fotografia Moacir Pimentel |
Moacir Pimentel
Por décadas desejamos passar um tempo mais tranquilo em Paris, uma
temporada mais longa para conseguir mergulhar na cultura, descobrir novos
arrondissements, flanar pela beira do Sena, experimentar a vida parisiense como
nativos em vez de ir embora depois de alguns dias com o gosto amargo de quero
mais das atrações culturais e das delícias gastronômicas.
A experiência só foi possível quando passamos três semanas inteiras na
cidade, no apartamento de uma velha amiga, idealmente localizado no 1º
arrondissement, a uma quadra do Louvre e do Jardim das Tulherias.
Foi nessa ocasião, em pleno verão, que descobrimos as melhores coisas
que se pode fazer em Paris começando por sentar no Jardim numa daquelas
cadeiras verdes, ou no terraço de um café e ler um livro e conversar ou apenas
ver o movimento das ruas e dos passantes sem qualquer tipo de pressão ou pressa
para fazer coisa alguma.
Ir à primeira missa do domingo na Notre Dame ou perambular pelos vários
mercados dentro do Mercado das Pulgas de Saint-Ouen ou passear pelo Canal San
Martin. Conhecer as Passagens e descobrir o Marais. Cruzar os pórticos das
arcadas da Place des Vosges e nos deparar com seus inesperados pátios verdes e
depois se encantar durante toda uma tarde no Museu Picasso.
Comer o melhor falafel do mundo – o sanduíche de origem judáica – no
Chez Hannah na Rua de Rosiers ou quem sabe, se calhar, descolar uma baguete no
fastfood da Rue de la Huchette e fazer como os franceses e ir comendo enquanto
o passeio continua.
Maria Antonieta estava errada: pão e brioche são coisas muito
diferentes. Os doces podem até roubar o show quando se trata de estética - nada
bate aquelas vitrines cheias de bolos decorados com brilhantes frutas e creme
Chantilly - mas o pão de Paris degustado ao ar livre é imbatível. E com o patê
e os queijos nativos e os saucissons, e um pouquinho de foie gras com aquela
geléia comprados na padaria mais próxima ou no primeiro andar gourmet da
Galeria Lafayette Haussmann, próxima da Ópera Garnier...
Nossinhora!! Em Paris há que fazer um piquenique na grama ou à beira do
Sena ou até mesmo na cama. Não importa. Só não esqueça o vinho!
No verão em Paris há que se ter paciência com os invasores turísticos,
categoria na qual obviamente não nos incluímos pois somos como traduzem os
chineses “velhos amigos”. Mas em compensação é justamente em julho e agosto que
coisas agradáveis acontecem nos fazendo gostar da cidade e da vida.
Poucas cidades podem rivalizar Paris em herança cultural, artística e
histórica. E poucos povos são tão teimosos quanto os franceses de Paris na
experiência sempre renovada da alegria de viver, especialmente durante os meses
de verão.
Porém um velho mantra de viagem diz para evitar Paris no verão, quando
seus cidadãos tradicionalmente saem de férias. Mas – fala sério! - na realidade
para onde iriam de uma vez os milhões de habitantes da cidade?
Decerto que muitos franceses saem de férias, que multidões de turistas
invadem a cidade, que os preços disparam, que alguns restaurantes e lojas
fecham em agosto, mas nada que prejudique a festa. A dica é não ir aonde os
turistas vão e fazer o que os nativos fazem.
Tem sempre um programa, um festival, uma feira rolando - flamenco,
artistas no trapézio, dançarinos folclóricos, música, teatro e cinema – por
todos os cantos da cidade e muitas das apresentações são ao ar livre.
Algumas das melhores atividades de verão ocorrem ao longo do Rio Sena, a
majestosa artéria serpenteando pela cidade. Os parisienses têm o hábito de
bicicletar e de se deixar ficar em piqueniques e conversas e risadas sobre as
pontes e nos quais e nos taludes do rio, notadamente naquela hora mágica quando
o sol começa a desistir de colorir o céu da noite. Mas a briga é longa: mesmo
às vinte e uma horas, as águas do Sena ainda refletem os edifícios orgulhosos à
sua beira.
O verão significa arte após o anoitecer: alguns pontos turísticos - como
a Torre Eiffel e a Catedral de Notre-Dame – funcionam até mais tarde, vários
Museus continuam de portas abertas à noite e no Parc de la Villette filmes são
vistos por centenas de pessoas sentadas sobre mantas na grama.
As bandas de rock e os festivais de jazz agitam os quadris da galera em
múltiplas paragens. Para não falar do repertório clássico dos concertos do
Parque Floral que praí há uns vinte anos permitem que todos possam experimentar
a emoção da música clássica em todas as suas formas.
Bem ao lado da Notre-Dame há uma galeria de arte ao ar livre. Aliás,
depois que o sol se vai, a Catedral conta com sons e luzes a sua história para
quem quiser ver.
Muitas igrejas antigas da cidade hospedam concertos de música de câmara
à noitinha e as fontes de Versalhes jorram iluminadas sob fogos de artifício.
Os engenheiros de Luís XIV literalmente redirecionaram um rio para abastecer
aquelas fontes que mesmo para os padrões de hoje continuam impressionantes.
Ao norte da Île de la Cité a prefeitura anualmente despeja duas mil
toneladas de areia à beira do rio para inventar uma praia temporária onde os
parisienses jogam frisbee, vôlei ou pegam “aquele bronze” (rsrs). Na Pont des
Arts além dos cadeados apaixonados tem sempre uma performance acontecendo.
fotografias Moacir Pimentel |
Os artistas de rua estão por todos os lados: posando de estátuas,
brincando com marionetes e até fazendo embaixadinhas pendurados em postes.
Os parques são invadidos pelas crianças grandes que se divertem com as
boules e com as verdadeiras que se dividem entre os passeios de pônei, os
barquinhos de aluguel, os brinquedos, os carrosséis, a música ao vivo, os
quiosques de comida. E viva os crepes e sorvetes e qualquer comida de rua!
É uma maravilha passar o dia todo perambulando pelas livrarias do
bairro: a Colette na Rua Saint Honoré ou a Galignani tão elegante à moda antiga
desde que nasceu em 1810 debaixo de uma arcada da Rua Rivoli. Para não falar da
WH Smith com tres andares repletos de tesouros localizada em frente ao Jardim
das Tulherias a poucos passos do Louvre.
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É uma delícia fuçar os livreiros ao longo do rio Sena, pescando preciosidades como velhas revistas de quadrinhos do Tintin ou da dupla
Asterix e Obelix ou postais irresistíveis em p&b. E não se pode esquecer
dos sebos.
De posse dos livros cuidadosamente escolhidos é hora de passar no
Angelina, também na Rua de Rivoli, que tem fama de ter o melhor chocolate
quente de Paris - há quem discorde! - mas uma coisa certa: é muito muito bom.
Se bem que lá só preciso mesmo é de um bom expresso para viajar para a
Belle Époque sem dar a mínima para a multidão de japoneses antecedidos pelas
longas lentes das potentes câmeras fotografando os biscoitinhos no balcão.
Mas prefiro disparado não fazer nada no primeiro andar do centenário
Café Verlet, que mora a uma quadra da Comédie Française e onde os grãos de café
ainda são moídos para inglês ver e se bebe o café saboreando uma fatia de bolo
de laranja.
O certo é que, quando em Paris, todos os dias passamos pelo Jardim das
Tulherias. Saindo ou voltando lá está ele, rodeado por tudo que gostamos: o
Musée d'Orsay lá na outra margem do rio Sena, as arcadas da Rua de Rivoli, o
Louvre e a Praça de la Concorde.
Um dos mais agradáveis passeios que se pode fazer em Paris é atravessar
os Champs Élysées na direção da Praça da Concórdia visitar a Praça e entrar no
Jardim...
Mas isso já é outra conversa. Enquanto isso, vale dar uma espiada aqui:
https://www.youtube.com/watch?v=62NhNbXPEPI
https://www.youtube.com/watch?v=62NhNbXPEPI
ResponderExcluirA verdade é que eu não ia saber nem por onde começar se pudesse passar semanas em Paris. Sou medrosa, Moacir. Morro de medo quando estou no estrangeiro sem conhecer nada. Ficar incapaz de me comunicar me torna dependente e preciso de babá. Ia terminar fazendo pique-nique na cama do hotel todos os dias kkkk As fotos das pessoas na 'praia' e noutras atividades culturais são um barato. Temos sol e praia de verdade aqui mas e a segurança? Saímos de casa cada vez menos e evitamos multidões. Sorte a de vocês poder curtir tudo isso em paz. Obrigada por dividir conosco estes belos momentos!
Mônica,
ExcluirConfesso que desse seu medo eu só ouvi falar. É que sou metido à besta e me considero cidadão do planeta Terra. (rsrs) "Ademais", como diz a Donana, os tais dos "apps" hoje traduzem a comunicação básica e de fome você não morrerá : os cardápios são poliglotas.
A barreira da língua é mais preocupante em países onde somos analfabetos como naqueles árabes que escrevem da esquerda para a direita ou no Japão e até na Grécia. No entanto acredite que, entre mortos e feridos, todos se salvam e felizes.Os humanos peritos em fazer contato.
Por fim, embora nossa casa seja o melhor lugar do mundo para se jogar conversa fora - descalço e sentado no chão! -, e violência urbana nos faça repensar antigas rotinas e tomar certos novos cuidados me recuso a ser um prisioneiro das minhas paredes.
Abração
1) Bom texto Moacir !
ResponderExcluir2) O belo verão parisiense chegou às minhas teclas, leitura boa acabei sentindo o clima nesta ensolarada manhã carioca outonal.
3)E viva o Budismo Francês (li outro dia que é a terceira religião da França: 1ª Catolicismo; 2ª Islã).
Antônio,
ExcluirCoincidentemente estou rascunhando - com direito a fotos budistas - sobre um belo país onde o budismo está por todos os lados já que é praticado por 80% da população. Mais não digo, mas aguarde...
Abração
Moacir,
ResponderExcluirGosto muito do que você escreve sobre Paris porque é de coração. No artigo de hoje destaco a linda foto dos anjinhos. Somente um amante das artes perderia tempo fotografando um cartaz sobre esculturas! Espero continuar passeando pelas delícias do seu verão parisiense.
Um abraço para você
Flávia,
ExcluirMinha saudosa mãe tinha muito amor e admiração pela velha França. Eu e meus irmãos crescemos entre os poemas de Baudelaire, Verlaine , Rimbaud e Jacques Prévert e as histórias de Victor Hugo e Dumas e os LPs de Édith Piaf, Charles Aznavour, Johnny Hallyday, Sylvie Vartan e Mireille Mathieu. Então, desde a primeira vez que botei os pés na cidade - @#$%&@! - foi mais do que amor à primeira vista,foi como se eu a reconhecesse ,como se já tivesse estado lá. Um mais que perfeito déjà vu ,um reencontro com amigos de infância (rsrs)
Quanto ao cartaz ele estava colado ao lado da entrada do Museu do Louvre que dava para o Museu dos Antiquários recentemente fechado.Tivemos muita pena de não poder ver a exposição florentina divulgada por todos os lados. E essa é uma das maravilhas de se estar em uma cidade européia. A cultura e a arte são valorizadas. Para saber sobre as ofertas culturais basta usar o metrô ou dar um passeio em um daqueles busões vermelhos e descabotados por qualquer cidade para saber que exposições estão rolando e onde. E, via de regra, terminamos vendo a Frida em Roma e a Paula Rego em Londres (rsrs)
Outro abraço
Paris é Paris e você a descreve muito bem. Merci et à bientôt.
ResponderExcluirMárcio,
ExcluirObrigado pelo incentivo e volte sempre que puder ... a Paris!
Pimentel,
ResponderExcluirApesar do link postado ser de uma beleza indescritível porque mostra Paris em sua exuberância, teus textos tem a mesma qualidade pelos detalhes e informações que ofereces ao público.
Com ou sem filmagem que enalteça e confirme os dados que te referes nos artigos, reverencio sempre o teu talento em reproduzir com fidelidade absoluta os cenários parisienses, dignos de quem conhece a Cidade Luz como poucos e que distingue o turista que prioriza a beleza, a cultura, a tradição de lugares para onde viaja e que se transformam em memórias inesquecíveis.
Agradeço compartilhar contigo esses textos tão reveladores de uma cidade que extrapola a sua nacionalidade, a ponto de ser considerada patrimônio da Humanidade, e que uma das figuras mais horrendas criadas pelo ser humano, Adolf Hitler, curvou-se à sua importância e magnitude, poupando-a de destruição!
Mais um artigo que copio e arquivo, claro, aumentando a minha coleção sobre Paris de forma significante.
Um forte abraço.
Saúde e paz.
Bendl,
ExcluirVocê mencionou em um dos seus comentários, faz tempo, que lia esses meus rascunhos sobre Paris munido de uma mapa da cidade e entrando e saindo do Youtube. Bravo! Então saiba que os vídeos têm um destinatário certo (rsrs) E continuo esperando por mais dos seus ótimos textos.
Muito obrigado pelo generoso comentário e um grande abraço
Pimentel,
ResponderExcluirBelo post e boas dicas de livrarias e passeios já anotadas para uso futuro, se Deus quiser.
Sampaio,
ExcluirObrigado pela leitura. E quando for ao Marais não deixe de passar no Chez Hannah e de experimentar o melhor falafel do mundo.
Olá Moacir,
ResponderExcluirVocê é como o bom vinho, cada vez melhor?
No verão, outono, primavera ou inverno, dizendo de escadas, becos ou museus, de queijos ou crepes ou patés, pães ou doces, de rios, bandas de rock ou de arte. De Paris, de Lisboa, de qualquer lugar. É sempre bom ler você!
O Senhor Redator disse que isso é puxação de saco. Mas você merece.
Até mais, sempre.
Caríssima Donana,
ExcluirAssim a senhora me deixa sem jeito e sem saber o que lhe teclar! É claro que o senhor Redator está equivocado mas eu certamente não sou merecedor da sua generosidade. Permita-me dizer-lhe de coração e budisticamente apenas:
"Gratidão"
ResponderExcluirÓtimo post com muitas informações interessantes