o fizesse
daria o seu nome à antiga Place Royale que seria rebatizada em sua homenagem. E
que o distante departamento dos Vosges, na fronteira da Alemanha com o
Luxemburgo, ganhou a competição. Já Dona História diz que, em vez, os
revolucionários rebatizaram a praça sim, mas com o nome de Place de
l'Indivisibilité e que foi Napoleão, em 1800, quem a renomeou Place des Vosges,
em gratidão à mesma região dos Vosges, a primeira na França a financiar as
campanhas dos seus exércitos. De um jeito ou de outro o nome foi afixado para
sempre em uma das pilastras da praça.
Moacir Pimentel |
O bairro que hospeda a praça é o Marais
que, como o nome diz, era um lugar pantanoso - “marais” significa pântano em
francês - formado pelas idas e vindas do rio Sena. Onde hoje está a praça
ficava o Hôtel des Tournelles, construído em 1388. O lugar tinha esse nome
porque possuía várias pequenas torres nos muros que cercavam a propriedade e,
bem assim, seus dois parques, seis jardins, vários pequenos bosques, um mini
zoológico, noves fora os muitos cômodos internos. Um verdadeiro palacete real.
E, de fato, no século XV o Hôtel des
Tournelles foi comprado pela Coroa e se tornou a Maison Royale des Tournelles,
uma residência real mais isolada, quase um retiro ou santuário pacífico para os
soberanos, longe da agitação da capital francesa. Dizem que os reis, que
moravam no Louvre, gostavam mais do pequeno palacete do que do seu grande
Palácio.
Até que em 1559 o rei Henrique II resolveu
organizar nas imediações da mansão um grande torneio para comemorar a sua
aliança com Filipe II, o rei da Espanha, mesmo tendo a rainha Catarina de
Médicis sido alertada por um astrólogo de que algo de nefasto aconteceria
durante o evento. Lenda ou não, o fato é que a lança de um adversário, Gabriel
de Montgomery, feriu Henrique II gravemente no olho. Levado para a Maison o rei
agonizou durante dez dias. Abalada e considerando o lugar maldito, após o
falecimento do marido a rainha resolveu demolir o edifício gótico e mudou-se de
vez para o Louvre.
Em seguida o terreno se tornou um mercado
de cavalos e depois, o ponto de encontro de mendigos e bêbados. Até que no
começo do século XVII o genro de Catarina, o rei Henrique IV, decidiu construir
ali a praça original, née Royale, para acolher festas e manifestações. Na verdade,
a praça era parte de um projeto maior de urbanização. Diz Dona Lenda que ela se
chamaria Place de France e que dela partiriam ruas com nomes das províncias
francesas. Apesar do plano não ter se concretizado algumas de suas digitais
ainda são visíveis, como a Rue de Bretagne e a Rue du Poitou.
Moacir Pimentel |
A Place des Vosges, como a conhecemos, foi
concebida e construída entre 1604 e 1612, por iniciativa de Henrique IV que
começou a construção de um novo espaço integrado para a fabricação de seda e
lençóis, destinado a competir com os estabelecimentos do tipo já então famosos
de Milão. Henrique, um homem de grande espírito público e um dos poucos
personagens admiráveis da história francesa, era um entusiasta do trabalho
artesanal tanto quanto das artes.
Ele planejou minuciosamente um vasto
quadrado povoado por prédios uniformes em três de seus lados. Os novos
edifícios deveriam ser os modelos de um eficiente uso múltiplo: abrigariam
fábricas de seda e têxteis nos segundo e terceiro andares, os artesãos e demais
trabalhadores viveriam no quarto andar, ao lado dos beirais, enquanto que no
piso térreo de arcadas, lojas venderiam os bens produzidos no local. Ou seja, o
plano original da Place des Vosges foi estranhamente moderno, um casamento
admirável e multiuso de habitação, indústria e varejo.
Moacir Pimentel |
De fato, o tijolo e a ardósia e a pedra
dos pavilhões, que hoje parecem tão acolhedores aos nossos olhos, naquele tempo
simbolizavam o luxo pois o tijolo então era um material acima dos bolsos burgueses.
Mas a mente real estava além desses detalhes mesquinhos e o olho real exigia
simetria em todos os lugares, com apenas um pavilhão marcadamente diferente do
resto. E o Pavilhão do Rei, foi erguido no centro do lado sul, servindo como
entrada para a rue St. Antoine, um edifício de onde o monarca, presumivelmente,
poderia supervisionar a sua criação arquitetônica.
Sucede que um católico fanático
enlouquecido assassinou Henrique IV em 1610, e as coisas rapidamente começaram
a mudar. Embora concebidos para o fabrico e o comércio, os edifícios da praça
tinham sido construídos por vinte e seis investidores e especuladores
imobiliários gananciosos para quem logo se tornou evidente que os predinhos
valiam mais como residências do que como fábricas, fato que determinou um
processo de gentrificação em uma única geração, no qual os ricos assumiram o
que antes fora destinado aos artesãos. Em breve, a quarta e última face da
praça foi edificada com mais um Pavilhão central para a Rainha chamar de seu,
enquanto o espaço central foi fechado por grades e passou a ser utilizado para
cerimônias públicas e casamentos reais.
Moacir Pimentel |
Existem, portanto, apenas duas exceções à
geometria perfeita da Place des Vosges: o Pavilhão do Rei ao sul, equilibrado
pelo Pavilhão da Rainha ao norte. Muito mais altos que os demais, os dois
Pavilhões moram de frente um para o outro, se elevam bem acima dos telhados
circundantes, não podem ser visitados mas dão acesso à praça através de seus
triplos arcos.
Foram construídos antes dos demais para
servir de modelo, embora suas proporções fossem mais imponentes e suas
ornamentações mais ricas. Muito tempo depois da construção da praça, durante a
Restauração, um medalhão do rei Henrique IV foi adicionado ao espaço central do
piso principal do Pavilhão do Rei. O busto do soberano é enfeitado por uma
guirlanda de folhas de carvalho e oliveira encimada pela coroa da França.
Ao contrário do que os seus nomes parecem
sugerir, os pavilhões dessa aristocrática praça jamais acolheram os reis ou as
rainhas da França, a não ser Ana da Áustria e mesmo assim por um brevíssimo
tempo. O morador mais ilustre do Pavilhão do Rei foi o concierge real.
Em 1612, o filho de onze anos de Henrique,
o rei Luís XIII, inaugurou a nova praça, com uma grande festa popular para
celebrar seu casamento com Ana da Áustria – dizem que com direito a um pioneiro
carrossel e seis mil convidados - e a Place des Vosges se tornou a expressão do
primeiro planejamento urbano feito por reis europeus e funcionou como o
protótipo de todas as praças residenciais que surgiriam dali em diante por
quase toda a Europa.
Luís XIII contribuiu financeiramente para
que as construções do quarto lado da Place des Vosges, paralelo à Rue
Saint-Antoine, fossem concluídas. Mas em seguida os edifícios foram vendidos a
particulares e os compradores dos lotes remanescentes tiveram que construir
mais pavilhões com a mesma simetria.
Originalmente a praça era coberta de areia
para permitir que os aristocratas se dedicassem aos exercícios equestres pois
logo após a inauguração, ainda no século XVII, a praça caiu no gosto da
nobreza, banqueiros e gente de dinheiro. Festas e feiras eram sempre realizadas
ali e, apesar da proibição, ela era palco para muitos duelos, que aconteciam à
noite, com espadas em uma mão e tochas na outra. Em 1619, um gramado central
tornou-a ideal para torneios e desfiles, tendo na ocasião o Cardeal Richelieu
encomendado uma estátua equestre em bronze de Luís XIII para o centro da praça,
cercando-a por um bosque para o qual convergem até hoje caminhos de cascalho,
separados por quatro conjuntos de canteiros com belas fontes decoradas por
leões. A estátua original, assim como tantos outros símbolos da realeza e do
catolicismo, foi derretida durante a Revolução Francesa e eventualmente
substituída por uma cópia em 1825.
Quem se dá ao trabalho de conferir o
cavaleiro de perto, percebe que seu cavalo parece empalado ou que, pelo menos,
a barriga do bicho é estrutural e estranhamente suportada por um tronco de
árvore. Quem for curioso o suficiente para perguntar ao garçom mais próximo o
porquê da estranheza, ouvirá que quando a cópia foi feita, os novos escultores
usaram mármore em vez de bronze e que o novo material, infelizmente, não
suportava o peso do design original. Daí a adição incomum do tronco sob o
animal.
Moacir Pimentel |
Originalmente, três dos quatro cantos da
praça eram fechados, preservando-a das correntes de vento. As carruagens
entravam apenas pela esquina noroeste, provenientes da Rue des Francs-Bourgeois
enquanto que os pedestres usavam a passagem localizada na esquina nordeste, ao
lado da Rue du-Pas-de-la-Mule, bem como as passagens localizadas no meio dos
lados norte e sul. Já no século XVII, as galerias cobertas pelas abóbadas de
tijolos e pedras e vazadas por arcos abrigavam lojas.
Mas essas arcadas ainda ficarão para outra
conversa...
Amei o artigo, Moacir! Nunca tinha ouvido falar da Place des Vosges. Linda demais! Acho que os guias da excursão que eu fiz não falavam de lugares assim porque queriam vender outros passeios não incluídos no roteiro. Para uma praça como esta qualquer viajante de primeira viagem seria capaz de ir. Bastava pegar um táxi. Você sempre me deixa com a impressão de que já conheço os lugares maravilhosos que descreve por causa da história tão bem contada, das fotos e dos detalhes como as placas e o tronco debaixo da barriga do cavalo do rei kkk Fiquei morrendo de vontade de visitar a pracinha mas antes preciso arrumar um acompanhante. Posar para selfies de solteirona excêntrica dando comida pros passarinhos num lugar tão romântico como este não está com nada kkk Obrigada!
ResponderExcluirMônica,
ExcluirÉ claro que os prezados guias tentam comercializar os tours opcionais - é o ganha croissant deles (rsrs) Mas, me desculpe, andar de táxi em Paris é coisa do século passado.No século XXI tudo o que uma jovem turista de primeira viagem teria a fazer - com a ajuda de um daqueles apps de tradução - é descobrir qual é a estação de metrô mais próxima do seu hotel e qual a linha que dela a levaria até a estação Saint-Paul, a pouco mais de um quilômetro da Place des Vosges. Caminhar faz bem à saúde! Quanto ao "acompanhante", é bem verdade que jamais estive na praça sem a "gaja" que viaja a vida ao meu lado, mas tenho certeza que você, sozinha ou avec - e mesmo alimentando a passarada! - ficará muito bem nas fotos (rsrs) “Obrigado” e bon voyage!
Uma de minhas tristezas é que, das vezes que fui a Paris, andei pelo Marais e não descobri esta arcada que leva a um lugar tão lindo. Mas lendo o seu post por um lado fico mais triste por não tê-la visto mas por outro me sinto como se você me tivesse levado a um passeio por lá. E quando voltar lá certamente a procuraremos.
ResponderExcluirObrigado pelo passeio, e um abraço do Mano.
Wilson,
ExcluirNão acho que a leitura substitua ou iguale-se ao concreto, a realmente se estar na Place des Vosges com todos os sentidos alertas (rsrs) e torço para que o casal chegue lá o quanto antes. Mas note que, quando pisamos em Paris pela primeira vez , além de vê-la com os nossos próprios olhos maravilhados a contemplamos com outras visões “de cima dos ombros dos gigantes” que já nos tinham descrito a cidade em verso e prosa e tintas e música. As estantes da casa da minha infância eram povoadas pelos poemas de Baudelaire, Apollinaire, Verlaine e Prévert e pelas histórias de Hugo e Dumas, Flaubert e Maupassant e a nossa “radiola” falava francês. Logo não é de se estranhar que em Paris eu tenha procurado pelas lindas passantes, a Ponte Mirabeau, o ruído dos cafés, as folhas mortas, os miseráveis e mosqueteiros e corcundas e as madames, em lugares como Montmartre, nos cenários das revoluções, nas praças desconhecidas, nos "predinhos" com mansardas do século XVII, por trás de portas da Belle Époque e nos bouquinistes nas margem do Sena. Que maravilha que, graças às nossas mentes hospedeiras de um sem número dos tais neurônios espelhos, somos capazes de empatizar e portanto de enriquecer e alargar nossas existências e horizontes através da palavra escrita.
Não se esqueça que esse post foi o resultado direto de uma observação da SUA lavra sobre arcadas e viagens na qual eu me reconheci. Da mesma forma também me são familiares seus mixed feelings, essa tristeza/alegria agridoce, essas saudade do que não fizemos e pressa de fazer o que ficou faltando. E cadê tempo? Mas se sempre há e haverá, “quelque chose qui manque ”, que bom que estamos aqui compartilhando um território tão distante da nossa geografia cotidiana onde podemos embarcar nas “viagens” uns dos outros. Pelo espaço e por elas, muito obrigado.
Abração
Moacir,
ResponderExcluirQuantas recordações boas o seu belo artigo me traz de uma tarde ensolarada que eu e minha família passamos nesta encantadora praça faz quase vinte anos. Descobrimos o lugar meio sem querer passeando pelo bairro judeu depois de visitar o Museu Carnavalet. Entramos no que parecia ser um prédio e saímos num lugar fechado com uma praça no meio. E que praça!! Rodeada por prédios charmosos, com fontes, um gramado, árvores, bancos, brinquedos e uma paz incrível. Meu filho adorou o espaço e logo começou a brincar explorando as novidades, o pai de olho. É verdade que aquelas árvores 'abafam o ruído das crianças'. Eu sentei em um dos bancos junto com uma simpática senhora francesa de 80 anos moradora da região que prontamente puxou um papo comigo e eu não falo francês mas nos entendemos às mil maravilhas. Ela me apontou o museu do Victor Hugo do outro lado. Outra coisa que adorei foi um casal de jovens, ela cantando ópera e ele tocando violoncelo. Mas o mais gostoso mesmo foi andar devagar descobrindo uma a uma as galerias de arte e as lojinhas das arcadas.
Um abraço para você
Flávia,
ExcluirQue bom que o post lhe provocou tão bons bytes de memória. Sim, a Place des Vosges é invadida pelas famílias sobretudo nos finais de semana: pirralhos, jovens, adultos e idosos e é claro, os turistas, brincando, lendo, ouvindo música, conversando ou apreciando a paisagem.Consigo imaginar pouquíssimos lugares no mundo melhores do que essa praça para se passar uma tarde tranquila. Por isso mal largamos as malas lá vamos nós cumprimentá-la, seja inverno ou verão, chova ou faça sol, e sempre a encontramos bonita, com suas árvores de cores mutantes, cafés, bancos, postes e prédios dos mais belos que há em Paris, sendo que a concorrência, como você sabe, é enorme a cada quartier. Quanto às arcadas e aos demais tesouros que elas abrigam conversaremos no próximo capítulo, está bem?
Outro abraço para você
As diferenças das viagens feitas pelo Pimentel em comparação aos demais turistas ou mesmo viajantes a negócios estão nos detalhes observados.
ResponderExcluirAs praças e suas peculiaridades, os chafarizes como esguicham suas águas, as ruas com seus cheiros e casas, os locais mais bucólicos de uma cidade, as suas arcadas, seus restaurantes, padarias, lojas, os artistas de ruas ...
Pimentel seria um devorador de lugares, no bom sentido, quero dizer, pois me refiro a absorver as peculiaridades e características de cada local visitado, e transportar para o papel as suas impressões invariavelmente ricas, relatando pormenores que para a maioria das pessoas passaram desapercebidos.
A essa tarefa se dá o nome de viajar plenamente, de se aproveitar o tempo para perscrutar o desconhecido por mais vezes que aquele local tenha sido visitado, de se encontrar as minúcias, as particularidades que somente um excelente observador lograria êxito!
Logo, quando Pimentel nos apresenta seus relatos das viagens que fez pelo mundo, esse documento deve ser guardado por duas razões:
Quem visitar as cidades por ele conhecidas terá um roteiro magnífico para ser cumprido ou quem jamais teve essa oportunidade, ao ler tais minuciosidades conhecerá o local mesmo permanecendo em casa, que é o meu caso!
Parabéns, Pimentel.
Comecei bem o ano, inicialmente lendo uma belíssima crônica da Ana, e depois me levaste para passear pela Cidade Luz, e visitei Paris como pouca gente a explora em como conhecer a capital francesa.
Um forte abraço.
Saúde e paz.
Prezado Bendl,
ExcluirVocê me deixou muito satisfeito com esse comentário. E não só pelos elogios exagerados como sempre, mas porque tive certeza de que você lê meus posts turísticos antes de os arquivar cuidadosamente (rsrs) Além disso você acertou na testa! Realmente sou um camarada atento, um observador por vocação e treinamento de sobrevivência. Dia desses o Antonio comentou que ao observar as minúcias de uma obra de arte, as cores e formas e planos de uma tela, por exemplo, eu faço uma espécie de “meditação”. Sei não. Acho que gostei mais desse seu diagnóstico : “devorador de lugares”. Afinal é apenas humana essa fome de conhecer as paisagens e nelas as pessoas, essa curiosidade de experimentar o desconhecido, esse apetite de entender não só as nossas próprias imagens mas tudo o que mora fora dos nossos limites, essa quase fissura de ver, tocar, cheirar e comer da vida um quase tudo. Foi ISSO, essa necessidade do conhecimento e do compartilhamento dele aquilo que determinou a evolução da nossa bípede espécie sem noção (rsrs)
Muito obrigado e outro forte abraço
A Place des Vosges merece todas as suas palavras entusiasmadas e gostei muito de conhecer os detalhes da história do lugar, principalmente de como os prédios foram idealizados para conjugar moradia, manufatura e varejo. Mas você se superou logo nos primeiros parágrafos dedicados à verdadeira beleza de Paris, conseguindo descrever algo que eu sabia mas que até ler o post achava que era indescritível. Um texto perfeito.
ResponderExcluirMárcio,
ExcluirOs parágrafos não são perfeitos até porque se jamais conheceremos Paris por mais que a conheçamos, como poderíamos descrevê-la a contento? Agora...
Lembra da moça de Colinas como Elefantes Brancos, do Hemingway, expressando toda a sua desilusão quando diz que “tudo tem gosto de alcaçuz”? Pois é. É triste mas verdadeiro que a realidade raramente alcança as nossas expectativa e imaginação poderosas(rsrs) No entanto há pessoas e cidades que nos provam que para toda regra há exceção e Paris tem sido uma delas : jamais me decepcionou.
Obrigado por participar.
Olá Moacir,
ResponderExcluirUm verdadeiro "devorador de lugares" como disse o Francisco Bendl.
Seu post está fantástico! Não há nada mais a dizer que não tenha sido dito.
Peguei um beirada grande de tempo, uma cadeira confortável e coloquei as pernas para o alto na mesa, pensando que o texto era bem grande. Mas quando acabei, sem perceber , vi que era pequeno, bem pequeno! Ficaria horas lendo.
Vai ter algum Giverny? Era começo de primavera e me apaixonei pelo lugar, pelos jardins, pela casa, tudo. Imaginei como deve ter sido feliz morar ali.
Até muitas arcadas mais e mais do que tiver. É sempre bom!
Caríssima Donana,
ExcluirSabia que gosto tanto, mas tanto, do trabalho de Claude Monet, que jamais escrevi sobre ele? Tem coisas que, como dizia o Machado, são indizíveis. Eventualmente eu menciono aqui e ali os nenúfares, os palheiros ou as catedrais , mas sem “devorar” e ou mastigar (rsrs) Como traduzir um cara que quis capturar a luz e a passagem do tempo pintando compulsivamente as mesmas coisas durante trinta anos? Quanto a Giverny eu gostaria de ler as SUAS impressões, que tal? Porque, dessa conversa impressionista , o que gosto mesmo é de sentar e observar , mediunizado, aquelas telas gigantescas naquelas salas elípticas e imaculadamente brancas da Orangerie.
“Gratíssimo” pelas palavras elogiosas, mas acho que vou discordar da senhora quando diz que “não há nada mais a dizer que não tenha sido dito” sobre a Place des Vosges. Acabei de conferir e o próximo - e último! - dos posts arcadianos é duas páginas mais longo que esse (rsrs)
“Até mais”
Pimentel,
ResponderExcluirEu assino o comentário do Wilson. A leitura também me deu uma tristeza danada por já ter estado em Paris sem ter conhecido a Place des Vosges porque sequer sabia da sua existência. Mas lendo o seu artigo pude imaginar como deve ser bom se deixar ficar por ali respirando História e viajando no tempo. Em si, a praça é até simples mas a sua arquitetura tem um charme único. Não estamos acostumados com praças deste tipo com prédios bonitos ao redor de jardins idem. O que ela tem de tão especial é o conjunto. Por fim é triste verificar que os jovens têm ainda menos informações sobre Paris e a Europa em geral do que a nossa geração teve e que cada vez mais vez gente prefere embarcar rumo a Miami.
Sampaio,
ExcluirSeguinte: eu chequei os números! E, so sorry, enquanto Miami recebeu 15.7 milhões de visitantes durante todo o ano de 2016, só no primeiro semestre de 2017 Paris já tinha dado as boas vindas a 16 milhões (rsrs) Os jovens de todas as nacionalidades gostam da cidade e a visitam, sim, mas é que a Paris deles não é aquela das nossas referências. A Paris que eles curtem é de vidro e aço e de street art com soundtrack da ZAZ! É aquela do filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain e de TODOS os puzzles do Código Da Vinci solucionados pelo Dan Brown (rsrs) Fazer o quê? São outros tempos e novas linguagens e, como eles dizem: "a fila anda" mas, entre mortos e feridos, “sempre teremos Paris”. Obrigado pelo seu ótimo comentário e, por favor, continue por perto pois nessas conversas o saudosismo saudável é mais do que bem vindo.
Caríssimo,
ResponderExcluirParis é uma festa, já disseram muito antes de nós. Visitá-la, um sonho para qualquer mortal, bem sabemos! Vê-la assim, com um guia do seu porte, deix o freguês de ponta-cabeça. Impossível dizer au revoir. Abração.