Louis Léopold Boilly - Jeux de Dames - 1803 (commons wikimedia) |
Antonio Rocha
Sempre que, neste ótimo blog do Mano, leio as crônicas do Moacir e ele
faz alusão a “martelar as pretinhas” ou coisa semelhante, eu lembro que esta
era uma expressão antiga que muitos escritores e jornalistas usavam nas
redações de jornais e revistas, ainda no tempo da máquinas manuais de
datilografia, uma referência às teclas na cor preta com as letrinhas brancas,
ou vice versa...
Quando Pimentel escreve a expressão acima, eu lembro do livro “Edson
Friques com as brancas, Lélio com as pretas (e o Diabo com todas)”, do meu
querido amigo José Bóia Farias, alagoano radicado em Santa Teresa, aprazível
bairro carioca. Trata-se, na verdade do jogo de damas da nossa infância.
Bóia é um especialista no quadrado mágico, conhecido como jogo de damas. Eu não sabia que este
passatempo é tão importante. Ele é técnico do setor, é comentarista de
partidas, profundo conhecedor, estudioso e pesquisador da matéria, analista de
jogos.
Corrigindo-me ele declara que não é um simples passatempo, mas um
esporte como qualquer outro e em seu blog cita:
“O tempo em que o Jogo de Damas era considerado como um passatempo já
acabou. É, na verdade, um desporto intelectual de primeira ordem, próprio para
afastar a juventude dos fúteis e fáceis prazeres; o jogo começa com meios
absolutamente iguais, o que exclui qualquer parcela de acaso!” (Pierre Lucot
─ ex-secretário-geral da Federação Mundial do Jogo de Damas).
Paris─França.
Foi graças a ele, aprendi que existe uma Confederação Brasileira do Jogo
de Damas, que organiza campeonatos municipais, estaduais e o nacional. Existe
também a citada Federação, com Copas do Mundo, semelhante aos jogos de futebol,
voleibol, basquete etc.
Em muitas cidades do Brasil há uma complexa rede de atividades
realizando concursos e promoções com esse jogo que, descobri, é paixão para
muitos.
Bóia já passou dos sessenta anos e desde a adolescência dedica-se ao
jogo de damas. Ele tem outros livros publicados: “O Pé-de-Avestruz e Outros
Ensaios” e “O Pé-de-Avestruz de volta”.
Alguns estudiosos afirmam que o jogo de damas ajuda a desenvolver o
raciocínio, sendo magnífico companheiro para as aulas.
Uns afirmam que no antigo Egito, se jogavam damas. E outros identificam
as origens na China multimilenar.
Observando bem, comecei a notar que é uma forma de meditação. De
relaxamento. De concentração, portanto, pode ser vista como uma disciplina
mental.
Um dos problemas atuais na área da Educação é que os alunos têm diversos
fatores que estimulam a desatenção, a distração e o jogo de damas, que é
parente do jogo de xadrez, bem pode ajudar a desenvolver o foco, prestar
atenção.
E tem os meios modernos que podemos jogar damas no computador, no
celular, acompanhados ou sozinhos, o jogo não perde a emoção. Autojogar-se,
autodescobrir-se, autoconcentrar-se, buscar a foco, refocar, outros nomes para
a conhecida atenção.
Importante atenção que o Buda ensinou. Da mesma forma que temos o
esporte do arco e flecha na prática do Zen-Budismo, podemos também desenvolver a
arte da atenção em um jogo de damas. O tabuleiro é a vida. A partida são os
desafios que a existência nos evidencia. Refletir, pensar bem e seguirmos
adiante.
Antonio, seu post me lembrou minha adolescência; eu gostava de jogar damas e xadrez, mas nunca tive a persistência para estudar o bastante para ficar bom em nenhum dos dois. Mas quando você fala do arco no Zen, me lembrei do "Arqueiro Zen", lembra-se da parte que fala de sentir que não é você, mas alguém fora de você que dispara a flecha? Me esforcei muito para chegar a este ponto quando eu competia em tiro, e quando se chega é uma sensação muito real, e muito boa. Me trouxe boas lembranças. E de algum modo isto pode ser aplicado a qualquer coisa que você realmente queira fazer.
ResponderExcluirUm abraço do
Mano
1) Concordo plenamente Wilson, através da prática do "tiro ao alvo" (não sei se é assim que se fala) vc autodescobriu-se. Parabéns !
Excluir2) É o que o Zen fala: passar o Portão sem Portão.
3) "isto pode ser aplicado a qualquer coisa" = certíssimo. Este é o Espírito da Atenção Budista !
4) Bom sábado !
Antônio,
ResponderExcluirConvicto de que o Universo vai juntando pontas soltas, peço-lhe licença para pular do tabuleiro das damas para o do xadrez e postar um poema com o qual me deparei faz alguns dias.
Abraço
Xadrez
Jorge Luis Borges
Regem no seu recanto os jogadores
As lentas peças. Esse tabuleiro
Demora-os toda a noite no severo
Âmbito em que se odeiam duas cores.
Dentro irradiam mágicos rigores
As formas: torre homérica, ligeiro
Cavalo, sagaz dama, rei postreiro,
Bispo oblíquo e peões agressores.
E quando os jogadores tiverem ido,
Depois do tempo os ter já consumido,
Decerto não terá cessado o rito.
No Oriente incendiou-se esta guerra
Cujo anfiteatro é hoje toda a terra.
Como o outro, este jogo é infinito.
II
Ténue rei, sesgo bispo, encarniçada
Dama, torre directa e peão ladino
Sobre o negro e o branco do caminho
Buscam e travam a batalha armada.
Não sabem que a mão assinalada
Do jogador governa o seu destino,
Não sabem que um rigor adamantino
Lhes subjuga o arbítrio e a jornada.
Também o jogador é prisioneiro
(Frase de Omar) de um outro tabuleiro
De negras noites e de brancos dias.
Deus move o jogador que move a peça.
Que deus atrás de Deus o ardil começa
De pó e tempo e sonho e agonias?
1) Muito bom Moacir.
ResponderExcluir2) "este jogo é infinito" = é a própria vida.
3) Me fez lembrar de um livro ótimo de Filosofia: "Homo Ludens", de Joan Huizinga, ed. Perspectiva.
4) O homem é um ser lúdico !
Caro amigo Rocha,
ResponderExcluirSempre gostei de jogar damas - não jogar COM as damas, frise-se.
A meu ver, prima pobre do nobre xadrez, que jamais consegui aprender, lógico, diante das minhas limitações mentais, distraí-me durante anos e anos debruçando-me sobre o tabuleiro, mais perdendo que ganhando.
Cheguei até a pensar que a falta de um campeão mundial em nível dos Grandes Mestres Enxadristas, que não havia no jogo de damas era o responsável pelo meu desinteresse em não estudar as artimanhas e estratégias relativas à disputa.
Ledo engano, haja vista que eu conto nos dedos da mão às vezes que fiz uma dama no jogo, que tinha a propriedade de avançar e recuar várias casas, assim como ir de um lado para outro, exatamente conforme as damas da minha época dançavam nos vistosos salões de baile dos clubes sociais!
Certamente mais interessado nos largos vestidos que deixavam uma pequena parte das pernas à mostra, os movimentos das damas humanas ocasionaram eu deixar de lado os limites do tabuleiro das damas de pedras, porque sem excitação, sem possibilitar que a imaginação ganhasse troféus de vencedores, que seria um abraço de qualquer dama que se dignasse a me apertar entre seus braços!
Assim, logo encontrei a minha dama, e passamos a jogar com a vida, uma peleja difícil, matreira, caprichosa, cheia de armadilhas pelo caminho.
No entanto - lembro a facilidade que as damas possuem no jogo que lhe empresta o nome -, a minha dama seguidamente me puxava as orelhas para seguir em frente, pois ela queria vencer a partida.
Parabéns, Rocha, pelo texto.
Uma novidade, pois há muito tempo eu não lia algo sobre este jogo tão agradável, e que não o disputo há décadas, além de não ser mais possível eu ir a bailes ver as damas rodopiarem nos salões porque estão escassos ou até extintos (ainda bem que achei a minha dama e eu soube preservá-la).
Um abraço.
Saúde e paz.
1) Salve Bendl, o que eu aprendi é que o jogo de damas é um esporte como outro, e não "prima pobre", mas respeito o seu ponto de vista.
ResponderExcluir2) Podemos até chamar de "damaterapia", gerando um duplo sentido.
3) Bom domingo !
Rocha, meu caro,
ExcluirQuando me referi que o jogo de damas era o primo pobre do xadrez, eu quis dizer que, neste último, se pensa muito mais, existem infinitos lances a serem imaginados, diferente do primeiro, que não exerce o charme do xadrez.
Decididamente não foi com a intenção de menosprezar quem joga damas ou que esta distração não tenha o seu valor, porém é indiscutível que o xadrez requer de seus jogadores uma condição mais apurada para se atingir certos níveis de excelência pois, jogar damas, até eu, Rocha, até eu!
Outro abraço.
Feliz domingo.
Olá, Antônio,
ResponderExcluirNunca consegui jogar xadrez ou dama apesar da insistência educativa do Mano.
O que você acha do sudoku?
Falando de outras coisas,
não sei se é a simpatia que sinto por você, sua calma e generosidade (ou por ser casado com uma gravadora, e por falar nisso, onde anda ela que nunca mais apareceu?) ou se é pelo Budismo ele mesmo, mas tenho me interessado por suas histórias e fico tempo pensando nelas.
Nunca serei uma budista, não sou de oferecer a outra face, sou mais vendilhões no templo. Sou ariana há 67 anos e, mesmo que quisesse, não dava tempo de mudar. Mas...alguma coisa, quem sabe?
Obrigada pelas novidades budistas.
Bom domingo e bom regresso.
1) Oi Ana, eu não sei jogar Sudoku, mas admiro quem sabe.
ResponderExcluir2)Agora que voltei das férias estou preparando algo sobre a gravadora Helô, mas dia 26 vamos para Teresópolis, então só retorno aos novos escritos em fevereiro.
3)Digamos que a simpatia (idem por vc e Mano)é o que chamamos "afinidade espiritual"
4)Por falar em Astrologia, Heloisa é Ariana, eu sou de Virgo, mas o meu ascendente é Áries e dizem que, quanto mais amadurecemos, mais o ascendente vai tendo preponderância; minha Lua é em Libra, mas eu não entendo nada. Na Astrologia Chinesa sou Dragão... um sonhador, não existo, faço esforço para manter o pé no chão. Meu estado ideal é viver por aí, voando igual o fictício Dragão.
5)Boa semana a partir de amanhã !