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11/11/2016

De Tios e Tias

Flora, Fauna e Primavera - imagem Disney

Wilson Baptista Junior


Todos nós temos histórias interessantes na família. Algumas que podem ser contadas, outras, talvez até mais interessantes, que melhor não contar.

Eu vou contar só algumas – escolhi como assunto alguns de meus tios e minhas tias, e histórias que posso contar, agora que todos eles já se mudaram para o andar de cima e que eu mesmo já virei um tio cheio de sobrinhas e sobrinhos e sobrinhos-netos, que, se tiver sorte, vai ser um dia lembrado por algum deles com o sorriso divertido e o carinho com que me lembro dos meus.

Não vou colocar nomes, apenas iniciais, para evitar confusões (nos dois sentidos da palavra...), e vou chamar aqui, indistintamente, de tios e tias os tios e tias e os tios-avôs e tias-avós.

A primeira história que me lembro de me contarem, ainda pequeno, era de minha tia C.
Tia C. morreu com mais de cem anos de idade, coisa rara naquela época. Só me lembro de tê-la visto uma vez, muito velhinha. Quando jovem, esteve no último baile do Império, aquele na Ilha Fiscal, onde a aristocracia dançava enquanto o regime se esboroava. Guardou toda a vida, com carinho, o convite e o carnet du bal.
Depois, na Belo Horizonte antiga, solteirona já velha e sistemática, tia C. gostava de ir ao cinema. E decidiu que sua poltrona preferida no Cine Metrópole era só dela. Quando chegava e a poltrona estava ocupada, ficava de pé ao lado dela até que o infeliz ocupante se desse por achado e lhe cedesse o lugar, não importa que o resto da plateia estivesse vazia.
Pedro Nava conta, em suas deliciosas memórias, que começaram com o livro “Baú de Ossos”, que os estudantes da época, já conhecendo minha tia, faziam de propósito e ocupavam seu lugar para arreliá-la, só se levantando quando o filme ia começar.  Nunca cheguei à conclusão de quem se divertia mais com isso, eles ou ela...

Um tio que não conheci foi o tio Santinho (desse digo o nome porque já falei dele aqui, uma vez). De Santinho só tinha o apelido, que vinha do seu sobrenome. Alistou-se na Força Pública, que hoje se chama Polícia Militar, num dos períodos mais turbulentos daquela época, em que se sucediam as revoluções, e participou de vários combates. De temperamento, digamos assim, um tanto forte, foi várias vezes promovido por bravura e depois rebaixado por indisciplina. Se naquele tempo houvesse Velcro, suas divisas deveriam ser presas aos uniformes com ele, para ficar fácil de por e tirar...
Contam que, numa ocasião, considerando-se desacatado por seu oficial superior quando de uma repreensão, procurou o armeiro do batalhão e lhe pediu que afiasse seu sabre do uniforme. Perguntado por que, disse ao armeiro que ia desafiar o oficial para um duelo. Seus companheiros, com mais bom senso do que ele, conseguiram acalmá-lo e fazer chegar discretamente a história aos ouvidos do oficial. Funcionou, não houve mortos nem feridos.

Do tio W. contam-se também muitas histórias. No seu tempo de estudante, na década de trinta, um de seus colegas, rapaz preparado, educado, tímido e franzino, apaixonou-se por uma moça, filha de um professor muito severo. Uma noitinha, tio W., que era alto e forte, juntamente com outro colega também forte, vinha descendo por uma rua do bairro da Serra acompanhando o colega tímido (deste não vou dizer nem as iniciais). Quando chegaram perto da casa onde morava a moça, uma daquelas casas antigas onde não havia jardim na frente e as paredes chegavam às calçadas, ouviram, pela janela da sala, que estava aberta para a noite de verão, uma janela alta, de parapeito baixo e postigos de madeira, como se usava naquele tempo, a moça que tocava piano na sala para a família, depois do jantar.
O enamorado postou-se atrás do postigo para ouvir a amada, e tio W. e o colega não tiveram dúvidas: agarraram cada um num braço do coitado, levantaram-no e o depositaram dentro da sala. Saíram correndo, claro, e por isso não sabemos como o moço explicou a inesperada aparição...

Outra do tio W nos seus tempos áureos foi na noite de uma apresentação no teatro de Ouro Preto, uma famosa declamadora recitava “O Corvo”, de Edgar Allan Poe, onde cada estrofe termina com um enfático “Nunca Mais!”.  Lá pelo enésimo “Nunca Mais” tio W. emendou, num trovejante sussurro de palco, “... Aqui me pegarás”! levantou-se e foi embora do teatro, deixando para trás o silêncio mais chocado que a pobre declamadora deve ter presenciado em sua carreira.
Ainda o conheci, nos meus tempos de menino. Alto, gordo, calvo, de rosto vermelho, cativava os sobrinhos equilibrando grãos de milho na careca para as pombas virem comê-los, no seu sítio perto de Belo Horizonte.

Tia L., baixinha, gordíssima, estabanada, sofria de diabetes. Naquele tempo começavam a aparecer os adoçantes artificiais, eram a esperança de quem tinha que fazer regime. Por ordens do médico, tia L. começou a usar o novo adoçante, andava sempre com um vidrinho na bolsa, mas não emagrecia um grama. Depois descobrimos que ela se servia dos doces e pingava o adoçante em cima, achava que era remédio e que, como ela dizia, “cortava o açúcar”...

Tia M. era freira, quando estudante tinha sido ativa participante da JUC, a antiga Juventude Universitária Católica. Intelectual, preparadíssima, tradutora de livros de arqueologia, vivendo recolhida na abadia mas de cabeça sempre aberta e atualizada, era querida por toda a família, era a conselheira escolhida por todos nos momentos difíceis. Quando os numerosos sobrinhos cresceram e se casaram, houve alguns divórcios na família; ela me confidenciou um dia que tinha parado de pedir notícias dos maridos ou mulheres dos sobrinhos ou sobrinhas que a visitavam, para evitar o constrangimento de terem que dizer que já não eram os mesmos...

Tio D. era alfaiate, no velho estilo. Fiz minhas primeiras roupas “sérias” com ele. Me encantava ver como traçava com giz azul aqueles desenhos cabalísticos na peça de casimira aberta sobre a mesa, cortava o pano com uma enorme tesoura preta e transformava magicamente aquilo num terno perfeito. Fumava sem parar, a alfaiataria cheirava a tabaco.  O fumo o levou embora mais cedo...

Tio O. e tio B. antes e depois de aposentados tinham viajado o mundo inteiro, e viviam numa casa na Serra cheia de lembranças das viagens. Tio B. tinha perdido uma perna e era apaixonado por música, música de qualquer tipo, tinha uma sala cheia de equipamentos, com aqueles gravadores de rolo e amplificadores de válvulas, onde ficava sentado na sua poltrona e gravava tudo o que tocava nas rádios, de sinfonias aos últimos sucessos populares. Passei horas e horas lá conversando com eles e ouvindo música. Minha diversão com ele era tentar encontrar alguma música que ele não tivesse gravada. Era difícil. Minha irmã mais velha passou um tempo fazendo um fichário para ele, em fichinhas datilografadas (era antes, bem antes, dos computadores pessoais), tentando em vão organizar os milhares de gravações e discos de modo a poder achar as que se quisesse.

Tia L (outra) era a minha tia preferida. Morava na casa de meus avós maternos, onde eu e minha irmã mais velha passávamos períodos de férias de vez em quando. Apaixonada por histórias policiais, me deu uma coleção da “Mistério Magazine” que tenho até hoje. Subornava a gente por um tostão para coçarmos as costas dela enquanto inventava maravilhosas histórias para nos contar. E nos regalava, à hora do café, com os pãezinhos de minuto mais deliciosos que algum dia já comi.
Para consternação da família, foi pedida em casamento por um vizinho bem mais velho, de temperamento difícil, que alugava a casa ao lado da de meus avós, que também era deles, algum tempo depois que a mulher deste vizinho morreu. Casou-se com ele (meu tio V.) e se mudou para o interior do Rio de Janeiro, onde ele comprou uma estação de rádio, e lá viveu feliz com ele e os filhos que tiveram, até o fim da vida. Tio V. era poeta, conquistou o carinho de todos à medida em que o foram conhecendo melhor, e deixou alguns versos lindos espalhados pela família.
Uma ocasião, eu tinha vinte e poucos anos e estava levando Papai e Mamãe numa viagem de carro, e pernoitamos na casa deles. Depois do jantar estávamos na varanda, sentindo os perfumes do jardim e saboreando a sobremesa, uma geleia de rosas que tia L. fazia que todos achavam deliciosa e que eu considerava um sacrilégio. Mamãe e tia L. se recolheram primeiro, tio V. entrou na casa e voltou com uma pistola .45 que me entregou com toda a naturalidade, explicando, ante o espanto de Papai, que tinha ouvido a notícia da fuga de alguns bandidos perigosos de um presídio dos arredores, e que era bom estarmos preparados. Eu também achei uma precaução perfeitamente natural, mas se Mamãe tivesse visto não dormiria aquela noite...

Desde que nasci até quase meu casamento, morávamos numa casa grande, que na realidade eram dois sobrados de paredes meias, construídas por papai e vovô.  Vovô morreu quando eu era pequenino. Do lado dele moravam minha avó e minha tia-avó D., que nunca se casou, e tinham um quarto sempre preparado para quando nos visitava tia N., irmã delas, que morava em Santa Luzia na casa que foi de meus bisavós. De tia N. me lembro que fazia renda de bilros, e que uma vez trouxe lá de Santa Luzia um enorme caramujo, um gigante pré-histórico perto dos caramujinhos que habitavam nosso jardim. Eu ficava absorto contemplando aquele monstro que gastava dias para atravessar os canteiros.
Tia N. morreu quando eu era pequeno, e quando a família foi crescendo (somos oito irmãos e irmãs) o lado da casa de meus pais foi ficando apertado, e aí pelos quinze, dezesseis anos eu acabei me mudando para o quarto que tinha sido de tia N. do lado de Vovó. Vovó era muito severa, e quando alguns anos depois eu voltava mais tarde das aulas porque tinha ido beber uma cerveja com os amigos ela me esperava para me passar um “sabão”, como se dizia antigamente. Aí vinha tia D., que era a bondade em pessoa, e dizia: “Deixe o menino, M., deixe o menino se divertir”...
Até a sua morte, eu já casado, com filhos, os sobrinhos netos nunca deixaram de ser os seus meninos...

Três tias da minha mãe eram chamadas por ela de “as meninas”, porque era assim que minha avó as chamava. Velhinhas, baixinhas, alegres e sorridentes, duas eram gêmeas e a outra muito parecida, iguaizinhas àquelas três fadas madrinhas da Cinderela de Walt Disney, Flora, Fauna e Primavera. Moravam em duas casas, uma em frente da outra, a em que duas moravam juntas uma casinha linda, com mobília e bibelôs de outros tempos, parecia mesmo uma casinha de contos de fadas. Quando eu e Ana ficamos noivos, de acordo com os costumes da época Mamãe fez questão de apresentar Ana a toda a família. Quando chegamos na casa das tias, a Ana assim um pouco sem jeito, começaram a conversar, e descobriram que a família delas em Ouro Preto tinha conhecido muito a família dos avós portugueses da Ana, que também tinham morado lá. E aí, pronto, fui eu quem sobrei na conversa, enquanto elas reviviam velhas lembranças e incorporavam imediatamente a Ana como parte da família...

Tia A. morava no Rio. Era a tia rica, a mais soçaite da família. Animadíssima, apesar da idade e de um problema numa perna que a fazia usar uma bengala. Uma vez em que ela esteve aqui o seu motorista estava levando o marido dela a algum outro lugar, e fui levá-la da nossa casa no Santo Agostinho à casa de tia P. na Serra. Naquele tempo tínhamos além do carro de Papai um jipe velho, verde, sem capota, sem portas, de para-brisa abaixado amarrado no capô. Era o que se chamava na época “jipe de boy”. Papai estava com o carro no trabalho, e eu com o jipe. Nunca vou me esquecer da figura de tia A., de casaco de peles, bengala de ébano de castão de prata na mão onde brilhava um enorme anel de brilhantes, a outra mão segurando o chapéu na cabeça, óculos escuros estilo “gatinha”, sentada no banco do jipe, adorando o passeio e o vento que despenteava os seus cabelos.
Nem do susto de tia P. aos nos ver chegar assim...

Houve outros tios e tias e outros casos, talvez mais interessantes, mas a prudência me aconselha a parar por aqui. Já foi bom escrever isso, reviver essas lembranças dessas pessoas queridas. Os mexicanos acreditam que os mortos vivem felizes lá do outro lado enquanto as pessoas aqui se lembram deles, depois vão para a Terra dos Esquecidos, que é triste e desolada. Então, cabe a nós mantê-los felizes enquanto pudermos.


11 comentários:

  1. Dulce Regina11/11/2016, 14:48

    Olá, Wilson. Adoráveis suas tias e tios, gostei demais das histórias. Enquanto lia, ficava imaginando as situações... Muito bom recordar momentos como esses e sim, enquanto estivermos lembrando daqueles que partiram e foram amados por nós, eles estarão vivos e ao nosso lado. Engraçado, ainda ontem, estava lembrando-me de histórias passadas na família. E pensei : " será que esses jovens de hoje têm paciência para ouví-las ?" Quando meu neto era pequeno e almoçávamos sentados à mesa, ele acabou de comer e quis levantar. Disse-lhe baixinho: " Fique sentado, senão seu irmão, vai querer levantar também e ele não acabou de comer." Ele ficou mais um pouco e tentou sair outra vez. Aí comecei a falar como nos comportávamos à mesa quando pequenas...ele virou-se prá mim e disse : " Vó isso é história de antigamente ." Dei um sorriso escondido, pois achei muito engraçado. Meu filho logo chamou atenção dele. Como são boas essas histórias de antigamente.... Abraços. Dulce

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  2. 1) Tios e tias são titãs, gigantes da amizade que encantam os sobrinhos crianças.

    2) E quando crescemos são ótimos amigos.

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  3. André Baptista11/11/2016, 17:21

    Ei Mano,
    Acho que já conhecia todas as histórias de nossas tias e tios, mas foi ótimo ouvi-las de novo. Deu saudades dos que conheci e de ouvir Mamãe e Papai contando histórias dessa época.

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  4. Moacir Pimentel11/11/2016, 19:09

    Pois é Tio Wilson,outro belo post, bem escrito e abotoado que nos faz olhar para trás e depois para a frente, para os nossos meninos de ontem e os sobrinhos que fomos lá atrás e, em seguida, para os homens que nos tornamos , esses tiozinhos que, de cabelos brancos, hoje teclam aqui nas Conversas. Quem ao olhar para trás reencontra avós, pais, tios, irmãos amorosos e presentes , quem como nós teve família e construiu a sua própria , sabe que não perdemos os que se foram,que eles apenas se encantaram e vieram morar dentro da gente. Que nós somos nós , eles são eles e a antiga vida que vivemos tão maravilhosamente juntos, permanece intocada, imutável.
    O que quer que tenhamos sido uns para o outros, ainda somos. Então, tiro o chapéu a você, que nos fala dos seus que já se mudaram para o andar de cima da mesma maneira alegre que sempre fez, sem mudar o tom, sem esforço ou sombra. Rindo das piadas que se contaram , relendo com alegria as cartas escritas e recebidas, curtindo as velhas fotos em p&b, reeditando grandes conversas e silêncios cúmplices,agradecendo pelo tempo que dividiram.
    A sua crônica nos diz que a vida continua a ter o significado que sempre teve e que existe uma continuidade absoluta e inquebrantável. Aqueles que amamos não são esquecidos só por estarem fora do alcance da nossa visão.Nem nós um dia tão pouco seremos.Os que partiram estão num intervalo misterioso, numa esquina ainda desconhecida, à nossa espera. E assim por diante até...quem sabe?
    Abração

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  5. Belas lembranças, Mano . Tivemos uma infância muito boa cercados desses tios e tias maravilhosos.
    Tita

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  6. Oi Mano,
    tive, acho que, 20 tios, 10 de pai e 10 de mãe. Não vou contar pelos nomes agora. Todos ótimos. Mas havia UM, que morava em Minas e a quem chamávamos de Matinada (não sei a razão), não na frente dele, só meu pai o chamava assim, que era tipo Ofelia (eu), para algumas coisas só pegava no tranco.

    Um dia, meu pai apresentou a ele o Dr. Nunes, que estava de jaleco. Meu tio perguntou, por estarem na calçada em frente à barbearia: "Ah, é o barbeiro?".

    Meu pai, querendo consertar a situação, emendou logo, que não, este aqui é o Dr. Nunes, médico etc e tal, e teceu mil loas ao doutor.
    Esse meu tio não se deu por vencido e foi logo arrematando a conversa: "Está com roupa de barbeiro!".

    Não pense que ele era idiota, era bem esperto. Todos, em todos os lugares, gostavam muitíssimo dele. Mas havia nele, se é que você me entende, um certo jeito Ofelia de ser (eu Ofelia, não a outra), rsrs...

    Saudade docê, tio. Era assim que ele brincava. 'Ô sobrinha docê!'

    Mandava cartas e cartões para a família toda quando viajava com a dele. Exemplo raro. Meu filho o adorava.

    Fez muita falta. Todos fizeram muita falta.
    Fazer o quê?
    Abraço, Mano
    Ofelia

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  7. Dulce, estas histórias de antigamente hoje são as nossas histórias... e será que antigamente, quando éramos pequenos, tínhamos mesmo mais paciência do que os meninos de hoje para ouvir as dos nossos velhos? Te digo que não sei...

    Antonio, os tios são os amigos que esperamos ser também para os nossos sobrinhos, continuando o nosso (e deles, e de nós todos) Caminho.

    André, meu irmão mais novo e meu afilhado, e Tita, minha irmã mais velha, nós (e os outros cinco também, tenho certeza) tivemos mesmo uma infância muito boa. Muito boa mesmo. E foi um pouco a saudade dela que me levou a escrever essas histórias.

    Moacir, você entendeu tudo o que estava por detrás do meu post. A tristeza pelos que foram para lá na nossa frente passa, a alegria que eles dividiram conosco fica para sempre dentro de nós.

    Ofélia, este certo jeito Ofélia de ser era, tenho certeza, o que fazia todo o mundo gostar do seu tio Matinada.
    Que era como você, de bobo não tinha nada...

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  8. Dulce Regina12/11/2016, 15:15

    De volta, Wilson. Oa reflexão a deixada por você. De fato não havia me dado conta disso, minhas histórias de antigamente começaram quando mamãe já disponível das responsabilidades dos filhos, começou a contá-las e, eu acompanhava seus relatos muito curiosa, pena não haver memorizado nomes de pessoas, ex : um " galinho garnisé " , assim se referiam aos que começavam " arrastar asa " , para as moiçolas e que fez o pai ( meu bisavó , que não conhecemos ) de minha avó, já adolescente, levá-la para morar com a família do seu patrão, homem de muitos recursos, com fazendas de café em Campo Grande e em Jacarepaguá. Essa é uma história muito bonita, interessante e histórica . Pois é, o nome desse tal rapaz era muito engraçado e os nomes dos três cavalos desse fazendeiro, e então padrinho de mamãe, que ia de Jacarepaguá a Campo Grande por trilhas, que hoje é a Rio-Santos. Converso sempre com minha irmã mais velha para saber detalhes e ficamos horas a fio nas belas recordações. Mamãe teve uma infância e juventude muito bonita, em meio de serestas e saraus, na época dos barões e baronesas de Jacarepaguá . É...acho que o interesse por histórias de antigamente, vêm com a maturidade. Bom de quem as tem para contar e com quem dividí-las. Seu quetionamento foi importante e acho que sorri com a resposta do neto, justamente por causa disso. Tenha um excelente sábado. Abraços para você e Ana

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  9. Francisco Bendl12/11/2016, 20:13

    Caro Wilson,

    Belo texto.

    Tive tios e tias que jamais vou esquecer.

    Por parte de mãe, que era filha única, as tias eram também dela, portanto, minhas tias-avós, de onde uma delas veio a ser minha "dinda", a Célia, na verdade, ANGERLINA ADELINA MANGANELLI, que lhe presto minhas homenagens neste espaço extraordinário e abençoado, indiscutivelmente.

    Tratavam-se de quatro pessoas admiráveis e inesquecíveis!

    As irmãs da minha vó foram as tias que mais vivi, a ponto de nos irem visitar em Brasília, na década de sessenta, quando morávamos em Taguatinga!

    Do lado do meu pai, que tinha dois irmãos, um casal, a convivência não foi nada fácil.

    Que família que brigava, credo!

    Meu pai era o mais velho, seguido do irmão dois anos mais moço e da irmã, também nascida após o mesmo tempo.

    Durante o tempo que meu pai viveu, curto, pois morreu aos 49 anos, deve ter se relacionado com eles somente antes de eu nascer, pois não me lembro de os três se darem nem que fosse bem aparentemente, para inglês ver, nada!

    O pau comia todas as poucas e raras vezes que se encontraram!

    Pois morreram sem se despedir um do outro!

    Talvez impressionado pela perda do irmão mais velho e o tempo que perdera brigando com ele, meu tio morre DOIS MESES DEPOIS, aos 47 anos!

    Quanto à irmã, esta depois que saiu do RS sem falar com os dois, viveu em Florianópolis até morrer em 2.001 sem a família, só, com apenas uma filha que tivera do seu segundo casamento.

    Então as minhas lembranças boas se fixam nas tias maternas, adoráveis, sensacionais, divertidas, sendo duas solteironas e duas casadas, sem filhos.

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  10. Francisco Bendl12/11/2016, 20:15

    Logo, eu e o meu irmão fomos criados por elas como se filhos fôssemos!

    A tia Wilma adorava cinema, viajar - o marido, o tio Rudi, era um técnico de som excepcional, e montou inúmeras salas de cinema nas décadas de quarenta e cinquenta em vários locais do Brasil -, a ponto de um dos verões, exatamente em 1.966 (eu tinha 15 anos) em Tramandaí, RS, ela andava na garupa de uma Lambretta comigo, de tão arrojada e ... corajosa!!!

    A tia Olga, sua irmã, casada com um ex-bombeiro da Brigada Militar - chegou a lutar na Revolução de 32 -, o tio Carlos, era um cara sisudo, sério, que não mostrava os dentes! Nós o evitávamos com receio de que usasse o seu revólver contra nós, eu e o meu irmão, pois não éramos nada silenciosos nas brincadeiras, e ele adorava o silêncio.

    A meiga tia Olga, sua esposa, era a cozinheira. As sopas, as massas, o pato assado com polenta e radicci aos domingos, a maionese ... a comida da tia Olga era inigualável, e era ela que fazia as compras na feira, escolhendo as verduras, vegetais, abastecendo a despensa da casa.

    Carinhosa, não perdia a paciência para nada. Uma dama!

    A tia Anita era solteirona, voluntariosa, misturava o nosso idioma com expressões italianas porque o meu bisavô e bisavó, pais delas, tinham vindo da Itália, da região do Vêneto.

    Um tanto irritadiça, baixinha, reclamava do mundo. Sem saber ler e escrever, surpreendia aos mais afoitos como que ela sabia dos problemas políticos e econômicos à época!

    NO ENTANTO, AI DAQUELE QUE A PERTURBASSE QUANDO SE SENTAVA EM FRENTE AO RÁDIO PARA OUVIR O SAUDOSO REPÓRTER ESSO!

    A tia Célia, minha madrinha, trabalhava à época como contadora (guarda-livros) de uma poderosa metalúrgica em Porto Alegre.

    Independente, solteira, era a chefe do bando porque as quatro irmãs e maridos de duas delas moravam juntos, na mesma casa, enorme, comprida, com quatro dormitórios, e se davam muito bem!

    A tia Célia era autoritária, olhos pequenos, uns riscos na face, porém brilhantes, pequenos radares astutos, observadores, e quando alguém vinha para cima dela com uma conversa que não lhe agradava, era virava as costas e exclamava:
    - Tanti chiacchiere!

    Foi exemplo de pessoa organizada, honesta, honra e palavra empenhada.

    Ela vinha almoçar em casa às 11;30h. Após o almoço, secava a louça, se arrumava de novo e voltava para o trabalho, cinco quadras de onde morava.

    Durante 38 anos seguiu este trajeto ininterruptamente! Ao se aposentar da única empresa onde trabalhara, ganhou de presente uma TV de 14", da marca Empire (não me esqueço).

    Cabia à dinda sustentar a irmã, tia Anita, e dividir com as demais as despesas de alimentos, água, luz, e manutenção da casa, inclusive o chalé na praia, que citei acima.

    Jamais as vi brigarem entre si. Era uma harmonia perfeita a vida daquelas minhas amadas tias.

    A primeira que morreu foi a Anita. Em seguida a minha dinda, ambas no mesmo ano, 73.

    Em 85, a querida tia Wilma, amável, dócil, bonita, esguia, elegante, vaidosa, divertida - eu a visitei no hospital dois dias antes de ela falecer de câncer.

    A tia Olga viveu até 92 anos, morrendo em 1.992, na casa da sua irmã, a minha vó materna, em Cachoeira do Sul, RS.

    A minha vó, quinta irmã - sobre ela vale um artigo que, se eu tiver condições um dia desses escrevo -, morreu em 1.996, aos 86 anos, e encerra em definitivo meu convívio com a família da minha mãe, que morrera em 1.971, antes de todas elas, aos 42 anos, vítima de câncer em uma das mamas!

    A perda da filha e da sobrinha amada foi uma tragédia!

    Claro que eu e o meu irmão - eu com 20, ele com 14 -, sofremos mais as consequências tanto emocionais quanto físicas, pois acompanhamos a existência de nossa mãe caracterizada por amarguras, decepções, infelicidades, deixando-nos certamente para descansar, ainda mais se ela levou em conta o seu casamento com o nosso pai, um capítulo à parte, em termos de sofrimento!

    Fui longe demais neste comentário.

    Um abraço, Wilson.
    Muita saúde e Paz!

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  11. Chicão, meu amigo, seu comentário valeu por outro post.
    E seu tio Carlos e meu tio Santinho talvez tenham peleado um contra o outro em 32, que bom que os dois tiveram sorte e sobreviveram.
    E vamos ficar à espera de seu post sobre a sua avó.
    Um abraço do
    Mano





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