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31/08/2016

Conversando com as Cobras

Antoine de Saint-Éxupéry - Desenho original


Antonio Rocha

Nesta vida, o meu primeiro contato com as cobras foi aos seis anos, um tio me deu de presente “O Pequeno Príncipe”, de Antoine de Saint – Exupéry.

Eu estava iniciando o abecedário e ele me entregou uma preciosidade que guardo até hoje. Publicação da editora Agir, 1958. Tradução de Dom Marcos Barbosa, do Mosteiro de São Bento, RJ, e da Academia Brasileira de Letras. Conceituado jornalista, onde semanalmente pontificava uma crônica.

Tive a honra de conhecê-lo, graças a uma amiga da família que era ex-freira e prima dele. Certa feita, em memorável noite, na época da Semana Santa, à meia noite apagam-se as luzes do convento, todos vão para o pátio, monges e visitantes. Acende-se a fogueira e entoam-se inesquecíveis hinos e cânticos gregorianos.

Após a cerimônia, nossa amiga nos levou, eu e minha esposa, para o refeitório e participamos da ceia com os monges. Haviam outros leigos, então conheci o consagrado escritor Dom Marcos Barbosa.

Mas, voltemos às cobras...

Na página 2 do citado livro tem o desenho do autor: uma jibóia que engoliu um elefante.

Seguindo nessa linha do tempo e visitando um antigo Templo Budista que ainda existe no bairro carioca de Santa Teresa, RJ, vi o monge, nascido no Sri Lanka, varrendo uma cobra para a floresta.

Lá eles não matam nada. Questionei e o monge me respondeu: “Tem tantas por aqui, se matar uma vem outra, eu prefiro varrê-las”.

Depois, um outro monge que chegou, também do Sri Lanka, ganhou um gato de presente e resolveu o problema, disse-me:

“Onde tem gato não tem cobra”.

E é verdade, as cobras sumiram, de vez em quando o heróico felino pegava uma cobra... seleção natural... não houve interferência do ser humano.

Assim que casei fomos morar em uma casa que se coligava com o terreno da Floresta, do alto de Santa Teresa, já no Parque Nacional da Tijuca. E como tinha cobra...

Fui aprender nos livros os hábitos das mesmas.

Aprendi também, budisticamente, a fazer preces e orações a um determinado plano no astral invisível onde ficam os espíritos das cobras pedindo proteção, pois minha filha acabara de nascer.

Belo dia ela ganhou um patinho de presente, quando cresceu vimos que era uma pata (colocava ovos) e uma vez a pata encarou e botou para correr uma cobra.

Nas minha aulas de autodidata em cobra, estudei que a época de reprodução delas é no mês de maio e, então, era um problema pois apareciam cobras demais, venenosas, uma delas, mordeu e matou uma cadelinha vira lata que tínhamos.

Que fazer?

Mediante os meus aprendizados esotéricos decidi “conversar” com as referidas. Fui para o meio do mato, o terreno era grande, entoei mantras, preces, orações, proteções e falei que estava estabelecendo um limite.

Da parte onde eu estava para baixo, elas podiam viver felizes. Todavia, se subissem eu, a contra-gosto, teria que matá-las, sabendo budisticamente que eu iria receber carma negativo, mas era uma questão de sobrevivência da minha família e amigos.

Depois disso, apareceram poucas... tive que assassiná-las em legítima defesa. Fervíamos um caldeirão e quando a água estava em ebulição jogávamos na cobra.

Lamento, por elas, triste fim, mas era um mal necessário.

Tenho outras crônicas de cobras e similares, depois conto.

Obs.: De acordo com o Budismo, qualquer pessoa, pode e deve conversar com todos os seres vivos e também os seres invisíveis.

Acredite se quiser, mas por enquanto, tem dado certo.



4 comentários:

  1. Moacir Pimentel01/09/2016, 09:43

    Caro Antônio,

    Desculpe -me chegar tão atrasado.Tem um poema , em versos livres , escrito por um dos meus autores favoritos , em um dia quente na Sicília, à beira de uma calha de água e diante de uma serpente bebendo água que tem tudo a ver com essa nossa "conversa". Como é enooooorme não vou postá-lo mas recomendo-lhe a leitura. A Serpente do H.D. Lawrence.

    Porém ...os monges do Sri Lanka têm razão: para cobras os gatos são a solução e, é claro, a terceirização do karma (rsrs). Talvez Pablo Neruda explique os nossos dilemas ..

    Ode ao Gato
    (...)
    O homem quer ser peixe e pássaro,
    a serpente quisera ter asas,
    o cachorro é um leão desorientado,
    o engenheiro quer ser poeta,
    a mosca estuda para andorinha,
    o poeta trata de imitar a mosca,
    mas o gato
    quer ser só gato
    e todo gato é gato
    do bigode ao rabo,
    do pressentimento ao rato vivo,
    da noite até seus olhos de ouro.
    (...)
    Abraço

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  2. Lembro-me que na década de sessenta, quando estava no auge os concursos de beleza, principalmente Miss Brasil, o livro de cabeceira das moçoilas era O Pequeno Príncipe!

    Algumas só tinham visto a capa, mas esta obra foi uma das mais citadas que ouvi na vida, assim como Em Busca do Tempo Perdido, de Proust, que poucos leram porque imaginavam ser apenas um livro, e não uma série.

    Voltando às cobras, como disse o Rocha, eis um bicho que não simpatizo.

    Certamente eu não teria esta atitude com elas, de conversar, estabelecer um acordo, pois eu as aniquilaria de imediato, sem contestação.

    Mas esta é uma das virtudes que aprecio no Budismo, de entenderem que todas as formas de vida têm direito à existência, e não se sabe qual seria aquela que teria precedência sobre as demais, incluindo a espécie humana, além de a serpente ter sido a causadora dos nossos problemas atuais, em face de ter tentado a Eva a comer do fruto proibido.

    Neste sentido, peço permissão ao Rocha para contar uma piada sobre a Eva ter sucumbido aos pedidos da cobra:

    Dizia a víbora:
    - Eva, experimenta esta fruta, ela é uma delícia.
    - Não, dizia a Eva resoluta.
    - Eva, se tu comeres esta maçã terás mais conhecimentos.
    - Não, respondia a Eva, decidida.
    A serpente estava desesperada porque havia um papel a cumprir e não estava conseguindo.
    Pensou por uns instantes e voltou à carga:
    - Come, boba, emagrece!

    Eis o resultado.

    Um abraço, Rocha, meu amigo.
    Saúde e Paz!

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  3. Antonio,
    Era pra eu reclamar do Bendl. Mas eu ri do inesperado verdadeiro. O que só vem a mostrar, mais uma vez, a esperteza da cobra.
    Foi engraçado, Antonio, não foi?

    No Alto da Boa Vista vi cobras duas vezes. Eu acho um horror, tenho medo delas. Mas curiosamente não saí correndo. Elas é que fugiram de mim (o significado de Ofelia é SERPENTE, sabia?).
    As únicas cobras de que gostei foram as do Veríssimo.
    Porque nem no jogo do bicho eu joguei.

    Ah: você sabia que na Islândia o povo acredita em duendes? Acredita mesmo.

    Eu cada vez mais acredito menos em tudo.
    Ah: Roberto Carlos conversa com flores, ou plantas. É o que dizem.
    Sabe que vou experimentar? Eu conversava com um melro que ficou comigo 18 anos. Será que durou muito por causa da nossa conversa diária?

    Abraço, Antonio.
    Saúde e Paz
    Ofelia

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  4. 1) Primeiro as Damas, sou das antigas ... oi Ofélia, é bem possível que o melro tenha vivido tanto por causa das conversa. As cobras, de fato, fogem da gente, elas só atacam se estiverem com fome ou sentirem-se encurraladas. Sim, eu sei que na Islândia eles acreditam em Duendes. Constituem uma espécie de Patrimônio Espiritual daquele povo, inclusive mudaram o traçado de uma auto-estrada devido a um rochedo, residência dos gnomos, duendes e afins.

    2)Moacir, um amigo brasileiro que morou 5 anos no Sri Lanka me contou que lá tem um ditado popular: "Deus criou os gatos para que possamos acariciar os tigres".

    3)Bendl, boa piada ! Impossível matar todas as cobras, assim o acordo foi melhor.

    4) Gratidão a todos (as).

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