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23/02/2017

O Vendedor

B. Pinelli - O Vendedor Viajante - 1825 (imagem wikimedia)


Francisco Bendl
Desde que me conheço por gente, viajo, e muito!
Vim ao mundo em 1950, na capital gaúcha, Porto Alegre.
Aos três meses de idade, eu já perambulava em automóveis e ônibus para Tramandaí, litoral do Rio Grande do Sul.
As idas e vindas para o balneário eram várias por ano, pois as minhas tias possuíam um chalé nesta praia, então a necessidade de manutenção e cuidados.
Tramandaí ficou tão atrelada à minha vida, que, em 59, quando nos mudamos para Brasília, a vida tinha dado uma guinada radical, dando a entender que o RS ficara para trás em definitivo.
O destino – se existe ou não é outra história - dá muitas voltas, mas o objetivo permanece porque sete anos depois tivemos de voltar para os pagos, com a minha mãe muito doente, falecendo dois anos depois e, na praia de Tramandaí, conheci a Marli e me casei com ela no Civil e Religioso, em 1970!
Desta forma, aos vinte anos, eu tinha uma quilometragem rodada que beirava um milhão de quilômetros sem maiores esforços para contabilizá-los.
Ao dar baixa do quartel, a função que melhor remunerava era ser vendedor viajante. Casado recentemente, e necessitando prover o lar e a família, aos vinte e dois anos e de posse de uma Variant branca, farol ainda quadrado, em meados de 72 fiz a minha primeira viagem como profissional e homem “sério”, como éramos conhecidos depois de casados, à época.
Lembro-me perfeitamente bem, como se fora ontem, que iniciei na função de Inspetor de Vendas de uma empresa que vendia máquinas de tecer japonesas, e a primeira cidade que visitei foi Iraí, RS, divisa com Santa Catarina, a quinhentos quilômetros da capital gaúcha.
Asfalto até Sarandi, mas depois chão batido, quase cento e quarenta quilômetros, em 72.
Iraí era ainda uma estação de águas termais, muitos hotéis, turistas, uma cidade agradável.
A Variant tinha um motor 1.6, horizontal, com dois carburadores. Duas peças fundamentais para o desempenho do carro e economia de combustível. No entanto, este tipo de veículo da WV tinha um sério problema:
A dificuldade de equalizar os dois malditos carburadores, que mais pareciam inimigos que conjuntos de metal com a mesma finalidade!
Com a poeira da estrada, solavancos, centenas de mudanças de marchas, a camionete quando chegou na cidade queria “descansar”, tanto pelas lutas que os dois carburadores se enfrentaram, quanto pela negativa de os dois contendores não permitirem mais que o carro andasse, tamanha desregulagem dos dois aparelhos.
Eu conseguira levá-la até o hotel, onde pela manhã eu chamaria a concessionária para consertar a teimosa, atender o único revendedor na cidade e seguir o roteiro deixado na empresa para aquela semana.
Antes das oito horas da manhã, eu estava defronte à agência da WV para que rebocassem o carro até a oficina. Às nove, eu aguardando o resultado do problema, o mecânico diagnostica que um dos giglês da entrada de ar tinha sido o causador de os carburadores não funcionarem sincronizadamente.
A pecinha, uma espécie de bengalinha furada lateralmente no seu fim, precisava ser trocada, porém, a casa não a tinha em estoque!
Naquela época, conseguir uma ligação telefônica era uma loteria. Do interior do RS para o interior do mesmo Estado, um parto, a fórceps!
Às três horas da tarde, a primeira concessionária que nos atendeu, de Carazinho, onde nasceu Brizola, também não a tinha disponível.
Diante da impossibilidade de se conseguir ligação com outra agência, voltei para o hotel e fui para as piscinas tomar banho de águas termais.
Uma delícia. Que vida mansa.
O hotel fornecia o jantar. Sem carro, achei que havia sido a melhor solução. Retornei para o apartamento para ouvir o rádio a pilha que eu levava comigo, pois TV também era raro os hotéis as terem instaladas nos aposentos.
Pela manhã, lá vou eu de novo aguardar na oficina a peça que uma agência poderia ter, e dar sequência ao meu trabalho.
Naquela quarta-feira apenas mais duas agências conseguimos contato, que também não a tinham em estoque.
Nessas três tardes/noites que eu me encontrava em Irai, onde eu não gastaria mais de uma hora para atender o cliente, o atraso no roteiro era em demasia.
Decidi pegar o ônibus que saía da cidade para Porto Alegre às 21:30h, chegando às 6:30h. Na capital, eu encontraria o tal do giglê, levaria para Iraí, a peça seria trocada e... zás, outras cidades para visitar em tempo recorde para compensar os dias parados, além de eu ser novo na empresa e precisar mostrar serviço!
Encontrei a danada da peça na última concessionária, perto da seis da tarde, que deu tempo de eu ir em casa, abraçar a esposa, contar-lhe a aventura, apanhar o ônibus no mesmo horário de volta, chegar em Iraí às 6:30h, rumar para a oficina, consertar a Variant, e voltar para a estrada.
Eu saíra de casa no domingo à tarde, de modo que na segunda-feira, cedo, eu atenderia o cliente, e dali rumaria para Santa Catarina, visitando o Oeste daquele Estado, as cidades de Maravilha, Concórdia, Videira, Caçador, Joaçaba...
No entanto, era sexta-feira, e eu me encontrava ainda em Iraí!
Explicar como para a chefia esse atraso, e por uma peça do tamanho de um pequeno parafuso?!
O tal do giglê foi trocado. O conserto terminara perto do meio-dia porque depois se precisou equalizar os carburadores.
Almocei no hotel, paguei a conta, carreguei a camionete com a mala e mostruário - uma das máquinas de tecer com pente, que fazia as tais gaitas nas blusas e mangas -, e imaginei percorrer os quarenta quilômetros que me distanciavam de Maravilha, em Santa Catarina.
Antes de eu chegar na ponte sobre o rio Uruguai, que separa o RS de SC, a portentosa Variant estanca na estrada. O motor falhara repentinamente e parou!
A muito custo eu a tirei do meio da estrada e a levei para o acostamento. Lembro que, se uma ligação telefônica de fixo era difícil, sequer imaginávamos no início da década de setenta o que seria um celular, quanto mais que um aparelho quase do tamanho de uma caixa de fósforos pudesse ser inventado!
Resultado:
Eu teria de conseguir parar um carro, pedir para o motorista que fosse para Iraí, que se deslocasse até a concessionária da WV, transmitisse o desesperado recado que eu estava com o carro quebrado antes da ponte, e que precisava de socorro.
Evidente que eu não poderia me basear que o primeiro condutor que se dignasse a parar e me ouvir, que iria me atender na solicitação. Qualquer veículo que fosse para o lado contrário do meu, que parasse, eu renovava o pedido!
Resumo da ópera:
Perto das quatro horas da tarde chegou o mecânico da mesma concessionária que me atendeu com relação à troca do giglê. Reconheceu a Variant, a mim, disse que estávamos azarados, e diagnosticou que o carro deixara de funcionar porque o platinado e condensador queimaram, depois de esforços enormes para compensar as falhas de motor pela “bengalinha”, o maldito giglê!
Ele não tinha consigo esta peça, e me rebocou de volta à oficina.
O serviço ficou pronto perto da seis da tarde. A noite surgia. O farol da camionete era pior do que qualquer lanterna por mais simples que fosse. E viajar à noite e em estrada de chão, com a poeira que outros carros deixariam em sentido contrário ou quando eu me aproximasse de outro carro para ultrapassagem ou ser ultrapassado, decididamente não seria uma boa ideia.
Achei interessante que o porteiro do mesmo hotel que eu me hospedara toda a semana não estranhou eu ter voltado. Bom, eu dormiria em Iraí, na sexta-feira à noite, sábado pela madrugada retornaria para casa. Explicaria na empresa os problemas acontecidos, e mudaria o roteiro na segunda-feira.
Cheguei em Porto Alegre perto das 14h. A fome era imensa. Devorei o almoço. Desfiz a mala, contei as aventuras para a Marli, e fui deitar.
Segunda-feira me dirigi à empresa.
Quando fui contratado, eu passara na entrevista inicial, depois com a psicóloga e, por último, um teste de venda, onde eu me saíra muito bem.
Apesar de eu ter criado um impasse permanente entre mim e a psicóloga – lembro que sempre me considerei um rebelde – quando ela me perguntou se eu tinha defeitos e eu ter respondido se ela teria tempo para eu relatá-los, e com cara de poucos amigos me pergunta se eu tinha qualidades, e eu ter enfatizado se ela teria mais tempo ainda para eu enumerá-las, foi no teste de vendas o ponto decisivo à minha contratação.
Portanto, quando na segunda-feira dei o ar da graça, o gerente imaginou automaticamente que eu teria vários pedidos. Após eu lhe contar as dificuldades que eu enfrentara na semana, que não atendi o roteiro e não vendi uma máquina sequer, ter gasto o dinheiro da empresa em hotel, refeições, passagens de ônibus, despesas com o carro, e cobraria ainda a quilometragem percorrida, o chefe se levantou da sua cadeira, me olhou firme nos meus olhos, e exclamou:
- Chicão, das duas uma: ou tu és um ator, que representou um vendedor muito bem ou tu és um vendedor turista, que depois de uma semana banhando-se em águas termais, quer me conversar que o carro quebrou várias vezes!
Voltei para casa ao meio-dia como vendedor demitido!

E assim começou a minha vida profissional como vendedor ou projeto de vendedor.

18 comentários:

  1. Wilson Baptista Junior23/02/2017, 11:06

    Grande história, Chicão!
    Continue nos brindando com as suas aventuras.
    Um abraço.

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    1. Francisco Bendl23/02/2017, 14:21

      Meu caro amigo Wilson,

      Aparando algumas arestas quanto a dar mais consistência à narrativa, todos os que viajaram no meu tempo passaram por problemas idênticos e, alguns, lamentavelmente, perderam a vida!

      Tive três amigos, dois deles meus colegas também porque trabalhávamos na mesma empresa, morreram em acidente de automóvel.

      Um deles, uma semana antes de se casar(!), saiu de Porto Alegre sábado pela manhã, após a reunião que tivemos no dia anterior, e bateu de frente com o seu fusca no ônibus que is para Lajeado, local onde morava, curiosamente.

      Eu jamais me acidentei, sequer um arranhão em mim ou nos SESSENTA E SEIS CARROS que dirigi, tanto meus quanto das empresas que forneciam o veículo para seus vendedores, supervisores e gerentes de vendas.

      Sempre considerei o carro um agente de trabalho, então eu precisava ter pleno domínio de como conduzi-lo e, a partir dessas experiências, eu me dediquei também a cuidar dos carros que eu viajava, e evitar ficar na estrada.

      Obrigado pelo comentário.

      Um forte abraço.
      Saúde e paz!

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  2. Viu, Bendl?
    E a gente ainda reclama das modernidades do celular e similares...
    Meu 'caixotinho', como apelidou um amigo o meu Fiat branco 147 L, que ganhei zerinho, deu muito problema de giglê. Aliás, dizia-se na época que FIAT significava Fui Iludido, Agora é Tarde. Era mais ou menos isso mesmo, meu amigo Albatroz (não esqueço mais do albatroz!). Um carrinho frágil como ele só. Que deu problemas desde o início. Mas me acompanhou muito.

    Minha tia teve uma Variant. Viajou muito com ela pra MG. Uma vez chegou lá rebocada, ou com o carro na garupa de um caminhão, não lembro.

    Posso imaginar seu sofrimento, Bendl. Posso mesmo. Dureza de vida a de vendedor. Você é um herói.

    Agora, a ilustração do seu texto me lembrou algo que não sei se é verdade. Eu via gente subindo no banquinho para protestar na Inglaterra.

    Sempre achei que fosse para ficar mais no alto e ser mais visto, ouvido. Disseram que não, um parente disse. Que não se pode falar mal da rainha com os pés em solo britânico. Para falar mal, somente subindo no banquinho. Você sabe algo a respeito, Bendl?

    Abração, Albatroz
    Ofelia

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    1. Francisco Bendl23/02/2017, 14:44

      Minha querida Ofélia,

      O Speakers'Corner (Recanto do Orador), ficava no Hyde Park, em Londres, onde o cidadão podia criticar quem quisesse, menos a Família Real e o Governo Inglês, claro.

      Para botar os bofes para fora, ele tinha de subir em um banco ou tablado, pois as tradições inglesas davam conta que, suspenso, sem tocar no solo britânico, ele estaria isento das leis e das famosas tradições britânicas!

      Agora, voltando à vaca fria, como se diz aqui, no Sul, se não fui um herói fui um SUPER HERÓI!

      Ofélia, a dificuldade de se achar hotel; dependendo da hora, os restaurantes fechados; estradas em chão batido, quando chovia era atolar, quando era seco era ficar empoeirado; carros que eram carroças; ar-condicionado NÃO SE SABIA O QUE ERA; não havia toca-fitas, apenas de cartucho; pneus diagonais, que duravam 15;20.000 e depois se desmanchavam; não havia rádio FM, somente as AM; quando se encontrava uma vaga em hotel era em quarto, onde este aposento não tinha banheiro, apenas uma pia; o banheiro era dividido por um andar inteiro, e se a gente quisesse tomar banho razoavelmente, tinha de ser de madrugada porque depois das seis horas era um martírio; inúmeras vezes eu me alimentei com uma lata de fiambrada - lembra? - sa Armour ou Swift, que tinha uma chavinha ao lado para abrir a embalagem, e um pão de 250g.

      Dormir no carro era comum. Pela manhã, eu lavava om rosto e as "axilas" no posto de gasolina onde eu encostara o carro, escovava os dentes, trocava a camisa e saía para atender a clientela; somente se comia bem quando era churrasco, a maioria absoluta dos restaurantes do RS eram churrascarias. Mas, mesmo o gaúcho, almoçar ou jantar churrasco diariamente não há quem aguente! A solução era a salsicha Viena, em lata pequena e o indefectível pão francês e um refrigerante.

      O carro ficava na cidade do roteiro aos fins de semanas, e eu pegava o ônibus ou trem para casa. Saliento que se trabalhava aos sábados até o meio dia, que era verificado porque se remetia o malote pelo Correio neste dia, com as vendas e cobranças efetuadas, então se poderia ir embora.

      Ou eu pegava o ônibus ou o trem húngaro, mais confortável, com a metade de um vagão como bar, mas o comboio, como dizem os lusitanos, demorava uma ou duas horas mais que o ônibus. Era ver qual tinha ainda lugar e vir para a capital.

      Enfim, hoje eu me lembro dessas dificuldades, que eu levava na flauta porque jovem, e constato que o espírito aventureiro exerceu a sua influência sobre mim plenamente, pois em condições normais de temperatura e pressão, jamais eu voltaria a ser vendedor!

      Muito obrigado pelo teu comentário, minha cara.

      Um abraço forte, caloroso e amistoso.
      Saúde e paz, Ofélia.

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    2. Meu querido amigo,
      você está mais tristonho? Foi ao médico em POÁ?
      Eu não tenho motivo algum para estar rindo, sabe, Bendl? Mas me esforço. As coisas comigo não vão nada bem, mas posso escolher entre ficar alegre ou triste. E ficar triste de nada vai me adiantar.

      A vida decidiu assim, e nada posso fazer. Ir a médicos não me leva a lugar nenhum.

      Então, desencuquei e saio por aí. Como cantava alguém (era o Paulinho?)... "Vou pelas minhas madrugadas a cantar, esquecer o que passou. Trago a face marcada, cada ruga no meu rosto simboliza um desgosto. Quero encontrar em vão o que perdi, hoje só resta a saudade, não tenho paz, e a mocidade que não volta nunca mais."

      Tô nem aí pra mocidade, Bendl. Não tenho rugas, as rugas externas não. Mas dentro de mim elas são como as 'nervurinhas' que minha tia fazia em meus vestidos. Não se desmancham na alma. Mas eu toco em frente, tal como a música do Satter, que também fala à alma do Newton: 'Tocando em frente'.

      Você foi ou não ao médico em POÁ?
      Abração, Albatroz
      Ofelia

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    3. Francisco Bendl23/02/2017, 18:59

      Minha querida Ofélia,

      (Respondo ao teu comentário acima em duas etapas. Apenas em um texto o blog não aceitaria pelo tamanho).

      Fui ao médico, sim.

      Na verdade, depois de tantas idas e vindas, me receitaram uma batelada de remédios que estão fazendo efeito!

      As dores que eu sentia e que eram quase insuportáveis diminuíram para níveis aceitáveis que, junto com o regime, tem dado certo o tratamento.

      Evidente que eu ainda sinto algumas dores pelo corpo, em face de os rins não estarem funcionando a contento, mas foi descartado pelo menos por enquanto a hemodiálise ou cirurgia, pois esta última me deixaria quase dois meses no hospital!

      De modo a não fugir, haja vista que eu jamais ficaria tanto tempo baixado, decidi fazer o tratamento à risca, então o meu deslocamento à capital para uma "revisão", cujos resultados estão conforme projeção.

      O que precisamos, Ofélia, nesta idade que temos é de não permitir que a nostalgia nos contamine, a saudade de algo, a falta, a necessidade.

      A solução inegavelmente passa por uma atividade, relacionamentos, passeios, saídas, viagens, sair de casa.

      Deixar-se amofinar é ser derrotado, perder para o tempo, ser levado pela enxurrada das emoções do passado em comparação com a vida no presente, pensa nisso!

      A hora é de brincar, viver, rir, se divertir, ir ao cinema, jantar fora, trocar mensagens, assim como fazemos graças ao blog do Wilson.

      E seguir em frente, marcar presença, levantar a mão, gritar, espernear, mas impedir que as costas verguem pelo peso do tempo, MAS, ao contrário, usá-lo como fator de experiência, de aconselhamentos para os mais novos, como sabedoria, Ofélia, como sabedoria!

      Afinal das contas, conhecemos o rengo sentado e o cego dormindo, então?!

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    4. Francisco Bendl23/02/2017, 19:06

      Mais a mais, as rusgas são as marcas indeléveis de DIGNIDADE, de amor pelo próximo, pelos filhos, cônjuges, de preocupação com parentes, de cuidados com os pais, pelas manutenções das amizades, decepções, tristezas, mas também porque se sorriu muito durante a vida, houve momentos alegres, felicidades fugazes, dias excelentes para compensarem períodos de muita tristeza.

      As rusgas nos rostos das mulheres as embelezam, deixam-nas altivas, admiradas, reconhecidas pelo tempo que se dedicaram aos outros e muito pouco a elas mesmas!

      A beleza na nossa idade não é mais explícita, mas é encontrada atrás de existências que se dedicaram ao bem comum, à família, à felicidade alheia, a lavar roupa, sim, a passar, a cozinhar, sim, a ninar o filho, a trocar-lhe as fraldas, limpar-lhe o bumbum, talquinho ...

      As rusgas femininas são o sulco da sua grandeza, da sua estatura moral, de ser absolutamente inatingível por nós, os homens, então o medo que temos de mulheres decididas, independentes, que fazem o seu próprio destino!

      Anteontem fui ao supermercado com a Marli, algo um tanto raro, pois esta é minha incumbência. Como somos muito conhecidos, eu pelas brincadeiras e quando chego no balcão da padaria berro como se fosse um trovão,
      - alô meninas!
      várias atendentes nos perguntam o que precisamos. Nesses momentos eu respondo imitando latidos, pois acompanhado da cônjuge estou acorrentado, portantoa a imitação como se eu fosse um mastim napolitano ou dog alemão, e dos grandes!

      A Marli fica fula da vida, mas, lá no fundo, ela está alegre porque tem o seu marido há quase 50 anos, e brincalhão, um pessoa que todos gostam e querem atender bem, pois é melhor do que ser um velho ranzinza, xarope, encrenqueiro, mal humorado!

      Assim, Ofélia, deixa de lado a discrição - sem exagero, claro -, mas te solta mais um pouco, relaxa, leva a vida com mais leveza. Aliás, lembra daquele livro, A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, de 84, que fez muito sucesso e até filme originou?

      Pois bem e, resumindo, temos de fazer prevalecer os aspectos psicológicos sobre os momentos reais, Ofélia.

      Vai te sentir bem se disseres uma frase jocosa? Diz!
      Vai rir se aproveitares uma situação e torná-la mais alegre? Faz!
      Se saíres com um sapato de um tipo e do outro pé diferente, e isto vai ser divertido pelo que as pessoas vão dizer, vai em frente!
      Eu já fiz isso, Ofélia!
      E peguei pela frente um cara mais divertido que eu, pois ao colocar os seus dois pés unidos porque estava com os mesmos sapatos, mas para levar a brincadeira adiante, o cara se saiu com esta, e EM PLENO BANCO:
      - Bah, mas estou com problemas, meus pisantes são iguais!

      Olha, foi uma gargalhada que até hoje a agência onde recebo os meus pilas se lembra do episódio.

      Vou me deixar levar pelas dores?!
      JAMAIS!


      Ofélia, a ordem que temos de obedecer rigorosamente é:
      DIVIRTA-SE!!!

      Um grande abraço, apertado, caloroso, amistoso.
      Saúde e paz.
      Ah, e como acertaste com o apelido que me deste, Albatroz!? De fato, sempre voei alto, para onde minhas asas sequer imaginariam que conseguiriam, mas eu as forçava a bater mais rápido e com força. Atravessei mares e rios, e hoje estou pousado em terra firme, olhando alguns voos rasantes, que bem poderiam estar muito mais altos!

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    5. Meu amigo, estou sem sono e vim aqui distrair os miolos. Não é que encontrei alguns atos falhos seus? Você chama as rugas de rusgas todo o tempo. Achei muita graça.
      Boa noite, amigo Albatroz.
      Ofelia

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    6. Francisco Bendl24/02/2017, 11:10

      Ofélia,

      "Todo o sábio é distraído" (rsrsrsrsrsrsrs)!

      Perdão pelo erro involuntário. Acostumado às rusgas diárias, eu as escrevi automaticamente quando, na verdade, o correto seria RUGAS!

      Ainda bem que parte do trecho usei sulcos, mas foi um erro imperdoável, fruto da pressa em te responder e não revisar o texto.

      Espero que me desculpes.

      Mas entendeste, o que importa.

      Mais um abraço.
      Excelente fim de semana.
      Saúde e paz.

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    7. Porque é distraído quando convém, amigo Albatriz?
      A união aqui é impressionante. São todos UM.
      Você não tem rusgas diárias. E se me equivoco às vezes e esqueço, não significa que eu esteja gagá. Só fico atrapalhada.
      Gagá ainda não, Bendl.
      Quando o homem veio instalar o ar condicionado, eu tinha que dar a ele R$350. Eu estava com o $ na mão, em notas de R$50, quando o interfone tocou. Fui atender e me atrapalhei, esqueci o que tinha feito, se tinha dado $ a ele ou não e quanto.

      Ele enfiou a mão no bolso e disse que eu havia dado R$50. Acho que dei mais. Ou não, como saber? O certo é que dias depois de instalar o ar ele me ligou, e se ofereceu para trocar uma peça do ventilador de teto. Talvez tenha imaginado que eu estivesse gagá de todo. Falei com ele que não estava. Ele não ligou de novo.

      Meus tropeços acontecem, às vezes percebo, às vezes não. Eu já quis comprar um carro novo, calculei errado. Meu irmão, que estava comigo, foi quem me chamou a atenção.

      Eu tinha o sentimento de que havia dado dinheiro ao instalador. Mas se naquela hora ele não tivesse enfiado a mão no bolso, eu não saberia o que tinha acontecido. Minha memória é um tremendo vaivém.
      Sofrido isso, Bendl.
      Aproveite o dia. E o final de semana.
      Abs
      Ofelia

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  3. Francisco Bendl, insurgente super herói amigo,
    Sua vida tem histórias de um nunca acabar! Hoje, contadas, são muito divertidas, mas na vivência deve ter sido duro. Ainda bem que você era jovem, bem humorado e aventureiro.
    Sua resposta para a Ofélia foi um outro post.
    Conte mais. Será muito bem vindo. Gostarei muito.
    Até mais, com "saúde e paz"!

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    1. Francisco Bendl23/02/2017, 19:19

      Querida Aninha,

      Foi muito difícil, Ana. Eu apenas me fortalecia na mulher e filho que estava para nascer, e tinha de trabalhar.

      Agora, sempre aliviando o peso dos problemas, ora levando na flauta ora rindo de mim mesmo ora não dando importância ao acontecido, a questão era não deixar O MORAL baixar, o ânimo, simplesmente a doença terminal de qualquer vendedor!

      E eu tinha comigo uma grande disposição, que ainda a levo nos dias de hoje, mesmo com o físico entrando em litígio com a mente, mas a garra é muito forte, a vontade também.

      Curiosamente, aceito pacificamente a velhice, sem rebeldia, sem mágoas, tranquilo. Mas não deixo de ser eu mesmo, de brincar, rir, me divertir, ver as Amarradas no youtube, isto é, o touro levando vantagens sobre as pessoas que vão atazanar a vida do animal!

      E leio, escrevo, saio para ir à farmácia, supermercado, oficina, bancos, visitar amigos em seus negócios ... não me deixar encostar no canto da sala e esperar a morte chegar, mas não mesmo!

      Nesse aspecto, o blog do teu marido, um cara extraordinário, admirável, veio a calhar, pois ao postar meus rabiscos graças à sua bondade, ocupo um tempo útil, prazeroso, que me diverte e faz pensar sobre o que escrevo.

      Obrigado, Ana, pelo comentário.

      Um forte abraço, grande, extensivo ao cônjuge.
      Saúde e paz!

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  4. Rebelde Bendl,
    Em tempo ou sem tempo, não importa.
    No seu contexto, adorei a resposta "Que quadro, Pimentel !?"

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    1. Francisco Bendl23/02/2017, 19:28

      Aninha,

      Analisando o contexto, onde há um quadro pequeno no papel, e as explicações convincentes e reconhecidas sobre a "expertise" do Pimentel sobre artes, claro que vou me debruçar em elogiar o artigo do gajo, o seu conhecimento, a sua especialidade, o seu talento e vocação irrepreensíveis.

      O cubismo é o de menos, assim como o quadro, pois quem sou eu para comentar sobre a pintura exposta?!

      Vou dizer o quê?!

      - Legal, muto bonita, me fez "feliz"!

      Não posso, Ana, apesar da genialidade de seu autor, que é indiscutível. Para mim, o texto do Pimentel se igualou à obra, transformando a pintura em palavras, que as entendi e aplaudi, então tornando a obra em questão verdadeiramente bela!

      - E, o quadro? Ora, o quadro é o de menos!

      Outro abraço, Ana.
      Mais saúde e mais paz!



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  5. 1) Salve Chicão, uma aventura e tanta...

    2) Ainda bem que vc deve gostar de automóvel e entender um pouco de motor.

    3)Eu não entendo nada.

    4)Parabéns pela contagem = postagem contando algo.

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    Respostas
    1. Francisco Bendl24/02/2017, 12:35

      Meu amigo Rocha,

      Obrigado pelo comentário.

      As nossas vidas têm passagem muito curiosas. Apenas resgato da lembrança aquelas que são indeléveis, divertidas, e que me ensinaram também.

      Um grande abraço, meu caro.
      Saúde e paz!

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  6. Moacir Pimentel24/02/2017, 10:43

    Bendl,
    Focando no que tem importância: O Vendedor é uma ótima história, muito bem abotoada, narrada com clareza e leveza, riqueza de detalhes e bom humor.Por ela muito obrigado.
    Um bom Carnaval para você e os seus

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    Respostas
    1. Francisco Bendl24/02/2017, 12:42

      Pimentel,

      Quem agradece sou eu pela leitura que fizeste de uma narrativa de tempos atrás.

      Se estou conseguindo e não for apenas bondade da parte de vocês, a intenção é escrever de um jeito ameno, divertido, que seja compreendido e aceito.

      Reitero ser uma honra e que me deixa alegre, os meus contos serem analisados por ti, pois o que dizes tem muto valor a respeito dos rabiscos que publico, que servem tanto de alerta quanto incentivo.

      Um forte abraço.
      Saúde e paz!

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