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31/01/2018

O Inferno da Mentira

O julgamento por Yama e os reinos do inferno budista (imagem  www.britishmuseum.org)
Antonio Rocha
Havia no tempo de Buda um praticante muito devoto, tinha muita fé. Quanto mais meditava mais percebia que os poderes que o Senhor Buda emanava, qualquer pessoa também podia adquirir e desfrutar, desde que seguisse o Caminho.
Certo dia, a mãe deste praticante faleceu. Tempos depois, o devoto lembrou-se de que, se estava na Senda, certamente teria os poderes de Sakyamuni, como também o mestre era conhecido, e munido com esta fé, imaginou que a mãe estava no mais alto dos céus, iria pessoalmente conversar com ela, da mesma forma que o Mestre Buda conversava  com a mãe Rainha Mahamaya.
Falou com o Buda, pediu autorização e foi logo ao mais sublime céu, lá no mais alto, entretanto... para surpresa... viu que a mãe não estava... e assim foi descendo na escala dos céus até o mais baixo... são planos espirituais onde residem os espíritos...
Chegou à linha limite dos infernos. Parou e voltou para conversar com o Buda. Buda lhe ensinou como fazer, autorizou novamente. Explicou que a mãe do praticante sempre cuidou do filho muito bem, mas mentia bastante, enganava muita gente, embromava, enrolava, trapaceava e mesmo uma mentirinha de nada é uma energia negativa.
E o devoto, completamente desapontado, foi descendo até que em dado momento chegou a um determinado plano: Inferno da Mentira e encontrou a mãe.
Abraçaram-se, choraram e através da poderosa Energia Búdica da Compaixão ela foi resgatada para um plano melhor, onde iria ser tratada e educada conforme os ensinamentos do Darma Sagrado, onde um dos preceitos é não mentir jamais. E se por alguma fraqueza mentir, corrigir logo mediante as práticas espirituais, sanando o débito e zerando a tal mentira.
Diz o texto sagrado do Mahayana que a mãe do devoto ficou tão feliz que saiu do Inferno dançando.
É e por isso, que até hoje, nos ritos fúnebres do Japão, existe a chamada “Dança de Obon” = cerimônia budista.
Aliás, o grande cineasta japonês Akira Kurosawa começa um de seus últimos filmes com as cenas de um rito fúnebre onde os participantes do sepultamento vão dançando.
Moral da História: mesmo que você vá para o Inferno, fique tranquilo, o Buda vai lhe tirar de lá. Claro..., você tem que fazer a sua parte... estudando e praticando, portanto... relaxe e medite.
Esta história nos foi contada pelo sacerdote da HBS = Budismo Primordial, Jyunshô Yoshikawa, no núcleo do RJ, em São Cristóvão, durante uma reunião mensal.


13 comentários:

  1. Moacir Pimentel31/01/2018, 17:20

    Antonioji,
    Seguinte: se não mentíssemos estaríamos todos solteiros, envelhecendo sozinhos. Budanoslivre! Quem diz que não mente , está mentindo. Uma mentira pode ser virtuosa, a prática de algo muito importante: a gentileza. Realmente depende da intenção por trás da mentira. Eu minto todos os dias, na boa. É melhor ir para o inferno depois do que viver nele agora (rsrs) Um exemplo? Os cabelos das senhoras agora deram de nascer escuros e terminarem claros nas pontas. Eu acho as cabeleiras híbridas muito esquisitas mas se elas me perguntam se o corte ficou bom, minto que ficou fan-tás-ti-co. E vou lá dizer ao amigo que me pergunta se gostei do presente de Natal que me deu, que não? Nem morto tiraria dele a satisfação de pensar que me deu uma lembrança bacana , do meu agrado.
    Certa vez uma prima, psiquiatra, nos disse que os deprimidos são mais honestos consigo mesmos do que pessoas mentalmente estáveis e que sabia que um deprimido estava a caminho da cura quando se tornava menos honesto ou pelo menos mais escorregadio no sofá (rsrs) É “normal” nos editar um pouquinho, nos pintar com cores mais amenas, suavizar más notícias. E se nós não gostamos de ouvir certas verdades porque os "outros" iriam gostar? Geralmente achamos que os "outros" querem ouvir a verdade. Só que não é bem assim. Sem mentiras talvez nossa vida social desmoronasse à medida que fossemos verbalizando o que realmente pensamos dos "outros" e descobrindo que eles nos percebem muito menos positivamente do que imaginamos.
    Quanto ao inferno, penso que é como poetou o Milton:
    “A mente é seu próprio lugar e em si mesma
    Pode fazer um Céu do Inferno e um Inferno do Céu.”
    Abração

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    1. 1) Oi Pimentel, qdo criança e jovem é claro que menti, adulto idem, mas qdo decidi praticar mesmo o Budismo parei de mentir e me senti/sinto ótimo.

      2) Percebi que mesmo uma mentirinha tola de brincadeirinha tem energia negativa e faz mal aos envolvidos.

      3)Perdão, mas, respeitosamente discordo da sua parente psiquiatra. Quando me perguntam algo, polidamente falo a verdade.

      4) Me sinto bem assim, talvez por isso não me fazem tantas perguntas embaraçosas, tipo se o cabelo da fulana está bonito ou não...

      5)Não sei se já falei aqui neste blog, mas uma amiga brasileira que casou com um sueco e foi morar em Estocolmo aprendeu que lá, de acordo com as leis, o cidadão "é obrigado a falar a verdade". Pode até mentir, mas quando descobrem é preso e paga multas altíssimas.

      6) Veja o caso, se nossas autoridades, pessoas públicas e políticos falassem 100% a verdade, penso que o nosso Brasil seria melhor.

      7) Abraços.

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    2. Moacir Pimentel01/02/2018, 08:58

      Antonioji.
      Minha sincera "Gratidão" pelos ensinamentos e a cortesia de sempre. Respeito imenso a sua religião/vida. Só gostaria de acrescentar que a psiquiatra em pauta não manisfestou uma "opinião" ao falar da autodepreciação dos deprimidos.Trata-se de um fato comum na prática profissional dela, de um estado psicológico apelidado na literatura médica de "realismo depressivo".
      Sabe?
      Nos seus escritos sobre o budismo o que mais me atrai é a serenidade, a temperança, a noção da efemeridade de tudo, o caminho do meio, avesso aos 8 ou 80 e P&B na vida, conhecedor dos matizes, sabedor de que a dosagem seja do remédio ou do veneno pode sim matar e/ou curar. Penso que assim como é inútil gritar para surdos e/ou mostrar as cores para cegos, dizer a alguém mais verdade do que está preparado para ouvir, só vai prejudicar a "comunicação".
      De resto você é um felizardo se não lhe fazem mais questões capilares. Na minha tribo as "fulanas" têm mania de me atormentar com perguntas "embaraçosas"(rsrs)
      Abração

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    3. 1) Oi Amigo Pimentel, vc tem razão e sua prima, academicamente idem.

      2) Lembrei de um conhecido que ao fazer análise de grupo, ele inventava histórias, criava situações várias pensando que estava enganando o analista, então, belo dia ele revelou: "tudo o que eu falo aqui é mentira, fico inventando".

      3)O médico que era psiquiatra/psicanalista/analista didata/professor respondeu: "Para a psicanálise não tem problema nenhum, se é mentira ou se é verdade, nós trabalhamos com o que vc fala e sente..."

      4)Então aprendi bastante com esta história que presenciei no grupo que fazia parte... claro que respeito as "psis" da vida.

      5) Contudo, para o meu gasto pessoal eu fico com a discutível prática da "verdade" conforme o Buda ensinou.

      6)Escrevo discutível, porque alguém poderá filosofar: verdade relativa ou verdade absoluta?

      7)Saio pela tangente e respondo: verdade búdica ! sem querer impor nada a ninguém.

      8) Aos demais:estou chegando de Teresópolis onde fiquei cinco dias, aos poucos vou comentando o que ainda não escrevi.

      9) Abraços gerais de boa semana !

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  2. Flávio José Bortolotto31/01/2018, 18:10

    Prezado Prof. Dr. ANTONIO ROCHA,

    Bela parábola Budista para ressaltar a importância de não Mentirmos.
    O quadro que ilustra a parábola é muito sugestivo, mostrando ao centro YAMA o Juiz Universal, a balança com os pratos do Bem e do Mal, e o Escrivão que assenta no Livro da Vida, a Sentença. Diabos a direita de YAMA, prontos para tomarem conta do Condenado e levá-los ao Inferno onde aplicam as mais cruéis torturas nos Culpados, conforme os sub-quadros ao redor mostram.

    Para nós Cristãos, N. S. JESUS CRISTO deixou o Comando: Mat. 6 - 37
    " Dizei sòmente: SIM, se é SIM: NÃO se é NÃO. Tudo o que passa além disto, vem do Maligno.

    Abração.

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    1. 1) Salve Dr. Bortolotto, concordo plenamente com o seu comentário. Ótimo !

      2)Gratidão pela citação bíblica.

      3)Abraços !

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  3. Mestre Antonio,
    Eu procuro não mentir, o que de vez em quando significa que é melhor ficar calado, mas às vezes, quando não dá para manter o silêncio, como nos casos que o Moacir deu de exemplo, tenho que concordar com ele que às vezes uma pequena mentira pode ser melhor para o outro do que a verdade, que pode machucar sem fazer bem.
    O difícil é avaliar quando isso é verdade.
    E é interessante que pessoas diferentes podem ter noções diferentes do que é a mentira, como o nosso netinho mais novo que, flagrado numa mentira dirigida à avó durante uma brincadeira, respondeu indignado: "Mas eu não sabia que você ia acreditar!"
    Um abraço do Mano

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    1. 1)Salve Wilson, entendo sua postura e a do Moacir, mas ao longo dos anos fui treinando ser cordial e falar a verdade, peço desculpas, mas falo a verdade.

      2)Não sou melhor do que ninguém, é um aprendizado que demora décadas.

      3)Abraços de Gratidão sempre !

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  4. Olá Antonio querido budista,
    Sempre fui sincericida por temperamento e por criação. E ja entrei em muitas frias e arrependimentos por causa disso.
    À medida que fui ficando mais velha fui aprendendo a mentir. E continuo aprimorando. O divertido é que, por ser sincera, todos acreditam nas minhas mentiras. Foi muito bom quando aprendi a jogar truco com meus filhos.
    Apesar de tudo ainda acho que comigo a verdade prevalece.
    Até mais.

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    1. 1) Oi Ana, o Buda recomenda que falemos a verdade, em qualquer situação, de uma forma agradável, amigável. Se o outro não entender, paciência... desapeguemos ...

      2)Na hora o sincericídio deve ser muito ruim, mas depois, qdo passar a tempestade, vamos ver que foi a melhor atitude. Estou falando por mim, não estou passando receita para ninguém.

      3)É que eu aprendi com Gandhi a "força da verdade" é algo belíssimo, mas reconheço que nem todo mundo tem maturidade para ouvir a verdade. Então fico Zen, fico em silêncio conforme o Mano disse.

      4)Tudo de bom !

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  5. Olá sincero Antônio,
    Sinceramente passo a acreditar nos seus elogios.
    Obrigada.
    Adorei a chamada enérgica para nós quase todos.
    Abraço para você.

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  6. Francisco Bendl02/02/2018, 16:25

    Caro Rocha,

    Perdoa-me o atraso, mas ando a mil por hora!

    Reitero que aprecio em demasia os teus contos budistas, todos com suas mensagens de otimismo e fé.

    E me impressiono com a quantidade de contos que já postaste!

    Afianço que para mim são sempre bem-vindos.

    Um forte abraço.
    Saúde e paz.

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    1. 1) Salve Chicão, sem problemas de atraso quanto às postagens e comentários...

      2) Os textos canônicos afirmam que ao longo de 45 anos, o Buda pronunciou nada menos que 84 mil ensinamentos (número simbólico).

      3) Então haja historinhas, parábolas e afins.

      4)Obrigado sempre !

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