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13/06/2016

Um lugar mágico

Dessa vez, a história do Moacir mistura os tempos de mochileiro com os de menos tempo atrás:


No Vale do Zêrzere - fotografia Moacir Pimentel

          Quem não acredita em magia - yo no creo en brujerías, pero que las hay, las hay - jamais esteve  no Vale do Rio Zêrzere, à beira das Penhas da Saúde e antes de Manteiga, na Serra da Estrela, em Portugal.

          Existe um camping no local. Nos finais de tarde, quando o céu perde a cor - mais ao menos às  19 horas no verão e às 16 no inverno -  a atmosfera, não sei porque, fica enevoada, tomada por uma luz suave e difusa, que modifica contornos, formas e cores, nos dando a sensação de estarmos nas brumas de Avalon. O vale é árido, mas aqui e ali ainda sobrevivem pinheiros bravos, castanheiros e o amarelo das flores da carqueja ilumina  a paleta monocromática de cinzas fantasmagóricos. A gente tem que prestar muita atenção - caso já não as conheça de cor - para perceber as habitações de pedra em meio às enormes muralhas de granito.

          Certa vez, os nossos filhos ainda eram adolescentes, visitando o local topamos com um casal muito jovem, acampado à beira do rio, debaixo de uma frágil barraquinha. Conversamos. Eram australianos muito simpáticos e gentis mas ela falava algum português graças a uma ascendente. Contei-lhes que também havia sido mochileiro quando rapaz e que havia viajado um tempo com jovens australianos.

          Não foi.... e-x-a-t-a-m-en-t-e....  assim. Na verdade, eu conhecera na  Tailândia  uma garota chamada Heather. Ela estava voltando para casa, em Sidney, depois de fazer a volta ao mundo .Tinha estado no Rio. Perguntei-lhe: How did you like Brazil? Ela respondeu com um sotaque encantador:
- "Mate, rice and beans is a great combination."  Falar de feijão com arroz para um brasileiro exilado foi sacanagem! Ela ganhou meu solitário e andarilho coração, e eu ali, naquele, momento, conclui que TINHA que conhecer a Austrália.

          Psiu! Este é um segredo cabeludo!

          A minha caçula, muito atenta à conversa, como sempre, mandou ver:
-  " Massa, pai ! Mas só acredito que você era que nem ELES, porque a mamãe está dizendo que VIU você cabeludo!"

          Lembro que à tardinha a garota sacou de uma flauta e tocou lindamente  a Dança dos Espíritos Abençoados do Gluck.

                 
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                                               GLUCK Dance of the Blessed Spirits
                                                         Flauta: Jean-Pierre Rampal

             
           Ela evocou Orfeu e Eurídice, um dos meus temas preferidos e não só na música. Coincidência? Eu prefiro acreditar, como os sábios indianos ancestrais, que "a pessoa que chega, é a pessoa certa".

           Ou por outra, que por alguma razão misteriosa, que nos escapa, estamos uns para os outros, no lugar certo, nesta vida.
           Mas é preciso fazer contato. Estender a mão. Convidamos o casalzinho para jantar. Nos dias seguintes meio que os adotamos e lhes mostramos a Serra como ela deve ser vista, longe dos olhos das hordas de turistas.
           À noite, depois de visitar os castelos e judiarias e povoados históricos com a juventude  e a criançada, já bebericando um Porto no café da aldeia, os australianos iam recebendo dos adultos dicas de viagem, e da nossa prole  informações detalhadas sobre o que NÃO fazer nos seus próximos destinos...

           Quando nos despedimos eles estavam muito bem vestidos: minha mulher os presenteara com agasalhos decentes. Já os visitamos na Austrália. Estão casados e têm um bebê. Prometeram-nos visitar o Brasil, quando o filhote  estiver mais crescido. Tomara.

2 comentários:

  1. Monica Silva14/06/2016, 10:23

    Moacir, seus textos me fazem viajar. Parabéns

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  2. Boas memórias ! Serra da Estrela, lindíssima !

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