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Dulce Regina
Desde mocinha gosto de ir passear em
Teresópolis, cidade serrana do Rio de Janeiro, conhecida pelo Dedo de Deus, um
pico de 1.692 metros de altura cujo contorno se assemelha-se a uma mão
apontando para o céu, dentre os vários monumentos geológicos da Serra dos
Órgãos.
Essa imagem me magnetiza por sua magnitude
e soberania, que pode ser avistada de muito longe e, à medida que nos
aproximamos, sentimos a vibração de sua força, às vezes escondida no meio das
nuvens, outras com o sol reluzindo-a, ou as nuvens em movimento como se num
abraço, envolvendo-a numa brincadeira incessante, fazendo com que a imaginação
de um olhar atento capte e forme diversos flashs, dando-nos elementos
subjetivos para uma criação de sonho e realidade individual e intransferível.
Como gostava mais do litoral, visitávamos
Teresópolis em ocasiões especiais. Mais tarde, percebi que a serra me atraía,
sentia-me mais calma e o lugar se tornou quase que obrigatório nos feriados
prolongados.
Hospedávamo-nos em um hotel-fazenda da
estrada Teresópolis - Friburgo, chamada de “cinturão verde”, por
causa das enormes plantações de verduras e legumes, sendo o maior fornecedor
deste setor para o mercado do Rio de Janeiro. É um verdadeiro colírio para os
olhos vislumbrar essa imensa área de diversos tons de verde.
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Na época, essa estrada ainda era de barro
e passamos por inúmeros “perrengues” com o nosso “fusquinha verde” (hoje
lembramos com risos desse tempo).
E assim nossa afeição pelo lugar foi
aumentando até decidirmos encontrar um lugar provisório e testar nossa
adaptação por um tempo mais longo. Encontramos uma bela casa, grande e
acolhedora. Nela, vivemos e partilhamos com amigos momentos inesquecíveis.
Vencido o prazo de adaptação, tentamos nos fixar nessa moradia, mas não foi
possível. Procuramos outras sem sucesso, pois nenhuma se igualava à experiência
anterior. Até resolvermos por construir o nosso próprio aconchego e adquirimos
um terreno. Empenhados no sonho de fazer nosso “cantinho”, fomos ceifados pelo
mais absurdo de todos os planos do governo, que tirou a tranqüilidade de todos
os brasileiros.
Inconformados e tristes, íamos ver a nossa
terra de vez em quando, até que um dia almoçando no restaurante do clube que
pertence a todo o complexo imobiliário, resolvemos visitar o apart-hotel dentro
do espaço do clube e com um lago os separando. Animamo-nos e decidimos por ali
ficar.
Foram quase trinta anos convivendo bem
perto da natureza. Tínhamos um espaço pequeno e acolhedor, onde coloquei meus
dons de decoração e arquitetura, e consegui transformá-lo no “meu cantinho
favorito”".
À tarde, na varanda, apreciávamos o pôr do
sol, o canto dos pássaros, a revoada das andorinhas, os quero-quero fazendo
seus ninhos na grama e espantando quem dele se aproximava, o martim-pescador na
beira do lago fisgando seus peixes numa destreza impressionante, os sabiás e canários
da terra passeando pela grama em busca de comida, peixes, gansos e marrecos no
lago. Tudo isso ouvindo uma canção, ao longe... bem caipira.
À noite, a lua se fazia presente junto com
as estrelas que parecem mais brilhantes e próximas. O perfume da dama da noite,
dos jasmins e a madeira queimada das lareiras, davam um toque de romantismo. E
os sapos coaxavam, as corujas piavam e os gaviões faziam seus vôos baixos
procurando suas presas.
Quando o tempo mudava, víamos o outro lado
da natureza se manifestando com trovões e relâmpagos que, apesar de
aterradores, formam imagens lindas, temidas e respeitáveis desde os nossos
antepassados e considerado uma das maneiras mais impressionantes da
manifestação da natureza.
À tardinha, minha tarefa preferida era passear
pelos jardins do condomínio, ver as flores desabrochando e juntar-me aos
jardineiros na sua manutenção, podando-as e regando-as.
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Nesse período, tivemos várias fases de
entretenimento e descanso. Primeiro, só a família. Fazíamos, à noite, fondues
sempre acompanhados de vinho, racletes, pizzas e, após esse imenso prazer
desgustativo, ficávamos madrugada a dentro jogando cartas.
Depois de algum tempo, a rotina mudou um
pouco. As brincadeiras, jogos e tempo livre foram se adaptando a uma nova
experiência de avós. De manhã, piscina, almoço sempre em casa (não dispensavam
a comidinha da mamãe e vó) e, à tarde, passeio nos parques para andar a cavalo,
charrete, trenzinho com personagens de super heróis, ou visitar o capril na
hora da ordenha das cabras - tivemos até o privilégio de dar mamadeira a um
filhotinho - façanha que ficará eterna na minha memória.
Anos depois, chegaram mais dois netos, a
freqüência de visitas diminuiu, só quando tinha feriadão a farra estava de
volta.
A vida é assim, moldada conforme o momento
presente que deve ser aproveitado e curtido com todas as emoções, carinho e
dedicação.
Com a família maior, senti que o espaço do
ninho ficou pequeno e pouco freqüentado. E, sem remorso, resolvemos passá-lo
adiante. Matenho meu laço afetivo por Terê passando alguns dias no “velho”
hotel-fazenda, onde encontro pessoas afáveis e receptivas que nos acolhem com
maior carinho, em um ambiente onde encontro paz e a natureza reinante com tudo
que gosto. E, indiscutivelmente, uma vantagem: sem preocupações de deveres e
compromissos de casa.
Quando todos resolvem subir a serra,
ficamos nos bangalôs com vista para um lago, com uma varanda grande e uma suite
para cada casal. A sensação é de estarmos em casa com total privacidade. Em outra
ocasião falarei desse lugar tão familiar para a família.
Minha Vida
Depois que entendemos que a felicidade depende somente
das nossas buscas e escolhas
das nossas buscas e escolhas
passamos a ver a vida com bons olhos,
observamos que não é necessário acumular tanto peso
e muito menos deixar que toquem nas feridas que já foram cicatrizadas.
Enxergamos claramente que ninguém será feliz por nós e que chorar,
limpa sim a alma,
mas que sorrir ilumina o caminho.
É de cor que a vida precisa
e estou disposto a fazer arco-íris se preciso for.
Renasço todas às vezes que me percebo prioridade.
E ninguém dirá que sou pouco,
porque sou muito mais do que olhos que viram,
sou o meu próprio amanhã!
(Vitor Ávila)
Que lindo, Dulce! Voce fala de coisas maravilhosas como o verde, flores e jardins, lua, estrela, trovão e por do sol. E fala também do medo e sabedoria da adaptação, de compreendermos que não é mais o mesmo mas também é muito bom! Voce é a nossa escritora flor!
ResponderExcluirObrigada Ana pelo " escritora flor " , ofereço isso em memória da minha mãe, foi ela quem passou esse sentimento para mim. Ah ! ...as rosas !!! Um dia ainda falarei dela por aqui. Abraços
ExcluirTerê, terra de boas lembranças, ótimas companhias.
ResponderExcluirMais um belo texto.
Sim Fábio, belas recordações dos nossos encontros de família. E o melhor, não acabaram, continuamos confraternizando momentos incríveis juntos. Estou aguardando o próximo ...Rsrsrs Beijos da Mamy
Excluir1) Fotos lindas. Texto idem. Gosto muito de Terê...
ResponderExcluir2)Heloisa, nasceu lá.
3) Na entrada do Cemitério local tem uma frase que considero basilar: "Sic Transit Glória Mundi = Assim passa a glória do mundo".
4)Oi Dulce, parabéns, vc escreve ótimo, mas, permita-me esclarecer, devido ao novo município de Guapimirim, que se emancipou de Teresópolis, o Dedo de Deus fica hoje em Guapimirim e não mais em Teresópolis, assim diz a propaganda da Prefeitura de Guapimirim.
5)Da minha varanda, em Santa Teresa, vejo o Dedo de Deus e vez por outra converso com esta bela montanha.
http://guapimirim.rj.gov.br/
ResponderExcluir1)O site oficial acima informa que "Guapimirim é a Cidade do Dedo de Deus".
Olá Antônio. Tenho conhecimento disso, inclusive foj uma grande batalha dos moradores de Guapimirim. Mas cá prá nós : o local onde vislumbramos com toda magnitude o Dedo de Deus, é em Teresópolis. Por fim, sejamos solidários, esse monumento da natureza pertence a toda humanidade e principalmente àqueles que relacionam-se constantemente com ele. Abraços, Dulce
ExcluirDulce Regina, você está de parabéns por este texto no qual não só nos fala lindamente do seu afeto por Terê , mas sabiamente nos ensina que não precisamos ter as escrituras dos nossos paraísos e que há que mudar para continuarmos os mesmos e unidos.
ResponderExcluir"A vida é assim, moldada conforme o momento presente que deve ser aproveitado e curtido com todas as emoções".
Disse tudo!
Também tenho ótimas lembranças dessa terra onde, na companhia de mais dois casais amigos e das respectivas proles passamos um mês de férias em marco de 85 , numa casa de cujo quintal avistávamos o Dedo de Deus. Além do que se comeria no almoço e no jantar e de quem ia cozinhar e se estava faltando leite em pó e fraldas descartáveis, não me lembro de mais nenhuma preocupação. Tancredo foi para o andar de cima enquanto estávamos lá mas o ambiente era tão agradável que mal notamos e continuamos a jogar conversa fora e sueca e a virar uns copos e a namorar... entre as mamadeiras. Quando os 30 dias se foram , falamos com o proprietário e continuamos no refúgio por mais 15. Descendo e subindo a Serra todos os dias para trabalhar naquelas duas semanas eu achava o percurso muito menos estressante do que a minha diária via crucis de então , da Rainha Elizabeth em Copacabana até a Praça da Bandeira e vice versa. Nos finais de semana o programa era sempre o mesmo: degustar o frango a Kiev da saudosa Dona Irene , quando era ela mesma que o fazia enquanto trazia as entradinhas e as vodkas e, afogueada , servia às 3 mesas do acanhado e feio restaurantezinho. Maravilha!
Fico feliz de saber que - além do pé de manacá continuar florindo - você e os seus encontram outras Terês para chamar de suas.
Abraço
Oi Moacir. Um pouco atrasada no meu agradecimento, mas muito feliz de ler suas pretinhas.. Quando li a frase entre aspas, que vc escreveu, fiquei boba de ler o que escrevi...são sentimentos vividos, que transparecem através das letrinhas e confesso minha felicidade de poder expressar isso. E você não esqueceu o manacá...isso também me emocionou. Obrigada, amigo. E sabe ? Foi justamente nessa época - 1984/85 - que fizemos nossa experiência de ter casa em Terê. Coincidência, não ? Adoro o restaurante da D. Irene e sua vodca, pena não fazer mais tanto frio como anos atrás, pois aquela moringuinha de alumínio descia que era uma maravilha ! Dois abraços, Dulce Regina
ResponderExcluirDulce, só fui conhecer o restaurante da Dona Irene na sua segunda encarnação, já na nova casa, depois que ela e o marido morreram e o restaurante foi herdado pelo casal que a auxiliava. Passei muitas horas boas lá, nos jantares de encerramento de nossas turmas do IBMEC do Rio, tomando aquela vodca deliciosa (e perigosa:) e comendo aqueles pasteizinhos (piroshkis?) enquanto esperava o frango a Kiev e conversava com o velho engenheiro que dirigia a casa junto com a mulher, e com quem eu tinha conhecidos em comum.
ExcluirFaz muitos anos que não volto lá, não sei como está agora, nem se os donos ainda são os mesmos.
Nossa, lendo o artigo me veio uma retrospectiva da nossa vida qdo as crianças eram pequenas. Elas adoravam ir à Teresopolis e guardam recordações maravilhosas destas viagens.
ResponderExcluirRecordações e vivências que constituem a base de sólidos valores para suas escolhas em seus caminhos na vida.
Valores como família, amizade , respeito e amor ao próximo e à natureza e principalmente União.
Muita bagunça, almoços maravilhosos, muita alegria, algumas confusões e mal entendidos.....
Mas como toda grande família td acaba voltando ao normal pela força que vem desta palavra (familia).
Bem , as sementes estão plantadas nas nossas crianças....que não são mais crianças. ...
Tempo bom.....
Todos agradecemos....
Ainda mais por vir.
BJS
de todos nós,
Rosane
Oi Rosane. É isso mesmo ...as recordações ficarão marcadas no " filme de nossas vidas " e para as crianças servirão de " caminho " para o futuro. O bom é que já estamos vendo os frutos sendo colhidos. As " confusões " normais em qualquer família, só acrescenta no nosso crescimento humano e espiritual. Digo sempre : " As árvores de vez me quando tem que ser sacudida, para caírem os frutos podres e depois nascerem os sadios . " Beijos, minha nora
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