Moacir Pimentel
E então,
Vincent, insatisfeito com as suas estrelas, pintou aquela que seria a mais
espetacular das suas obras...
“Esta manhã
eu contemplei a paisagem da minha janela por um longo tempo antes do amanhecer.
Lá não havia nada além da estrela da manhã que parecia muito grande”,
escreveu
van Gogh a Theo, descrevendo sua inspiração para A Noite Estrelada.
A janela a
qual ele se referia era a do seu quarto no asilo de Saint-Paul, em Saint-Rémy,
perto de Arles, onde procurou refúgio do seu sofrimento emocional, para
continuar a fazer a sua arte.
Além de um
aposento privativo, a partir do qual ele tinha uma vista deslumbrante da Serra
dos Alpilles, no asilo van Gogh também dispunha de um pequeno estúdio para a
sua pintura, considerada pelos médicos como “terapia ocupacional”.
Como das
janelas destes espaços o pintor não podia ver a cidade mas sim o jardim do
asilo, presume-se que van Gogh tenha construído o seu mais famoso quadro usando
elementos de algumas obras concluídas anteriormente e armazenadas em seu
estúdio, bem como a delirante imaginação e a memória.
Van Gogh - Noite Estrelada |
Os especialistas nas tintas têm argumentado, por exemplo, que essa torre da igreja
na aldeia é muito mais holandesa do que provençal, uma amálgama de várias
torres de igrejas diferentes que van Gogh já teria pintado antes. Van Gogh compreendia,
pelo menos nas suas cartas, a pintura como sendo um exercício de estilização
deliberada, como escreveu para o irmão:
“Estes são
exageros do ponto de vista da organização e suas linhas são controladas como as
de xilogravuras antigas com seus contornos grossos e formas simplificadas”.
Como
podemos ver, van Gogh estava ciente de que as suas composições estreladas eram
surreais e estilizadas. Por outro lado, A Noite Estrelada evidencia uma
observação prolongada de van Gogh do céu noturno. Depois de deixar Paris para
áreas mais rurais no sul da França, van Gogh passava horas contemplando as
estrelas sem a interferência do gás ou das luzes elétricas cada vez mais em uso
no final do século XIX. Nas copiosas cartas ele poetava:
“A noite é
ainda mais ricamente colorida do que o dia, colorida com violetas mais
intensos, azuis e verdes. Se você olhar cuidadosamente, verá que algumas
estrelas são cor de limão, outras têm uma cor rosada, verde, ou o fulgor azul
dos miosótis. Pintar um céu estrelado não é colocar pontos brancos em azul ou
preto”.
Parece que van
Gogh, seguiu seu próprio conselho, pois a Noite Estrelada explode em uma
variedade de cores nas sua texturas e pinceladas enlouquecidas. Sem dúvida, é
esta rica mistura de invenção, lembrança e observação combinada com uso de
linhas simplificadas, impasto grosso e cores ousadamente contrastantes que fez
o trabalho tão atraente para as gerações subsequentes de espectadores. Inspirar
e encorajar outros artistas é precisamente o que van Gogh queria alcançar com
suas cenas noturnas que poderiam dar aos outros a ideia de fazer a noite melhor
do que ele. Ao fim e ao cabo, o desejo do pintor foi atendido já que sua Noite
Estrelada tornou-se uma imagem fundamental para o expressionismo.
Esse quadro
é dominado pelo céu noturno cheio de estrelas, turbulento, agitado mesmo, em
redemoinhos e espirais que parecem rolar por toda a sua superfície como ondas.
O impacto desse céu é tamanho que nos é difícil, de saída, individualizar os
elementos que crivam de luz o espaço pictórico. As onze estrelas amarelas são
como fogueiras iluminando toda a cena em contraste com o céu que leva em uma
incrível variedade de tons de azul e cinza. Há também a lua crescente no canto
superior direito que irradia uma luz mais brilhante e mais laranja que as
demais estrelas e Vênus, a estrela da manhã, à esquerda do centro, rodeadas
ambas por círculos concêntricos de luz branca e amarela radiante.
Abaixo do
céu monopolizador, mora uma aldeia silenciosa de casas humildes que cercam uma
igreja, cujo campanário se eleva, acentuadamente, acima das ondulantes
montanhas azul-quase-pretas no fundo. A vista para o céu, a noite e a aldeia
são parcialmente bloqueadas por um enorme cipreste que tem uma qualidade
contorcida e uma coloração verde muito escura, quase preta, totalmente
alienígena em meio aos demais tons da tela relativamente pastel. Esse cipreste
toma conta do primeiro plano da noite, cresce poderoso e quase alcança a borda
superior da tela, fazendo uma ligação visual entre a terra e o céu.
Considerado
simbolicamente, o cipreste poderia ser visto como uma ponte entre a vida,
representada pela terra e a aldeia, e a morte comumente associada com o céu. De
resto, convencionou-se que os ciprestes são árvores de cemitério e arautos do
luto, pelo menos nas telas noturnas do Vincent.
“Mas a
visão das estrelas sempre me faz sonhar,” van Gogh escreveu certa vez.
“Ora, eu
pergunto para mim mesmo, e se os pontos de luz no firmamento fossem tão
acessíveis para nós como os pontos negros no mapa da França? Assim como nós
pegamos o trem para ir para Tarascon ou Rouen, tomaríamos a morte para ir a uma
estrela.”
Eu prefiro
não espiritualizar A Noite Estrelada. As formas girando no céu, para mim são
nebulosas da tempestade interna do artista. Não percebo nesta cena noturna
qualquer caos mental, mas muito ao contrário, acredito que van Gogh estudou
detalhadamente os céus noturnos da Provença, que planejou todo o cenário e que
a ele chegou através de tentativas e erros pretéritos.
O fato da
Noite Estrelada ter sido pintada a partir de uma imagem mental pode contribuir para
que essa peça me passe uma sensação tão forte de deslocamento mental e
intensidade emocional. É como se van Gogh não fosse capaz de conter seus
sentimentos e que toda a sua angústia e paixão tivessem sido misturadas às
tintas.
Ao fazer a
lua e as estrelas surgirem tão grandes que até nos parece que o céu pode
desabar a qualquer momento sob o peso delas ou que as estrelas estão prestes a
mergulhar de cabeça no vilarejo, é como se van Gogh estivesse criando o seu
próprio tipo de realidade e nela enfatizando o que era importante para ele,
mesmo que isso resultasse em perspectivas distorcidas.
Ele dissera
a Theo, que em vez de usar cores de forma realista, ele as usaria “mais
arbitrariamente, a fim de expressar-me com mais força”.
Se eu
tivesse que apontar, nessa tela, um espaço no qual van Gogh se encontra
projetado, sem vacilar acusaria esse cipreste de folhas escuras que alastra
seus galhos como serpentes do lado esquerdo da imagem. Ele nada tem a ver com o
resto da pintura e perturba todo o equilíbrio daquilo que sem ele teria sido
uma Noite Estrelada de contos de fada mas não uma obra prima.
Na sua
“Sintaxe da Linguagem Visual” Donis A. Dondis jura de pés juntos que o olho
humano normalmente favorece a área inferior esquerda de qualquer campo visual.
Uma interpretação coerente é supor que van Gogh tenha deliberadamente pintado o
cipreste em uma posição tão proeminente como uma representação da angústia
interior que dentro dele também se contorcia, resultante da solidão de ver o
mundo como ninguém mais via.
Como van
Gogh mesmo nos esclarece:
“Nós
podemos ter mais sucesso na criação de uma natureza mais excitante e
reconfortante do que com esse discernimento nascido de um vislumbre da
realidade.”
Apesar de
toda a sua originalidade e exuberância, essa composição me parece equilibrada e
é estruturada pela colocação consciente e milimétrica do cipreste inabalável
porém curvilíneo e pintado da mesma maneira que o céu, com essas linhas leves
que aumentam o fluxo da noite, em meio às nuvens que giram, as estrelas que
brilham, a lua que se expande, todas elas com impressionantes fluidez e
movimento.
É claro que
na Noite Estrelada as formas e contornos são um meio de expressão e eles são
usados para transmitir emoção e por isso mesmo muitos entendem que a luta de
van Gogh para superar sua doença está refletida na escuridão do céu noturno e
na aldeia pintada com cores escuras.
As janelas
iluminadas criam uma sensação de conforto, a vila é pacífica em comparação com
o céu noturno dramático e o silêncio da noite quase pode ser sentido. O
campanário domina a aldeia e pode até simbolizar a unidade entre a cidade e a
noite acima dela, mas em termos de composição passa uma impressão de
isolamento. Os edifícios no centro da pintura são pequenos blocos de amarelos,
laranjas e verdes com uma pitada de vermelho à esquerda da igreja. As casas são
discretamente pintadas no canto inferior direito da pintura e se misturam muito
bem com a floresta e as montanhas. A arquitetura da aldeia é simplória e sem
qualquer fato luminoso a dar-lhe vida tem-se a impressão de que todos lá estão
provavelmente dormindo.
A
predominância do azul na Noite Estrelada é equilibrada pelo laranja dos
elementos do céu noturno e pelos toques de verde no reflexo da lua. Van Gogh
usou ainda o branco e o amarelo para criar um efeito em espiral e chamar a
atenção para o céu. As linhas verticais, como as do cipreste e as da torre da
igreja suavemente quebram a composição sem retirar qualquer brilho do poderoso
céu, o dono incontestável deste show.
O certo é
que o próprio van Gogh não deu maior valor a essa obra de arte excepcional, não
só pela sua qualidade, mas pela raridade dentro da obra do artista, uma vez que
em comparação com outros temas mais favorecidos, como íris, girassóis, ou
campos de trigo, as paisagens noturnas são poucas. Van Gogh a mencionou a sua
melhor Noite Estrelada brevemente em suas cartas como um “estudo da noite”.
Há várias
interpretações da Noite Estrelada e uma delas é que essa tela retrata
esperança, pois van Gogh nos teria expressado que mesmo na sua escura noite
mental e trancafiado em um hospício, ainda lhe era possível ver a luz nas
janelas das casas e estrelas brilhantes para guiá-lo. Outros lembram que
durante anos a fio van Gogh dedicou sua vida à evangelização daqueles em
situação de pobreza - a quem dava o salário, os alimentos e as próprias roupas
- e acreditam que ele nos deixou uma mensagem religiosa refletida nas onze
estrelas da pintura. Em Gênesis 37: 9 pode-se ler:
“E sonhou
ainda outro sonho, e o contou a seus irmãos, e disse: Eis que sonhei um sonho a
mais, e eis que o sol, a lua e onze estrelas se inclinavam para mim.”
Parece-me
que os que assim interpretam essa pintura não perceberam que nela não há sol
(rsrs) e que nas pinturas, muito mais importante do descobrir o que o seu autor
tentou dizer-nos, é o que a obra efetivamente diz a cada um de nós. Para mim,
na Noite Estrelada de van Gogh, uma torre de igreja e um cipreste representam o
homem - o que pinta e o que observa - e ambos falam sobre o vasto poder da
natureza mas a reinventam enquanto apontam para Deus.
Essa Noite
Estrelada escalou o Everest das realizações artísticas e as consequências dela
são enormes. Tornou-se uma das imagens mais conhecidas na cultura moderna, bem
como uma das mais replicadas e procuradas impressões. Da canção de Don McLean “Vincent”,
inspirada pela pintura, a um número sem fim de produtos que ostentam esta
imagem, é quase impossível se desconhecer, em qualquer lugar do vasto mundo,
esta pintura surpreendente.
Pode-se
começar a perguntar o que na pintura é responsável pela sua popularidade
crescente. Para começo da conversa essa é uma cena com a qual todos podemos nos
relacionar. O céu mantém os olhos do espectador prisioneiros e faz com que se
desloquem sobre a pintura, seguindo as curvas e orientados pelas estrelas. Este
movimento mantém o espectador envolvido com a pintura, o faz reconhecer a
pequenina aldeia, ver as janelas iluminadas, resgatar memórias de seus próprios
anos de infância cheios de imaginação e de outros céus estrelados. Trata-se de
uma imagem universal, que fala ao coração humano.
Claro que
para entender o seu estilo dessa pintura temos de olhar para a imagem maior:
van Gogh como Hegel acreditava na supremacia da Arte, do “produto humano”
sobre quaisquer produtos naturais, era convicto de que o espírito, mesmo ao
produzir o maior dos absurdos, é superior à natureza que é cega, e pregava no
que parecia ser um deserto que “a arte não é para imitar a forma, mas para
criar formulário.”
Além disso, van Gogh tinha sido
treinado em Paris por impressionistas, mas inaugurou uma nova era na pintura,
tendo sido o primeiro dos pós-impressionistas da gema. Tanto o Impressionismo
quanto o Pós-Impressionismo foram dois imensos e inovadores passos na história
da arte. Embora ambas as tendências compartilhassem conceitos, os dois estilos
foram bastante diversos quanto aos objetivos e as técnicas.
O Impressionismo, que deve a Claude
Monet os seus primórdios, pretendia capturar um momento no tempo com a pintura,
registrar a visão inicial de seu entorno, com objetividade pura. Embora
variassem nas técnicas, todos os impressionistas compartilharam a rejeição dos ideais
românticos subjetivos e o impulso para registrar a realidade de um jeito
moderno.
Já o Pós Impressionismo, que de saída
pode ser definido como uma resposta ao Impressionismo, estava ligado ao desejo
dos artistas de ir além de uma representação passiva da percepção. A ideia
inaugurada por Monet da percepção imediata foi rejeitada por van Gogh, em favor
do ponto de vista pessoal e original do artista de seus arredores. Em outras
palavras, o Impressionismo foi filho da objetividade, enquanto o Pós
Impressionismo foi cria da subjetividade, embora ambos falassem línguas vanguardistas.
Van Gogh era espiritual e romântico
enquanto Cézanne pintava de forma mais intelectual e cerebral, mas ambos
alteravam a realidade e perseguiram a auto expressão e cada um deles teve um
estilo único, embora com perspectivas deliberadamente distorcidas. O Pós
Impressionismo destruiu a ideia de “arte como uma janela” e deu o espectador um
papel mais ativo, forçando o público a interpretar obras de arte, em vez de
observá-las passivamente.
O que
significa que os artistas deste período tiveram uma visão subjetiva do mundo
visual e pintaram o seu mundo de acordo com suas próprias percepções
artísticas.
Suas obras
refletiam suas próprias personalidades originais e percepções. No caso de van
Gogh, ecoaram ainda uma grande intensidade emocional. Ele gostava de pintar
paisagens porque elas refletiam melhor a sua alma divorciada das fronteiras
artísticas tradicionais. A Noite Estrelada é a personificação do estilo e da
expressão única de van Gogh. Na verdade, peças como estas têm desempenhado uma
grande influência sobre a arte moderna.
Mas essas
belíssimas noites não são para mim anúncios da morte do artista. Veja o caso
dos girassóis. Inicialmente, girassóis apareceram como pequenos detalhes nas
paisagens de van Gogh. Então, em 1887, em uma série de quatro óleos, ele fez um
estudo minucioso deles, enfatizando suas sementes, como símbolo de vida. As
telas foram consideradas “risíveis” pelos críticos parisienses. E van
Gogh continuou a pintá-los indiferente. Ele simplesmente gostava dessas flores.
Mas foi em
Arles que o grande "período girassol" de van Gogh aconteceu. Ele
estava tão satisfeito pintando seus girassóis que pendurou duas grandes telas
no quarto de Gauguin, para saudá-lo quando, depois de muita relutância e
atraso, o amigo chegou em 23 de outubro de 1888.
“Estou
pensando em decorar meu estúdio com meia dúzia de pinturas de girassóis. Minhas
pinturas são um grito simbolizando gratidão no girassol rústico.”
Van Gogh - Girassóis |
Nessa
versão, que hoje faz parte da coleção da National Gallery de Londres, van Gogh
pintou quinze girassóis em um pobre vaso de barro contra um fundo amarelo em
chamas. Algumas das flores são frescas e alegres, outras começam a murchar e a
largar sementes, outras despencam tristes. Em parte a tela é uma meditação
sobre os caprichos do tempo, mas a imagem confere um toque vivo, dinâmico,
ferozmente colorido à longa tradição humana da pintura de flores.
O artista
combinava os amarelos das flores em contrastes brilhantes, as formas e linhas
das pétalas e dos caules lhe ofereciam renovados desafios, e no verão de 1888
ele pintava os girassóis de forma rápida e com grande energia e confiança.
Escreveu ele ao irmão
“Estou
pintando girassóis com o entusiasmo com que como uma bouillabaisse Marseillaise!”
(um ensopado de peixe provençal).
Van Gogh
percebeu de imediato que tinha criado algo importante e apreciava o fato dos
seus girassóis serem tão distintos ao ponto de funcionarem quase como sua
assinatura de artista. Como ele disse a Theo, em janeiro de 1889: “O
girassol é meu.” Portanto creio que a tela abaixo foi um dos bilhetes
suicidas mais eloquentes de van Gogh.
Van Gogh - Girassóis Secos |
Há uma
extensa polêmica a respeito de qual teria sido a última tela de Vincent Willem
van Gogh. Charles-Francois Daubigny era um dos pintores mais conhecidos da
Escola de Barbizon. Mudou-se para Auvers por volta do ano 1860 e tinha lá uma
casa que se tornara um ponto de encontro para muitos artistas. Van Gogh pintou
o grande jardim em torno de sua casa várias vezes. Em julho de 1890, van Gogh
completou duas pinturas do jardim e mencionou estas obras em uma carta a seu
irmão em 23 de julho. Uma destas pinturas poderia ser a pintura final de
Vincent van Gogh.
Alguns
estudiosos acreditam, em vez, que Raízes de Árvores e Troncos foi a última tela
pintada por ele.
Não importa
qual das pinturas tenha sido, de fato, aquela derradeira. Todas as que
mencionei aqui foram pintadas às vésperas de sua morte e, portando, influenciadas,
em algum grau, pela decisão de van Gogh de acabar com a própria vida.
Atualmente não existe nenhuma prova de qual das pinturas de van Gogh foi a
definitiva. A menos que surjam novos dados, a questão permanecerá um mistério.
Van Gogh - Campo de Trigo com Corvos |
Porém... Gosto
de imaginar que tenha sido O Campo de Trigo com Corvos pois tenho certeza de
que depois DISSO van Gogh teria abstraído.
Mais uma
vez são imensas as leituras desta tela de van Gogh e elas vão desde as mais
devotas às mais absurdas. Interpretações simbólicas podem ser muitas vezes
interessantes, e, ocasionalmente, reveladoras, mas o excesso de “interpretação”
de uma obra de arte coloca o espectador em risco de se perder na viagem.
As obras de
Vincent van Gogh proporcionam a quem as observa uma gama incrivelmente complexa
e bonita de assuntos para explorar e admirar. Suas cores são o produto de um
contador de “estórias” de habilidade indescritível. Em vez de buscar respostas
dentro dos campos de trigo ou no sussurro das asas dos corvos melhor é admirar
a cor, a vitalidade e a harmonia turbulenta de cada pincelada. Os segredos
intangíveis, se houver algum, estão dentro de nós.
“Eles são vastas
extensões de trigo sob céus incomodados, a fim de tentar expressar a tristeza e
a solidão extrema... Estou bastante certo de que essas telas irão dizer-lhe o
que eu não posso dizer em palavras”.
Vincent van Gogh
1)Parabéns Moacir, quedo-me estudando suas linhas com as linhas de van Gogh.
ResponderExcluir2)Li alhures, não me lembro onde que, van Gogh era teólogo, vc confirma?
3)Gravei até uma frase atribuída ao pintor que considero linda: "Eu tenho necessidade de religião, então, eu saio à noite e pinto as estrelas".
4)Que bela profissão de fé que encanta os nossos olhos e as nossas mentes.
5) Abraços. Antonio.
Olá, Antônio,
ExcluirNão, van Gogh não era um teólogo. Na verdade ele chegou a se preparar para fazer o exame de admissão para a Escola de Teologia em Amesterdam , mas se recusou a fazer a provas de Latim e foi reprovado.
O que se prova é que o filho de um pastor luterano e de uma amante da natureza e aquarelista , teve a vida marcada por Jesus Cristo e pelo desejo de se tornar um pastor missionário e isto efetivamente ele se tornou, no sul da Bélgica, em um lugar para onde os pregadores eram normalmente enviados como punição. Ele pregou e cuidou dos doentes e ainda pintou os mineiros de carvão e suas famílias, que o chamavam de Cristo pois ele passara a viver com os pobres, a dar-lhes o salário e até as próprias roupas e a se apresentar praticamente como um mendigo, comportamento que a Igreja considerava inadequado e preocupante ,principalmente quando a coisa passou a ter um tom de martírio.
Depois que reprimendas e castigos não resultaram em um comportamento mais "equilibrado", a Igreja Luterana se recusou a renovar-lhe o contrato e ele foi afastado das funções. Tentou continuar a pregar de forma independente por um curto período de tempo, foi também recusado pela Igreja Metodista, até que foi forçado a deixar as minas e encontrar outra fonte de renda.
Ele então se afastou da religião pelo resto de sua vida mas procurou a fé cristã entre aqueles desencantados com a Igreja e foi atraído pelos escritos de Ernst Renan, de quem adotou muitas das filosofias mas se afastou quando Renan finalmente negou a divindade do Cristo.
Há rumores sobre um abraço no misticismo oriental, no qual não acredito, por que não há nada nas suas caudalosas cartas que sequer sugira isso.
Embora como pintor ele tenha rejeitado o uso das imagens cristãs tradicionais, à exceção das obras a Ressurreição de Lázaro, a Pietà, e a Parábola do Bom Samaritano já no final da vida, ele desenvolveu uma iconografia espiritual própria nesses ciprestes - segundo ele "mais belos que catedrais" - campos de trigo e céus estrelados.
Abraço
1) http://yukisekine.blogspot.com.br/2009/12/o-japao-que-van-gogh-sonhou.html
Excluir2) Obrigado Moacir, eu tb já ouvi essa história do possível interesse de van Gogh por gravuras japonesas.
3)No link acima o autor transcreve trecho de uma carta de van Gogh ao irmão Theo falando sobre pinturas japonesas ...
4)Na faculdade uma professora de Filosofia dizia que o impressionismo ocidental tem traços japoneses ...
5)Obrigado, de novo ! Antonio
Antônio, meu vizinho, se cabe a alguém é a mim e não a você, os agradecimentos por estarmos "conversando".
ExcluirEu sou cuidadoso ao "traduzir" van Gogh.Você que é doutor em Literatura sabe que se lemos: "o rei morreu e depois a rainha morreu", estamos diante da História. Mas que se lemos, em vez, "o rei morreu e depois a rainha morreu de DESGOSTO" , trata-se de Poesia.
No caso de van Gogh, por causa das cartas - quase mil só para o irmão Theo - a prosa não nos permite muitos versos. Van Gogh se referiu ao Japão mais de cem vezes na sua correspondência. E um fragmento dessas menções não deveria ser lido como o todo.
O pintor foi profundamente influenciado sim pelas cultura e arte japonesas - no tempo dele a reclusão japonesa tivera fim e rolou o comércio entre o Japão e o Ocidente. Ele colecionou gravuras japonesas feitas com blocos de madeira - as ukiyo - juntamente com o irmão e Manet e Degas e Monet. Naquela época o Japão "viralizara" e , é claro, tudo isso pincelou o trabalho dos impressionistas. As centenas de peças dessa coleção de van Gogh moram no Museu de Amsterdam.
No post A Luz da Provença eu falo das paixões nipônicas de van Gogh pois sem elas várias telas dele não teriam sido pintadas. No entanto o entusiasmo artístico de van Gogh pelo Oriente já diminuíra em julho de 1888 em favor do impressionismo, pois então ele escreveu ao irmão:
"Felizmente, sabemos mais sobre os japoneses franceses, os impressionistas. Isso é, definitivamente, a essência e a coisa principal".
Então termino onde você começou brilhantemente: quando ele tinha necessidade de Deus, saía à noite para pintar as estrelas.
Abração
Moacir,
ResponderExcluirEstou escrevendo e ouvindo a música depois de ter passeado pelos quadros de Van Gogh no vídeo. Quadros falam tudo. Ele viveu muito além do seu tempo sofreu por isso e é comovente ver que a tristeza dele deixou o mundo mais colorido e estrelado.
Que descanse em paz nas estrelas.
Um abraço
Moacir, de arte eu sei quase nada mas a Noite Estrelada dói de tão bonita e quem já olhou pro céu na praia de Lençóis no Maranhão entende um pouco de estrelas. Sabe o que é triste lendo os seus lindos artigos sobre Van Gogh? Imaginar a barra que não deve ter sido para este homem ver o mundo de um jeito que 'ninguém mais via'. Só podia dar no girassol que deu.
ResponderExcluirCaro Pimentel,
ResponderExcluirObrigado pelos artigos sobre este fenomenal Van Gogh, e que nos ensinam - a mim, pelo menos - observar esses talentos geniais com outros olhos, com mais amplitude, que não seja apenas a maestria de suas telas, o talento e vocação notáveis à pintura!
Por outro lado, já sei o presente que vou te dar dia desses, até porque vou pesquisar para encontrar:
A biografia deste pintor notável, Vincent van Gogh!
Aliás, se tiveres uma sugestão de autor, por favor, me comunica.
Um forte abraço.
Saúde e paz, meu caro.
Olá Moacir. Mais uma bela esplanação sobre as telas de Van Gogh. Essa tela é uma das mais bonitas e expressivas dele- eu acho. No seu mundo conturbado Van Gogh consegue maravilhar-se com o céu estrelado e transmitir através das cores de sua tinta todo o esplendor capturado nessa Noite Estrelada. Cada detalhe explicado por você faz com que apreciemos quase que um céu real. Fico perguntado-me : Será que ele sentia calma nesses momentos ? Acredito que sim...e música dedicada a ele, fala-nos de sua libertação sentida quando ele pintava. Eu - como a música - gosto de imaginá-lo enlevado, calmo, numa relação direta com Deus., afinal de contas a natureza nada mais é do que o próprio Deus a nos falar. Abraços encantados, Dulce
ResponderExcluirOlá, Moacir. Van Gogh e você, dobradinha de sucesso. E um texto tào rico, que a gente vai da palavra para a imagem, para conferir, e volta para apalavra, e se perde, e começa de onde achou, um delicioso nunca acabar. Até mais.
ResponderExcluirFlávia, penso que sem experimentar toda essa agonia que adivinhamos nessas telas estupendas, van Gogh não teria pintado mas torço para que ele tenha alcançado as estrelas.
ResponderExcluirMônica, você botou o dedo na ferida: solidão é ver o mundo do nosso jeito apenas. Quando o vemos pelo olhar de mais alguém dá em... arte (rsrs)
Caríssimo Bendl, tem um livro sim , e não é sobre van Gogh, que eu teria muito orgulho de colocar na minha estante. Mas trata-se de uma obra que jamais esteve à venda e me parece que , mesmo assim, a edição se encontra esgotada. Não tenho certeza do nome...mas a história acontecia dentro de um Táxi.
Querida Dulce Regina, a linguagem desse gênio mais que a da Natureza era a da cor e foi com ela que van Gogh tentou expressar suas emoções. É a cor que nessas telas desenha e contorna, envolve e se distende em espirais sucessivas, num acordo rítmico com o secreto trabalho mental do pintor . Foi ela que o fragmentou. Eu sinto como se a morte o tivesse libertado tanto da realidade quanto da arte. Ou seja, como se a natureza e os seus aspectos, a vida e suas crueldades , enfim, tudo que não era invenção da cabeça dele , tivessem sido por ele abstraídos e representados com fúria,com um realismo sufocante e inexorável só dele , do qual nem mesmo o ato libertador da arte foi capaz de livrá-lo.
Donana, me parece "bem bom" esse ir e vir por caminhos ora pretos no branco ora de variadas tintas. Afinal...
"Caminante, no hay camino, se hace camino al andar"
Abraços e muito obrigado a todos
Oi Moacir,
ResponderExcluirdevagar, quase parando, chego um dia atrasada.
Para perguntar: o que há de verdade na história de miopia nos impressionistas?
Para dizer: fiquei tão alegre por você ter encontrado um vídeo com novas pinturas, pinturas que meus olhos não conheciam.
Abraço
ofelia
Ofélia,
ResponderExcluirLembro que alguém na academia cogitou essa teoria há muitos anos atrás. Eu pessoalmente não acredito nela. Por várias razões. Apesar de se ter prova de que alguns impressionistas - Degas, Monet, Renoir e Pissarro - tinham problemas de visão, eles ocorreram bastante tarde em suas carreiras depois que tinham pintado por pelo menos uma década - ou duas em alguns casos - grandes pinturas impressionista.
A miopia se caracteriza pela visão prejudicada somente à distância.Ela também não afeta a percepção da cor. Muitos míopes preferem ler sem lentes, inclusive. Ou seja, nada impediria tais artistas de ter a visão próxima e perfeita dos seus temas, se eles tivessem desejado capturar os detalhes que não podiam ver à distância.
Eu diria que a catarata de Monet - um dos meus malucos preferidos - no final de sua vida, afetou sua pintura. Para melhor. Além dele, eu não me lembro de alguma vez ter ouvido dizer que Morisot, Sisley, Cézanne, Manet, Bazille e muitos outros tivessem problema de visão.
Os pintores impressionistas pintaram consciente e deliberadamente e sabiam exatamente o que estavam fazendo: expressando a vida de um jeito diferente nas suas telas. Uma possível epidemia de miopia (rsrs) não seria um argumento forte o suficiente para banalizar a intenção das obras impressionistas.
Um abraço para você