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13/09/2016

A Luz da Provença


Van Gogh - Auto Retrato (Musée D'Orsay)


Moacir Pimentel

Quem era Vincent Willem van Gogh?

Talvez o pintor se fizesse esta mesma pergunta ao elaborar, diante de espelhos, tantos retratos de si mesmo. Van Gogh eternizou o seu desenvolvimento artístico em uma incrível coleção de auto retratos ingênuos, que nos servem como GPS, não só para acompanhar as mudanças nas suas técnicas e cores mas também para compreender a sua confusão psicológica e o seu declínio mental, os quais ele registrou com humildade e honestidade jamais vistas a não ser nos auto retratos de Rembrandt. Nos últimos cinco anos de sua vida, van Gogh pintou mais de trinta auto retratos!

A tela acima mora no Musée d'Orsay em Paris e é, sem dúvida, o auto retrato mais intenso da história da arte. Este quadro reúne todos os elementos da última e genial fase do artista na qual as cores refletiram não apenas paisagens externas mas o seu turbulento mundo interior, o seu estado emocional oscilante e um estilo que pulsa de energia e nos revela o quanto ele lutou contra seus demônios.

Esta pintura nada mais é do que um retrato da crise interna de van Gogh, pintado com pureza de intenção e torto realismo. Vemos o rosto real do artista, com a barba ruiva e áspera, a boca infeliz, as pálpebras caídas. Trata-se de uma identidade que mal se mantém sob a pressão do caos azul em redemoinhos. O rosto pode até parecer bastante sólido de saída, mas as roupas desmentem tal estabilidade pois perdem a identidade à medida que as linhas entram em parafuso, comprimem e desconstroem, mostrando-nos como van Gogh sentia-se na condição de indivíduo mentalmente doente e sofredor.

Esta é uma imagem muito corajosa de um homem tentando manter-se inteiro e de como ele enfrenta os seus medos interiores. A obra prima nos faz intuir que, neste momento, van Gogh estava se esvaindo, se dissolvendo misturado ao fundo trágico de sua existência.

Este rosto é notável pela representação calma e digna que o pintor fez dele mesmo e pela sensação de coragem que nos passa, apesar a situação aflitiva na qual se encontrava. O hábil uso de cores contrastantes, o traço sensível e a impressão de maduro domínio das tintas, indicam um intelecto superior, não importando quão perturbadas estivessem as emoções do autor.
Todas as pinceladas foram dadas lado a lado sem fusão nem modelação. Por volta desta época van Gogh criara uma nova espécie de pintura, baseada nos atributos expressivos inerentes à cor. No mês em que executou esse quadro ele escreveu a seu irmão Theo manifestando o desejo de pintar retratos com mais vitalidade associando duas cores complementares para ter as misteriosas vibrações dos tons análogos.

O toque de cor mais estranho aí é o trecho em verde, surpreendentemente vívido, nos olhos de Vincent, na testa franzida, nas olheiras e nas faces. O verde funciona como foco, atraindo nossa atenção para a mirada firme e penetrante.

A estrutura destes olhos é vigorosamente rasa. Linhas retas e escuras definem os olhos e o cenho carregado, deixando neles o peso da angústia. Todos os mínimos detalhes dos olhos são delineados com clareza, mas embora os traços rígidos mostrem firmeza, o verde ácido desse rosto, chocando-se com o vermelho dos cabelos e da barba, denota uma agitação reprimida, uma angústia contida.

Os olhos penetrantes da figura paralisam os nossos e nos fazem focar não no que estava acontecendo do lado de fora, mas dentro da cabeça do indivíduo. A energia do quadro foi construída e é percebida a partir dos olhos da figura, os dois espaços mais firmemente pintados na tela.

O ritmo das pinceladas se espalha através dos planos desse rosto, ganhando energia e prosseguindo em ondulações através do casaco e do cabelo, e, finalmente, irrompendo na agitação do fundo azul-gelo. Os azuis e verdes claros que normalmente são cores calmas, quando contrastados com o vermelho vibrante do cabelo e da barba produzem uma nota dissonante que define perfeitamente o tom psicológico do retrato.

Em meio às harmonias predominantes e frias de cinza-prata, verde-prata e azul, a cabeça de van Gogh brilha como uma chama. Essa é uma pintura de grandes contrastes.

Tudo o que não pertença a esta cabeça fulgurante é deliberadamente atenuado. As pinceladas agitadas em redemoinhos ao fundo, aludem a como era precária a estabilidade emocional do artista, para mim simbolizada aí nesse paletó limpinho, na camisa abotoada até o pescoço e, é claro, na pose que nos faz pensar em silêncio e calma. Veja que o fundo distingue-se da figura apenas pela textura das pinceladas espirais, que, de resto, têm cor praticamente igual à do corpo.
Ele pintou este Auto-Retrato em um hospício em Saint-Rémy-de-Provence, em setembro de 1889, depois do violento colapso emocional cujo epílogo fora uma briga com Gauguin, um pedaço de orelha decepado e oferecido, como presente, a uma prostituta e uma hemorragia que quase o matou.

Eu passei a me interessar verdadeiramente por Vincent van Gogh em outubro de 1992, quando estive em Amsterdam a trabalho durante 10 dias úteis com um final de semana no meio. Num sábado chuvoso resolvi visitar o Museu do artista.

O Museu van Gogh foi inaugurado em 1973, e se localiza na Praça do Museu, entre o Museu Stedelijk e o Rijksmuseum e perto do Concertgebouw, uma das três maiores salas de concertos do mundo,
É composto por dois edifícios, o Rietveld, projetado por Gerrit Rietveld, e a ala Kurokawa, desenhada por Kisho Kurokawa. Nos seus jardins encontramos um dos ícones do artista: os girassóis. O primeiro edifício tem quatro andares. No piso térreo, além da clássica loja e de um café o Museu faz uma espécie de introdução da exposição de arte.

O primeiro andar abriga as obras do artista expostas cronologicamente. O segundo andar trata de restauração de pinturas e tem um espaço para exposições temporárias menores. O terceiro andar mostra pinturas de contemporâneos de van Gogh relacionadas ao trabalho do próprio artista. Finalmente a ala Kurokawa é usada para grandes exposições temporárias.

A coleção permanente inclui também nove dos auto retratos do artista e obras de arte notáveis de contemporâneos de van Gogh, impressionistas e pós-impressionistas. O Museu oferece importantes exposições sobre tais movimentos artísticos e temas da história da arte do século XIX.
Podemos encontrar por lá esculturas de Auguste Rodin e Jules Dalou, e pinturas de Émile Bernard, Maurice Denis, Kees van Dongen, Paul Gauguin, Édouard Manet, Claude Monet, Odilon Redon, Georges Seurat, Paul Signac e Henri de Toulouse-Lautrec.

O Museu tem a maior coleção de obras de Van Gogh do mundo, composta por 200 pinturas, 400 desenhos e 700 cartas do pintor. A exposição principal narra as diversas fases da vida artística do artista. Começando pelas telas que ele pintou em Nuenen entre 1880 e 1885, entre as quais a obra prima é Os Comedores de Batata.


Van Gogh - Comedores de Batatas (Museu Van Gogh)


Vale a pena abrir um parêntese para esta obra, que van Gogh pintou enquanto vivia entre os camponeses e trabalhadores em Nuenen na Holanda. O pintor se esforçou para representar nesta tela, com veracidade, as pessoas e suas vidas. Ao renderizar a cena em uma paleta maçante e escura, ele repetiu as condições de vida monótonas dos camponeses e usou modelos feios para enfatizar e percorrer ainda mais a devastação que o trabalho manual em condições desumanas desenhava nos corpos desses trabalhadores. Este efeito é aumentado pelo seu uso de pinceladas soltas para descrever os rostos e mãos dos camponeses como se eles se amontoassem em torno da pequena lanterna, comendo sua escassa refeição de batatas.

Na minha modesta opinião van Gogh representou nesse espaço pictórico a sua própria miséria. A vida trágica de Vincent van Gogh poderia ser resumida se enfatizadas a sua partida antecipada da educação formal, o fiasco como vendedor no mundo da arte, a tentativa confusa de ser um pastor religioso, as dificuldades com o sexo feminino e as relações familiares turbulentas, o retorno ao mundo da arte, e as suas tendências em direção a extremos de má nutrição, consumo de álcool e tabagismo.
Sua pintura a óleo "Os Comedores de Batatas" clandestinamente retrata a pobreza e os fracassos vividos pelo artista. Apesar da natureza evocativa da cena, a pintura não foi considerada bem sucedida, até depois da morte de van Gogh. No entanto, o trabalho não só demonstrou o compromisso de van Gogh de pintar cenas emocionalmente e espiritualmente carregadas em sua arte, mas também estabeleceu as ideias que Van Gogh seguiria ao longo de sua carreira.

Passando pelos quadros feitos na Antuérpia, em 1886, com destaque para o Crânio de um Esqueleto com Cigarro Aceso, em seguida nos deparamos com os trabalhos realizados em Paris, de 1886 a 1888, com ênfase para as telas que retratam Agostina Segatori, o Campo de Trigo com uma Cotovia e a Vista de Paris, a partir da sala de Vincent na rua Lepic, em Montmartre. Finalmente o Museu trata do melhor da obra de Vincent Van Gogh: a fase Provença. Cujo nome é LUZ!

Dia destes conversando com o nosso editor sobre a elaboração deste post, eu lhe disse que quem quer conhecer Van Gogh vai sem escalas para esse museu holandês, em vez de peregrinar pelo deprimente circuito turístico no sul da França para ver plaquinhas comemorativas diante de locais onde o artista viveu ou pintou, os quais, muitas vezes, sequer existem mais.

Comentei que se vai a Provença, não para encontrar Vicent van Gogh mas para passear pelas aldeias tão diversas entre si, ver as ruínas romanas, beber bons vinhos e se empanturrar de queijos e foie gras e bem amar. Não deixa de ser verdade. Eu jamais tentei olhar para as estrelas à beira do rio Ródano! Mas então o Wilson me retrucou com uma verdade maior ainda da qual, até então, eu não me dera conta. Disse-me ele:

“Quando você chega em Amsterdam para ver os quadros dele só vai compreender de verdade a sua luz se, como dizia o Daudet, já tiver tido seu cérebro fritado pelo sol do Midi... Não se procura Van Gogh na Provença, mas se reencontra uma Provença terrivelmente sofrida em Van Gogh. Ou não?!”

É claro que sim! Quando eu bati os olhos para valer na arte de van Gogh reunida naquele museu, foi um caso sério. Lembro que meus afazeres findavam às 17 horas e então, diariamente, lá ia eu mediunizado para o museu, para ver Vincent van Gogh enlouquecendo e, ao mesmo tempo, se tornando um grande gênio naquelas imagens explodindo de cor. De novo e de novo e a cada tela deslumbrante. Como o museu van Gogh expõe os quadros por ordem cronológica, as pinturas que van Gogh realizou enquanto esteve em Arles com Gauguin na famosa Casa Amarela e mesmo depois, enquanto pintava internado no hospício de Saint-Rémy são especiais, como se fossem janelas iluminadas entre a escuridão da fase anterior e a loucura da que se seguiu.
Entre as telas de paletas sombrias anteriores e os quadros delirantes produzidos em Auvers-sur-Oise, fora de Paris, onde ele esteve aos cuidados de um médico e artista amador, o Dr. Gachet, até a sua morte, os trabalhos executados na Provença, tanto em Arles como em Saint-Rémy, tem uma qualidade inigualável.

Nas pinturas dessa fase provençal van Gogh desenvolveu a cor simbólica da emoção interior, que por óbvio não depende da natureza, mas que foi tocada pela exuberante luminosidade do sul da França, forte o suficiente para penetrar nas brumas mentais do artista.  

Em Saint-Rémy, van Gogh criou mais de cem obras, que tiveram os jardins e os campos circundantes da clínica e as noites estreladas como seus principais temas, registrados com pinceladas dinâmicas e paletas exuberantes típicas de seu período de maturidade. Em passeios supervisionados, van Gogh mergulhou na experiência do ambiente natural, das oliveiras e ciprestes, íris, e outros elementos da flora que povoavam o campus da clínica, e mais tarde, na recriação das suas memórias de Arles.

Eu notei que já nas telas trabalhadas em Paris o verão estava prometendo chegar. Ali van Gogh tornou-se inquieto:

"Eu sei, com certeza, que tenho um instinto de cor, que ele me tomará virá cada vez mais e que a pintura está na medula dos meus ossos".

Era hora de seguir em frente. Nunca verdadeiramente feliz nas grandes cidades, Vincent decidiu deixar Paris e seguir o sol e seu destino na direção sul. Tomou o trem de Paris para Arles em 20 de fevereiro de 1888 animado com seus sonhos para um futuro próspero e divertindo-se com a paisagem.

Van Gogh - Campo de Trigo com Ciprestes


Talvez essa simpatia que passei a sentir pelo artista, tenha a ver com o fato de que eu conhecia as melhores das paisagens do artista. A Provença. Eu conhecera a avó de meus netos em janeiro de 1978 e no verão seguinte, com um bando de amigos, resolvemos ir para a França e "fizemos" a Provença de trem e de "carona", fingindo que éramos hippies e trabalhando nas colheitas para descolar uma grana e nos permitir alguns luxos durante as férias, entre eles o vinho!

Então, ali, já mais maduro, aos 37 anos eu sabia do que o Vincent estava querendo dizer naquelas telas. Eu também escapara, como ele fizera, das multidões de verão de Paris, e perambulara por Arles e Saint-Rémy, me maravilhando com as paisagens tomadas pela lavanda que os romanos cultivaram ali pela primeira vez, para perfumar com ela seus banhos e roupas. Os italianos não quiseram deixar a flora local por menos, já que mãos gregas ali plantaram, seiscentos anos antes do Cristo, as primeiras vinhas, as primeiras das treze cepas atuais cujos frutos nós então colhemos.

Eu já conhecia as pontes e aquedutos e ruínas romanas, as canoas atracadas ao longo das margens dos rios e os altos ciprestes, e já me hospedara em pousadas em prédios toscos e antigos como os que Van Gogh retratou. Eu já vira Roussilon feita do ocre das montanhas ao seu redor, já me encantara boquiaberto com aquela Gordes de pedra no alto da colina, já cruzara a tal ponte cantando “Sur le pont d'Avignon on y dance on y dance” e ultrapassara as suas muralhas.

Já vivera um solstício de verão em Aix-en-Provence, borracho de rosé e de beijos e da música e das performances que rolavam pelas ruas. Já visitara a arena romana em Arles e todos os mercados daquelas paragens, para provar tomates frescos, pêssegos, morangos e cerejas e economizar no almoço.

Já explorara centenas de calçadas e caminhos de pedra sinuosos em torno de dezenas de pequenas cidades e vira milhares de portas e janelas coloridas. Me eram familiares os campos de trigo dourados, as árvores envergadas pelos ventos refrescantes e a mistura das cores vermelha e laranja derivadas do ocre natural dos horizontes provençais e os matizes vivos dos rios cor de esmeralda no fundo dos penhascos.

Eu lembrava dos campos de oliveiras para onde os patrões nos levavam ao amanhecer e onde trabalhávamos com os nativos até que, às onze horas, a senhora da propriedade chegasse trazendo um almoço de pão, queijo fresco, um bendito ratatouille, e tapenade noire a la provençal - uma mistura de azeitonas pretas, anchovas e alho que a gente comia chorando!

Eu já dividira muitas refeições com franceses generosos e gentis, servidas sobre uma toalha puída na relva, à sombra das árvores enquanto se ouvia não lembro de onde um fluxo de água fria e o sol se metia através das folhas e era tão bom.

Para além dos olivais havia pomares e eu me familiarizara com as azinheiras, os canteiros de tomilho e de arruda. Tudo crescia ao nosso redor. Aquela gente plantava, criava, colhia e fabricava tudo o que consumia: legumes, verduras, frutas, grãos, leite, manteiga, queijo, pão, vinho, azeite. E se orgulhavam disso.

Com a paga do suor dos nossos rostos à noite, depois de um longo banho frio com o único souvenir que podíamos comprar - pedaços de sabão roxo que destilavam o perfume dos campos de lavanda - a gente se permitia um patê, um queijo de cabra e um cordeirinho e o estalo da cortiça de uma garrafa de vinho rosé em um bistrô sonolento. E nada de foie gras!

Van Gogh, naquelas telas, falava dos cafés que ocupam os andares térreos de edifícios antigos, em cujas esplanadas a gente discutia sobre um copo de Pastis como mudaríamos o mundo pela força dos nossos sonhos. Contava-me histórias de campos roxos de sálvia, de muros de pedra construídos por invasores de onde brotava alecrim selvagem e dizia dos perfumes inebriantes dos mercados de flores.
Há algo indescritível nas antigas paredes de pedra daquelas aldeias: vibrações do passado. A gente percebe que aqueles lugares testemunharam milênios de história e experimenta uma sensação de paz, de aterramento, de pertencer a algo maior do que os olhos podem ver.

Naqueles quadros reencontrei manhãs ensolaradas, a natureza fervilhando, as rochas estéreis, caminhos esculpidos durante séculos pelos pés de agricultores e pelos cascos dos seus jumentos, os céus mal humorados, os crepúsculos alaranjados, os girassóis amarelos, os cinzas-esverdeados das folhas, as papoulas vermelhas e os hibiscos que floresciam como manchas cor-de-rosa emoldurando fachadas.

Foi como se aquelas telas de van Gogh tivessem despertado em mim memórias de infância, vivas e fortes, tão doces como os beijos de uma avó. Eu talvez não esteja escrevendo de forma objetiva, mas ninguém opera com o lado esquerdo do cérebro quando se é jovem e feliz e está na Provença muito bem acompanhado.

Mas o que para mim fora pura alegria, intoxicação dos sentidos e aventura, para Vincent van Gogh, pelo menos naquelas telas, parecia-me ter sido puro sofrimento e terminara em tragédia. O que para mim ainda eram lindos e relaxados bytes de memória, ele pintara de forma agônica, aplicando a tinta com camadas cada vez mais espessas, atraído por objetos sob estresse na natureza: sóis girando, ciprestes e oliveiras retorcidos, estrelas "tremeluzindo", céus mal humorados, montanhas ameaçadoras.

Van Gogh - Oliveiras com as Alpilles ao fundo


Desde então tenho estudado o trabalho do pintor e me interessado pelas suas cartas. Ele e o irmão Theo se corresponderam durante toda a vida e as cartas de van Gogh - mais de mil! - explicam com a mais absoluta candura a sua arte imensa e nos abrem uma avenida iluminada para a sua alma atormentada. Com a palavra o pintor:

"Eu posso muito bem subsistir na vida e também na pintura sem o bom Deus, mas eu, uma criatura sofredora, não posso subsistir sem aquilo que é maior do que eu, que é toda a minha vida - a força da criação. Gostaria de pintar homens e mulheres e expressá-los pelo brilho, pela agitação trêmula das cores. Expressar o amor de um casal pelo casamento de duas cores complementares, pela sua mistura e contraste, pelo vibrar secreto de tonalidades aproximadas uma da outra. Expressar a inteligência de uma fronte através do brilho de um tom amarelo sobre um fundo escuro. Expressar a esperança através de uma estrela, a paixão de uma pessoa através de um por do sol brilhante".

Dizem que Vincent van Gogh colocava velas acesas em seu chapéu para ser capaz de pintar à noite, embora o que se prova é que em uma carta van Gogh mencionou que:

"A noite estrelada sobre o Ródano foi pintada à luz de um lampião de gás".

Em outra carta para o irmão, ele acrescentou ao mesmo tema:

"Muitas vezes parece-me que a noite é muito mais viva e rica e colorida do que o dia"

Se as lendas são verdadeiras, van Gogh frequentava os cafés à noite, usando seu chapéu de palha e velas para espanto dos outros clientes. Para o amigo e artista Anthon van Rappard, van Gogh escreveu que a vela representava uma mulher e a mariposa um homem e acrescentara que

"O suicídio vale a pena se cometido dessa forma".

Vincent van Gogh teve a vida turbulenta que todos nós conhecemos. A triste história da orelha cortada é hoje parte da mitologia dos gênios. A infelicidade documentada nas cartas para o irmão Theo transforma-se, na sua arte, numa exaltada busca da estabilidade, da verdade e da própria vida. Um pouco como Rembrandt, ele tinha o poder de interpretar o feio, mesmo o terrível, e de torná-lo bonito pela própria paixão.

Os anos de formação como pintor revelam confusão e inquietude, pois teve vários empregos enquanto procurava uma existência significativa. Aos vinte anos saiu da Holanda para morar na Inglaterra, em seguida foi missionário na Bélgica e, em 1886, aos 33 anos, mudou-se para Paris.

 Theo era marchand, e, graças a ele, Vincent foi apresentado a outros artistas como Degas, Pissaro, Seurat e Lautrec e conheceu técnicas impressionistas. Chegou a seu estilo artístico por caminhos demorados: só depois de ter assimilado por completo as influências do impressionismo e da arte japonesa e feito suas próprias experiências cromáticas foi que descobriu seu próprio talento.

E ali, na Provença francesa, região onde passaria os últimos dois anos de sua vida, van Gogh começou a expressar a sua genialidade. Produziu as suas obras mais notáveis como, por exemplo, O Quarto do Artista, uma tela de grande força e pungência. O sonho de fazer de Arles uma comunidade de pintores foi para o espaço depois que a relutante visita de Gauguin acabou em desastre.

Desta fase do pintor me agradam O Por do Sol e A Casa da Fazenda na Provença, na qual a natureza é exaltada para fazer eco às emoções do pintor. Assim a tela sugere uma fertilidade terrível e ameaçadora à vida. O trigo cresce por todos os lados, as espigas quase subjugam uma pequena figura que tenta atravessar o mar amarelo, o muro interrompe-se bruscamente devorado pelo trigo maduro, as flores vermelhas e o verde da vegetação se espalham desordenados.

A fazenda dá a impressão de estar sitiada. As edificações comprimem-se enquanto o céu se conserva em absoluta neutralidade. A natureza sempre se apresenta a van Gogh, com raras exceções, dessa maneira ameaçadora, mas ele nunca se dá por vencido: atraca-se com ela, capturando nas telas a violência e o poder naturais. E a atenção pura e simples de cada espiga de trigo garante a van Gogh superioridade moral sobre esse poder.

Van Gogh - Esplanada do Café à Noite

A Esplanada do Café à Noite foi outra das cenas famosas que van Gogh pintou em Arles e a primeira pintura na qual ele usou um fundo noturno. Usando cores e tons contrastantes, van Gogh alcançou uma superfície luminosa que pulsa com uma luz interior, quase em desafio ao céu escuro. As linhas do desenho levam os olhos do observador para o centro da tela, ao longo da calçada, como se o espectador estivesse passeando por essa rua de paralelepípedos. O café existe até hoje e é uma meca para os fãs de van Gogh que visitam o sul da França.

Descrevendo esta pintura em uma carta à sua irmã, van Gogh escreveu:

"Aqui temos uma pintura da noite sem usar o preto em nada, mas sim o belo azul e o violeta e toda a tela ilumina-se de amarelo pálido e verde limão. Diverte-me enormemente pintar a noite assim."

Van Gogh recriava a realidade diretamente de suas observações, uma prática herdada dos impressionistas. No entanto, ao contrário dos impressionistas, ele não gravava uma cena apenas como o olho a tinha observado, mas dava à imagem um tom espiritual e psicológico que ecoava a sua reação individual e pessoal. As pinceladas vibram nessa esplanada de Café com a sensação de excitação e prazer que van Gogh experimentou ao pintar este quadro.

O quarto de Vincent em Arles é outra das pinturas icônicas do artista e virou atração turística. Nela as cores marcantes, a perspectiva incomum e a atmosfera familiar criaram uma obra que o próprio artista muito apreciava.

O Quarto foi pintado por van Gogh em cinco versões: três óleos sobre telas e dois esboços em cartas para o irmão. Na verdade, Vincent descreveu esta pintura em nada menos do que treze cartas e, como resultado, sabemos sobre os pensamentos e sentimentos do artista sobre o trabalho.

Van Gogh - O Quarto de Dormir



 Em uma carta ao seu irmão, Theo, Vincent escreveu:

"Desta vez é simplesmente o meu quarto. Só que aqui a cor faz tudo e garante às coisas, com a sua simplicidade, um estilo grandioso, sugerindo o repouso do sono. Olhar para a imagem deve descansar o cérebro, ou melhor, a imaginação."

E ele prosseguiu descrevendo com entusiasmo as paredes azul- violeta, o chão de azulejos vermelhos, a madeira da cama e das cadeiras que seriam pintadas com um amarelo da cor da manteiga, os lençóis e os travesseiros aos quais daria um leve toque de verde-limão, o escarlate da colcha, a porta lilás, a bacia azul, e como no quadros ele abusaria do branco porque não havia branco naquele quarto.

Esse uso brilhante e corajoso da cor no quarto de Vincent em Arles é típico da paleta vibrante que o pintor começara a usar timidamente nos seus derradeiros quadros do período que passou em Paris.

O amarelo foi a cor favorita de van Gogh durante todo o seu período de Arles e Saint-Rémy. Se eram paisagens ao ar livre em campos de trigo sob o sol provençal ou se eram obras internas, como este quarto, tanto fazia. Porém...

Os tons amarelos utilizados por van Gogh em suas pinturas quase como uma assinatura, foram possíveis graças à revolução industrial e a um novo pigmento chamado de amarelo de cromo que, como muitos dos pigmentos é quimicamente instável.

Infelizmente, esses amarelos têm significativamente desbotado e escurecido ao longo dos anos de modo que os espectadores contemporâneos não enxergam a luminosidade original das obras. Reverter essa reação química provavelmente causaria mais danos ainda às pinturas.

Provavelmente o aspecto mais marcante e incomum dessa pintura é a perspectiva peculiar. O trabalho não é realista na sua representação distorcida do quarto, com os objetos meio que inclinados.
Alguns especialistas argumentam que essa pintura do quarto de Vincent encapsula todos os seus sonhos e aspirações durante os primeiros meses em Arles. E a tristeza por vê-los se transformar em... nada.

Assim, também a pintura A Casa Amarela, como a do quarto, sugere a domesticidade e essa sensação de bem-estar dentro da própria casa experimentada por todos nós. Uma "serenidade absoluta", nas palavras do artista.

Mário de Andrade captou o sentido da coisa:

“Minha casa.../ Tudo caiado de novo!/ É tão grande a manhã!/ É tão bom respirar!/ É tão gostoso gostar da vida!.../ A própria dor é uma felicidade!”.

Talvez van Gogh tenha pintado mais duas cópias do seu tosco quarto e a sua casinha amarela, entre as quatro paredes daquele asilo em Saint-Rémy, de pura saudade de tudo o que ele tinha perdido em Arles e do muito de que se encontrava privado: um lar e um senso de propósito.

Da mesma forma os vários retratos que Vincent fez da senhora arlesiana Madame Ginoux, por exemplo, nos sugerem a solidão de sua vida no hospício e a necessidade de pintar compulsivamente os poucos amigos que ele tinha feito em Arles. Outro sintoma da carência do artista é a enorme atenção que ele dispensou à tela A Mousmé, em uma Cadeira de Junco,

Van Gogh - Mousmé

Como o artista explicou em mais uma carta para o irmão marchand, esse retrato fora inspirado pelo romance de Pierre Loti Madame Chrysanthème e pela arte japonesa. Ele escreveu:

"Levei uma semana inteira... mas eu tinha que reservar a minha energia mental para fazer bem feita essa Mousmé, que é uma menina japonesa - provençal, neste caso - que tem entre 12 e 14 anos de idade.

O uso que o pintor fez das cores aqui pretende ser simbólico. O olhar do observador é atraído pelos padrões que trazem uma energia e intensidade para o trabalho. Os tons complementares de azul e laranja destacam-se contra o verde pálido do fundo e as flores só adquirem sentido se as linkarmos com o fato da garota estar em pleno florescimento da vida. É como se van Gogh tivesse emprestado uma personalidade japonesa a uma mocinha provinciana com o colorido de Arles.

Van Gogh fez vários desenhos preliminares da sua Mousmé, cuidadosamente, pois considerava telas com essa “a única coisa na pintura que me excita até as profundezas da minha alma, e que me faz sentir o infinito mais do que qualquer outra coisa”

A pintura faz parte da coleção da National Gallery em Washington. Van Gogh demorou muito a concluir essa obra, até que nos apresentou uma mocinha de rosto baço composta tão somente por massas coloridas.
A roupa da garota não é um vestido, mas uma coisa composta por dezenas de listras sinuosas e, embaixo delas, um monte de bolinhas vermelhas uniformes e bobas sobre um fundo azul cheguei.

A tal cadeira de junco também não é um móvel, mas arcos esquemáticos em torno da adolescente como que a emoldurá-la. As mãos e o rosto possuem um tom muito esquisito. Um marrom róseo e opaco e, o que é pior, em borrões. Veja como as mãos pendem das mangas como que desossadas. Note as improváveis flores que parecem brotar da palma de uma das mãos.

No rosto dela está aquela ausência sempre presente na cara das bonecas de plástico ou dos manequins nas vitrines da vida. Até o tronco parece errado assim literalmente curvado sobre esse fundo verde – cinza - nada.

Essa Mousmé é tão patética e, no entanto, é maravilhosa. Nela, atributos como beleza e graça deixam de ser pertinentes. Ela me olha tão desconfiada que me deixa até embaraçado. Seus olhos são castanhos, atentos e magoados, como se ela já soubesse que a vida não a trataria bem. Posar deve ter sido um exercício tenso para essa garota.

Mas van Gogh a tratou com uma atenção tão veemente, com um respeito tão total, com um carinho de detalhes tão generoso - até uma fita vermelha ele inventou nos seus cabelos - com uma confiança tão grande de poder resgatá-la do inferno da existência pela vontade absoluta das suas visão e mão - que a pintura tem extraordinário êxito.

Outra inesquecível obra de van Gogh é A Amendoeira em Flor, também muito mencionada na correspondência do pintor com a mãe, o irmão e a cunhada Johanna. Vincent pintou a tela para presentear uma pessoa especial: o bebê recém-nascido do casal. Van Gogh ficara profundamente comovido quando Theo e Johanna decidiram chamar a criança de Vincent e sempre dedicou uma grande dose de carinho ao sobrinho. Escreveu ele à mãe sobre o quadro:

“Comecei a fazer uma tela para o rapazinho pendurar em seu quarto, grandes ramos de flores brancas de amendoeira contra um céu azul. Você verá que essa foi talvez a melhor, a coisa mais pacientemente trabalhada que eu já fiz, pintada com calma e com uma maior firmeza de toque.”

A flores da amendoeira foram idealizadas em homenagem ao xará mas também para honrar a arte japonesa que ele tanto admirava.

Vincent van Gogh menciona o Japão mais de uma centena de vezes em dezenas de suas cartas para amigos e familiares. É claro que o interesse em arte e cultura japonesa foi bastante popular na Europa na segunda metade do século XIX. Edmond de Goncourt e Emile Zola e Pierre Loti, três escritores que van Gogh admirava, escreveram sobre o Japão que, então, começara a se abrir para o mundo. Vincent, um devoto de literatura e arte, iria desenvolver uma profunda admiração pela a cultura do país asiático e uma imaginação japonesa e telas influenciadas por tudo isso.

Sem essa fascinação que sentia pela arte japonesa van Gogh não teria pintado algumas de suas obras definitivas e monumentais de temas florais, como por exemplo, Borboletas e Papoulas, Íris e Raízes e Troncos de Arvore. As cartas de Vincent van Gogh para Theo explicam essa coisa da cor, que na verdade era a linguagem dele:

“A água forma manchas de um belo tom esmeralda ou de um rico azul na paisagem, tanto na terra como no céu. O pôr do sol tem uma cor laranja pálido que faz com que os campos verdes apareçam em azul e que o sol, de um esplêndido amarelo, depois de contaminar as nuvens, passa a ser sanguíneo. O outro nome desse lugar é... vida”.

Van Gogh não estava preocupado em pintar com cores naturalistas mas em expressar as suas emoções pelo uso de cores dramáticas em tons vibrantes e pela distorções das formas. Nas suas telas a cor desenha e contorna, envolve e se distende em espirais sucessivas, num acordo rítmico, com o secreto trabalho mental que enreda a tela e que, gradualmente, fragmentava o seu pintor.

Apesar da enorme produtividade, van Gogh sofria de vários episódios de instabilidade mental, provavelmente incluindo epilepsia, episódios psicóticos, delírios, e transtorno bipolar. Gauguin partiu para Tahiti, em parte como um meio de escapar comportamento cada vez mais errático de Van Gogh.

Alguns meses depois da alta do hospício de Saint- Rémy, o pintor Pissarro, por carta, sugeriu a van Gogh que voltasse a se internar e ele, espontaneamente, foi para o hospício em Auvers, onde produziu até o fim, em média uma pintura por dia.

Van Gogh - Undergrowth with Two Figures



A depressão de van Gogh se aprofundou bruscamente. Em 27 de julho de 1890, em um campo de trigo próximo ao asilo, ele disparou contra o próprio peito com um revólver e morreu amparado pelo irmão Theo dois dias depois. Suas últimas palavras supostamente teriam sido:

"A tristeza durará para sempre."

Em se tratando de Van Gogh eu sinto como se a morte o tivesse libertado tanto da realidade quanto da arte. Como se a natureza e os seus aspectos, a vida e suas crueldades, enfim, tudo que não era invenção da cabeça dele, tivessem sido por ele abstraídos e representados com um realismo sufocante e inexorável, do qual nem mesmo o ato libertador da arte era capaz de livrá-lo.

Exemplos claros da grande influência de van Gogh podem ser vistos em toda a história da arte. Os fauvistas e os expressionistas alemães adotaram, imediatamente após van Gogh, o uso subjetivo e espiritual que ele fazia da cor. Os expressionistas abstratos utilizaram, em meados do século XX, as pinceladas expressivas de van Gogh para indicar o estado psicológico e emocional do artista. Até mesmo os neo-expressionistas da década de 1980, como Julian Schnabel e Eric Fischl, muito devem à paleta de van Gogh.

Na cultura popular, a sua vida tem inspirado música e numerosos filmes, incluindo Lust For Life - Paixão pela Vida - de Vincente Minelli, que em 1956 explorou a relação volátil de van Gogh e Gauguin. Pelo que se conhece pela correspondência entre van Gogh e Gauguin o filme é uma representação bem precisa da tumultuada amizade dos dois. Os diálogos sobre as mulheres e a pintura são magistrais. Quando Gauguin lhe diz que ele pinta depressa demais, van Gogh retruca: 

“E você olha depressa demais.” 

Em sua vida, van Gogh criou novecentas pinturas e fez mil e cem desenhos e esboços, mas vendeu apenas um quadro durante sua carreira.

A arte inimitável de van Gogh foi definida pelo seu estilo poderoso, dramático e emocional. A preocupação do artista com o sofrimento humano está aí em estudos sombrios e melancólicos. Talvez ele tenha tentando explicar a luta entre a mente e a natureza humana. Essa dupla natureza é observável em cada uma de suas pinceladas. Van Gogh escreveu certa vez:

“Nós passamos nossas vidas inteiras em um exercício inconsciente da arte de expressar nossos pensamentos com a ajuda de palavras.”

Como dizia Pablo Picasso, não é papel do cineasta ou do pintor explicar as suas cenas ou as suas telas, pois se assim fosse, em vez de as dirigir ou pintar, as descreveriam. Os cineastas e pintores fazem cinema e pintam porque não conseguiriam se expressar escrevendo.

Porque o que a música fala as imagens não dizem, o que as palavras comunicam a música não consegue passar. Quem escuta a Ode à Alegria, ou olha para as telas de Vincent Van Gogh, ou contempla a Dafne de Bernini, não pode “traduzir” o que essas obras expressam. Talvez, por isso mesmo, a arte tanto enriqueça as nossas vidas, ao acrescentar a elas, por exemplo, a Noite Estrelada de Vincent van Gogh, que não poderia existir fora da tela onde o artista a pintou e que será tema, pois merece, de uma outra conversa.

E a gente se pergunta: mas qual é o legado de Vincent van Gogh?

A beleza! Que ao contrário do que muitos dizem, não está nos olhos de quem a vê. A contemplação da beleza é única para seres racionais. Somente o homem olha para o mar, o neto ou o corpo de uma mulher ou a Provença e pensa: que lindo!?

E, o que é mais denso ainda, só ele percebe que a beleza não é a forma, a mera questão, mas o que se encontra por baixo dela. Que não é o material que faz a escultura bonita, não é a tinta que faz um quadro arrebatador, mas as intenções artísticas e os projetos que moldaram tais obras de modo a fazer delas não algo em si mesmas, mas beleza, esse efeito do nosso espírito.


12 comentários:

  1. 1)https://www.youtube.com/watch?v=Gi_P8XwrSCU

    2)Postei o acima no meu Facebook Antonio Rocha

    3)"Leigamente", desde a adolescência sempre gostei do Vincent.

    4)Moacir, grande crítico de Arte. Parabéns !

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  2. Monica Silva13/09/2016, 09:57

    Moacir, são sempre lindas as suas palavras sobre paisagens, cores ou quadros. Mas me comoveu de forma especial o jeito como você fala do pintor atormentado e da garota adolescente quase como se os conhecesse e eles fossem seus amigos. Terminei a leitura atordoada pela beleza que você comunicou e com vontade de dar colo e paz ao genial Van Gogh e beijos

    (tão doces quantos os de uma avó) na matutinha e em você. Obrigada.

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  3. Moacir,

    Faz algum tempo parei de ler seu texto sobre Van Gogh. Não depressa demais. E continuei aqui. São meus olhos úmidos que revisitam as telas que você junta ao texto.

    Quanta beleza em todas elas, quanta indagação no olhar do seu auto retrato, que me olha fixamente com seu olho esquerdo. E eu devolvo o olhar para o fundo da tela em 'tafetá', que sai do fundo e se insere na roupa de Van Gogh também pelo lado esquerdo. Apenas um fino risco preto separa figura e fundo nesse lado, me deixando a impressão de que ele modificou o que ia fazer.

    Gostaria de dizer alguma coisa que o consolasse nesse tempo para sempre retido em sua pintura. Não há consolo. "A tristeza durará para sempre".

    Van Gogh foi o pintor da delicadeza. Ele me inspira carinho, cuidado. Há nele alguma coisa de mim que me faz querer olhar toda a vida para seus quadros.

    A emoção de ter a pintura de Van Gogh ao alcance dos olhos deve ser de perder a respiração. É um deus, Moacir.

    Abraço
    Ofelia

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  4. https://www.youtube.com/watch?v=Gi_P8XwrSCU

    Vale a pena ouvir, Moacir. Acho a música uma lindeza. Com as imagens de acompanhamento então...

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    1. Moacir Pimentel13/09/2016, 18:18

      Ofélia,
      Eu adoro a canção mas não conhecia este vídeo, muito obrigado.E você tem razão: olhar para essas telas é tudo. Deixo aqui mais uma maravilha.As mãos e os olhos marianos são indizíveis. Foi um dos trabalhos maduros dele - de setembro de 1889. Apesar de toda a sua espiritualidade , essa foi a única vez que van Gogh pintou o Cristo. Se não conseguir abrir o link , o nome da tela é... Pietà
      Abraço

      https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/8/82/Vincent_Willem_van_Gogh_083.jpg

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  5. Dulce Liporace13/09/2016, 16:21

    Olá Moacir ! Gosto demais das pinturas de Van Gogh e você nesse relato além de refletir a vida psíquica do pintor, nos mostra como ele atuava com técnicas de pinturas únicas, como uma pessoa que testa os próprios limites de seu corpo e da sua existência. Suas telas devem ser admiradas com olhos de encantamento , pois apesar das dores físicas e psicológicas com que foram pintadas, elas têm lugar em qualquer ambiente de nossa casa, trazendo-nos a beleza da arte ao nosso convívio e aconchego. Beleza maior é poder admirá-las no Museu D'Orsay, no Museu com seu nome em Amsterdã , ou melhor ainda...nos lugares retratados por ele. Feliz de quem pode vivenciar essa experiência. Aprender, cultivar, admirar artes é um " ato de amor "... Obrigada, mais uma vez, pelo belíssimo relato com cheiro de Provence . Dulce

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  6. Flávia de Barros13/09/2016, 17:25

    Moacir,
    Van Gogh é o pintor da minha vida. Desde menina achava os quadros dele o máximo com todos aqueles amarelos e azuis e coisas incomuns. Eu chorei diante das telas dele naquele museu porque ali estava totalmente revelada a alma atormentada de um ser humano tocado pela beleza divina. Um gênio!
    O seu artigo é muito informativo e a descrição da Provença é simplesmente deliciosa. Mas são suas opiniões sobre o artista que tornam o artigo memorável. Quando diz que Van Gogh retratou a própria miséria na escuridão dos Comedores de Batatas que transformou a cor em emoção que estava se 'dissolvendo' no fundo do autoretrato que a vida era o que inventava na própria cabeça para pintar que tratava os seus modelos com todo respeito e que a garota era patética e por isso mesmo tão especial você diz coisas que eu só sinto e não consigo expressar. Jamais sonhei dizer que Van Gogh tornava o feio bonito nem que se 'atracava' com a natureza mas é verdade.Basta olhar para a pintura dele. Palavras não podem traduzir telas e sinfonias mas essa beleza que você cita a beleza que Van Gogh via e pintava também está na sua alma e ela 'contamina' a sua escrita. Um grande abraço.


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  7. Caro Pimentel,

    Torna-se um lugar comum elogiar os teus textos, tanto pelo brilhantismo dos relatos quanto pelos detalhes abordados!

    Afora tu demonstrares a tua excelência como crítico de arte, principalmente dos grandes mestres pintores!

    Os quadros não estão na minha preferência, lamento confessar, apesar de defini-los como obras memoráveis, esplêndidas, mas que requerem interpretações de almas muito sensíveis, de espíritos muito bem equilibrados entre a realidade e a imaginação.

    Não é o meu caso, que sou até mesmo proibido de entrar em lojas que vendem cristais!

    Mas admiro este teu conhecimento, Pimentel, sobre essas obras inigualáveis e os estilos que os mestres criaram, consolidando-os como assinaturas de seus trabalhos através de digitais inconfundíveis, exatamente pela maneira como lidavam com as cores e os pincéis.

    Assim como maestros regendo os grandes temas com suas batutas e lendo as partituras dos inesquecíveis compositores clássicos, de música erudita, a eterna, esta arte a minha preferida, que não a estou colocando como superior à pintura, de forma alguma, apenas por uma questão de gosto pessoal, mais nada.

    E, justamente, em face do que escreves e pela forma como te expressas, Pimentel, ao abordares a pintura e relatos da vida dos grandes artistas, que estou copiando e arquivando esses registros, assim como fiz com as tuas viagens à Índia, narrativas simplesmente inigualáveis!

    Na falta de competência para poder traduzir melhor a sensação que este teu artigo representou para mim, muito obrigado, Pimentel, por estares conseguindo que eu sinta quase o mesmo impacto que a música me traz, de enternecimento, de viajar no tempo, de me deixar levar pelos acordes, neste caso, pelas cores, pelo estilo e delicadeza de Vincent van Gogh, graças às tuas não menos importantes e extraordinárias palavras a respeito desse fenômeno holandês que, desesperado pela mulher que amava e esta ter se jogado nos braços de Gauguin, outro mestre da pintura, cortou a sua própria orelha, dizem alguns de seus biógrafos!

    Um abraço forte, Pimentel.
    Saúde e Paz!

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    1. Moacir Pimentel14/09/2016, 08:44

      Chicão,
      Ernst Cassirer, um filósofo alemão, explicou a importância das artes da seguinte forma:
      "A ciência ordena os pensamentos, a moralidade ordena as ações, arte ordena a apreensão das aparências visíveis, tangíveis e audíveis".
      Ou seja, nós só somos capazes de considerar o nosso entorno racionalmente, através do prisma histórico gigantesco da ciência, da filosofia e da arte. Todas as artes são linguagens universais e há milhares de anos atrás, a humanidade já contava histórias através delas,com imagens desenhadas nas paredes das cavernas ou com os sons de flautas de ossos. Mas apesar de serem linguagens as artes não se traduzem. Se palavras pudessem expressar tudo o que uma tela diz não a teriam pintado e se pudessem traduzir o encantamento que a grande música provoca em você , árias e concertos e sinfonias não teriam sido compostos.
      O fato é que não importa o meio, nem se é pelos "acordes ou, neste caso , pelas cores" - como você tão acertadamente coloca! - desde que ela seja capaz de nos alcançar nos mantendo eternos aprendizes do mundo, de nós mesmos e do outro.
      De resto, Chicão, enquanto houver homens sobre a Terra, sempre haverá dentro deles mais uma história que valerá a pena ser contada.
      Muito obrigado pelo seu importante comentário e um grande abraço

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  8. Dulce Liporace13/09/2016, 23:43

    Caro Francisco assim como gosto de pinturas, esculturas, fotografias - meu hobby- adoro música clássica, jazz, blues , e ou uma boa música - fale-nos sobre suas preferências - adoraria conhecê-las e acredito que o Moacir também, pois já tivemos oportunidade de trocar vários links musicais - através desses links conheci muitos cantores e músicas inéditas no meu repertório . Para mim é fácil admirar algo novo até mesmo na redondeza do meu bairro, numa manhã cinzenta, num entardecer ensolarado, num arco-íris que aparece de vez em quando, num pássaro comendo goiaba madura no vizinho, nas folhas caindo das árvores da minha rua- quando venta. Gosto muito de poesia, de filmes...enfim tudo que me leva a acreditar na grande possibilidade de viver cada minuto intensamente. E...amo elogiar os amigos, e você faz parte deles- seus textos me fazem refletir bastante. Abraços, depois de ouvir " As quatro estações " de Vivaldi - para adormecer...

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  9. Olá Moacir,
    A inocência do primeiro olhar é insubstituível.
    Mas ver a obra sabendo dela, do lugar, das suas cores e dos seus cheiros é muito bom! É ter de novo a chance de uma outra primeira vez.
    Sua escrita, Moacir, é leve e solta, quase divertida se não,fosse séria.
    Até mais
    "... O trabalho de um homem nada mais é do que uma lenta jornada para redescobrir, por entre os desvios da arte, aquelas duas ou três grandes e simples imagens em cuja presença o seu coração primeiro se abriu." (Albert Camus)

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  10. Moacir Pimentel14/09/2016, 08:27

    Antônio, mais do que um crítico de arte eu sou um pintor amador sem talento, morrendo de inveja e babando diante dos grandes mestres.
    Mônica, se as telas de van Gogh lhe comunicaram beleza , ao gênio você já deu colo e paz.
    Ofélia, seja lá o que de você mora nas tintas de van Gogh, essa coisa que a faz " querer olhar toda a vida para seus quadros", que lhe inspira "emoção, carinho, cuidado e delicadeza", seja lá o que ISSO tudo for , me parece que só pode ser coisa de Deus, arte do dedo Dele.
    Dulce, minha amiga, há décadas que em cada um dos museus que visito eu procuro pelos quadros de van Gogh e de todos continuo saindo querendo mais do mesmo. De resto pensei no seu amor pela Provença enquanto a rascunhava.
    Flávia, no seu comentário ao falar da minha escrita "contaminada " você me fez lembrar da tentativa de definir a arte feita pelo grande Leo Tolstoy , da qual registro uma livre e resumida tradução:
    "A arte é a atividade humana que faz um homem, conscientemente, através de certos sinais externos, por meio de movimentos, linhas, cores, sons, formas ou palavras, oferecer com suas mãos a outros um sentimento que já viveu, expressando-o de modo a que outros possam ser infectados por ele e possam experimentar a mesma sensação. E se os homens não têm essa outra capacidade, a de serem infectados pela arte, são selvagens ainda, e, acima de tudo, distantes e hostis uns aos outros".
    Ana, você botou o dedo na ferida pois - aqui entre nós e baixinho - eu me DIVIRTO! e muito escrevendo (rsrs) Mas o seu comentário me levou sem escalas para a formidável infância e um outro olhar de outro Alberto, o meu Mestre Caeiro :
    "Tenho o costume de andar pelas estradas
    Olhando para a direita e para a esquerda,
    E de vez em quando olhando para trás...
    E o que vejo a cada momento
    É aquilo que nunca antes eu tinha visto"
    Muito obrigado e um abraço para todos vocês

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