Rio Oirase - imagem TANAKA Juuyoh (Creative Commons) |
Antonio
Rocha
Quando
aquele ator global faleceu na correnteza do Rio São Francisco, eu me lembrei
das lições que as correntezas da vida me passaram.
A
primeira lição eu tinha uns quatro anos, ainda estava no Recife, às margens de
um caudaloso rio, não sei se Beberibe ou Capibaribe. Contemplei o
impressionante volume de águas e desde então passei a respeitar a força das
águas. Então ouvi: “Respeite a Correnteza”. Certamente um anjo me soprou o
recado nos ouvidos. Pode ter sido gente, mas eu não lembro de ninguém perto...
só eu e o Rio. Aliás, hoje, budisticamente falando, vejo que o Rio também é um
Ser Vivo, é uma “pessoa” aquática...
A
segunda lição já foi no RJ, em Realengo onde eu morava, perto de nossa casa
havia um pequeno rio e nas chuvaradas de verão ele transbordava e muitos iam nadar.
Novamente eu contemplava a Energia das águas, algo marcante.
A
terceira lição já foi na cidade satélite do Gama, DF, perto de nossa casa, no
Setor Leste havia um córrego. Se tinha nome eu não sei, todo mundo chamava de
córrego. Eu acho esta palavra com uma sonoridade linda... córrego... de correr,
de passar, a vida correndo, passando e nós devemos acompanha-la.
Foi
nesse córrego que aprendi a nadar. Adolescente nós víamos as mulheres lavando
roupa na beira desse riacho, batendo as peças de roupa nas pedras, após
ensaboadas deixando-as quarar ao sol e por fim o enxágue.
Novamente
me disseram: respeite a correnteza, em tempo de chuvarada não mergulhe, pode
ter pedaços de madeira encobertos ou mesmo pedras.
Belo
dia fui participar de uma Colônia de Férias na Área Alfa, que era uma
localidade próxima ao Gama, residências da Marinha e um Clube Campestre, local
lindíssimo. Eu não sei se era o mesmo córrego do Gama, mas o riacho que passava
na Área Alfa, com uma correnteza bem mais forte fizeram uma bonita piscina de
água corrente e claro, lá aprimorei os meus primeiros passos, ou melhor, as
minhas primeiras braçadas em uma piscina de respeito com água corrente.
A
Colônia de Férias era orientada pelos Jesuítas e o coordenador era o padre
espanhol Gabriel Galache, anos depois encontrei ele como diretor das Edições
Loyola, em SP. Fomos
treinados para fazer um trabalho social em uma região carente chamada Vila São
João onde estava acontecendo um surto de poliomielite e nós, da Colônia de
Férias, íamos de casa em casa, vacinando as crianças.
Mas o
destaque é que, uma vez fiquei entusiasmado com a piscina citada e na hora do
almoço não acompanhei o grupo que já estava no refeitório. Nadando só na piscina,
me aventurei na correnteza, na borda só havia uma beldade em minúsculo biquíni
da época e um rapaz perto, os dois pegando sol.
Não
sei como, esqueci todas as lições e comecei a me afogar na correnteza, sentia
sendo puxado pela estranha força, gritei “socorro”, mas a mulher ao sol nem
ligou para a minha aflição. Só depois de beber bastante água e ser um pouco
arrastado pela correnteza é que o rapaz pulou na água e me puxou pelos cabelos,
ainda bem que era a moda dos cabelos grandes na época da “jovem guarda”.
Aprendi
outra lição, para salvar alguém de afogamento, puxe pelos cabelos, pois a
tendência do afogado é abraçar o salvador e aí os dois podem, no desespero,
morrer.
Quando
saí da piscina, tossindo e vomitando água, a mulher exclamou:
- Então era verdade? Eu pensei que você estava
fazendo graça para eu te olhar...
- Dona, o cara quando está morrendo afogado não vai
pensar em paquerar ninguém – disse o rapaz que me salvou.
Agradeci
e fui almoçar.
Por
fim, nas minhas experiências com as correntezas foi quando a turma do Gama
resolveu fazer uma pescaria em Goiás, no Rio Santo Antonio do Descoberto, que é
um grande rio e um município.
Os
outros pescaram, eu não pesquei nada, limitei-me a contemplar a magnífica
correnteza. Também não me atrevi a nadar. Observei que nem os experientes
pescadores que estavam comigo banharam-se no rio. Os outros conseguiram pescar.
E na volta ganhei um único peixe, como prêmio de consolação, que entreguei para
minha mãe preparar. Era um peixe de uns cinquenta centímetros, bem encorpado.
Quanto
ao ator global, na ocasião, fiz as minhas preces budistas para ele, que já
estava em outra dimensão da vida, e os familiares e amigos que ficaram.
Olá Antônio. Concordo com você a natureza deve ser muito respeitada e às vezes até temida. Lembro das palavras de minha avó ( ouço ainda perfeitamente a voz dela ), na ocasião em que fizeram o aterro do Flamengo : " Ficam mexendo com natureza...um dia ELA cobra ". Intuição dos mais velhos, naquela época nem se pensava em ecologia ou aquecimento global. Bom fim de semana ! Abraços, Dulce
ResponderExcluir1) Obrigado Dulce, sua avó estava certa.
Excluir2)Eu tb acredito que, vez por outra, a Natureza cobra os deslizes que cometemos contra o Ecossistema.
3) A cobrança não é vingança, mas uma questão de Equilíbrio do ambiente natural.
4)Amplexos !
Antonio, não sei bem como dizê-lo "budisticamente", mas parece que naquele dia o biquíni fez você esquecer a concentração no aqui e agora :)
ResponderExcluirA vida é cheia de correntezas, difícil é saber, em cada uma, para que lado nadar.
1)Oi Wilson, concordo plenamente. Depois que escrevi o texto entendi que contemplei demais a beldade e esqueci as lições de natação...
Excluir2)Outra lição que aprendi e não citei no artigo, na hora do almoço eu deveria ter ido com todo o grupo, fiquei isolado com a visão da sereia e quase fui ao fundo...
3) O Aqui e o Agora, budisticamente falando era o almoço que me esperava.
Antônio, dizem que "quem quer peixe molha o rabo" mas nem um pouco "budisticamente" e quase literalmente a gente conclui que:
ResponderExcluir" Não se vai ao Rubicão para pescar "
Bom final de semana para você
1) Vizinho Moacir, vc tem toda razão, por pouco não fui visitar os inebriantes aposentos no Palácio da Sereia de Biquini, lá nas profundezas...
Excluir2) Bom final de semana !
Oi Antonio,
ResponderExcluirbom dia.
Você sabe, deve saber, eu acho, que a Ofélia, do Hamlet, morre afogada.
Quando eu soube, ainda menina, aquilo chegou até a mim como uma ameaça.Toda e qualquer água sempre me assustava.
Se íamos a Niterói visitar as irmãs do meu pai e o tempo não estava muito bom para botar o carro na barcaça (que jogava mais que a barca de passageiros), meu pai me dava de presente a viagem longa por Magé, circundando a baía. Não havia ainda a Ponte Rio-Niterói.
No dia em que a ponte foi inaugurada, meu pai botou minha mãe e os quatro netos no carro e foi desbravar o trajeto. Pegou um senhor engarrafamento, A criançada queria água, queria tudo, mas na ponte não tinha.
Foi uma satisfação a ponte concluída. Ir a Niterói tornou-se fácil. Bom, quando não ventava muito. O vento, na ponte, é um grande problema.
Ah, minha amiga Renilde, baiana, contava que quase se afogou no rio com outra Ofélia lá na Bahia. Disse ela, que nada muito bem, que viu Ofélia se afogando, foi tentar salvá-la. Ofélia se agarrou nela e as duas começaram a descer o rio, a cada momento uma subia pra respirar e a outra descia. Até que Marinalva, irmã da Renilde, mais adulta, salvou as duas.
E por falar em rio: O tio do meu pai, Benjamin como o bisa, gostava de alertar para a largura do rio. Chamou meu irmão, rapazinho, e perguntou se ele conseguia jogar a pedra na outra margem. O jovem meu irmão disse 'claro que sim'. "Então joga", falou seo Benjamin, entregando uma pedra ao meu irmão. Meu irmão mirou, botou toda a força na jogada e, para sua decepção/incredulidade, a pedra não alcançou sequer a metade do rio.
A largura do rio é outra enganação.
Gostei de ler sua história de aperto, Antonio. Com essa coisa de água e possível afogamento, ou afogamento mesmo, conheço algumas.
Quanto ao Montagner, também rezei por ele. Fiquei mexida, aflita.
Abs
1) Ofélia, obrigado pela participação e comentário.
Excluir2) VC escreveu palavras ótimas.
3)No campo da Astrologia, que não entendo nada, sou virginiano,signo de Terra, por isso, respeito muito as Águas.
4) Tem um filme lindo antigo "Odisséia" que já no final da película, completamente perdido no Oceano, Ulisses, único sobrevivente de sua frota grita para o Deus dos Mares: "Posseidon, o que vc quer de mim?"
4) E o Oceano belamente responde: "Ulisses, é para que vc saiba, que sem os deuses, o homem não é nada"...
5)E é por isso que eu, budisticamente, reverencio Amithaba, o Buda das Águas, considerado por muitos como um dos criadores do universo.
6)No Budismo é uma equipe de divindades criadoras, cada uma com uma função.
7)Gratidão Ofélia. Conte-nos suas histórias !
Olá Antônio,
ResponderExcluirDesculpe o atraso. Estava às voltas com castração mineira de gato carioca.
Muito perigosas as sua correntezas, principalmente as de biquini! Já disse gente importante que " a experiência chega quando a gente não precisa mais delas". Expero muito que não seja o seu caso!
Bom domingo para voce e a gravadora de pássaros fantásticos!
Ana
1)Oi Ana, lembrei que duas cadelinhas vira-latas que nós tínhamos tb castramos. Coisas da vida.
Excluir2)Hoje tenho plena certeza de que as sereias habitam as águas e se esquecermos das lições, elas nos levam para os palácios ...
3)Qdo criança sempre gostei de pássaros, adulto e casado com Heloisa continuando gostando dos pássaros, de fato, fantásticos...
Bom dia, Antônio
ResponderExcluirJá tomei alguns sustos com água, mas nenhum tão grande quanto o seu. Por via das dúvidas, como amo as piscinas das serras, e vou a elas sempre que posso, nado o ano todo no clube para estar com os braços em forma quando necessário...
Afinal, seguro morreu de velho!
Um abraço,
1) Você tem razão André, "seguro morreu de velho" e é por isso que hoje estou aqui.
Excluir2) Uma vez estava na praia de Itacuruçá,em Itaguaí, RJ, nadando, de repente uma perna minha ficou dormente, esticada, não flexionava.
3) Mas foi tranquilo, chamei um amigo que estava perto e pronto.
4)Aventuras sozinho nas águas ... nunca mais ...