Moacir Pimentel
Era tão famosa quanto a sua arte a mitologia amorosa do artista
Francisco Brennand, notadamente com as suas modelos. Em dezembro de 2016 o
artista publicou finalmente os seus diários, cinquenta anos de memórias rascunhadas
entre 1949 e 1999 em quatro volumes e um total de duas mil cento e noventa
páginas. Os três primeiros volumes foram batizados de “O Nome do Livro” porque
por décadas vendo-o escrever tão diligentemente os amigos lhe perguntavam “qual
seria o nome do livro”. O quarto volume que se chama “O Nome do Outro” é um
acerto de contas com o passado, só que feito através de personagens fictícios.
E a lenda continua! (rsrs)
Brennand nos seus escritos nos assegura que, se Van Gogh não tivesse
escrito aquelas cartas, ele não teria sido considerado tão genial por todo
mundo e esclarece que foi a emoção que experimentou ao ler o livro “Noa Noa”,
um registro das impressões do pintor francês Paul Gauguin sobre o seu exílio na
Polinésia Francesa, aquilo que o inspirou e motivou a começar a rascunhar o seu
próprio diário.
Brennand concluiu que jamais poderia saber apenas olhando para as
maravilhosas telas de Gauguin que “noa noa” era o perfume exalado pelas
mulheres taitianas - “meio animal, meio vegetal, um cheiro de sangue misturado
ao das gardênias que usavam nos cabelos”- descrito pelas pretinhas de Gauguin.
Ao terminar a leitura começou a escrever no navio que levava a ele e a esposa
Deborah para a mesma Paris da qual Gauguin fugira.
Desde então Brennand tem escrito diariamente e desejado publicar os seus
rascunhos.
“Quantas vezes abro este caderno, aturdido
pelas lembranças e pronto para iniciar o que tantos outros artistas, escultores
e pintores fizeram em grande parte de suas vidas!”, escreveu Brennand na primeira página.
E questiona:
“O que posso pedir mais da vida? Nada.
Passei a vida inteira com desejo de publicar isto. Não há escritor que não
escreva com a intenção de publicar. Borges diz: “o leitor é o autor duplicado”.
Para viver as peripécias que narra Brennand precisou de muito talento e
fôlego para nos contar de viagens, amores, amigos, inimizades, livros,
aprendizados, processo criativo, a morte da companheira do cisne que habita o
lago da Oficina e os seus encanto e paixão pelas mulheres que às vezes beira à
misoginia (rsrs)
“A maioridade espiritual da mulher é a
concepção e suas consequências (...) Só a Mãe Natureza percebe aquilo que elas
de fato sabem. Sabedoria totalmente oculta à percepção dos homens. No final das
contas, ficamos empatados, embora não exatamente iguais”.
O artista, que agora tem também leitores entre os seus fãs, jura que
escreveu muita tolice e que se arrependeu, sobretudo, dos cadernos preenchidos
entre os anos de 1963 a 1973, os quais queimou na “cabeça do forno” junto com
suas peças de cerâmica. Aquilo não me pareceu apenas um diário mas antes um
retrato do seu mundo da lua com histórias realmente especiais, que se misturam
e vão nos atropelando:
“As histórias me embrenham pelos ouvidos,
elas me fascinam e eu não me esqueço delas.”
Os diários são incrivelmente reveladores do homem e, é claro, do
artista. Se quando escreve Francisco Brennand continua esculpindo quando
desenha ele pinta e, sem dúvida, foi muito gratificante para nós entrar em
contato com a pintura dele na sua totalidade, quando a Accademia foi inaugurada
na Oficina. Até então dele só conhecíamos as gravuras, tramas em linhas
incisivas e cores que muito variaram através de décadas.
Os desenhos do artista são muitas vezes realizados em técnica mista, com
uma sensível dominância do pastel, e neles o que salta aos olhos do espectador
é a importância das cores.
Os quadros de Brennand falam de tudo: mulheres, naturezas mortas, flora
e formas vegetais. Ele prefere os esboços e estudos preparatórios de suas telas
às obras concluídas. É sabido que o artista geralmente parte de uma fotografia
de seu tema e que lhe servem de modelos os familiares e funcionários.
Paisagens e animais não estão ausentes nas pinturas e desenhos de
Francisco Brennand, e com alguns exemplos magistrais, como na série “Os Peixes”
onde ele quase adentra o surrealismo. Mas a figura humana domina, especialmente
a figura feminina, trabalhada de todas as maneiras possíveis, das mais
naturalistas às mais expressionistas, do nu a todas as etapas do desnudamento e
nas mais variadas situações e idades e ambiências.
Nas suas telas é constante a presença de figuras femininas que são retratadas
ora como se estivessem posando para Brennand, ora como se desconhecessem que
estão sendo observadas.
Mais uma vez Mestre Ariano Suassuna traduz o amigo
“Os pintores aprendem o segredo das cores
e vernizes brilhantes, para acariciar tecidos finos, captam a carnação das
mulheres, enfeitando-as de jóias para maior sedução. Por meio de desenhos
descuidados e cuidadosamente dúbios, imobilizam as folhas e os frutos
sumarentos, surpreendidos em seu eterno oferecimento. E por aí vão.”
Pequenas figuras de vastas barbas brancas se encontram em muitas das
cenas fazendo-nos torcer para que, caso cheguemos a tão avançada idade, nos
reste a metade da força do olhar do pintor tão bem descrito por Ariano.
Às vezes, nessa celebração surge a figura do pintor, discretamente,
dissimuladamente auto retratado. Há nas pinturas de Brennand, aí sim, um
erotismo violento, às vezes criado puramente pela imagem, às vezes pelo
conceito anexado a ela.
Aliás, a fábula da Chapeuzinho despertou a curiosidade do público, como
nem mesmo suas abordagens anteriores da Suzana e os Velhos ou da Alice no País
das Maravilhas, conseguiram. Tratando-se de um confesso admirador de Balthus, a
curiosidade é compreensível (rsrs)
Certos temas são recorrentes nas pinturas de Brennand, como as garotas
muito jovens, as ninfetas e lolitas, como, por exemplo, nas séries das
Chapeuzinhos Vermelhos e das Ginastas, nas quais o artista já assumiu que é o
“Lobo Mau”.
Mesmo sendo autor personalíssimo, há algumas influências cristalinas nas
telas e desenhos de Brennand: a de Balthus, com quem compartilha a atração por
uma certa mise-en-scène oblíqua, às vezes lampejos de Egon Schiele, e até mesmo
uma ou outra pincelada de Klimt.
Numa série como “O Beco” - beco que de fato existe na Oficina Brennand -
ele vai quase ao mais violento expressionismo
Sobre a sua mais recente pintura, diz Brennand:
“Nada procurem de “tropical” nos meus
quadros da idade madura, perdido no labirinto do lobo como prefiro me
encontrar, aqui na Várzea às vezes tão sombria nos fins de tarde”.
Os seus quadros mais modernos feitos com tintas acrílicas sobre tela têm
um ambiente incerto e enevoado, quase abstrato e tão noturno quanto as
paisagens inglesas de onde veio o primeiro dos Brennands do clã brasileiro.
Certas obras, no entanto, não evocam o erotismo como pode parecer ou se
tenta comprovar. Não estou falando, é claro, daquelas telas nas quais o assunto
é notoriamente “aquilo”,
mas especificamente daqueles desenhos em que mesmo a representação do nu
feminino não aponta para tal aspecto da sexualidade. Naqueles cuja temática não
é alegre, mas sim filosófica, e sua filosofia conduz às dores da condição
humana.
“Quem disse que o artista procura fugir do
sofrimento?”
Pode soar estranha uma tese em que se tente separar a interpretação
plástica do corpo nu de sua conotação erótica, só que a representação do nu
feminino nas telas e esculturas de Brennand mesmo quando estão ligadas a
sexualidade, fala da natureza humana.
O que Brennand tenta comunicar é que em alguns momentos nas suas telas a
nudez parece pedir perdão, ou a expiação dessa tristeza que ele descreve. Em
outros momentos, a nudez explícita está muito mais presente num rosto, em um
olhar pedindo piedade e compreensão.
Sobre o assunto escreveu Mestre Ariano
“Não é portanto de se espantar sendo o
sentido da visão o ponto de partida desse anseio sensual e quase obsceno de
posse, que o desejo culposo que deveria vir à tona diante de um corpo feminino
apareça, em vez disso, diante da forma onírica de uma flor que se abre ou de um
fruto que se entremostra. Ou que, pelo contrário, tal mulher que se oferece
tenha algo de cândido em sua animalidade".
E nos diz o artista:
“Um corpo nu também pode ser a metáfora ou
a imagem da mais profunda tristeza, da rendição de todas as vaidades, do desejo
e da consciência de sermos apenas esse corpo”.
É isto o que acontece, por exemplo, com a série de mulheres mulçumanas
que, entre as demais, pareceu-me mais um símbolo da inquietação do artista com
o embate entre humano e o divino. Nestes desenhos, os limites entre a religião
e o humano nos questionam.
E a mulher, de quem mal distinguimos as formas sob o manto e a burka -
que lhe cobre a cabeça e apaga a identidade - é retratada por Brennand sempre
de forma a não poder negar o inevitável: a existência de seu corpo.
A forma se rebela e luta contra a anulação. Por isso, através de tantos
quantos forem os panos a encobrir-lhes as vontades, as linhas e gestos femininos,
as formas daquelas figuras são como gritos de insurreição ou ainda gemidos que
denunciam ali a presença de uma mulher.
Se na fragmentação das formas humanas em sua escultura Brennand nos guia
através de uma espécie de “templo de sacrifícios”, sua obra desenhada e pintada
é uma homenagem à mulher, essa mulher que é, em todos os mundos do artista– o
real, o pictórico e o escultórico - o centro de tudo.
Desde as primeiras figuras acadêmicas, passando pela fase floral e as
paisagens e naturezas mortas, é a mulher, das mais diferentes idades, uma
obsessão do artista.
Às vezes temos a impressão que seus desenhos são tarefas de casa, que as
tais “desconstruções” são o real objetivo, mais importantes que o tema, como se
ele precisasse do exercício do traço e da pintura para não perder o faro.
Percebe- se uma busca do gesto primitivo, talvez anterior mesmo ao risco
rupestre, só existente nos desenhos das crianças.
Tal qual nos rabiscos de nossos netos, não se pode desvendar a figura,
definir o sexo, saber se houve crime ou se é só pesadelo mas uma coisa é certa:
Brennand parece buscar a dor humana.
Que Brennand é um sedutor, não se tem dúvidas. Mas ele é também,
sobretudo, um homem esotérico, um místico que transforma todas as suas
expressões criativas, do desenho à pintura, da cerâmica à escultura, em
símbolos que não estão desprovidos de sensualidade – não há anjos nas nossas
praias! mas que nos expressam uma perplexidade comovente e estão muito próximos
da forma de religiosidade dele – seja ela qual for.
Brennand é um construtor, um arquiteto, que utiliza de forma extremada o
seu instinto de jogo, de vida e morte e nos entrega um universo de grande
riqueza plástica.
Um senhor feudal que não vive longe da sua terra, um animal metafísico,
um cavalheiro do século passado, um amante da beleza “em convulsão” que, com
sentimento, paixão e intuição, ele mantém viva nas suas paragens. Na Oficina
Francisco Brennand reconhecemos um lugar luminoso. Cada uma de suas obras
guarda um segredo que é importante revelar, porque essas figuras são partes de
um todo infinito.
Quem enxerga “pecado” original nas obras do artista, o faz sem ter
realmente visto aquela velha olaria banhada pelo sol.
É pela arte que Brennand se comunica. Mas olhando para a obra dele,
lendo sobre ela, tentando descrevê-la, nunca chegaremos à verdade, pois fazemos
leituras circunstancializadas por nossa individualidade, por nossa formação,
por gosto e valores, que nos impediriam de ver o mundo que Brennand percebe. No
conjunto, a sua arte é uma resposta a uma realidade interna labiríntica e a um
mundo externo conturbado. Por isso, a sua beleza é terrível.
É a mesma beleza das máscaras africanas, dos desastres da guerra
pintados por Goya, da carnalidade sagrada e do sangue e do terror da via crucis
do Aleijadinho, das luzes em redemoinho das Noites Estreladas de van Gogh, das
cores do Grito de Munch, da antropofagia de Tarsila do Amaral, da abstração das
Ninféias de Monet, dos planos e cortes das Senhoritas de Picasso, da melancolia
da obra de Farnese de Andrade.
Este tipo de belo não se mede por regras ou por cânones – mede-se pelo
efeito que causa. Talvez falte a Brennand um tanto de piedade, mas ele não é um
apologista pagão da vida. Entendo a arte de Brennand como um ato de vida, uma
negação da morte, um exercício de resistência, como a dos primeiros pintores
rupestres desse mundo que, tenho certeza, ou eram xamãs ou iniciados nessa
aventura.
Contudo, contemplando as pobres degoladas, as personagens mitológicas e
históricas, as grandes cabeças, os totens e a carnificina no universo da
sexualidade, não tenho dúvida de que Brennand olha também - e assustado - para a
morte, a eternidade, o infinito. Todos o fazemos.
As metáforas criadas por Brennand no seu imenso repertório de obras são
inesgotáveis. Ele e a natureza nos surpreendem e permanecem incompreensíveis na
exaltação, numa espécie de orgia, de frevo, de fervor, de ode carnavalesca à
beleza e à reprodução. Depois de tanto escrever percebo que a arte de Brennand
continua inexplicável. Recuso-me a continuar tentando fazer com ela o que
aquele personagem de um dos poemas de Machado de Assis fez com a bela e mágica
Mosca Azul.
Dissecou-a,
A tal ponto, e com tal arte,
que ela,
Rota,
Baça, nojenta, vil
Sucumbiu;
E com isto esvaiu-se-lhe
Aquela Visão
Fantástica
e sutil
Brennand é Brennand e é ele quem termina por mim este artigo:
“Comer argila pode ser um caminho para a
salvação. Eu estou sozinho, assim como o dia em que nasci, antes do que todos
nós temos que fazer um dia. Aceitar o
inevitável.”
1)Belo texto, belas fotos, belas modelos. Parabéns Moacir ! Não resisti e fui à web:
ResponderExcluir2)https://www.ebiografia.com/francisco_brennand/
3)Então descobri, entre outras, que ele faz aniversário no próximo dia 11 de junho.Felizes Aniversários desde já, Felizes Saúdes, Felizes Artes Brennand !
4)Voltemos ao Pimentel: só agradecer a bela oportunidade de estar lendo e aprendendo com o excelente crítico de Arte do blog Conversas do Mano.
5) Apreciar e Vivenciar !
Vizinho Antônio,
ExcluirVamos agradecer é ao grande Francisco que, no próximo dia 11, completará 90 anos e ainda está lá na sua Oficina apoiado numa bengala, mas comendo barro e brincando com tintas e escrevendo e fazendo sabe-se lá mais quais "artes".
Abração
Olá Moacir,
ResponderExcluirBelo e rico texto .
Interpretações interessantes e reveladoras da arte de Brennand que eu desconhecia. E de que agora quero saber mais. Uma arte sempre cheia de pulsões, do sexo e da morte, que na verdade,são tão próximos, atados pela "dor humana".
Você diz que é" pela arte que Brennand se comunica. Mas olhando a obra dele nunca chegaremos à verdade, pois fazemos leituras circunstancializadas por nossa individualidade".
Ontem conversava com cunhadas e sobrinhas, éramos quatro em torno de uma mesa quando, lentamente nuvens encobriram o sol da tarde e fui percebendo a mudança da luz, o ensombrecer gradual nos rostos conversados. De brilhantes se tornaram cinzas, e depois mais cinzas, as linhas se curvando para baixo, as bocas, os olhos ficando nitidamente mais tristes. Na verdade, qual era a verdade se um pouquinho de nuvem mudou tudo? Antes ou depois?
Que dizer então do nosso olhar sobre uma obra de outro olhar?
Bom sábado de sol, de praia e caminhada e até mais.
Caríssima Donana,
ExcluirDifícil essa sua pergunta de poetisa:
"Éramos quatro em torno de uma mesa quando, lentamente nuvens encobriram o sol da tarde e fui percebendo a mudança da luz, o ensombrecer gradual nos rostos conversados. De brilhantes se tornaram cinzas, e depois mais cinzas, as linhas se curvando para baixo, as bocas, os olhos ficando nitidamente mais tristes. Na verdade, qual era a verdade se um pouquinho de nuvem mudou tudo? Antes ou depois?"
Acho que a verdade é a beleza da SUA visão daquela conversa antes e depois e durante. Sobre isso já falou o John Keats:
"Eu de nada tenho certeza, a não ser da realidade das afeições do coração e da verdade da Imaginação. A beleza apreendida pela Imaginação deve ser verdade."
E sim, porque hoje é sábado vamos ao sol e aos nossos e às obras de arte precoces do netinho e ao vinho!
"Até mais" poesia.
Disse tudo, Moacir! Gostei de saber que eu não falei bobagem sobre os quadros dele terem um erotismo que não vi nas estátuas. Você explicou tudo muito bem mas acho que só mesmo visitando o lugar pra entender do que você está falando. O 'conjunto da obra' é que é impressionante. Obrigada!
ResponderExcluirMônica,
ExcluirSim, você tem razão sobre "o conjunto da obra" e as diferentes abordagens da sexualidade que Brennand comete nas suas cerâmicas e tintas.(rsrs) E já que conheceu a Accademia deve ter notado que por lá moram pinturas mais importantes do que aquelas que usei para ilustrar o post. É que, infelizmente, não é permitido fotografar as telas , diferentemente das esculturas. De resto muito obrigado lhe digo eu pelas leitura constante e boas palavras.
Abração
ResponderExcluirMoacir,
Eu já gostava das obras de Brennand antes de começar a ler seus artigos. Mas adorei saber mais sobre a história do homem e a formação do artista. Achei perfeitas todas as suas colocações sobre a arte dele e parabenizo você pelo jeito sereno como fala do erotismo e da espiritualidade na pauta de hoje. Destaco as palavras:
'Comer argila pode ser um caminho para a salvação'.
Um grande abraço
Flávia,
ExcluirDepois de lhe agradecer pelas boas palavras vou começar pelo fim, pelas palavras do velho senhor:
"Comer argila pode ser um caminho para a salvação".
Bem, Na minha leitura até aqui o "caminho da salvação" dele foi mesmo e literalmente o barro. Brennand conta como um belo dia voltando da propriedade do pai se deparou com a estradinha de barro que levava às ruínas da antiga Olaria da família. Ele tinha quarenta e cinco anos e era conforme as suas próprias palavras "completamente irresponsável". Naquela trilha enlameada porém ele não se perdeu, não tomou o "caminho errado" como na famosa metáfora de Dante no Primeiro Canto do Inferno...
“Da nossa vida, em meio da jornada,
Achei-me numa selva tenebrosa,
Tendo perdido a verdadeira estrada”
Ele atravessou a ponte e contemplou a Olaria de sua infância e - Fiat Lux! - na meia idade esse homem atormentado pela própria criatividade que não dava conta de expressar, esse escultor, desenhador, muralista, tapeceiro, pintor, arquiteto, poeta e escritor, perdido no mundo dos outros, reencontrou o seu menino comedor de barro e, desde então, segue no caminho certo. A única condição imposta pelo pai para entregar ao filho as terras e as ruínas da Olaria foi que para tocá-las o artista jamais voltasse a pedir a ele ou aos irmãos ajuda financeira.
E então nasceu a Cerâmica Brennand com três fornos , dois dos quais queimam pisos e revestimentos e a bela cerâmica utilitária enquanto que o derradeiro faz artes. A Cerâmica, ao tornar-se um sucesso comercial, viabilizou a Oficina e significado e propósito para a vida dele e um mundo da lua e um museu para as estranhezas que o criador compulsivo passou a poder concretizar.
Outro abraço para você
Sem diminuir o brilho do texto e o mérito da arte do grande "animal metafísico" Brennand, nas fotos o lado animal é bem mais evidente que o metafísico hehehe
ResponderExcluirMárcio,
ExcluirEu concordaria com você se estivéssemos conversando apenas sobre as telas em pauta onde um voyeur de barbas brancas é retratado entre Suzanas e Alices e Chapeuzinhos e Ginastas pelos becos da vida e por aí vai (rsrs) Se fosse assim talvez só Her Docktor Freud pudesse explicar. Se bem que tenho as minhas dúvidas(rsrs)
Mas a gente contempla aquelas telas na Accademia, em um edifício bem no centro de uma esquina única e personalíssima no mundo, da Oficina Brennand, do conjunto da obra fortemente influenciado também por Tânatos, de um templo de formas e arquitetura monumentais, de um mundo da lua, de um universo mutante mas sempre abissal , dionisíaco, subterrâneo, obscuro, sexual e religioso. Aí fica mais complicado ver somente o "animal".
Mas deixemos que o próprio artista poetando tente explicar o inexplicável ...
Paraíso Perdido
Envilecidos na lúgubre caminhada
Sem retorno,
Traímos pensamento, palavras e obras,
O sagrado e o profano,
O amor pronunciado em desespero
Ignorando a flor, o terremoto e o vulcão."
Abração
ResponderExcluirPimentel,
Parabéns por mais um excelente post de arte onde palavras e imagens se completam à perfeição.
Sampaio,
ExcluirQue bom que você apreciou o post sobre as tintas de Brennand. Quanto ao casamento das imagens com as palavras há que ter cuidado para que o colorido , em vez de embelezar, não devore as pretinhas. E nisso vou me entretendo. Obrigado pelo comentário