Heloisa Pires Ferreira - Bordado |
Antonio Rocha
Em 1980 eu e Heloisa fomos passear na belíssima cidade de Castelo
Branco, norte de Portugal.
Assim que descemos do ônibus, olhei para o chão e vi as calçadas
decoradas com aquelas pedras portuguesas apresentando pássaros e flores as mais
variadas, os mais variados.
Então exclamei:
- Olha os teus pássaros aí. No teu
inconsciente, as origens deles estão aqui.
Desde que começamos a namorar, em 1974, Heloisa dizia que sua família
Pires Ferreira e os Castellos Brancos eram primos. Não sei se com um “L” ou
dois. Quem sabe lá na formação do Nordeste brasileiro, com certeza os dois
ramos familiares se encontraram?
A foto que ilustra a matéria de hoje é um bordado de Heloisa. Pode ser
um pássaro, pode ser umas folhagens, pode ser algo não identificável e cada um
ou cada uma interpreta como quiser. Faz parte da leitura da Arte, da
experiência que temos com o fazer artístico.
O bordado me lembra a Arte da Tapeçaria do antigo Oriente. As tapeceiras
da Ásia. Mas nosso Nordeste também tem as bordadeiras.
Identifico nestes pontos bordados os detalhes de nossas vidas, as vidas
de todos nós seres humanos, e não só as vidas minha e de Heloisa. Detalhes,
passagens, tramas, tessituras, tecidos, tecendo = te sendo...
O que é que estamos sendo e tecendo nesta existência?
De imediato, lembro fantasiosamente, os tapetes voadores das histórias
infantis. Mas, simbolicamente eles voam sim. Eles nos levam, ela que borda, ela
que faz, para interiores, inconscientes vastos. Eu que contemplo, embelezo-me
admirando a agulha que vai furando aqui e aparecendo ali um desenho que ela nem
sabe o que é, mas que aos poucos vai tendo forma, vai tendo vida. É a forma e o
conteúdo de que falam alguns teóricos da Arte.
Eu? Limito-me a caminhar em cada cor, em cada nozinho, em cada ramo ou
rama da também possível folhagem. Grandes pássaros, pequenos pássaros, médios
pássaros. Em alguns o tecido escolhido foi bem liso, em outros já apresenta uma
área um pouco mais fértil de possibilidades interpretativas, leiturais.
E a cauda? Pode ser, mas também pode ser um ferrão, para dar ferroadas e
se defender. Espinhos no caso de planta. Os olhos miram a frente, seguem para o
alto.
Lembrei que uma vez, ainda solteiro, um monge budista do Sri Lanka leu a
minha mão e disse que eu ia casar com um mulher do Oriente.
Faz sentido, vejo nas Artes de Heloisa algo da Ásia Central, da antiga
Pérsia, motivos bem coloridos da Mongólia, do Tibet e daquela região do
Himalaia. Estados de Ladak, Sikkim e Cachemira que pertencem à Índia, são quase
que majoritariamente budistas, seguem o chamado Vajrayana ou Veículo do
Diamante, também conhecido como Lamaísmo. Como essas regiões são muito frias,
para esquentar os olhos e os corpos e a vida, os tapetes, que eles chamam de
Tankas, tem um profusão de cores marcantes.
Leram? Viram? Foi só eu embarcar nas visões que o bordado me proporciona
e já fiquei viajando por terras nesta vida ainda não caminhadas. Nas vidas
anterior quase que afirmo sim. O “quase” é porque ainda não tenho a certeza
matemática, só terei do outro lado, então peço permissão ao Mano, para quando
chegar na outra dimensão enviar algumas notícias daquelas bandas...
Aliás, em sânscrito “bandha” significa “união”!
Pelas amizades estamos unidos. Pelas Artes idem!
Caro Rocha,
ResponderExcluirBelíssimo texto!
E mais valorizado ainda porque utilizas um trabalho da tua esposa para nos relatares as tuas viagens espirituais, o que sentes com relação ao Budismo na tua existência, e a forma como compreendes este contexto entre esta vida e de encarnações pregressas.
Parabéns pelo artigo, pois de muito bom gosto, otimamente escrito e, mesmo eu não concordando com alguns aspectos do Budismo, desta vez o que escreveste não tenho qualquer ressalva, pelo contrário, somente elogios e consideração.
Um forte abraço.
Saúde e paz.
1) Obrigadão Chico !
Excluir2) Valeu o estímulo. E cá estamos nós falando um pouco de cada vida.
3)Se elas existirem ótimo.Se não existirem, fazemos ficção, arte da escrita com elas.
4)Abraços !
Que bonito, Antônio!
ResponderExcluirO tapete, as terras ainda não andadas, as palavras e a sua história com a Heloísa! Uma belezura! A arte do tapete não precisa ser nada, basta ser.Parabéns para a Heloisa.
Adoraria receber mensagens de outras vidas, mas passear pelo mundo, prefiro fazer nesta! Muito mais interessante!
"Gratidão". Até mais.
1)Oi Ana, quem sabe ainda nesta vida, vc recebe mensagens de outras vidas ...
ResponderExcluir2) É isso aí, basta ser... não apenas quanto à arte do tapete, mas a uma série de coisas.
3)Sempre quis ser um turista intergalactico (não confundir com o chocolate Galak)então eu estava contando esses meus planos siderais para a minha filha, ela devia ter uns 5 anos e lá pelas tantas ela exclamou:
4)"ô pai, me espera que a gente vai junto"...
Uma beleza, Antonio, tanto o bordado como a sua descrição de você vendo a Heloísa bordar. É um privilégio que nós dois partilhamos ser casado com uma artista e assistir ao processo de criação.
ResponderExcluirE, se pelos caminhos da vida, você mudar de dimensão antes de mim, claro que tem toda a permissão para nos contar aqui no blog como vão as coisas por lá.
1)Oba ! ganhei o fim de semana.
ResponderExcluir2) Vou realizar meu sonho.
3)Já pensou: "Amigos do Blog, hoje escrevo diretamente dos anéis de Saturno"...
4)Prezados leitores, hoje lembrei do Moacir, estou visitando uma Galeria de Arte no planeta Mercúrio...
5) Outro dia, leitores espaciais, vi o Chicão questionando uma decisão do São Pedro ...
6) Me aguardem ...
E os seus posts vão começar com: Hello Earth!! (rsrs) Bem, enquanto ainda somos vizinhos de planeta, dou-lhe os parabéns pelo seu post intergalático que muito me agrada mas por motivos terráqueos.
ResponderExcluirPrimeiro pela arte da Heloísa, mais um dos belos pássaros misteriosos dela, que me remete,talvez pelas cores,a uma gravura que temos do Brennand de um Pássaro Rocca, fugido das Aventuras de Simbad, onde valentemente defendia seus ovos dos marinheiros e piratas.
Da parede da sala você me levou para Portugal, para a calçada portuguesa , uma arte em vias de extinção. Tenho muitas fotos das calçadas, notadamente de Lisboa e do Porto, mas da última vez que cliquei-as , em dezembro passado, foi em Matosinhos, onde resolvemos almoçar uns peixinhos honestos e fomos surpreendidos por um Festival de Poesia, que estava rolando justamente pelas calçadas, onde não se via pássaros mas se lia versos pintados e escritos. Bonito!
Por fim, porque ao descrever o bordado “o desenho que vai adquirindo forma e tendo vida”, você nos falou da caminhada de vocês dois,de uma vida construída passo a passo e ponto a ponto, que traduz perfeitamente o significado aquilo que, em sânscrito, se diz “bandha”.
Abração
1) Salve Moacir, obrigado pelas palavras e pelo incentivo.
Excluir2) Sugiro então que escreva sobre as calçadas portuguesas, com as devidas fotos.
3)Abraços de união literária e fraterna !