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06/11/2016

A Questão do Trair

Hans Breininger - O Beijo de Judas (wikimedia commons)
  
Antonio Carlos Rocha


Um dos temas mais palpitantes da vida. Antes o assunto era abordado nos romances, filmes, telenovelas, hoje estão nas colunas sociais, fofocas e também nas crônicas políticas, econômicas e afins.

Certa feita um presbítero docente da Igreja Presbiteriana falou do púlpito em um culto dominical, mais ou menos assim: “a Cristandade tem um começo esquisito, quando o Espírito Santo fecunda a Virgem Maria e José, o noivo, adota o menino Jesus”. (escrevo com todo respeito Teológico e Acadêmico, aos que discordam).

A polêmica nos fez lembrar do ótimo livro “Amar Trair”, de Aldo Carotenuto, publicado pela editora católica Paulus, 1997, 256 páginas. A obra tem como subtítulo: “Quase uma apologia da traição”.

A traição pode ser de várias formas: afetiva, econômica, ideológica, social, individual, coletiva, política, partidária, sindical, histórica, platônica, profissional, religiosa, jornalística, literária, pode ser traição só com os olhos, traição só no pensamento, hoje a web proporciona a traição virtual etc.

Parece que viver é trair, estamos sempre traindo e sendo traídos. A traição pode ser total ou parcial, em todas as áreas acima citadas, e nas que não foram citadas também, mediante a interpretação de cada um.

Nunca antes no Brasil, se falou tanto em traição parlamentar, eleitoral, programática, pragmática etc.

Muitos afirmam que Jesus foi traído por Judas, mas há quem declare que o traído foi Judas, que esperava de Cristo, uma atitude mais politizada de enfrentamento contra o Império Romano, logo... pontos de vista, cada um tem o seu.

O autor, Aldo Carotenuto é psicólogo e um dos maiores estudiosos, em nível internacional, do pensamento de Carl Gustav Jung. É professor da Universidade de Roma, autor de vinte livros traduzidos para vários idiomas. É presidente da Associação Italiana de Psicologia e Literatura, membro da Associação Americana de Psicologia, USA.

Um livro instigante. Através desse estudo ficamos sabendo que trair pode ser um pedido de socorro, de ajuda, em função das carências múltiplas (ver o quarto parágrafo, o que foi escrito sobre a traição pode ser dito sobre as carências) que todo ser humano tem.

Diz o autor: “Nascemos traídos e com a necessidade de trair para crescermos: é uma lei cármica (...) é esse o significado profundo que o mito hebraico da expulsão do Paraíso terrestre representa simbolicamente (...). Porque a traição é essencialmente “passagem” – é esse seu significado etimológico – “entrega” a outrem (...) é necessária essa “passagem” pela morte, esse reconhecimento do limite, da finitude, esse saber-se traidor e traído”. – páginas 8 e 9.


“A traição repugna a nossa consciência de “puros”, mas”, afirma o autor, “ela é uma experiência inelutável. (...) Todo indivíduo está sob o imperativo, inscrito na dinâmica evolutiva da psique, de emancipar-se de tudo o que o mantém fiel a uma imagem de si que não lhe corresponde, mas corresponde às exigências do ambiente social ou ao desejo de seus interlocutores”. – capa.


7 comentários:

  1. Oi Antonio,
    quando entrei em jornal e o motorista pegava a seletiva da Brasil, eu morria de medo porque ele corria mesmo muito. Com o passar do tempo fui perdendo o medo e já entrava no carro com tranquilidade. A gente se acostuma.

    Acho que no caso de trair acontece o mesmo. Quanto mais se trai mais a pessoa se acostuma e relaxa.

    Não sei se você assistiu à peça É..., do Millôr. A mulher do professor, Vera Toledo, tão bem representada por Fernanda Montenegro, descobriu as traições do marido por causa das multas que chegaram em casa. Não havia motivo pra ele estar ali, ou lá, naquele horário.

    Millôr também escreveu que 'amor não é para amadores'. Verdade verdadeira. Os tarimbados sabem tudo de tudo.

    Cada um faça o que lhe der na telha e responda ao próprio julgamento, ao julgamento que faz de si mesmo. Se é que faz algum.

    Se existe um sentimento forte, acho que deixa de ser reles traição. Trair por trair é que é uma bobagem. E grandes amores podem ter começado assim, à toa.
    Abraço
    Bom domingo
    Ofelia

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    Respostas
    1. 1) Obrigado Ofélia pelo comentário.Concordo com vc: O ser humano se acostuma com as coisas construtivas e destrutivas.

      2) Não vi a peça do Millor.E concordo plenamente com a frase que vc falou dele.

      3)Me interessei pelo citado livro pois aprendi a ver traição no sentido plural, em todas as área da vida e não só no âmbito de um casal.

      4)Por exemplo, as mudanças econômicas que estão ocorrendo em nosso país, falam em cortar 30% do salário dos servidores no Estado do RJ, ora, isso a meu ver é uma traição das autoridades...

      5)Tudo de bom !

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  2. Parabéns Antônio, voce ganhou um comentário da Ofélia, coisa rara e preciosa!
    Seja política, cármica, um pedido de socorro, uma lei do crescimento, passagem para a morte ou outra vida mais interessante, até mesmo exigências sociais, traição é traição.
    O que é traição? Já que faz parte certa da vida, é ética? Voce e o Moacir estão fundindo a minha cuca!
    Bom domingo.

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  3. 1)Oi Ana, com a resenha do citado livro eu procurei ver a traição no sentido amplo, plural. Não apenas a traição de conjuges.

    2)Por exemplo, qdo criança, às vezes mentimos, pelos mais diversos motivos. Vejo a traição como uma forma de mentira, quebra de confiança.

    3) Gostei qdo o autor do livro fala que todos somos traidores e traídos. Me fez lembrar da Bíblia quando fala que todos somos pecadores...

    4)Eu penso que a traição não é Ética, mas pelo menos uma vez na vida ninguém é ou foi 100% ético.

    5) A forma como entendi a colocação do Moacir é que há uma "ética", nas quadrilhas e organizações criminosas, tipo se quebrar o Código de Conduta do Crime pode-se morrer.

    6)Por exemplo, o pai de Sidarta Gautama era um rei e queria que o filho assumisse o trono, mas o jovem se tornou um religioso, neste sentido Buda traiu o pai... e vem a psicanálise e a psicologia nos dizer que, para crescer precisamos trair...

    7) Mas o próprio Buda depois diz que o equivocado foi o pai que não devia depositar tantas expectativas no filho e ampliando para a vida, em qualquer área: que nossas expectativas tenham o caminho do meio.

    8)É assunto para muitos comentários, não se esgota nesse.

    9)Boa semana !

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  4. Moacir Pimentel06/11/2016, 19:20

    Boa noite , Antônio. Achei o texto muito interessante. Não conheço os escritos do Carotenuto - obrigado pela dica de leitura - mas sendo um dos grandes estudiosos de Jung , ele não poderia pular o capítulo da traição encontrado na mitologia e história humanas, de Eros e Psiquê a Até Tu , Brutus? A traição é o fato perpétuo da vida humana não porque seja certo trair mas por que mudamos e não porque somos fracos ou estúpidos, mas porque é da nossa natureza, seres sociais que somos , confiar.Viver e se relacionar sempre trazem riscos e procurar garantias de que ninguém será traído é uma demanda infantil. Nos mitos - pelo menos! - a traição para os que a sobrevivem é seguida por uma vida melhor encontrada nas cinzas. O que Jung grifa é a troca - o perder e o ganhar - o autoconhecimento que pode nascer de uma traição, que ele traduzia como a morte das idealizações que fazemos de nós mesmos e das fantasias que tecemos do outro , o movimento para fora de um estado infantilizado, a dor da individualização , de nos descobrirmos indivíduos em separado.
    Abraço

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  5. Belo comentário, Moacir.
    Abs
    Ofelia

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