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09/05/2012

Não é só a taxa de câmbio...

15/04/2012

Muito se tem falado atualmente do inegável processo de desindustrialização que a economia brasileira vem sofrendo, com a queda da participação da indústria de transformação tanto no conjunto do PIB quanto no volume das exportações brasileiras. As exportações diminuem e o mercado interno é invadido por produtos estrangeiros a preços mais baixos do que os nacionais.

Os industriais gritam, o governo promete medidas para ajudar a recuperação da indústria, e todos eles reclamam da excessiva valorização do real, como se a maior culpada do processo fosse a taxa de câmbio, que deveria ficar no entorno de 2,50 reais por dólar para que a indústria brasileira pudesse ter competitividade.

Para tentar resolver o problema imediato, o governo faz esforços para segurar a valorização do real e toma medidas de restrição às importações, com o aumento das taxas ou até a imposição de cotas. E procura aumentar a disponibilidade de crédito para aumentar o mercado consumidor interno e com isso escoar a produção industrial.

A coisa não é tão simples assim.

É evidente que a taxa de câmbio influi, e muito, no equilíbrio entre as exportações e as importações. Claro que é mais fácil exportar quando o real está desvalorizado, o que melhora a nossa competitividade no mercado externo, e  as importações aumentam quando ele está valorizado, o que piora a nossa competitividade no mercado interno. Mas para a competitividade de nossa indústria a taxa de câmbio é só um dos fatores, que, além de ser de difícil controle, porque as medidas que o governo tem para tentar atenuar suas variações num regime de câmbio flutuante são reduzidas e de custo muito alto para o país, está longe de ser o mais estratégico.

Um índice bastante utilizado para determinar aproximadamente a sobre ou sub valorização de uma moeda em relação ao dólar é o "BigMac Index" publicado pela revista inglesa "The Economist", que começou como uma brincadeira mas evoluiu e hoje já pode ser utilizado como uma aproximação bastante razoável do valor de compra da moeda de diferentes países.
Ele compara o preço ao consumidor de um Big Mac da McDonald's, convertido para dólar, numa série de países com o seu preço atual nos Estados Unidos. A escolha do Big Mac é porque o sanduíche é feito, nestes países, utilizando os mesmos insumos básicos e o mesmo processo de produção, e, como as lojas são franquias, com uma qualidade de produto pelo menos comparável. Claro que um resultado mais preciso poderia ser obtido utilizando uma cesta maior de produtos, mas é difícil escolher uma cesta de produtos que obedeçam todos a estes critérios e tenham os mesmos insumos disponíveis numa ampla gama de países.

A última tabulação disponível do BigMac Index (http://www.economist.com/blogs/graphicdetail/2012/01/daily-chart-3) publicada em 12 de janeiro mostra um sanduíche BigMac no Brasil custando US$ 5,68 contra US$ 4,20 nos Estados Unidos e apenas US$ 2,44 na China. Se considerarmos, à falta de maiores informações, que a margem de lucro dos fabricantes e revendedores seja aproximadamente igual nestes três países, chegaremos à conclusão que a China consegue produzir o mesmo BigMac por menos de metade do custo do produzido no Brasil, e os Estados Unidos por um custo 26% menor do que o Brasil.
O que significa que nestas condições para assegurar a competitividade do Brasil com a China o dólar deveria estar valendo mais do dobro do seu valor atual, e isso sem considerar os efeitos negativos que uma tal taxa de câmbio produziria na nossa indústria pelo encarecimento das importações (porque a nossa indústria ainda depende da importação de máquinas e equipamentos de produção e de outros insumos, para não falar de hardware e software de informática).
O verdadeiro obstáculo à nossa competitividade são os custos que fazem com que um produto fabricado aqui custe muito mais caro do que o produto equivalente fabricado lá fora.
E estes custos se devem a uma infraestrutura que provoca altos custos de logística, porque as estradas para o transporte rodoviário são ruins, mal projetadas, mal construídas e pior conservadas, porque falta transporte ferroviário e praticamente inexiste o transporte hidroviário e porque a navegação de carga de cabotagem é fraca e os portos são ineficientes. Se devem a um custo financeiro dos mais altos do mundo, a uma taxação também exageradamente alta, a um excesso de burocracia que implica em perda de tempo e custos para as empresas, a uma formação deficiente da mão de obra por causa do baixo nível da educação nas escolas.

Então, com essa estrutura de custos, incentivar o mercado interno pelo aumento do crédito vai apenas fazer com que os produtos importados continuem abocanhando uma grande fatia desse aumento do mercado. Dificultar a entrada dos produtos importados pela imposição de taxas e cotas é uma medida que não resolve o problema da nossa competitividade lá fora, provoca uma retaliação dos demais países que complica ainda mais essa competitividade, e não passa de um paliativo de efeito estritamente temporário para a indústria aumentar sua participação no mercado interno.
O que temos de fazer é o que todos os países que conseguiram melhorar a sua posição competitiva fizeram: investir maciçamente em educação e em infraestrutura, diminuir a carga tributária e reduzir a burocracia. Mas para isso o governo tem que fazer o que não vem fazendo, parar de achar que propaganda e palavras resolvem, reduzir suas despesas de custeio e acabar com o desperdício de dinheiro para poder ter dinheiro para fazer os investimentos que não tem feito e reduzir a carga tributária sobre os setores produtivos para que eles possam fazer a sua parte dos investimentos. E não é um processo que dê resultados imediatos de curto prazo, é um processo longo de efeitos a médio e longo prazo que tem que ser perseguido com obstinação e determinação para reverter o quadro atual de desindustrialização e levar o país a um progresso real que possa também acabar com a oscilação interminável entre aumento de renda e aumento de inflação, onde cada aumento de consumo que deveria beneficiar o mercado interno leva a um aumento de inflação de demanda porque a produção não teve como crescer para acompanhar esse aumento de consumo, o que então provoca um esforço do governo para restringir o consumo pelo aumento dos juros e por aí vai. E isso não é de agora, há décadas que nós todos acompanhamos este vai e vem que tem segurado o Brasil enquanto outras nações com menos recursos naturais e de população têm disparado na frente e se transformado em potências industriais e tecnológicas.

Para quem quiser mais informações, um estudo de janeiro de 2011 da FIESP (http://www.fiesp.com.br/agencianoticias/2011/01/10/desindustrializacao_depecon_29_11_10.pdf) faz uma análise da variação da participação da produção industrial no PIB brasileiro, de 1947 a 2009, prevendo uma participação de 15,9% em 2010. O resultado real de 2010 foi 15,8%, caindo ainda mais em 2011 para 14,6%. Uma análise desta variação mostra que a participação da indústria, que era de 11,27% em 1947, subiu para 13,75% em 1956, quando o presidente Juscelino iniciou a execução do seu "plano de metas", e continuou num forte processo de subida que atingiu seu pico em 1985, com 27,2%. Daí para a frente entrou em processo de descida, com pequenos períodos de inflexão de subida, descendo para 15,7% em 1997.

Com a fortíssima desvalorização da moeda brasileira a partir de 1999, quando o real chegou a valer quase quatro vezes menos do que o dólar no início de 2003 (http://www.indexmundi.com/xrates/graph.aspx?c1=BRL&c2=USD&days=3650), e a consequente diminuição das importações, a participação da indústria ensaiou uma pequena recuperação, chegando a 18,02% em 2002 e 19,02% em 2004, mas daí em diante voltou a descer até os 14,6% do ano passado. É claro que intervieram outros fatores, mas se a taxa de câmbio favorável fosse a solução mágica, a recuperação da indústria entre 1999 e 2003 teria sido muito maior do que o foi.

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