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11/07/2016

Cala-te, boca!

Hoje o Chico nos conta de um "fora" que deu no táxi:

Francisco Bendl     

Um dia passei por um aperto grande. Por minha culpa.
Apesar de ter sido divertido me ensinou muito sobre várias questões.
Para dizer a verdade eu era ainda um novato no táxi, mas isso não justificava o “fora” que eu tinha cometido.

Reviver aquela cena me diverte.
Era quinta-feira à tarde. Chovia. Os táxis, engarrafados no trânsito com este tempo se tornam escassos, difíceis de apanhá-los.  Uma corrida de quinze minutos se estenda para mais de meia hora e o grande prejuízo do taxista é ser envolvido vazio, sem passageiro, em engarrafamento.

Eu deixara uma pessoa na Fernandes Vieira. Segui por ela, atravessei a Oswaldo Aranha e entrei à direita, na José Bonifácio. Em seguida uma senhora ergue o braço chamando o táxi.
Ela era grandalhona, barriga bem acentuada. Não era bonita. Cabelos pintados de loira para aparentar uma idade menor, certamente. Sua figura era uma incógnita a respeito de o percurso que iríamos fazer se agradável ou maçante (sempre é uma expectativa a pessoa que vamos conduzir quanto ao seu humor).

Ela entrou no carro e prontamente me disse para eu levá-la à av. Praia de Belas.
Expliquei-lhe que havia dois caminhos: o mais curto eu teria que deixá-la do outro lado da pista, sentido centro/bairro, mas como estava chovendo ela iria se molhar e no seu estado interessante (informo aos mais moços que esta era a expressão que definíamos a gravidez no passado)...
Uma voz cavernosa e profunda, grave e corretiva vem do banco de trás:
- Eu não estou grávida!
No intuito de diminuir a minha inconveniência, emendei:
- Sim, sim, mas a senhora tem quantos filhos?
- Moço, eu não tenho filho nenhum, não sou casada!
A voz forte e agora irritada foi como se eu levasse um soco.

Não me dei por satisfeito:
- A senhora faz bem. A gente vê tanta criança abandonada...
Ela me interrompe. O trovão que eu ouvira não era do tempo, era a voz dela:
- Motora, se eu tivesse tido filhos eu sustentaria, pô.

Não sei o que eu tinha naquele momento que eu teimava em consertar o erro que se tornava maior à medida que eu tentava um diálogo. Ainda querendo sair simpático da situação, disse-lhe:
- A senhora vai concordar comigo que sustentar uma família se faz necessário um provedor e se pai e mãe se unem...

Novamente fui aparteado.
A voz agora era gutural. Dava a impressão de raiva incontida. Pensei que receberia uma cuspida, pior, um escarro!
- Meu negócio não é homem, imbecil, é mulher!
A doença repentina que me acometera insistia que eu retrucasse:
- Ainda bem que penso igual a senhora, pois também gosto de mulher.

Nessas alturas, aos gritos, ela encerra a fatídica corrida para meu bem estar físico, pois mais um pouco e ela me teria dado um safanão:
- Espero, ô idiota, que onde tu consegues as tuas não seja no local onde apanho as minhas, seu palhaço!
Neste momento eu chegara ao destino. Dei o preço, ela me deu o dinheiro com a mão trêmula de raiva e teve tempo de berrar batendo a porta com violência:
- Vocês, homens, são todos insuportáveis.

Moral da história:
Nunca emita um parecer sem ter certeza antes ou...

6 comentários:

  1. Excelente vivência Bendl. Continue escrevendo bem e nos contemplando com as histórias das ruas porto-alegrenses. Obrigado.

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    1. Francisco Bendl14/07/2016, 15:49

      Rocha, meu caro,
      Grato pelo comentário, mas escrevi vinte crônicas enquanto fui motorista de táxi por seis anos.
      Claro foram mais algumas, mas as que eu escolhi para o livro, que se chamou o Divã Móvel foram duas dezenas, e não mais.
      Portanto, quando elas terminarem de ser registradas neste blog agradável não restarão mais relatos de Porto Alegre, mas, possivelmente, de um velho que definha a cada dia e que percebe as forças lhe abandonando, assim como os textos escritos há mais de dez anos.
      Um abraço forte e afetuoso.
      Saúde e Paz!

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  2. Moacir Pimentel12/07/2016, 08:41

    Ou como dizia a senhora minha avó: " Em boa fechada não entra mosquito".Valeu, Bendl
    Abraço

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    1. Francisco Bendl14/07/2016, 15:50

      Meu caro Pimentel,
      De fato, aprendi este ditado pessoalmente!
      Um abraço, e obrigado por leres as minhas bobagens.
      Saúde e Paz!

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  3. André Baptista12/07/2016, 14:10

    Ótima história!

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    1. Francisco Bendl14/07/2016, 15:53

      Prezado André,
      Alegro-me que tenhas gostado desta passagem, que foi o ápice para mim em termos de mal entendido!
      Por outro lado, foi divertido assistir a passageira aumentar a sua ira gradativamente, de acordo com as minhas vãs tentativas de consertar o estrago, que aumentava o desastre justamente porque eu queria sair simpático da situação!
      Não é por nada que dizem os entendidos que, "mais vale um mau acordo que uma boa demanda"!
      Um abraço.
      Saúde e Paz!

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