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13/10/2016

Meu Portugal


fotografia Moacir Pimentel


Moacir Pimentel

Esta ponte é sempre primeira imagem que vejo quando estamos para aterrissar no aeroporto Sá Carneiro da cidade do Porto. Trata-se da Ponte da Arrábida, vista aqui não de um avião, mas dos jardins do Palácio de Cristal por ocasião de uma feira de livros em tempos não digitais.
Estou há meses tentando escrever sobre a t’rrinha e deletando em seguida os meus escritos porque, como dizia o poeta, “todas as cartas de amor são ridículas”.

Eu teria preferido chegar à conclusão de que gosto de Portugal por uma longa e lenta lista de razões e vantagens que fui colecionando ao longo dos anos. Mas foi o contrário.
Apaixonei-me da noite para o dia, sem qualquer aviso, e desde então - que remédio? - tratei de procurar razões para tanto afeto, encontrando-as, muitas vezes, entre outras razões que tinha e tenho, para não querer saber de “conversas” com a minha segunda pátria.

Só entendi o quanto gostava de Portugal quando me descobri sentindo a sua falta, feito um namorado que se apaixonou sem se dar por isso.
Deve ter sido lá atrás, durante as minhas primeiras visitas, quando ia ao Minho para ver minha namorada e para trabalhar durante os verões para ganhar uma boa grana e poder sair de lá rapidinho e continuar correndo mundo.

fotografia Moacir Pimente

O certo é que quando descobri o tanto que gostava já era tarde demais e hoje passei a querer correr para lá, sempre que posso.
Encontrarei sempre, para lhe dar, razões para amar Portugal, mas a maior delas talvez seja esse jamais amaldiçoar o carinho que me prende ao país, como acontece tantas vezes com o amor tão doído que tenho pelo meu Brasil.

Jamais me esquecerei de como, apátrida e no exílio voluntário, eu me emocionei até as lágrimas ao ler pela primeira vez os versinhos do Vinícius...

“Vontade de beijar os olhos de minha pátria
 De niná-la, de passar-lhe a mão pelos cabelos...
 Vontade de mudar as cores do vestido (auriverde!)
[tão feias
 De minha pátria, de minha pátria sem sapatos
 E sem meias pátria minha
 Tão pobrinha!”

Talvez a maravilha de amar Portugal seja poder me sentir, secretamente, vaidoso desse bem quer, orgulhoso do objeto do meu afeto.

E não sou só eu, somos muitos os que têm o feitiço português plantado na alma funda com ou sem sangue lusitano correndo-nos pelas veias, e se calhar, todos terminam sendo um poucachinho apaixonados por Portugal, de vez em quando.
O mais engraçado é cada um desses enamorados foram seduzidos por t’rrinhas diferentes da minha. A bem da verdade e conforme a ocasião e as marés, o meu Portugal é bastante diverso dele mesmo, deste Portugal que estou tentando descrever tão mal e que eu conheço tão pouco!

Um país de filhos migrantes, de gente viajante, para quem - apesar da fama de l-e-n-t-o-s que têm nas nossas piadas - não preciso explicar jamais o que é sentir orgulho da pátria amada. Nem o significado da palavra saudade.

fotografia Moacir Pimentel

Uma nação para onde eu e quem mais já experimentou a festa que ela é para os sentidos deseja voltar um dia, porque voltar para Portugal, como canta o poeta e compositor Pedro Abrunhosa, é como...

“Embarcar num golpe de asa, ir para casa, para os braços de minha mãe”.





14 comentários:

  1. Monica Silva13/10/2016, 10:16

    Que coisa linda, Moacir. Me fez chorar e nem sei do que gostei mais. O artigo é maravilhoso e tudo combinando com as fotos. De onde elas são? A última é quase tão boa como a canção do Pedro Abrunhosa de quem nunca tinha ouvido falar e vai direto para a minha pasta de eternos. Obrigada!

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    1. Moacir Pimentel14/10/2016, 12:37

      Mônica, a segunda foto mora num painel de azulejos na varanda manuelina que circunda um lugar de sonho: o Palácio do Buçaco em meio à Mata Nacional do mesmo nome, no conselho da Mealhada , em Aveiro , onde se vai , principalmente, para comer o leitãozinho à Bairrada.
      A última foto é do Monumento ao Emigrante que , por sua vez, mora no topo da escadaria do Monte São Félix,no município da Póvoa de Varzim, na região do Minho. Trata-se de um local religioso ancestral. No sopé da montanha se encontra o Santuário da Senhora da Saúde e no seu cume , entre vários moinhos de vento , está uma capelinha em homenagem à São Félix, que conforme a crença popular viveu como eremita naquelas paragens e cuja festa e romaria rolam no primeiro domingo de setembro, quando geralmente estamos por perto. O monte é um ponto de referência dos pescadores da região pois pode ser visto do alto mar e, é claro , nos oferece uma visão panorâmica da costa do Minho , das praias de Vila do Conde, da Póvoa , de Santo André e , nos dias claros de verão, até mesmo de Viana do Castelo.
      Obrigado a você pela leitura e tão gentil comentário

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  2. Dulce Regina13/10/2016, 11:09

    Olá Moacir. Foste muito sucinto ao falar do seu Portugal, mas fizeste bem pois, não haveria espaço para mostrá-lo por inteiro. Acredito que todos nós temos um carinho imenso pela t'rrinha, por laços afetivos ou como filhos adotivos dos nossos queridos irmãos portugueses. Quem um dia visitou Portugal, sente saudade e fica com o desejo de voltar voltar sempre. E ele nos acolhe de braços abertos como fossemos o " filho pródigo ", dando-nos o melhor para comer e beber, e todo seu afeto. O link musical é uma conversa à parte. Emociona, traz lembranças boas e ficou eterno na minha mente e coração. Abraços, Dulce

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  3. Flávia de Barros13/10/2016, 12:00

    Moacir,

    O artigo é lindo as fotos maravilhosas e desconfio que não é apenas para Portugal que no seu coração você canta essa canção. Deixo-lhe um abraço especial

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  4. Oi Moacir,

    Tudo que vem de Portugal me fala à alma.
    Menina, uma de minhas melhores amigas era a Quina - Maria Joaquina, irmã do Aurélio. Duas figuras das mais belas que conheci.

    Pra mim, saíram ao pai, Sr. Fernando. Não que a mãe, dona Maria fosse feia, não era. Era pequena, sumia perto do marido. Ele sim, um bonitão. Minha cabeça de menina lembra bem.

    Morávamos no mesmo prédio. De vez em quando me chamavam para almoçar com eles. A magrelinha inapetente rejeitava aquela comida feita com sangue coagulado de galinha, cujo nome me foge agora. E que eu deixava no prato. Um pecado. Hoje eu não rejeitaria.

    Quina trazia no pescoço, em dias festivos, um grosso cordão de ouro português. Você deve saber a diferença entre esse ouro e o nosso.

    Não havia medalha de santo pendurada, mas a foto do pai dela, Fernando, em um medalhão. Não lembro se o medalhão era de abrir ou se a foto era vista de cara. Acho que abria.

    Dona Maria não enchia a Quina de brinquedos no Natal, ela ganhava roupas, belas roupas. E brincava com meu excesso de brinquedos para os quais eu não ligava. Para tristeza da minha mãe, que me enchia de conjuntos de bules com xícaras, bonecas e que tais (das bonecas eu gostava, Martinha foi batizada na pia do banheiro pelo padre Tio Francisco e minha tia costurou pra ela).

    Minha brincadeira predileta era imitar a Margarida com seus bolos salgados e usar as tampas de lata de cera, fazer o bolo com barro e cobrir com papel amarelo do Óleo de Peroba, para imitar a gema de ovo que lá em casa se pincelava nos salgados.

    Quina e seu cordão com o medalhão do pai está na minha foto de primeira comunhão. É a única foto que tenho dela.

    Do Aurélio ficou uma outra bela foto com a minha família, na Quinta da Boa Vista, ao lado do carro e do primo querido de minha mãe, padrinho de casório. Aurélio usava sapatos com a parte de cima branca. Eram muito elegantes os portugueses.

    Um dia foram embora pro Grajaú. E deixaram o apartamento para a Dona Carmen, Sr. Antonio e a filha, outra lindeza!, Esmeralda. Que se casou com um português por procuração.

    Dona Carmen fez meu vestido de 15 anos. Que capricho!

    Esmeralda era paquerada por todos os jovens da rua. Ia muito limpar a varanda. Às vezes se demorava mais um pouco e logo se ouvia a voz de dona Maria: "Ó Esmeralda, estás a limpar ou... (não lembro o quê)?

    A família da Quina tinha posses. A de Esmeralda não.

    Esmeralda voltou pra Portugal sozinha e casada por procuração.

    Demorou não sei quanto tempo, quantos anos, não muitos, para dona Carmen cair em prantos e gritos, que chamaram os vizinhos ao apartamento dela, no segundo andar. A razão do sofrimento era o telegrama, frio telegrama do genro: "Esmeralda faleceu". Foi triste.

    Durante muito tempo, ou todo o tempo de vida, dona Carmen manteve uma vela acesa no móvel da sala, em frente a um retrato da Esmeralda.

    Do outro lado da rua, na casa de dois andares da Ana, eram muitas as brincadeiras. Foi lá que aprendi a jogar buraco sob a proteção do Sr. Nelson. Foi lá que bebi quentão e cuba-libre. Foi lá que dancei valsa de aniversário e participei da brincadeira familiar (todos muito alegres). No meio da dança, o primo delas parava de dançar e perguntava de repente: "Vocês já fez cocô hoje?

    Dona Carmen se afeiçoou à menina temporã. Pra ela, gritava do outro lado da rua: "Ó Mírian, fizeste cocô hoje?"

    Minha mãe dizia que meu avô materno tinha um misto de sangue português e espanhol. Que está no meu sobrenome de solteira.

    Meu irmão foi a Portugal mais de uma vez. Eu não fui. Poderia ter ido conferir o dono da abotoadura de ouro (que ainda guardo), do rapaz de Coimbra, que visitou minha escola com seus colegas de capa escura.

    Gostaria de ter feito como Aguinaldo Silva, que tem casa em Portugal e anda de bonde por lá.

    Entardeceu pra isso.

    Abraço
    Ofelia
    PS: Sua foto é linda, Forrest, é de encher os olhos.


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    1. Ofélia, seu comentário vale bem um post. Não deixe nunca de nos escrever.
      Um abraço.

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    2. Dulce Regina13/10/2016, 17:55

      Oi Ofelia. Adorei sua narrativa ! Você foi fantástica nesse retorno ao passado, acompanhei cada cena e palavra na minha mente, como se estivessem acontecendo no momento, ouvi até o sotaque português . Concordo com o Wilson , foi um post encantador. E gostei do " Forrest ", você acertou em cheio. Abraços. Dulce

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    3. Obrigada, Mano.
      Vamos em frente, como diz o Newton.
      Abraço
      Ofelia

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    4. Moacir Pimentel13/10/2016, 18:38

      Do "Forrest" pataxó para o Sr Editor e demais rascunhadores.
      Seguinte: acho que os tempos verbais, por aqui, estão muito confusos. Na minha modesta opinião esse incrível texto da Ofélia DEVERIA SER POST - o primeiro!- assim que o Mano reencontrar seu computador. Tudo bem, Ofélia?
      Abraços gerais

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    5. 1) Tem tb um outro comentário da Ofélia, em artigo de duas semanas atrás que merece ser transformado em post.

      2)Viva nossa colaboradora Ofélia, bem - vinda !

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  5. 1)Adoro Portugal, morei lá em 79/80, inesquecível. Parabéns Moacir, concordo com tudo o que vc escreveu.

    2)Heloisa era "bolseira" (bolsista) da Fundação Kalouste Gulbekian, de Lisboa, junto à Cooperativa de Gravadores Portugueses.

    3)Eu estudava "Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa" na Universidade Clássica de Lisboa.

    4) Voltei lá mais duas vezes. Se o Criador permitir pretendo voltar mais.

    5) Considero minha segunda Pátria.

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  6. Olá, Moacir, seu "traíra...", gostas mais de Portugal do que do nosso pobre Brasil, heim?Quando lá estive com minha querida mãeziinha, nos vimos tão parecidas com as lisboetas, e tantas semelhanças havia entre as ladeiras de lá com as Ouro Preto, que nos sentimos felizes em casa, abraçadas às raízes!. Até mais

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  7. Márcio P. Rocha13/10/2016, 18:31

    Bravo! O aperitivo foi perfeito. Fico por aqui aguardando o bacalhau.

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  8. Moacir Pimentel14/10/2016, 12:40

    Dulce Regina, minha amiga , desligue o celular e aperte o cinto, pois as "viagens " lusitanas estão apenas começando. Mas por mais que se tente explicá-los - e muitos com muuuito mais talento do que eu bem que tentaram nos últimos milênios - como descrever nossos paraísos? Quanto ao Abrunhosa ajuda a ruminar as saudades.
    Flávia , a sua leitura e as suas pretinhas são sempre certeiras e revelam grande sensibilidade.
    Ofélia, segundo a especialista em "ouro" mais próxima e pelo menos no Minho de antigamente, quando as "raparigas" passavam a usar o primeiro cordão de ouro com os "vestidos de domingar" , estavam já "fazendo lenços de amor" e prontas para namorar. Mas com os "trajes de feira" elas tinham que usar um segundo cordão e com o "traje de noiva" , elas usavam o terceiro cordão , presente do noivo. O fato é que ainda hoje , nas festas de São João, por exemplo, as "gajas" desfilam orgulhosas nos trajes típicos minhotos sob o peso do seu "ouro". Que bom que você gosta das fotos do Forrest
    Antônio, estudar e fazer artes na nossa segunda pátria é o meu sonho para a terceira idade avançada. Mas como passei da idade de ser "bolseiro", tais planos foram temporariamente adiados.
    Donana, sem raízes nada dá flores nem frutos.
    Márcio, que tal umas "pataniscas" na sequência?
    Obrigado e abraços para todos

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